Page 30 - Revista Política Democrática Online nº 39 - Janeiro/2022
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REPORTAGEM ESPECIAL - VANESSA AQUINO
m situações muito extremas ou comple- ambiental nesse sentindo e isso se torna evi-
xas de monitorar, Miguel Felippe explica dente ao olhar com atenção para eventos
que é necessário utilizar estratégias de en- como enchentes. O desmatamento das ma-
E genharia para manutenção. “Em casos tas ciliares, por exemplo, torna os leitos dos
como de Capitólio, é possível colocar tramas rios vulneráveis. Quando um rio transborda, o
metálicas, redes para segurar o rochedo ou blo- excesso de água atinge as margens e se não
cos que podem cair. Existem inclusive soluções houver mata ciliar o resultado pode ser catas-
que são de bioengenharia, mais ecológicas e trófico. Para Maria Dalce, é fundamental inicial
menos intervencionistas. Mas a gente só vai um processo de gestão ambiental que proteja
conseguir saber o que fazer, se a gente souber o e recupere o curso d’água.
que está acontecendo, e para saber o que está É importante entender que, quando o cur-
acontecendo precisa tanto do mapeamento de so d’água não possui matas ciliares, o vento
risco, quanto do monitoramento”, acredita. e a chuva levam a camada superficial do solo
O Brasil forma todos os anos profissionais em direção aos rios. O acúmulo de terra, lixo
capacitados para executar esse tipo de traba- e matéria orgânica no fundo de um rio é cha-
lho, segundo Miguel Felippe. São técnicos, ge- mado de assoreamento. O desmatamento é
ólogos, geógrafos, biógrafos, engenheiros que um dos maiores agravantes nesse processo.
fazem, desde o mapeamento de risco até o mo- Sem árvores, arbustos ou até mesmo grama, o
nitoramento e os planos de emergência. “É pre- solo fica mais solto e menos resistente, ou seja,
ciso uma equipe multidisciplinar, profissionais mais propício para ser arrastado pela chuva ou
treinados e capacitados especificamente para pelo vento. A falta de matas ciliares também
esse tipo de evento. No Brasil, as universidades ocasiona a erosão da encosta dos rios.
brasileiras produzem um corpo qualificado para Além da dificuldade de navegação, o asso-
esse tipo de trabalho”, destaca. reamento pode causar outros danos sociais e
Se o problema não é formação de profissio- ambientais. Devido aos sedimentos acumu-
nais capacitados, qual seria? O professor Miguel lados no fundo do leito, a água vai procurar
Felippe explica: “O problema é que os órgãos atalhos para seguir seu caminho. Muitas ve-
públicos que deveriam fazer esse tipo de traba- zes esses desvios acabam chegando em áreas
lho, seja em nível municipal, estadual e federal, com ruas e casas, o que ocasiona as enchentes
estão muito estrangulados. Nos últimos anos, urbanas. Uma das soluções para evitar esse
a gente teve uma perda de recursos humanos fenômeno é o reflorestamento das áreas pró-
gigantesca, um esvaziamento do corpo técnico ximas às margens de cursos d’água para im-
desses órgãos públicos, sobretudo na área am- pedir a entrada de sedimento nos rios. Conter
biental, que está articulado com essa política de os processos erosivos das matas ciliares é outra
desmantelamento da pasta ambiental do go- forma de prevenir e frear o assoreamento.
verno federal e aqui em minas do governo esta- Maria Dalce acredita que, além da recupe-
dual. Então isso faz com que muitas vezes fique ração ambiental, é importante que haja uma
a cargo dos órgãos municipais fazer esse tipo recuperação social. “O pessoal mais pobre é
de trabalho, e esses órgãos municipais além de empurrado a ocupar as áreas de risco sem ne-
reproduzirem essa lógica de estrangulamento nhuma estrutura de engenharia, no caso dos
dessa pasta ambiental, eles acabam também barrancos por exemplo, que não deveriam ser
não tendo recursos humanos, financeiros, téc- ocupados, o caso das margens de rio. Eu digo
nicos suficientes para atuarem sozinhos. Então, que é uma recuperação social, porque tem
isso está totalmente articulado com essa lógica que haver um programa, nem que fosse a lon-
neoliberalista de diminuir, de enxugar, de des- go prazo, por parte dos municípios, do gover-
mobilizar essa pauta.” no estadual, do governo federal, no sentido de
remover essas pessoas para outros locais”,
Recuperação ambiental e social considera a ambientalista. Ela acredita que
Segundo a ambientalista e fundadora da é necessário começar pelas áreas mais sujei-
Associação Mineira de Defesa do Meio Am- tas a inundações e a deslizamentos. “Não é
biente (AMDA), Maria Dalce Ricas, é impor- uma tarefa fácil tecnicamente e nem barata,
tante que haja uma gestão ambiental eficien- mas é plenamente possível, principalmente
te, que além de definir possibilidades de uso, se nossos impostos forem revertidos pelo
cuidasse ambientalmente de locais de risco. bem da proteção do meio ambiente e da
Ela explica que não há micro ou macro gestão justiça social.”
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