Vinicius Torres Freire: Ruim para os EUA, pior para o Brasil

Economia americana teve algum alívio em maio, mas depende de gás do governo.
Foto: White House
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Economia americana teve algum alívio em maio, mas depende de gás do governo

Maio foi um mês de despiora ligeira para a economia dos Estados Unidos. Houve mais festinha nas Bolsas marombadas e nova conversa sobre a projeção mais otimista de alguns adivinhadores profissionais, minoria para quem a recessão será em forma de “V”, queda e retomada rápidas.

O aumento das vendas do varejo americano em maio mais do que compensou as perdas de abril, embora o faturamento ainda esteja uns 8% abaixo do nível pré-epidemia. Cerca de 2,5 milhões de pessoas voltaram a trabalhar, mas falta empregar outros 20 milhões que foram para a rua na epidemia. Houve crescimento da indústria, embora bem abaixo do esperado.

Parte do salto das vendas foi consumo represado, de quem manteve o emprego e ficou com dinheiro na conta, poupança forçada devido ao confinamento. Parte foi graça dos trilhões de socorro do governo, que pagou uma renda básica instantânea e aumentou para valer o valor do seguro-desemprego —tudo somado, além da renda emergencial, o pacote é quase 50% maior do que o PIB brasileiro. Esse auxílio para trabalhadores e famílias acaba em julho.

O presidente do banco central, o Fed, Jerome Powell, disse ao Senado que a coisa ruim vai longe. A OCDE estima que o PIB americano caia 7,3% neste ano e chuta que, no ainda mais nebuloso 2021, cresça 4,1%, o que não recupera o prejuízo. Para o Banco Mundial, o PIB cai 6,1% em 2020 e sobe 4% no ano que vem.

Maio foi um refresco parcial em setores localizados. Haverá desemprego prolongado, redução de salários, redução no investimento, confiança baixa ainda por causa do risco de contágio, empresas falidas ou endividadas, destruição de capital, setores danificados por muito tempo (turismo, restaurantes, entretenimento etc.), ineficiências provocadas pela reabertura sujeita às condições do vírus e pilhas de outros problemas para fazer rodar a atividade econômica real. E há o problema das rendas de emergência e outros socorros. Como se dizia, os democratas querem dobrar a conta, para mais de US$ 4 trilhões (um quinto do PIB dos EUA).

Em escala e qualidade muito diferentes, o Brasil terá os mesmos problemas. Mas o governo federal americano não paga nada para se financiar (taxa real de juros zero ou menos do que isso); em parte, na prática, é bancado pelo seu Banco Central.

Esqueça-se, para facilitar, que a economia brasileira é uma carroça de roda quebrada perto da americana. A epidemia, por aqui, ainda irá mais longe do que nos EUA; os auxílios emergenciais e outros socorros, não. Em tese não haverá investimento público para dar impulso a uma retomada. Aqui, maio ainda foi mês de afundamento, embora o número de pessoas ocupadas tenha parado de cair.

As taxas de juros de prazo mais longo estão altas. O governo se financia no curtíssimo prazo ou paga contas com dinheiro que tem no colchão de emergência, a fim de evitar por ora o custo de se financiar no mercado.

Na receita da política econômica, a despesa com a epidemia terá de cair, o que vai arrastar a atividade econômica. O peso relativo da dívida pública continuará a aumentar (por falta de crescimento do PIB e de receita de impostos), o que já era um problema notório faz anos, antes desta calamidade.

A fim de evitar ruína sem fim, terá de haver uma mistura de crescimento rápido, juros (Selic) quase tão baixos quanto os de agora e alguma alta de impostos e/ou corte de gastos. “Reformas”, por si sós, não tiram a economia do chão, reconhece até a OCDE.

Nós não temos uma receita para essa mistura.

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