Page 20 - Revista Política Democrática nº 49 - Novembro/2022
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POR UM PROGRAMA PARA OS BATALHADORES E UM HORIZONTE PARA O PAÍS - CARLOS DAVID CARNEIRO




                     Esther Solano e da cientista política Camila  renda, e/ou mesmo de trabalhar de forma
                     Rocha, a pesquisa “O conservadorismo e as  flexível e sem patrões. Já para as pessoas
                     questões sociais”, ajudou a destrinchar as  mais pobres, o “empreendedorismo po-
                     visões de mundo de parte deste segmento  pular” seria “uma forma de sobrevivência
                     (a moderadamente conservadora e residen-  para a qual se é empurrado por uma situa-
                     te em grandes metrópoles), oferecendo ao  ção econômica muito ruim”.
                     país informações valiosas para a compreen-  discursos, tratam-se de demandas justas e,
                                                                Descontadas as ideologias presentes nos
                     “                                        há uma certa dificuldade do que se chama
                     são das tarefas presentes.
                                                              muitas vezes, necessárias. Ocorre que hoje
                                                              de “esquerda”, em dialogar com elas. Se,
                                                              de um lado, um certo economicismo tende
                                                              a subsumir as frustrações a uma questão
                     Convivência com
                                                              de “crise econômica”, por outro, certas re-
                                                              imaginação programática se volte aos an-
                     a realidade do                           ferências intelectuais têm dificultado que a
                                                              seios dos batalhadores. Comecemos pelo
                                                              segundo ponto.
                     ‘empreendedorismo’,                      pletora de ferramentas intelectuais, parece
                                                                A  “crítica”,  como  amálgama  de  uma
                                                              ter tornado seu próprio exercício no “hori-
                     desejado ou por                          zonte último” das possibilidades políticas.
                                                              Se esse tipo de expediente confere algu-
                     necessidade, será                        ma vantagem em termos de “não se deixar
                                                              enganar”, as contradições encontradas na
                                                              sociedade deixam de ser vistas como pro-
                     duradoura, queiramos                     dutivas e a moralidade imanente ao tecido
                                                              social deixa de ser fonte de energia trans-
                     ou não”                                  formadora  para  se  tornar  apenas  fonte
                                                              inesgotável de autoengano.
                                                                Quanto ao economicismo, certamente
                                                              um ponto central de enfrentamento ao
                                                              “mal-estar” dos batalhadores, assim como
                       Entre  as  conclusões  da  pesquisa,  que  ponto central de um projeto nacional, con-
                     entrevistou em profundidade 120 bata-    siste em desenvolver uma economia de alta
                     lhadores residentes em  quatro metrópo-  produtividade e ocupações de qualidade.
                     les, apontou-se um sentimento recorrente,  É preciso, no entanto, situar este projeto
                     sobretudo entre os evangélicos, de “de-  no tempo. Mesmo se hoje fizermos tudo o
                     cadência social”, ligada à crise de valores  que precisa ser feito e, em alguns setores,
                     como ordem e hierarquia. Foi constante,  inclusive por conta disso, ainda teremos,
                     nessa chave, a preocupação com a “edu-   durante anos, amplos contingentes da po-
                     cação moral” das crianças e jovens.      pulação excluídos do trabalho de ponta.
                       A pesquisa também concluiu que há  Nesse sentido, a convivência com a realida-
                     muita frustração e revolta com a violência,  de do “empreendedorismo”, desejado ou
                     o que levaria a um sentimento de perda do  por necessidade, será duradoura, queira-
                     espaço público e insegurança mesmo no  mos ou não.
                     âmbito privado. Em relação ao poder públi-  O que fazer? Apesar de resgatar linhas
                     co, haveria, segundo as autoras, sentimen-  de crédito e pautar a questão do endivi-
                     tos de abandono, “de inutilidade, descar-  damento sejam bons começos, já sinaliza-
                     tabilidade, vulnerabilidade e insegurança”.  dos pelo novo Governo Lula, é preciso ir
                       No plano do trabalho, as autoras identi-  muito mais além. É preciso pensar em um
                     ficaram uma relação ambivalente dos ba-  Estado para os batalhadores. Certamente,
                     talhadores com o “empreendedorismo”.  uma estratégia nacional de desenvolvimen-
                     Entre os mais jovens e mais estáveis, este  to jamais poderá ser baseada em negócios
                     aparece como forma de complementar a  muito pequenos. Mas é possível pensar em




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