vera magalhães
Vera Magalhães: Antipetismo é a maior chance de Bolsonaro; e vice-versa
O melhor dos mundos para os extremos é se enfrentar no 2.º turno da eleição presidencial. Tanto Jair Bolsonaro (PSL) quanto Fernando Haddad (PT) têm na disputa mano a mano a melhor chance de se eleger presidente. O candidato do PSL segue liderando a disputa para chegar à 2.ª fase. O do PT patina, num sinal de que talvez o partido tenha levado longe demais a estratégia de esticar a corda da candidatura inviável de Lula.
É verdade que Bolsonaro oscilou positivamente, na margem de erro. Mas a maior movimentação foi no miolo, num sinal de que o deputado é resiliente, tem um voto consolidado, mas encontra dificuldade de expandir esse eleitorado. Comprovações disso são a rejeição recorde entre todos os postulantes e o fato de perder com relativa margem para quase todos os oponentes testados no 2.º turno – exceção feita justamente a Haddad.
Dos dez pontos porcentuais que migram do bloco de brancos, nulos e indecisos e dois que saíram dos nanicos, grosso modo é possível dizer que Bolsonaro abocanhou dois pontos, enquanto candidatos do pelotão intermediário cresceram dez, numa demonstração de que há espaço para um voto moderado. A se manter esse movimento, são praticamente nulas as chances de vitória no 1.º turno, mas também vai ficando difícil para os adversários tirá-lo da final, como imaginavam que seria fácil.
Aliás, a campanha na TV não causou nenhum arranhão no casco do PSL nos primeiros dias – tucanos e petistas, os mais interessados nos milagres que a propaganda pode operar, dirão que ainda é cedo para isso.
Geraldo Alckmin oscilou para cima, mas o ritmo ainda é insuficiente para atestar se, a despeito da vantagem estrutural que tem com a enorme aliança que construiu, conseguirá ir ao 2.º turno – se for, se torna bastante competitivo, como mostra a pesquisa.
A outra pergunta de US$ 1 milhão de 2018 – se Lula será capaz de, mesmo preso, transferir seu espólio a Haddad – também tem como resposta do primeiro Ibope após o TSE indeferir a candidatura do ex-presidente um “ainda não”. Por ora são Ciro Gomes (PDT) e Marina Silva (Rede) os maiores usufrutuários destes votos, ainda que não sejam herdeiros legítimos.
Vera Magalhães: Puberdade democrática
Brasil precisa superar a adolescência, sob pena de ficar senil sem nunca ter sido adulto
Quanto vale a democracia para você? E para o seu candidato a presidente da República? Para mim ela é um valor absoluto, não passível de negociação, flexibilização, tergiversação ou relativização. O compromisso com ela tem de ser total. Questão de princípio. Um limite rígido, que separa o aceitável do inaceitável.
No Brasil, a democracia entra na puberdade. Como todo adolescente, se acha plena, invencível. Testa seus próprios limites correndo riscos tolos, bestas. Olha para o passado dos pais com desdém, como aquele passado embolorado que aconteceu com eles, porque são velhos, mas jamais se repetirá com ele, o jovem malandrão.
Nas democracias mais velhas, portanto menos fanfarronas, a institucionalidade é um bem, não a tia chata que você tem de driblar a toda hora para pegar o carro escondido.
É algo com que não se brinca, porque se sabe que qualquer quebra institucional, por aparentemente menor que seja, abre uma brecha para outras maiores e pode levar o barco a afundar.
No Brasil adolescente, um presidente da mais alta Corte da Justiça combina com o presidente do Senado de mudar nas coxas a lei que trata do impeachment e fica tudo por isso mesmo.
Um partido força os limites das instituições até esgarçar seu tecido, insistindo na candidatura à Presidência da República de um preso, condenado em duas instâncias por crimes comuns (corrupção e lavagem de dinheiro), e tudo bem.
Um candidato a presidente e seu filho, deputado federal, dizem que vão resolver os problemas do País “nem que seja a bala” e são aplaudidos por uma turba cada vez mais fanática e mais disposta ao tudo ou nada.
Este mesmo candidato diz que se tiverem de morrer “10, 20” para que se resolva um problema de segurança, “paciência”, numa confissão prévia de falência do Estado, e quem questiona isso – uma vez que as leis do País não preveem essa permissão – é perseguido como defensor do “politicamente correto” ou “de bandido”.
Nada disso. O que existe é lei. Estado. Constituição. Não se resolve a violência transigindo com a barbárie, sob pena de a democracia sucumbir. Simples assim. Sabem disso todos aqueles que têm na defesa das instituições um valor, e não um discurso de conveniência. Não há meio termo, pois se houver se cruzou a barreira que permite relativizar tudo o mais. E não se pode fazer isso.
