Page 47 - Revista Política Democrática nº 44 - Junho/2022
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PAOLO SOLDINI - O QUE NOS DIZEM AQUELAS TATUAGENS NAZISTAS DO BATALHÃO AZOV




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                  “Devemos nos perguntar se é mesmo normal que, num conflito em que se mata sem piedade, todos tendamos a
                  considerar quase um detalhe afirmações de pertencimento ideal que em outras circunstâncias, na normalidade da
                                        paz, consideraríamos aberrantes”, adverte Paolo Soldini



                     se é mesmo normal que, num conflito em     Não os tratemos como heróis
                     que se mata sem piedade, todos tendamos    Quem se preocupa com a liberdade dos
                     a considerar quase um detalhe afirmações de  ucranianos e quer que se criem as condições
                     pertencimento ideal que em outras circuns-  para a paz tem o dever de exigir que tal con-
                     tâncias, na normalidade da paz, consideraría-  tinuidade seja quebrada. Que não haja mais
                     mos aberrantes.                          nenhuma ambiguidade e que possa ser lan-
                                                              çado na lixeira da propaganda mais estúpida
                       Suásticas e efígie de Stepan Bandera   o afirmado propósito de Putin de “desnazifi-
                       O nazismo não é um detalhe da história.  car” a Ucrânia.
                     Menos ainda nas terras em que, hoje, os    Depois, poderemos nos ocupar da sor-
                     ucranianos estão se defendendo da agressão  te dos prisioneiros. Esperamos todos que
                     dos russos. Entre as imagens que apareciam  tenham  a vida poupada, que  sejam tra-
                     na pele dos homens de Azov, havia também  tados como prisioneiros de guerra, que
                     a efígie de Stepan Bandera. Para quem não  os russos finjam (como nós) não ver as
                     sabe, trata-se do ultranacionalista ucraniano  tatuagens e, quem sabe, mandem-nos de
                     que alinhou seu exército independentista ao  volta para casa numa troca de prisionei-
                     lado dos alemães quando estes invadiram a  ros. Mas, por favor, paremos, ao menos
                     União Soviética. Queria a  liberdade do seu  nós, de chafurdar nos mares da retórica,
                     povo em face dos russos, mas o subjugou ao  tratando-os como “heróis”. Mais do que
                     Terceiro Reich de Hitler, e as SS ucranianas fo-  nunca vale nesta circunstância a adver-
                     ram tão impiedosas quanto as austríacas e as  tência do Galileu de Bertolt Brecht: “Infe-
                     alemães para matar judeus.               liz é a terra que precisa de heróis”.
                       Bandera foi “reabilitado” em 2010 pelo pre-
                     sidente Viktor Yushchenko. Apesar dos duros
                     protestos das comunidades hebraicas e de Isra-      SAIBA MAIS SOBRE O AUTOR
                     el, sua imagem reapareceu nas praças durante
                     a revolta de Euromaidan e, desde então, está              PAOLO SOLDINI
                     muito presente, com estátuas e ruas com seu
                     nome, sobretudo na parte ocidental da Ucrâ-        SAIBA MAIS SOBRE O TRADUTOR
                     nia. Assinala uma continuidade ideal que existe,
                     assim como as tatuagens dos homens que rea-           LUIZ SÉRGIO HENRIQUES
                     pareceram das trevas do subsolo de Mariupol.



       JUNHO  2022                              REVISTA POLÍTICA DEMOCRÁTICA                                    47
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