Congresso fica mais independente; núcleo original da gestão de governo se desfez
Jair Bolsonaro deve manter em 2020 o mesmo padrão de relacionamento com o Congresso observado em 2019: nenhum. Haveria ao menos um padrão mínimo de governo?
O Planalto é mais e mais ocupado por oficiais-generais.
Podem colocar ordem na zorra da coordenação administrativa, embora não tenham experiência de articulação de governo, ministerial, e ainda menos parlamentar.
O núcleo original de ministros “da casa”, com assento no Planalto, acaba de se desmanchar de vez com a provável nomeação de um oficial-general de quatro estrelas para a Casa Civil.
Gustavo Bebianno foi demitido da Secretaria-Geral ainda em fevereiro do ano passado; o general Santos Cruz caiu da Secretaria de Governo em agosto em junho. Ambos foram abatidos com humilhação pela filhocracia, adepta da seita do orvalho de cavalo. Onyx Lorenzoni deve deixar oficialmente a Casa Civil, onde de fato jamais esteve, por inoperância.
A Secretaria de Governo é ora comandada por um general de quatro estrelas da ativa, Luiz Ramos. A Casa Civil pode ir para outro general de exército da ativa, Braga Netto, que seria outro chefe de Estado-Maior do Exército a ir para o governo, como foi o caso do ministro da Defesa, Fernando de Azevedo. Como foi o caso, aliás, dos generais-ministros Sérgio Etchegoyen (Gabinete de Segurança Institucional, GSI) e Luna e Silva (Defesa) no governo de Michel Temer.
A Secretaria-Geral é ocupada por um major PM, Jorge Oliveira, de longa relação familiar com os Bolsonaro, que tenta ser um gerente-geral jurídico-administrativo. Depois de uma quarentena na geladeira política, em parte autoimposta, o vice-presidente-general Hamilton Mourão foi convocado para conter a balbúrdia em parte da área ambiental, assumindo o Conselho da Amazônia.
Depois de levarem rasteiras inesperadas por eles mesmos quando pareciam conter as áreas mais lunáticas do governo (Itamaraty, filhocracia fazendo bagunça no play do Planalto), os oficiais-generais parecem dar a volta por cima de modo também imprevisto. O comando do Exército fica ainda mais identificado com o governo.
O sentido da mudança ainda é difícil de decifrar, como tanto no governo Bolsonaro.
Ao que parece, para o presidente, militares teriam a capacidade de gerência, mas não estariam inclinados a fazer carreira política ou sombra para Bolsonaro.
Para lideranças do Congresso, os generais são criaturas com quem se pode dialogar de modo razoável, racional e profissional, mas que não têm traquejo para articulações políticas maiores. Enquanto o comando do Congresso tiver lideranças mais ou menos comprometidas com isso que se chama de “agenda de reformas”, toca e comanda o barco.
Isso vai durar? Os parlamentares pouco ganham do governo, têm cada vez mais poder sobre o Orçamento (emendas e investimentos em particular), são enxovalhados pelas milícias virtuais e aos poucos vão se cansando de carregar o piano de medidas impopulares.
Por ora, o governo tem maioria acidental, instável e desestruturada para aprovar linhas gerais da “agenda liberal”, que nem é exatamente a de Paulo Guedes. Mas por que continuariam a apoiar o programa geral da elite e de parte do governo se do governo não precisam ou dele pouco recebem?
Não há pontes entre governo e Congresso, apenas pinguelas. Os comandantes do Exército ocupam o Planalto. Ministros da ala lunática continuam quase todos fora da casinha. Assim começa a política do ano dois da nova era.