Por ação ou omissão, é hora de decidir por arrocho ou avacalhação do teto
Existem três hipóteses para o começo de 2021: 1) um arrocho por inércia dos gastos do governo federal; 2) um arrocho conflituoso, que depende de mudanças da Constituição; 3) uma avacalhação do limite de gastos federais, o “teto”. O ritmo de despiora da economia e a popularidade de Jair Bolsonaro dependem da decisão que será tomada (por ação ou omissão).
Se vier uma vacina no início do ano, haverá um choque favorável de expectativas, claro. Seus efeitos práticos, ao menos econômicos, apareceriam na segunda metade do ano, porém. Nem é bom pensar no que aconteceria em caso de repique relevante do número de infecções, agora ou até o Carnaval mudo de 2021. Mesmo no melhor cenário para a epidemia, o gasto do governo terá papel dominante.
Faz meses que esse é o assunto maior e mais urgente da economia, discussão empurrada com a barriga pelo governo, em particular desde o início de outubro. Passada a distração das eleições, o muro do final do ano parlamentar e do problema do gasto estará a palmos dos nossos narizes. Qual o risco de quebrarmos a cara?
No cenário de “arrocho por inércia”, o governo não aprova medida alguma de corte relevante de despesas. Corta mais um pouco, a fim de respeitar o teto, de início talvez até mais, pois é grande a possibilidade de o governo federal não ter um Orçamento aprovado no início do ano (o que exigirá um escalonamento de despesas mais comedido). Nesse cenário, não haverá Renda Brasil, Bolsa Família encorpado ou coisa que o valha. Os pobres desempregados irão à miséria e haveria um impacto mais forte na capacidade de consumo.
Dadas a incompetência e a desumanidade de quem comanda o governo federal, que não sabe fazer coisa melhor, o cenário “arrocho conflituoso” talvez seja o menos mau. Nessa hipótese, governo e Congresso aprovam alguma mudança constitucional que arroche setores específicos. Isto é, cortam salários de servidores ou o abono salarial, por exemplo; pior e improvável, acabam com a despesa mínima federal em saúde e educação. Neste caso, haveria algum troco para dar auxílio aos mais pobres.
No cenário “avacalhação do teto”, governo e/ou Congresso inventam pelo menos uma gambiarra a fim de burlar o limite constitucional de gastos e pagam algum auxílio emergencial ou Bolsa Família menos magro.
O primeiro cenário, de inércia, é o arroz com feijão. Depois de despiorar, a economia se arrasta quase ao passo de 2017-2019. Há uma degradação lenta das expectativas econômicas e, tudo mais constante, do prestígio de Bolsonaro.
No segundo, haveria conflitos políticos sérios com as vítimas específicas do arrocho, melhora mínima do auxílio para pobres e miseráveis, alguma perspectiva melhor de crescimento e um resultado incerto na política.
No terceiro, do teto avacalhado, haveria alguma degradação das condições financeiras (juros em alta, dólar mais caro) e perspectiva de estagnação econômica ou coisa pior, a depender do tamanho da avacalhação e do tumulto financeiro. Note-se que não se discute aqui de revisão ordenada do teto dentro de um plano econômico sério (goste-se ou não da cor ideológica dele), tocado por governo e economistas capazes. Trata-se de avacalhação.
O país não tem nem Orçamento. O Congresso está atolado em disputas sobre seu comando em 2021 e sobre a (suposta) reforma ministerial. Bolsonaro está quase em pânico com o risco de cadeia para o filho Flávio e, pois, de mais revelações sobre os negócios históricos da família. Aumenta o risco de apagão na escuridão do governo.