Page 31 - Revista Política Democrática nº 50 - Dezembro/2022
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RICARDO JOSÉ DE AZEVEDO MARINHO - PARA UMA CRÍTICA PROGRESSISTA DO IDENTITARISMO




                     pressões superfi ciais e/ou intuições vagas.   Wilson Gomes insiste com razão que a
                     Desenvolveram uma argumentação basea-    nova língua dessas correntes, em sua diver-
                     da em análise precisa dos textos que em-  sidade, forma uma frente aparentemente
                     basam a política identitária. E parecem ter  unida apenas contra o homem-branco-pa-
                     a capacidade de ler muito do que os iden-  triarcal-ocidental, responsável por todos os
                     titários produzem, em toda a sua geografi a  infortúnios do mundo. Mas, assim que tais
                     política, mantendo a serenidade e agindo  correntes são criticadas a partir de outras
                     frente aos apaixonados pela vitimização  vertentes, elas se dispersam, e, se cada
                     “                                        mesmos argumentos certamente não são
                                                              uma pode reconhecer a validade dos ar-
                     com uma postura aberta ao diálogo real.
                                                              gumentos contra seu vizinho em luta, os
                                                              válidos para ela.
                                                                Há muitas causas diferentes a defender,
                                                              injustiças a reconhecer e reparar, como
                     Pedro Franco ilustra a
                                                              mostram as estatísticas maniqueístas ex-

                                                              colla. A cada um seu território de ativismo
                     absorção da política                     postas por César Benjamin e Bruna Fras-
                                                              e busca por reconhecimento, como mostra
                                                              Barbara Maidel. Ricardo Rangel acompa-
                     identitária pelas                        nha de perto as mutações das lutas femi-
                                                              nistas, de Beauvoir aos estudos de gênero,
                     corporações, indicando                   dos grupos LGBTQIA+ até Meghan Markle,
                                                              das lutas anticoloniais às pós-colonialida-
                                                              des e culturas de cancelamento. Rangel su-
                     o paradoxo das                           blinha de cada vez a proliferação de voca-
                                                              bulários opacos que permitem eliminar as
                                                              contradições  da  realidade  e  construir  um
                     consequências ”                          universo autolegitimado.




                       Para tanto, Antonio Risério, Barbara   “
                     Maidel, Bruna Frascolla, César Benjamin,
                     Demétrio Magnoli, Gustavo Alonso, Pedro   Adversários da direita
                     Franco, Ricardo Rangel, Raphael Tsavkko
                     Garcia e Wilson Gomes, entre outros, agar-  extrema se baseiam na
                     ram-se fi rmemente aos valores clássicos de
                     esclarecimento, precisamente o que é ne-
                     gado e rejeitado quando se recorre a ex-  mesma lógica identitária,
                     purgos, julgamentos e condenações.
                       Nas 561 páginas, 20 ensaios inéditos,
                     uma entrevista e alguns artigos, o livro   no ódio à alteridade e na
                     mostra até que ponto as reivindicações
                     identitárias,  em  todo  o  espectro  político,   definição fixa e imutável
                     são contraditórias e colocam essa política
                     em crise: elas rejeitam uma postura plane-
                     tária universal que articula as diferenças,   da identidade”
                     mas que acabam por proclamar para si em
                     outro lugar. Será preciso percorrer a his-
                     tória de toda essa literatura de vingança,   Pedro Franco ilustra a absorção da políti-
                     de todos esses apelos aos assassinatos em  ca identitária pelas corporações, indicando
                     nome da restauração da justiça, para per-  o paradoxo das consequências, inclusive
                     ceber que não se trata de tornar o mundo  em governança ambiental, social e corpo-
                     um lugar melhor, mas apenas ocupar o lu-  rativa (Environmental, Social and Gover-
                     gar dos odiados dominantes?              nance - ESG). Raphael Garcia expõe como




       DEZEMBRO  2022                           REVISTA POLÍTICA DEMOCRÁTICA                                    31
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