Vera Magalhães: Apagão de janeiro

Primeiro mês do ano mostrou governo preso a suas próprias crises.
Foto: Marcos Corrêa/PR
Foto: Marcos Corrêa/PR

Primeiro mês do ano mostrou governo preso a suas próprias crises

O Congresso retoma suas atividades nesta semana ainda sem saber qual a estratégia do governo para a reforma tributária, sem perspectiva de receber a proposta de emenda à Constituição da reforma administrativa e sem um projeto do Executivo para equacionar o financiamento da educação básica a partir de 2021.

Janeiro ficou para trás e foi gasto, em Brasília, por apagões gerenciais do governo em várias áreas vitais para a população, crises palacianas vulgares e desnecessárias e o surgimento da velha e boa mamata por parte de aliados de Jair Bolsonaro, que propagandeava que ia acabar com essa velha prática da política, mas uma vez eleito passou a condescender com ela, a depender da lealdade e da proximidade de quem a pratica.

O que se viu no primeiro mês do ano não condiz com as elevadas expectativas que empresariado, mercado, produtores rurais e analistas têm para 2020: de mais reformas, crescimento acima de 2,5% ao ano, geração de empregos em ritmo mais acelerado e reforço na política do ministro Paulo Guedes de contenção do gasto público e ajuste fiscal paulatino, que foi bem sucedida no primeiro ano, mas enfrentará desafios adicionais neste.

Além disso, é necessário observar os ventos do mundo, e o que eles sopram neste início de ano é uma emergência global com o surto do novo coronavírus, cujo impacto na economia ainda é impossível de mensurar, mas que certamente afetará as exportações brasileiras.

Diante de um cenário internacional cada vez mais complexo e da importância de uma agenda econômica difícil de implementar, era de se esperar que o presidente e seus ministros estivessem focados nos assuntos importantes, e que iniciassem desde antes da volta do recesso a tão fundamental quanto negligenciada articulação política com o Legislativo.

Mas não foi isso que se viu no mês que passou. O Ministério da Educação brindou o País com uma lambança no Enem e no Sisu que não se sabe ainda se terminou. O secretário de ensino superior pegou o boné e deixou o cargo pouco depois do lançamento do Future-se, projeto que já pode ser “redesenhado” sem nem ter sido implementado. E a saída para a substituição do Fundeb é discutida pelo Congresso com o Ministério da Economia, porque o MEC simplesmente não é um interlocutor naquela que é a decisão mais importante para o financiamento da educação básica.

Mas o ministro Abraham Weintraub segue prestigiado junto a Bolsonaro. Ganhou uma fotinho no Twitter ao lado do presidente no fechamento da semana como sinal de que escapou do paredão. Tão previsível quanto desalentador, por ser um indicativo claro de que mérito não é critério para a nomeação e substituição de ministros neste governo, e sim uma lealdade baseada em mistificação, ideologia barata e promoção de guerra cultural.

Com essa régua, não causa espanto que o episódio da demissão, recontratação e “redemissão” de Vicente Santini, ex-assessor da Casa Civil que usava a FAB para conhecer o mundo, tenha virado um pretexto para fritar Onyx Lorenzoni, que estava de férias. Era necessário um bode expiatório quando a mamata do amigo da família Bolsonaro ficou pública.

O ministro perdeu o PPI, plano de parcerias e concessões, não porque a lógica sempre ditou que ele seja da Economia, mas como castigo e humilhação pública. De novo, competência não é o critério.

Filas no INSS e no Bolsa Família, intervenção na política ambiental depois da evidência internacional de fracasso na área e a desnecessária pinimba com o ministro da Justiça, Sergio Moro, foram outros legados de janeiro. Nesse quadro, os humores do Congresso na volta não tendem a favorecer a hercúlea tarefa de Paulo Guedes, que virou o ministro faz-tudo. Até quando ele vai segurar?

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