Page 10 - Política Democrática
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8 ENTREVISTA - LUIZ WERNECK VIANNA REVISTA POLÍTICA DEMOCRÁTICA
to, no caso da onda do impeachment manter o governo, fosse necessário tos do novo governo têm feito referên-
ganhar viabilidade. fazer uso da força? Não acabaria levan- cia só existe em razão de os bloqueios
Não é à toa que a reação fala em do à utilização de um método forte? políticos ao novo grupo no poder serem
marxismo cultural, uma das invenções LWV - Sim. Acho que esse caminho ainda muito frágeis. Não há oposição
discursivas com que se tenta paralisar é plausível. efetiva, os movimentos sociais estão
a revolução em curso. Mas é possível destroçados, o sindicalismo também.
devolver as mulheres a seus lugares e Então, por mais que a harmonia na atu-
papéis antigos? Quem vai devolver nos- al coalizão governamental seja difícil,
sa consciência ao substrato primitivo? “ESTAMOS DEPENDENDO e vai ser, os riscos são pequenos para
Quem vai nos devolver aos anos 20 do DAS NOVAS GERAÇÕES, ela. Por exemplo, ficamos sabendo pelo
século passado? Porque a tentativa é QUE NÓS NÃO noticiário que houve recuo na questão
essa – uma tentativa forte, movida por CONSEGUIMOS FORMAR. da cessão de parte do território para
grandes recursos, embora não tenha PORQUE NÃO HÁ uma base americana. Era de se presu-
capacidade de persuasão, pois, para ASTÚCIA POLITIQUEIRA mir que haveria muita dificuldade nisso,
onde se olhe, todas as grandes fren- OU ELEITORAL QUE NOS porque as Forças Armadas são o que
tes da presente mutação nas coisas do TIRE DESSE PÂNTANO.” são. Imagino que a reação que levou
mundo, como o meio ambiente, por a tal mudança de posição tenha vindo
exemplo, estão amparadas por biblio- mais do corpo militar do que de qual-
grafia, movimentos sociais, em setores quer outro lugar; não foi, certamente, a
expressivos da opinião pública, esforços reação da opinião pública.
sedimentados em diferentes agências RPD - O caminho da força? Mas, agora, quem vai segurar a orde-
por todo o mundo. Quem vai apagá- LWV: Sim. Cumpre a nós impedi-lo. nação democrática que conquistamos
-las? Quem vai subtrair tais temas das O céu de Brigadeiro a que alguns arau- com a Carta de 88? O Judiciário? Mas
bibliotecas e do mundo da vida? Quem
vai esquecer o inventário de análises
que o processo de Chernobyl suscitou? Foto: luiz jorge
A ordem cosmopolita, sempre latente
como utopia na tradição do pensamento
filosófico está, agora, presente no mundo
como uma utopia realista a partir de, pelo
menos, duas instituições muito podero-
sas: o Vaticano, de um lado, e a ONU, de
outro. Por isso mesmo, elas são institui-
ções-alvo a serem neutralizadas. Essa é
uma era sombria; e não apenas no Brasil.
A situação brasileira não pode ser
vista isoladamente. Ela contém aspec-
tos locais, sem dúvida, uma paisagem
social marcada pela desigualdade, ato-
res com tradições muito sedimentadas,
como os militares e os juízes, que não
são personagens vinculados ao mundo
da produção, mas ao Estado, a sistemas
organizacionais, a sistemas culturais
que lhes são específicos. A nova ordem
nacional que está vindo aí não por aca-
so escolheu o campo da cultura como
lugar privilegiado de suas intervenções,
porque é nele que se abrigam os ideais
de inovação, de igualdade e liberdade.
RPD - Mas essa nova ordem nacio-
nal, que está pontilhada de projetos
antagônicos, não levaria a que, para