Numa democracia que já tivesse superado a fase das espinhas purulentas, nunca uma Corte eleitoral – por si só uma excentricidade juvenil – se reuniria a portas fechadas depois de decidir que o preso de que se falou antes não pode, mesmo, ser candidato e seu partido não pode usar o horário eleitoral até que indique um candidato apto para, logo em seguida, fechar as portas e decidir que tudo bem, vai. É só por hoje. Amanhã a gente cumpre a decisão. Afinal, já ficou tarde.
Isso é coisa de moleque que pega o carro do pai escondido, não de gente que veste toga. Isso dá margem não para que o partido em questão se sinta contemplado, mas que teste ainda mais os limites das instituições, como vem fazendo sem reserva, não se furtando nem a falsear a História numa narrativa farsesca.
Toda essa abundância de molecagens, à esquerda, à direita, vindo dos próprios Poderes constituídos, numa confluência de irresponsabilidade com o aperfeiçoamento da democracia, tem consequências graves. Elas são diárias. Aparecem na rápida corrosão do tecido social, que se pode notar na falta de educação geral nas redes sociais, na propensão de uma parcela grande do eleitorado a votar numa ideia fantasiosa de passado e de outra enorme a votar com o fígado.
Já passou da hora de o Brasil superar a adolescência. Sob pena de ficar senil sem nunca ter sido adulto.
Vera Magalhães: O voto moderado
Estão na batalha por esse eleitorado Marina Silva, Ciro Gomes, Geraldo Alckmin, Alvaro Dias, João Amoêdo e Henrique Meirelles
Se até este ponto da disputa presidencial os únicos votos consolidados parecem ser aqueles dados nos extremos, começa a ficar encarniçada a disputa pelo contingente de eleitores que não comunga nem do lulismo renitente nem do bolsonarismo exaltado.
O tal voto que já foi classificado como “de centro”, mas que comporta um espectro político-ideológico mais amplo – que vai da centro-direita à centro-esquerda – e, por isso, poderia ser chamado mais corretamente de voto moderado.
Estão na batalha por esse eleitorado Marina Silva, Ciro Gomes, Geraldo Alckmin, Alvaro Dias, João Amoêdo e Henrique Meirelles. Diante de tal pulverização fora dos extremos e do alto contingente de indecisos flagrado pelas pesquisas, será previsível assistir a um fenômeno que ocorreu em 1989: o surgimento de “ondas” na direção de um ou outro nome até que configure o segundo turno.
Esses candidatos vão mirar o eleitorado de Bolsonaro e do PT – que, até agora, não se transferiu para Fernando Haddad –, mas também trocar cotoveladas entre eles pelos indecisos e moderados insatisfeitos com a polarização exacerbada.
A temporada de dedo no olho nesse meio de campo já começou. Alckmin é alvo de artilharia dos rivais em peso pela aliança com o Centrão, que lhe garante uma vantagem logística na briga por esses votos. Bastou crescer um pontinho nas pesquisas e Amoêdo também entrou na mira dos demais.
Na sabatina Estadão/Faap, Marina mostrou o caminho que pretende seguir nessa disputa em que entra sem capilaridade partidária nem tempo de TV: focar tudo no eleitorado feminino, que hoje lidera o bloco dos indecisos, e na defesa de uma saída intermediária para o confronto bolso-petista.
Certamente não ficará sozinha nesses dois objetivos estratégicos, mas por ora leva vantagem nas pesquisas pelo recall das eleições passadas, por herdar momentaneamente os votos lulistas e pela trajetória política sem máculas éticas.
Pode ser pouco diante do arsenal que seus adversários terão em termos de recursos financeiros e acesso à propaganda. Ela própria não soube responder se o apelo ao voto moderado será suficiente numa campanha até aqui marcada pela estridência e a revolta com a política.
Pelo sim, pelo não, a ex-senadora não passará incólume a ataques dos adversários atentos a sua movimentação: depois do confronto que ela e Bolsonaro protagonizaram no debate da Rede TV!, apoiadores do ex-capitão já fazem o trabalho de desconstrução da ex-senadora nas redes. O mesmo trabalho, aliás, que começa a se voltar contra Amoêdo e já era feito em relação a Alckmin.
O bolsonarismo age para manter a tropa unida e evitar que se abra brecha para opções menos radicalizadas, o que poderia ser um golpe nas pretensões do candidato do PSL.
CAMPO MINADO
Rivais vão fustigar Bolsonaro por faltar a debate da CNA
Jair Bolsonaro será o alvo de todos os demais candidatos durante sabatina da Confederação da Agricultura e Pecuária do Brasil (CNA) hoje, em Brasília, um dos muitos eventos do gênero que decidiu cabular. Os opositores vão aproveitar a ausência do líder nas pesquisas para colocar em dúvida seu compromisso real com o agronegócio, setor no qual conta com o apoio de uma ala mais “tradicionalista”.
