Page 18 - Revista Política Democrática nº 42 - Abril/2022
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ENTREVISTA ESPECIAL - MARCO ANTONIO VILLA
otimista. Mas temos que ver sempre um refletem visões da sociologia america-
outro lado das questões. Estamos com o na que não se podem aplicar à realidade
espírito tão baixo – natural depois da tragé- brasileira, na análise da revolução burgue-
dia do governo Bolsonaro – que não con- sa no Brasil e da integração do negro na
seguimos ver transformações importantes sociedade de classe. As contradições do
e positivas que estão ocorrendo no mundo Brasil não são as mesmas da sociedade
até mesmo no tocante à democracia. americana. Falar isso eu sei que é um ter-
Por exemplo, o que está ocorrendo no reno pantanoso, perigoso, mas temos que
Chile é muito positivo e torço muito para falar, não dá para tergiversar. A questão
que dê tudo certo lá e influencie nas elei- que envolve a identidade no Brasil não é
ções na Colômbia, onde são promissores naturalmente a mesma que a dos Estados
os avanços na direção do fortalecimento da Unidos, por exemplo.
democracia. Lembro, ainda, os resultados São desafios, assim, que temos de con-
da última eleição portuguesa, em que o siderar no campo acadêmico e no campo
partido socialista obteve a maioria absoluta político. Há, infelizmente, nos tempos atu-
das cadeiras. Na Alemanha, os sociais-de- ais, uma fratura entre esses dois campos,
mocratas fizeram pelo menos o chanceler. que não existia nos anos 1950, nos anos
Vamos ver o que vai acontecer na França, 1960. Basta recordar que, nos anos 1970,
onde tudo é sempre problemático. Macron a Sociedade Brasileira para o Progresso da
deverá vencer no segundo turno, mas a ex- Ciência (SBPC) promovia grandes reuniões,
trema direita é historicamente fortíssima. prática que se estendeu a alguns momen-
Basta recordar que, no século 19, se ger- tos da década de 1980. Hoje, temos só fra-
minou todo aquele antissemitismo alemão, tura, justo quando enfrentamos questões
cujo padrão teórico veio de Gobineau, na complicadíssimas e fundamentais que me-
França, e de Chamberlain, na Inglaterra. receriam nossos melhores esforços conjun-
“ res recomendações para equacioná-las.
tos para, senão resolvê-las, listar as melho-
RPD: Com relação à conjuntura políti-
ca atual, estamos vivendo uma espécie de
OS PARTIDOS NÃO CONSEGUEM
Lula parecia ter vencedor garantido, mas
MAIS UMA RELAÇÃO DIRETA inflexão. A polarização entre Bolsonaro e
começa a revelar uma certa reversão em
favor do presidente, ao passo que forças
COM O ELEITOR, OU COM O da oposição batem cabeça. Essa avaliação
“REBANHO”, COMO GOSTAM é procedente? Em caso afirmativo, o que as
“ Metrópoles um levantamento interessan-
forças oposicionistas deveriam fazer?
DE FALAR MV: Hoje de manhã, olhava no portal
te sobre o que acontecia há cerca de seis
1998 e, sucessivamente, até 2018. Qual
O mundo está passando por transfor- meses antes das eleições de 1989, 1994,
era o desenho eleitoral no primeiro e se-
mações abruptas desde 24 de fevereiro. gundo turnos. O estudo verificou que, na
Até então, a história tinha registro de maior parte das vezes, o retrato seis meses
dois pontos de inflexão: a segunda guerra antes não foi o retrato do primeiro turno
e a queda do muro de Berlim. A invasão das eleições presidenciais. Pode ser que o
russa da Ucrânia lança novo desafio para fato se repita, não sei, é necessário cuidar.
todos nós, nos planos da economia, da Lembro que, em 2014, a morte do Edu-
política e da sociedade. ardo Campos, em 13 de agosto, mudou
Refiro-me, em particular, a essa disputa a situação eleitoral. Naquela segunda
na sociedade em torno de questões identi- quinzena de agosto e na primeira semana
tárias. Reli, recentemente, textos – decerto de setembro, Marina Silva passou a lide-
de autoria de jovens pesquisadores – que rar as pesquisas, quando sofreu o maior
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