Page 32 - Revista Política Democrática nº 43 - Maio/2022

POR QUE AINDA PRECISAMOS DO FEMINISMO? - BEATRIZ RODRIGUES SANCHEZ

“ as mulheres ao mundo privado da emoção

e do cuidado e os homens ao mundo pú-
blico da razão. Por isso, os cursos de en-
A VIOLÊNCIA CONTRA AS fermagem, pedagogia, assistência social e
terapia ocupacional, apenas para citar al-
guns exemplos de cursos relacionados ao
MULHERES, EM SUAS universo do cuidado, são majoritariamente
femininos.
DIVERSAS EXPRESSÕES, AINDA ainda hoje recebem salários menores do
No mercado de trabalho, as mulheres
que os homens, mesmo quando ocupam o
É UM GRAVE PROBLEMA QUE mesmo cargo. Além disso, a divisão sexual
do trabalho faz com que, além do trabalho
A SOCIEDADE BRASILEIRA produtivo remunerado, as mulheres sejam
responsáveis pelo trabalho de reprodução
PRECISA ENFRENTAR “ social da vida, que inclui o cuidado com
crianças e idosos e as tarefas domésticas.
Neste cenário, algumas mulheres, especial-
mente brancas e de classe média, podem
pagar para que outras mulheres, especial-
mente negras e periféricas, realizem este
A violência contra as mulheres, em suas trabalho, muitas vezes em condições pre-
diversas expressões, ainda é um grave pro- cárias. Assim, a divisão sexual do trabalho,
blema que a sociedade brasileira precisa en- conjuntamente com a divisão racial do tra-
frentar. Seja a violência doméstica, aquela balho, cria obstáculos para o exercício ple-
que acontece dentro de casa, entre marido no da cidadania.
e mulher, ou entre filhos e mães, ou avós Quando analisamos a representação po-
e netos; seja a violência política de gênero, lítica das mulheres nas instituições, o cená-
que acomete as mulheres que ocupam car- rio atual também é preocupante. No Poder
gos dentro da política institucional (como Legislativo, no Executivo ou no Judiciário,
o feminicídio político de Marielle Franco); as mulheres, especialmente as mulheres
seja a violência obstétrica, especialmente negras, periféricas, indígenas, trans e ru-
contra mulheres negras que, por conta do rais, são minoria nos espaços de poder e
racismo estrutural, são vistas como mais re- na burocracia estatal.
sistentes à dor e muitas vezes não possuem Atualmente, o Brasil ocupa a 146ª co-
acesso à anestesia. Todas essas formas de locação no ranking de mulheres nos par-
violência ainda marcam, nos dias de hoje, lamentos, atualizado mensalmente pela
a sociedade brasileira, historicamente pa- organização Inter-Parliamentary Union
triarcal e racista. Apesar de o argumento (IPU). Essa sub-representação política das
da “legítima defesa da honra” em casos mulheres se reproduz em todos os níveis
de violência contra as mulheres ter ficado federativos – federal, estadual e municipal
demodê, todas essas formas de violência – prejudicando a consolidação de nosso re-
continuam impedindo que as mulheres gime democrático. Para se ter uma ideia,
exerçam o direito à vida e à dignidade de apenas 2 das 27 unidades da Federação
forma plena. (incluindo o Distrito Federal) são chefiados
No âmbito da educação, apesar de ter- por mulheres: Rio Grande do Norte e Piauí.
mos entrado no ensino superior, alguns No governo federal, dentre as 23 pastas
cursos ainda são majoritariamente mas- ministeriais, apenas duas são ocupadas por
culinos, especialmente os cursos da área mulheres.
de exatas. As salas de aula dos cursos de Como podemos perceber, a desigualda-
engenharias, matemática, economia, es- de entre homens e mulheres continua sen-
tatística, por exemplo, ainda têm poucas do estruturalmente marcante na socieda-
mulheres. Essa diferenciação de gênero nas de brasileira. No entanto, quando falamos
áreas de formação tem relação com cons- em “mulheres”, devemos lembrar que não
truções sociais históricas que relacionaram formamos um grupo homogêneo. Apesar

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