Aliás, essa divisão do agro em grupos ficou evidente com a organização do debate. Aquele mais ligado à pesquisa e à automação não está fechado com o candidato do PSL e se mostra mais próximo à vice de Alckmin, a senadora gaúcha Ana Amélia (PP).
Outro ausente do evento de hoje que não tem muito ambiente no patronato ruralista é Ciro Gomes (PDT), devido ao fato de sua vice, Kátia Abreu, que já presidiu a CNA, ter angariado muitos desafetos por lá desde que hipotecou apoio incondicional a Dilma Rousseff e fez uma guinada à esquerda.
Vera Magalhães: Bolsonaro entrincheirado
Líder nas pesquisas recolhe exércitos e reforça os territórios já conquistados
O início oficial da campanha levou Jair Bolsonaro para atrás das trincheiras. Ex-capitão do Exército e fã confesso de estratégias militares, o líder nas pesquisas preferiu recolher seus homens e reforçar os territórios de votos já conquistados para esperar a pesada artilharia adversária que virá.
A decisão de restringir ao máximo, e talvez até abandonar, a presença em debates se inscreve nessa lógica defensiva. Bolsonaro vinha abrindo o flanco e gostando desse tipo de confronto. Contribuiu para sua sensação de que podia ir para cima o desempenho acima do esperado no Roda Viva, para o qual contribuiu a prevalência de perguntas sobre os temas que ele está acostumado a debater – ainda que sua opinião nessas matérias choque uma parte da sociedade, esta não é aquela propensa a votar nele. Veio a sabatina na GloboNews e, de novo, ele achou que saiu por cima com a tática de eleger a imprensa como adversária.
Aquela semana positiva fez com que os adversários de Bolsonaro fossem ao primeiro debate acovardados e poupassem o capitão. Essa fase acabou no debate da RedeTV!, e como escrevi aqui ainda no calor do programa, ele acusou o golpe. Tanto que mudou de estratégia. Abrir mão dos debates na posição de Bolsonaro é uma aposta de risco. Ele é o que é hoje graças a uma mística de valentão, que não foge do confronto e diz verdades na cara dos inimigos e da sociedade.
Faltar a uma, duas, três sabatinas, ignorar encontros de setores aliados, como a Confederação Nacional da Indústria, e deixar em suspenso até a participação nos debates das grandes emissoras mostra um candidato temeroso das próprias fragilidades – programáticas, discursivas, posturais.
A trincheira que ele escolheu para defender sua cidadela de 20% dos votos são as aparições de rua, embaladas pela tietagem em torno de si e amplificada pela exposição massiva nas redes sociais. Nisso ele acerta brilhantemente: tem escolhido territórios de forte simbologia para exibir sua força, como cidades grandes e médias do interior paulista, exibindo seu poderio bélico perante Geraldo Alckmin, que governou o Estado quatro vezes.
É uma aposta em algo diferente das eleições anteriores: que um fenômeno nascido e criado nas redes sociais e vitaminado nas ruas poderá se manter intacto ao ataque que será perpetrado na propaganda eleitoral e nos debates a que deixar de ir.
Pesquisa CNT/MDA divulgada nesta semana perguntou aos entrevistados qual o meio de maior influência na definição do voto. Para 34,2% são os debates. Em seguida vem o horário eleitoral na TV, com 20,4%. As redes sociais estão em quarto lugar, com 7,7%. Na TV, Bolsonaro sofrerá um massacre quantitativo. Terá 11 comerciais ao longo de toda a campanha, contra 13 diários de Alckmin – aquele mais interessado em fustigá-lo, por calcular que disputam a mesma vaga no segundo turno.
Cito os comerciais porque são a modalidade mais impermeável ao discurso de Bolsonaro para que as pessoas desliguem a TV na hora da propaganda eleitoral: o spot aparece no intervalo, quando você não espera, tem 30 segundos e pode ser usado para minar aos poucos o primeiro colocado.
O candidato do PSL parece apostar na cristalização de sua posição, que o tornaria refratário a esses estratagemas – testados em eleições anteriores, mas que ainda são uma incógnita diante dos novos paradigmas pós-Lava Jato e impeachment e num momento de crescimento do peso relativo da internet na política, aqui e no exterior.
Se insistir na nova tática, serão 40 dias na trincheira. Parece tempo demais, mas ele estocou munição e tem consigo um exército fiel, disposto a defendê-lo com unhas e dentes. E à bala.
