Page 12 - Revista Política Democrática nº 50 - Dezembro/2022
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O DEBATE AUSENTE: O DESEQUILÍBRIO EXTERNO PERSISTENTE DA ECONOMIA BRASILEIRA - JOSÉ LUIS OREIRO
R$ 150 por filho, recompor o orçamento Está claro que a situação fiscal no Bra-
do programa farmácia popular, entre ou- sil está longe de ser confortável, mas a
tras políticas sociais e assistenciais. Muitos dívida pública brasileira (% do PIB) é si-
economistas, a maioria deles ligada direta milar a de países como Índia e China. Se
ou indiretamente ao mercado financeiro, se o próximo governo for capaz de dese-
opuseram publicamente a essa medida ale- nhar uma nova regra fiscal para pôr no
gando que a “farra fiscal” (sic) iria produzir lugar do teto de gastos, que seja capaz
uma fuga de capitais do país, a interrup- de conciliar o espaço fiscal necessário
ção do financiamento da dívida pública por para o aumento do investimento públi-
parte do mercado, uma maxidesvalorização co em infraestrutura e dos gastos assis-
cambial e o recrudescimento da inflação ao tenciais com a redução da dívida pública
longo do ano de 2023, o que levaria a uma como proporção do PIB no médio prazo,
queda do salário real e a um agravamento para um patamar em torno de 65% do
da situação de fome e pobreza no país. PIB, não há razão para acreditar que o
Não é a primeira vez que esse tipo de ce- crescimento econômico possa ser restri-
nário apocalíptico é desenhado. Em 2020, to pelo lado fiscal.
durante a pandemia da covid-19, não foram Uma ausência gritante, para não di-
poucos os que disseram que o Brasil cami- zer escandalosa, no debate econômi-
nhava para um “abismo fiscal” devido aos co brasileiro é o desequilíbrio externo.
gastos excessivos com o auxílio emergencial, Conforme verificamos na figura abai-
os quais levariam a relação dívida pública/PIB xo, a partir de maio de 2008, no acu-
para perto de 100% em 2022 e que, devi- mulado em 12 meses, o Brasil começou
do a algum mecanismo mágico, a economia a apresentar déficit crescente na conta
brasileira entraria numa espécie de “buraco de transações correntes do balanço de
negro” com consequências catastróficas pagamentos, o qual atingiu a marca de
para a economia do país. Como sabemos, 4,25% do PIB em outubro de 2015. Esse
nada disso ocorreu. Graças, em larga me- desequilíbrio externo resultou numa des-
dida, ao auxílio emergencial, a economia valorização da taxa real efetiva de câm-
brasileira teve uma contração modesta em bio de 17,12% entre janeiro e dezembro
2020 (de apenas 3,3%) na comparação com de 2015, contribuindo de forma decisiva
os Estados Unidos e os países da União Euro- para a aceleração da inflação neste ano
peia. Além disso, a relação dívida pública/PIB e para a elevação da taxa básica de juros
no Brasil deve fechar em torno de 78% em por parte do Banco Central, amplifican-
2022, muito abaixo do cenário desenhado do a recessão que havia começado no
pelos profetas do apocalipse. segundo semestre de 2014.
Fonte: Ipeadata. Elaboração do autor
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