Page 22 - Revista Política Democrática nº 47 - Setembro/2022
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ENTREVISTA ESPECIAL - JORGE CALDEIRA




                     de economia de subsistência era usado  lidar com isso. O que a República fez, e o
                     por economistas conservadores, liberais e  Brasil  precisa  fazer  agora,  é  simplesmen-
                     da esquerda, que achavam que ali não ha-  te diminuir o tamanho do caminho entre
                     via riqueza. Isso foi contemplado nos anos  economia formal e economia informal para
                     1970, quando viram que a economia dos  que haja crescimento. Se quiser plantar em
                     índios era capaz de produzir excedente,  cinco milhões de propriedades, você tem
                     fazer troca, e, portanto, permitia acumula-  que facilitar a vida de cinco milhões de
                     ção. No livro Banqueiro do Sertão, mostro  proprietários e fazê-los empregar outras
                     como  fazer  negócios  com  índios  gerava,  cinco milhões de pessoas que, hoje, estão
                     dentro da economia brasileira, uma cadeia  tudo na informalidade. Vai ter que forma-
                     de acumulação de capital gigantesca. Ca-  lizar para poder prestar conta do contrato
                     pital era prata contrabandeada do Peru,  de venda de carbono fixado para alguém
                     em 1600, 1700, antes do ouro. Então, esse  que veio do exterior. Esta formalização sim-
                     padrão não era visto pelo conceito antigo.  ples permite muito, e o problema do Brasil,
                     Hoje, para se explicar como que a econo-  para ser uma segunda, primeira economia
                     mia colonial brasileira chegou a ser do ta-  do mundo, é saber fazer isso direito hoje,
                     manho que a dos Estados Unidos, a razão  o que não é tão difícil. Acho que o que se
                     é  simples.  O  chamado  mercado  interno  faz, no país, é vender como não educação
                     que, antigamente, era calculado em peso.  o que, na verdade, é cultura e produtivi-
                     A economia informal era a economia. No  dade. Índios sabem reflorestar melhor do
                     século XVIII, o padre Guilherme Pompeu de  que o melhor fazendeiro. Temos que arran-
                     Almeida movia negócios em uma área que  jar um jeito também de, nessa economia,
                     ia de Buenos Aires, Potosí, Belém, Salvador,  chamar um índio para nos ensinar, o que
                     Rio de Janeiro, sem sair de Araçariguama.  não  é  feito porque achamos que ele é
                     Ele tinha capital suficiente para fazer isso  mal-educado e que nós somos educados.
                     trocando – ele basicamente fabricava ferro,  Não é verdade. Todo o Brasil foi feito de
                     “                                        Europa desconhecia. Quem se adaptou?
                                                              adaptação a uma realidade tropical que a

                                                              Quem conhecia? O índio. Eu sempre dou
                                                              o exemplo do homem da carrocinha de
                                                              reciclagem, que é economia circular e a
                     A elite brasileira tem
                                                              mais moderna que existe. Aquilo lá é tra-
                                                              é trabalho, e ele, trabalhando, enche a
                     muita dificuldade de                     balho e capital. A carrocinha é capital. Ele
                                                              carrocinha, que é capital, e faz renda. Ele
                                                              não tem emprego. Ele não está no mun-
                     olhar uma economia                       do formal, mas ele é, tecnicamente, um
                                                              empreendedor, uma mistura de trabalho
                                                              e capital. Para a nossa sorte, a população
                     com os princípios da                     pobre do Brasil tem esta característica es-
                                                              sencial, e ela pode ser aproveitada.
                                                                PD: O Brasil já foi mais ou menos ino-
                     economia de carbono                      vador, mais ou menos capitalista, o ca-
                                                              pitalismo chegou à base?
                     neutro”                                    JC:  Há uma diferença entre empreen-

                                                              dedor e capitalismo. Capitalismo é tra-
                                                              balho assalariado, basicamente. Então,
                     que era a mercadoria base de troca com   você precisa ter acumulação suficiente
                     os índios. Trocava, fornecia esse ferro, por   de empreendedores para que chegue a
                     algodão, madeira, farinha. Vendia isso e   uma empresa capitalista. Isso depende de
                     acumulava prata nas trocas, que também   condições institucionais. No Brasil, não
                     fornecia para as áreas. Havia grande capa-  é muito bom porque mantém, na infor-
                     cidade empreendedora, mas a economia     malidade, a população empreendedora,
                     formal brasileira era realmente pobre para   e o país não é muito bom de formalizar




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