Começo este texto com uma longa citação de Roberto Ampuero, escritor chileno que viveu sob três ditaduras: a de Pinochet, a de Honecker, da Alemanha comunista e a de Fidel Castro:
“ Qual retorcido mecanismo mental conduz seres humanos a denunciar o abuso, a tortura, a marginalização, o exílio, o escárnio, o exílio, o assassinato daqueles que pensam de modo diferente sob uma ditadura de direita, mas os faz justificar as mesmas medidas contra aqueles que se opõem a uma ditadura de esquerda… Será que isso se deve à ignorância, à hipocrisia, ao ao oportunismo ou a uma lealdade mal entendida em relação a bandeiras ideológicas, à postergação da realidade em relação à utopia e do indivíduo em relação à massa?
A citação cai como uma luva para tentar entender parte da intelectualidade brasileira que colocam seu talento a serviço da deturpação histórica e para a construção de um mito ao qual endeusam e ficam esperando sua volta, como os fanáticos de Canudos acreditavam no retorno de Dom Sebastião.
Ontem disse que Palocci passaria a ser tratado como o grande traidor. Não deu outra. Os escribas do lulopetismo saíram a campo. Um deles comparou Palocci aos “desbundados dos anos 70” que iam à televisão para renegar a causa que abraçavam e tecer loas à ditadura. Com empáfia conclui: dos desbundados sentiu nojo. Eis aí um belo exemplo de lealdade mal-entendida em relação a bandeiras ideológicas.
Em nome de que causa Palocci deveria manter o silêncio? De um projeto de poder que pretendia fazer da corrupção o caminho mais rápido para o socialismo? E quem ele deveria preservar, o maior traidor dos brasileiros que institucionalizou o assalto aos cofres públicos?
Traiu a quem, aos petistas que se lambuzaram na lama? Ou a quem se aliou com a fina flor do patrimonialismo para obter vantagens indevidas? O que há de ideológico na Omertá petista?
Ainda está para ser escrito o papel nefasto da intelectualidade que pôs a sua pena, ou melhor, o seu teclado, a serviço da construção de um mito, de uma fraude. Não inovam. Na história da esquerda sempre existiram intelectuais dispostos a fazer genuflexão para seus ídolos, adotando uma postura reverencial e escrevendo hagiografias.
Os hagiográficos de ontem reverenciaram Stalin como o Pai de Todos os Povos, como Farol-Guia da humanidade. Idolatraram Dolores Ibárruri, como se ela fosse Nossa Senhora de Fátima. Veneraram o “comandante” Fidel Castro, assim como a Hugo Chávez e ao “companheiro Maduro.”
Como disse Ampuero, protestam contra ditaduras de direita, mas aplaudem as ditaduras de esquerda, como a de Cuba e a da Venezuela. Denunciam a corrupção de governos de direita, mas defendem com unhas e dentes.
Vociferam contra a corrupção quando cometida por governos de direita, mas dão justificativas ideológicas quando ela é cometida pela esquerda.
Mais grave: usam seu intelecto para vender a fraude de que, no caso de Lula e do PT, tudo não passa de uma orquestração da burguesia contra os trabalhadores. Me poupem!
Algum dia os hagiográficos terão de se ver perante a história e prestar contas de sua empulhação.
Quando os crimes de Stalin vieram à tona, Jorge Amado teve a hombridade de reconhecer que deificou um monstro, assim como deificou Prestes.
Não esperem atitude semelhante dos escribas petistas. No frigir dos ovos, eles são mais danosos do que Palocci, pois continuam firmes na sua missão de iludir o povo.