O noticiário do início do ano está coalhado de situações em que Jair Bolsonaro e alguma outra área do governo se contrapõem à diretriz de austeridade, corte a subsídios e combate ao populismo fiscal e tarifário da equipe do ministro Paulo Guedes (Economia). Trata-se de uma queda de braço que por ora passa meio batida pelo radar, uma vez que Guedes está em férias no exterior e só retorna ao Brasil brevemente para uma escala antes de Davos. Mas os focos vão se multiplicando.
O Estadão desta sexta-feira informa que Jair Bolsonaro quer conceder subsídio na energia elétrica para templos religiosos de grande porte, em mais um aceno político aos evangélicos, que têm sido um importante esteio de seu governo. Encomendou inclusive uma minuta de decreto ao ministro de Minas e Energia, Bento Albuquerque.
Subsídios tarifários e fiscais estão sendo combatidos pelo Ministério da Economia, que tenta, quase sempre sem sucesso, revogar vários que foram concedidos pelo governo da petista Dilma Rousseff.
O episódio dos templos não é o único a opor a área de Minas e Energia e o time de Guedes: há ainda a polêmica da revogação do subsídio às placas de energia solar em residências, pretendida pela Economia e pela Aneel e sustada por ordem de Bolsonaro, e a discussão sobre um colchão para os preços dos subsídios, esboçada por Bento Albuquerque e à qual a equipe da Economia tem sérias restrições, conforme informa o colunista Lauro Jardim em O Globo desta sexta.
Por fim, na cesta de problemas do início de ano que aguardam a volta de Guedes estão o caos no INSS, agora sob o guarda-chuva de seu superministério, a negociação com Bolsonaro sobre a reforma administrativa, que o presidente quer atenuar ao máximo, e a busca por recursos para a expansão prometida do Bolsa Família, conforme mostra reportagem da Folha nesta sexta.
Caos do INSS depõe contra discurso das reformas
As cenas de caos na análise de concessão de benefícios previdenciários, com estoque de mais de 1 milhão de pedidos não analisados e filas quilométricas com velhinhos, pessoas com necessidades especiais e crianças aguardando por horas para não serem atendidas, depõem contra o convencimento, por parte da sociedade, tanto da reforma da Previdência quanto da reestruturação do Estado, com sua redução –ambas medidas virtuosas e necessárias, mas que precisam ser implementadas com a necessária competência e com cuidado para com os cidadãos.
O governo perde a narrativa de que a reforma da Previdência foi bem estruturada quando o responsável pelo atendimento do INSS vai a uma rede nacional para admitir que o sistema não está ainda programado para calcular os benefícios pelas novas regras. Como defender que a informatização garantirá “conforto” aos usuários, palavra que ele usou, se as imagens mostram um colapso de atendimento?
Da mesma forma, essa impossibilidade de atender a demanda contradiz o discurso de enxugamento do atendimento humano na Previdência e sua troca por serviços informatizados, já que, da forma como estão estruturados, eles claramente não estão dando conta do recado.
A redução do Estado é algo desejável diante do caos fiscal do Brasil, mas ela tem de vir acompanhada de um choque de eficiência que não torne os serviços públicos, que já são de péssima qualidade diante de uma carga tributária das maiores do mundo, ainda mais caóticos.