Page 17 - Revista Política Democrática nº 42 - Abril/2022
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MARCO ANTONIO VILLA - ENTREVISTA ESPECIAL
Foto: Reprodução/Blog do Villa
para o Brasil, em que tudo se discutia. Mas certo momento da nossa história, no sécu-
a questão hoje não é incorporar na base lo 20, crescimento econômico sem demo-
programas sociais e intervenções imedia- cracia: durante o primeiro governo Vargas
tas da dimensão de um Bolsa Família, hoje e durante a ditadura militar. A democracia
renomeado e mal elaborado. Além disso, plena foi recuperada a partir da Constituição
são necessários, para se combater com de 1988. O que precisamos agora é voltar
efi cácia a miséria e a pobreza, progra- a crescer de forma sustentável mesmo, ter
mas efetivos que desloquem socialmente, um papel de destaque no mundo, entrar nas
usando uma expressão ao Elio Gaspari, o cadeias produtivas globais. Tudo isso que se
andar de baixo para andares intermediá- fala todo dia, e, ao mesmo tempo, enraizar
rios na estrutura social brasileira. o que dizia Otávio Mangabeira, essa planti-
Esse é o grande desafi o da atualidade, nha tão frágil que é a democracia no Brasil.
políticas permanentes. É a condição sine
qua non para o país voltar a crescer. Fico RPD: Virou moda, hoje em dia, matizar o
ouvindo discussões sobre como melhorar a conceito de democracia diante das dificul-
defesa dos direitos trabalhistas no campo dades de o sistema capitalista fazer refletir
do direito, quando, na verdade, a questão sobre os níveis de renda e emprego da po-
central não está no que falta ou sobra na pulação, os frutos das incessantes conquis-
legislação trabalhista. A questão é que a tas alcançadas pela tecnologia. Seria essa a
economia não volta a crescer, como cresce- origem de discursos políticos alternativos,
mos em certo momento da nossa história. populistas e demagógicos, que buscam
Se olharmos as últimas quatro décadas – a simplifi car conceitos que fissuram o edifício
de 80, a de 90 no século passado e as duas da democracia para valorizar o recurso à
primeiras deste século – são quase décadas discórdia, senão o ódio, entre os cidadãos?
perdidas. Quando dizíamos que os anos
80 foram uma década perdida, tínhamos MV: Na breve conversa que tivemos
como referência os anos 60 e 70. Mas, na hoje no café da manhã, minha mulher fez
comparação com o que veio depois, não uma relação entre a vitória do Orbán, na
há dúvida de que 80 foi a melhor das últi- Hungria, a guerra da Rússia contra Ucrâ-
mas quatro décadas. nia e questões do Brasil. É inevitável, mui-
O desafio é, portanto, voltar a crescer e tas vezes, entrever uma leitura um pouco
combinar crescimento econômico, que em pessimista da conjuntura contemporânea.
si já é um desafio, com democracia. Este é Não sou o doutor Pangloss redivivo, o céle-
o desafio duplo brasileiro. Já tivemos, em bre personagem de Voltaire, eternamente
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