Page 25 - Revista Política Democrática nº 50 - Dezembro/2022
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HENRIQUE BRANDÃO - NUNCA HOUVE NINGUÉM COMO PELÉ




                     1956, no Santos, e termina em 1977, no  Wharhol (1928-1987), quando encontrou
                     Cosmos de Nova York. Foram 21 anos en-   Pelé em 1978, teve que rever sua profecia:
                     cantando o mundo com jogadas geniais e  “Você é a única celebridade que, em vez
                     gols maravilhosos (1.282 no total), marca-  de durar 15 minutos, durará 15 séculos”.
                     dos de diversas maneiras: de falta, de ca-  Pier Paolo Pasolini (1922-1975), cineasta
                     beça, com a perna esquerda, com a direita,  italiano, autor de O Evangelho Segundo
                     de bicicleta, de voleio – fora os dribles des-  São  Mateus  (1964),  disse:  “No  momento
                     concertantes que aplicava nos adversários  em que a bola chega aos pés de Pelé, o
                     – às vezes mais de um – antes de mandar a  futebol se transforma em poesia”.
                     “                                        velho esporte bretão já sabiam. Pelé pai-
                                                                Seus colegas de profi ssão corroboraram
                     bola para o barbante.
                                                              o que os pobres mortais adoradores do
                                                              ra, soberano, acima dos demais. O técni-
                                                              co argentino Cesar Luiz Menotti não dei-
                                                              xa dúvidas sobre o seu lugar no panteão
                     No momento em que
                                                              um novo Pelé se ganhasse três Copas do
                                                              Mundo e marcasse mais de mil gols”. Da
                     a bola chega aos pés                     das glórias esportivas: “Maradona só seria
                                                              mesma forma, o craque da seleção hún-
                                                              gara de 1954, Ferenk Puskas (1927-2006),
                     de Pelé, o futebol se                    decretou: “O maior jogador de futebol do
                                                              mundo foi Di Stefano. Eu me recuso a clas-
                     transforma em poesia”                    sifi car Pelé como jogador. Ele está acima
                                                              de tudo”. Johan Cruyff, jogador e técnico
                                                              holandês, foi na mesma toada: “Posso ser
                                                              um novo Di Stéfano, mas não posso ser
                                                              um novo Pelé. Ele é o único que ultrapassa
                       O mundo, estarrecido, submeteu-se ao   os limites da lógica”. Sigge Parling (1930-
                     Rei. Foi uma conquista que se deu não    2016), zagueiro sueco que jogou a fi nal da
                     na ponta das baionetas, mas no bico das   Copa de 58, quando Pelé despontou para
                     chuteiras mágicas que calçaram os pés de   o mundo fazendo dois gols na vitória da
                     um garoto nascido em Três Corações, no   seleção brasileira por 5 a 2, reconheceu o
                     sul de Minas Gerais, em 1940, fi lho de   talento do jovem adversário: “Após o quin-
                     dona Celeste e de João Ramos do Nasci-   to gol, eu queria era aplaudí-lo”.
                     mento, o Dondinho, jogador de futebol      A crônica esportiva tupiniquim, acos-
                     que levava o fi lho Edson Arantes do Nas-  tumada a vê-lo em ação, sempre teceu
                     cimento para acompanhar os treinos. O    loas ao Rei. Armando Nogueira (1927-
                     apelido Pelé veio dessa época, uma cor-  2010), cronista de mão cheia, afirmou:
                     ruptela do nome do goleiro do time de    “Pelé certamente teria nascido bola, se
                     seu pai, chamado Bilé, que o garoto Ed-  não tivesse nascido gente”. Nelson Ro-
                     son insistia em chamar de Pilé. A chacota   drigues (1912-1980), outro observador
                     com o guri acabou gerando o apelido que   perspicaz do futebol e da alma humana,
                     virou sinônimo de fi na realeza.         foi contundente sobre sua habilidade em
                       Mesmo altas autoridades políticas mun-  livrar-se dos oponentes:  “Quando ele
                     diais, ou personagens que fizeram parte da   apanha a bola e dribla um adversário é

                     história nos séculos XX e XXI, se curvaram   como quem enxota, quem escorraça um
                     ao  prestígio  da  majestade  negra,  nascida   plebeu ignaro e piolhento”. João Salda-

                     pobre, apenas cinco décadas depois do fim   nha  (1917-1990),  com  quem  Pelé  teve
                     da escravidão, em um país marcado pelo   rusgas em 1969, quando Saldanha era
                     racismo e pela extrema desigualdade social.     o técnico da seleção brasileira que viria
                        “Eu sou Ronald Reagan, presidente dos   a ser campeã em 1970, concorda que,
                     Estados Unidos. Mas você não precisa se   dentro das quatro linhas, não tinha ou-
                     apresentar, porque Pelé todo mundo sabe   tro igual a ele: “Dentro de campo, Pelé
                     quem é”, sentenciou Reagan (1911-2004),   foi um gênio, o maior que conheci. Fora
                     presidente dos EUA de 1981 a 1989. Andy   do campo, é um homem comum”.




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