Page 44 - Revista Política Democrática nº 43 - Maio/2022
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UM HISTORIADOR CORDIAL - IVAN ALVES FILHO
das camadas médias no país, buscou apro-
ximar o movimento comunista brasilei-
ro dos militares revoltosos - foi ele quem
trouxe Luiz Carlos Prestes para o PCB - e
da própria intelectualidade - Oswald de
Andrade, Tarsila do Amaral e Di Cavalcan-
ti, participantes da Semana de Arte Mo-
derna, os quais ingressaram no partido
ainda nos primórdios da agremiação. Com
isso, rompia com a chamada política de
classe contra classe, revelando visão mais
sofisticada da nossa realidade.
Autor de vários livros, e posso citar Ma-
chado de Assis e Formação do PCB, As-
trojildo criou também inúmeras publica-
ções teóricas, com destaque para a revista
Estudos Sociais, que circularia entre 1958
e 1964. Nessa revista seminal, apresentaria
valores como Armênio Guedes e Leandro
Konder, para ficarmos apenas nesses dois
nomes. No plano internacional, integrou
a Executiva da Internacional Comunista,
fundada por Vladimir Lenin, sendo, aos 39
anos de idade, um dos líderes da revolução
mundial. Não era para qualquer um. Em
Moscou, dividiu um apartamento com nin-
guém menos do que o revolucionário, po-
“ Ho Chi Minh, figura central das lutas pela
lítico, escritor, poeta e jornalista vietnamita
emancipação do homem no século XX.
Oriundo do anarquismo, de extração li-
ASTROJILDO PEREIRA FOI bertária, portanto, Astrojildo Pereira talvez
tenha trazido para o PCB visão mais rica do
papel da sociedade civil entre nós, sempre
UM BRASILEIRO RARO. maior do que o Estado. O PCB só ganharia
com isso. Este revolucionário cordial, na fe-
liz expressão de Martin Cezar, conviveu com
E UM DEMOCRATA homens como Lima Barreto, Oscar Niemeyer,
Hélio Silva, Otto Maria Carpeaux, Graciliano
EXEMPLAR “ Ramos, Heitor Ferreira Lima, Nelson Werne-
ck Sodré e Luiz Carlos Prestes. Ou seja, com
o que o Brasil tinha de melhor e mais plural.
Com apenas 17 anos, protagonizou um
Foi um prazer poder reler esse clássi- encontro com Machado de Assis, eternizado
co, cuja primorosa reedição realça o livro em uma crônica de Euclides da Cunha, intitu-
como objeto. Astrojildo Pereira marcou, lada A última visita. O cineasta Zelito Vianna
como poucos, nossa trajetória nacional. reconstituiu historicamente esse episódio, a
Se não, vejamos. Gráfico de profissão, foi partir de um argumento do próprio Martin
secretário geral da Central Operária Bra- Cezar. Astrojildo Pereira foi um brasileiro raro.
sileira (COB), em 1913. Em 1917 e 1918, E um democrata exemplar. Escreven-
lideraria importantes greves no Rio de Ja- do de Moscou em 1925, reconheceu
neiro, sendo barbaramente espancado na que “a democracia, ainda que burguesa,
cadeia. Fundou, em 1922, a Seção Brasi- era vista como um bem pelas massas”.
leira da Internacional Comunista - Partido Era preciso ter coragem política para es-
Comunista. Percebendo o papel crescente crever isso naquele momento no país dos
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