Page 49 - Revista Política Democrática nº 47 - Setembro/2022
P. 49
HENRIQUE BRANDÃO - UM NATAL COM DARCY RIBEIRO
sentido do Brasil, é considerado sua Depois disso, no período da luta
obra-prima na área das ciências sociais. pela redemocratização, assisti a inú-
O sociólogo e crítico literário Antônio meras palestras e debates em que
Cândido (1918-2017) indicou a obra Darcy era a estrela, lotando auditórios
como a melhor introdução sobre o que – sempre defendendo os índios, suas
é o Brasil. “Livro trepidante, cheio de
“ elemento libertador para o povo brasi-
terras e cultura, e preconizando a im-
portância do papel da educação como
leiro. A frase “a crise da educação não
é uma crise, é um projeto” sintetiza a
sua luta política.
Darcy era uma figura
Tive um encontro que me marcou
tal. Ateu, não faço questão de come-
vibrante, que defendia para sempre com Darcy. Foi em um Na-
morar a data. Mas essa ficou na me-
mória. Creio que era o ano de 1978,
ideias de maneira o primeiro sem meu pai. Estávamos
eu, meus irmãos e minha mãe. Se não
me falha a memória, também estavam
eloquente e apaixonada” presentes Marcos Palmeira e Betsy de
Paula, filhos de Zelito Vianna e da Vera,
em cuja casa acontecia a reunião. Ha-
via ainda um índio recém-chegado do
ideias originais”, disse o professor Mato Grosso, onde Zelito havia rodado
emérito da USP, em artigo escrito no seu filme Terra do Índios, Darcy e sua
ano de 2000, quando listou quais se- mulher, Claudia Zarvos, e Frei Betto,
riam as 10 melhores leituras para co- que organizou a cerimônia natalina.
nhecer o país. Sentamos todos em uma roda e
Além de todas as qualidades de ho- sorteamos uns papeizinhos que con-
mem público e intelectual militante, tinham o nome de cada um de nós.
Darcy era uma figura vibrante, que Coube a mim pegar o nome do Darcy.
defendia ideias de maneira eloquen- E assim fomos nós, eu e ele, para um
te e apaixonada. Amigo de meus pais, canto da casa conversar. Na volta, de-
frequentador da minha casa, Darcy foi veríamos relatar a conversa para o res-
quem, em abril de 1978, proferiu o to da turma, assim como todos os ou-
discurso de despedida à beira do tú- tros também o fariam. Devo confessar
“ por quem tinha profunda admiração
mulo de meu pai, Darwin Brandão. que a surpresa de poder compartilhar
certa “intimidade” com um homem
travou minha língua. Falei quase nada.
Sorte a minha que o Darcy falava pe-
los cotovelos e me salvou de gaguejar
A frase “a crise da
na hora de contar aos demais sobre o
nós dois. E foi assim que passei o Na-
educação não é uma que havíamos conversado: falou por
tal mais inusitado de minha vida, na
companhia da família, de amigos, um
crise, é um projeto” frei revolucionário, um índio e... Darcy
Ribeiro. Inesquecível.
sintetiza a sua luta SAIBA MAIS SOBRE O AUTOR
política” HENRIQUE BRANDÃO
SETEMBRO 2022 REVISTA POLÍTICA DEMOCRÁTICA 49