O ‘garoto’ Felipe Neto, assim estigmatizado por analistas de todos os lados, deu um banho de humildade e maturidade em políticos e analistas no ‘Roda Viva’
Confesso que me causou espanto o nó que o convite a um influenciador digital com milhões de seguidores, Felipe Neto, para uma entrevista, provocou na cabeça de pessoas de várias faixas etárias e de diferentes cortes ideológicos. A reação, um verdadeiro rebuliço, para usar uma palavra que o próprio Felipe transformou em bordão nos seus vídeos, é sintomática do grau de infantilismo do debate político brasileiro.
O “garoto” Felipe, assim estigmatizado por analistas de todos os lados, deu um banho de humildade e maturidade em políticos, analistas políticos, cientistas sociais e outros que torceram o nariz para sua presença no centro do Roda Vida.
Dizendo de cara que não era especialista e que seu “lugar de fala” era o de um empresário, especialista em comunicação e cidadão interessado em política, falou com propriedade sobre autoritarismo, negacionismo científico, estratégias de comunicação via redes sociais e necessidade de união de esforços para preservar a democracia.
Admitiu erros do passado, propôs caminhos de convergência com a propriedade de quem sabe que influencia um imenso público jovem e se dispôs a ouvir.
A reação do bolsonarismo foi a de tentar desqualificá-lo pela idade e pelo fato de ser um youtuber. A de parte da esquerda, sobretudo do petismo, foi bater bumbo em cima de uma frase que ele falou de passagem em uma resposta, a de que hoje acredita que o impeachment de Dilma Rousseff teria sido um “golpe”. Pronto! Veio uma espécie de catarse retroativa nas redes sociais, e passou batido o que ele disse sobre a oposição estar totalmente vendida no debate público (como ficou comprovado, aliás).
A resistência de formadores de opinião e políticos a encarar que a forma como se faz comunicação mudou e que uma nova gama de influenciadores tem de ser trazida para o debate público mostra por que não será simples deixar um momento de interdição de ideias e do campo democrático do qual o bolsonarismo se alimenta.
Enquanto o presidente usa a rampa do Planalto como playground de golpistas à luz do dia de um domingo, os que o rechaçam se horrorizam com o fato de que um youtuber pode atingir mais pessoas para mostrar por que esse comportamento é inadmissível que muito político barbado e ultrapassado. O tempo passou na janela, e só Carolina não viu.
Covid-19: Prefeitura de SP insiste em medidas improvisadas para achatar curva
A Prefeitura de São Paulo resolveu tentar achatar a curva da covid-19 na base da tentativa e erro. Medidas arbitrárias, aleatórias e sem amparo em dados técnicos são anunciadas pelo prefeito Bruno Covas e em seguida revogadas, sem resultado algum para conter o aumento da transmissão do novo coronavírus. Do ponto de vista político, o improviso joga contra o discurso de Covas e do governador João Doria, ambos do PSDB, de tentar se contrapor às ações do governo federal com o argumento de que em São Paulo as decisões são tomadas com base na ciência e nos dados.
Depois de anunciar e voltar atrás no fechamento de grandes vias da cidade e na ampliação do rodízio de carros (que aumentou, como era óbvio, a aglomeração no transporte público), Covas decidiu fazer um feriadão prolongado de hoje até a próxima segunda-feira. As escolas municipais mal acabaram de conseguir iniciar uma mal ajambrada substituição para as aulas, depois de um mês de férias no início da pandemia. Grande parte dos alunos não conseguiu ainda acessar o aplicativo para acompanhar as aulas, pois não dispõe de recursos digitais. Nas escolas privadas, que também se adaptam, ainda que com muito menos dificuldade, ao ensino a distância, o feriado vai deixar famílias cinco dias com crianças em casa sem fazer nada enquanto os pais tentam trabalhar. Qual o convite? Para que as pessoas deixem a cidade para passar o feriado rumo ao interior e ao litoral, levando o vírus para passear.
A educação já sofrerá um imenso baque com a interrupção das aulas presenciais. O feriadão prolongado só vai desestimular alunos e professores. Além disso, regiões como a Baixada Santista estão próximas do colapso pela covid-19. Estimular a ida de famílias entediadas para essas cidades só vai agravar o problema. O custo de medidas improvisadas na base do “a gente vê, e se não der certo volta atrás” é o mesmo das declarações irresponsáveis de Bolsonaro: aumento da proliferação do novo coronavírus. Se São Paulo quer mesmo dizer que se guia pela ciência, é bom prefeito e governador coordenarem suas ações.