Page 30 - Revista Política Democrática nº 49 - Novembro/2022
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ENTREVISTA ESPECIAL - BABALAWÔ IVANIR DOS SANTOS
                     “                                        diálogo crítico com ela e criar novas per-



                                                              guntas que levem a novas possibilidades.

                     Nem todos os
                                                                PD: Como o senhor vê a possibi-
                                                              bilização para garantir a segurança
                     acadêmicos são                           lidade de se fazer uma grande mo-
                                                              alimentar da população negra e dos
                                                              povos tradicionais como um todo?
                     intelectuais.                            dução de alimentos necessários. Todo
                                                                Primeiro, ampliando o apoio à pro-

                     Normalmente, são                         mundo  acha  que  a  África  é  fome  para
                                                              todo  mundo.  As  pessoas  conhecem  as
                     reprodutores de meros                    áreas de crise na África, onde o povo,
                                                              de fato, às vezes, por questões climáti-
                                                              cas ou de dificuldades de agricultura ou
                     conhecimentos, uma                       de conflitos, não tem o que comer, mas
                                                              a África tem o que comer. Na Guiné-Bis-
                                                              sau, há alimento e pesca. Em países que
                     boa parte deles. Não                     têm a pesca como ponto fundamental e
                                                              onde não entrou a ideia do lucro em si,
                     é à toa que eles não                     excessivo, a produção é mais coletiva, e
                                                              é isso que tem que ser feito no Brasil,
                                                              nas comunidades quilombolas. Como
                     topam certos debates                     se constrói uma rede de produção nas
                                                              áreas tradicionais que resulte em preços
                     porque não dominam,                      mais baratos nas favelas? A gente não
                                                              tem uma rede de comunicação, porque
                                                              o  agronegócio  e  os  grandes  empresá-
                     pois a academia não é                    rios dos mercados dominam essas áreas.
                                                              Até nas dos quilombolas, eles financiam
                                                              a produção, mas como se transforma
                     uma verdade absoluta”                    a lógica de produção de alimento para
                                                              alimentar quem está no campo, mas
                                                              também quem está na cidade? São de-
                                                              safios, mas essas áreas podem produzir
                     esses centros e os questionou. Muitos    alimentos  de  qualidade.  Na  Nigéria,  há
                     africanos questionaram, a partir do aces-  produção  de  inhame,  que  é  a  base  da
                     so que a colônia tinha como privilégio,   comida nigeriana. Há grandes mercados
                     como o próprio Amílcar Cabral e muitos   populares de rua com comércio de inha-
                     outros nomes brilhantes. É isso que te-  me, pimenta, dendê, peixe, batata doce
                     mos  que  fazer  também aqui  no Brasil,   e laranja. Há comida farta. Todo mundo
                     criar uma possibilidade de um pensa-     acha que não há na África, mas existe.
                     mento intelectual acadêmico que reflita   Fome Zero não é só, na minha opinião,
                     mais os de baixo no nosso país. Mesmo    dar o cartão para o pessoal adquirir o
                     aqueles que falaram do povo brasileiro   alimento no mercado, mas criar um pro-
                     deixaram uma lacuna enorme para en-      cesso de produção e escoamento de ali-
                     tender a questão racial até do ponto de   mentos  para que  cheguem a  uma rede
                     vista acadêmico. Sérgio Buarque, assim   mais barata e a quem mais precisa.
                     como muitos outros, foi brilhante. A es-
                     querda o tem como referência importan-
                     te, mas há lacunas enormes a partir das            SAIBA MAIS SOBRE O ENTREVISTADO
                     nossas perspectivas. Não quer dizer que
                     você vai desqualificar essa produção,              BABALAWÔ IVANIR DOS SANTOS
                     pelo contrário, mas tem que fazer um




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