Vera Magalhães: Candidatos sem atributos
O que se viu no primeiro debate foi um deserto de homens, mulheres e ideias
A Lava Jato sacudiu a política brasileira, dragou seus principais expoentes e deixou no lugar um deserto de homens, mulheres e ideias. Muitas análises podem ser feitas sobre estratagemas mais ou menos eficientes sobre o primeiro debate presidencial, mas nenhuma vai superar o fato de que o que se assistiu foi um desfile miserável de frases vazias, por vezes desconexas e que não enfrentam nenhuma das gravíssimas e urgentes questões nacionais.
O eleitorado descrente, raivoso e desesperançoso que viu no curso de menos de quatro anos um ex-presidente ser preso, uma presidente recém-reeleita ser apeada do cargo para o qual já não tinha condições mínimas de exercício, o segundo colocado nas últimas eleições se autoincinerar ao vender a alma para um açougueiro em troca de dinheiro vivo e um presidente da República virar um zumbi depois de ter de parar de governar para salvar o próprio pescoço não encontra nas opções colocadas na praça alguém com atributos necessários para assumir o comando.
Quem declara voto em Jair Bolsonaro e professa essa decisão como os seguidores de algum culto lisérgico de um líder messiânico ou um curandeiro televisivo não o faz porque entenda que ele é preparado para o cargo. E sim porque quer professar seu desalento e seu ódio pelo que está aí da maneira mais estridente.
Quem olha para Geraldo Alckmin e pensa em votar nele não o faz porque vê no tucano um líder capaz de conduzir o País a um novo ciclo de desenvolvimento, mas sim porque teme os extremos e vê em seu discurso anódino, monocórdio e burocrático a opção menos pior.
Aqueles que ainda apontam Marina Silva como possível recebedora do seu sufrágio não manifestam empolgação pelas ideias "nem lá nem cá" da ex-senadora nem sua postura de vestal diante dos malfeitos, mas sim movidos pelo recall de suas aparições anteriores, há quatro e oito anos atrás, e o fato de que ela não apareceu em nenhuma lista de indiciados nesse período.
Quem indica Ciro Gomes nas pesquisas não está em busca de uma opção desenvolvimentista de esquerda, mas enxerga na retórica incisiva do ex-ministro uma alternativa à ausência de Lula na chapa.
Por fim, os espantosos quase 30% que ainda falam que votariam num condenado em segunda instância a mais de 12 anos em regime fechado por corrupção e lavagem de dinheiro o fazem fechando os olhos para o fato de que seu partido comandou um esquema de pilhagem sistemática e orgânica do Estado. Iludidos pela volta de uma certa bonança econômica artificial que também ela foi demolida por Dilma Rousseff, essa invenção pela qual Lula parece também ter sido absolvido pelos seus defensores.
Na ausência absoluta de um debate acerca de quais serão as tarefas urgentes do futuro presidente - que nada têm a ver com banir a ideologia de gênero das escolas ou limpar o nome dos endividados no SPC - os candidatos vagam diante dos eleitores como autômatos que não têm coragem de dizer a que vieram. Ou apostam nessas pautas pseudo-populares, mas que são na verdade poções de devaneio perigosas diante da tal dança à beira do precipício fiscal.
Para serem considerados líderes, os presenciáveis precisariam ter coragem de dizer com todas as letras que, se eleitos, tentarão de toda forma barrar o indecente reajuste do Judiciário e do Ministério Público, por serem insultos imorais a um País já encalacrado do ponto de vista fiscal. Teriam de dizer como vão compor sua maioria, sem o blábláblá de que vão "governar com os melhores" porque isso é ficção ruim.
Nenhum tem tônus muscular para falar o que precisa de forma clara. Diante dessa flacidez política, o eleitor desalentado pode ser seduzido a flertar com o populismo. Não terá sido culpa dele.
Vera Magalhães: Bolsonaro: modos de lidar
Na véspera do primeiro debate na TV aberta da eleição presidencial, o da Band amanhã, as campanhas dos adversários de Jair Bolsonaro ainda não chegaram a um consenso sobre a melhor maneira de confrontar o líder nas pesquisas.
Enquanto a necessidade de fazê-lo desidratar nas pesquisas poderia sugerir que ele seja o alvo natural dos ataques de todos os demais, as recentes sabatinas e entrevistas das quais o candidato do PSL à Presidência participou levaram os QGs rivais a reverem essa estratégia.
Um dos responsáveis pela preparação de um dos oito contendores observa que “o bizarro, o inusitado”, não tira voto de Bolsonaro. Ao contrário, parecem fortalecê-lo diante do eleitorado fiel.
A seguir esta leitura, o melhor seria deixá-lo “quieto”, sem forçar um confronto direto no qual ele pode sair “vencedor” segundo uma régua que não é a convencional da política.
A desconstrução de Bolsonaro seria feita, aí sim, na propaganda eleitoral de TV, quando seus adversários vão dispor de um latifúndio de tempo para atacá-lo, e ele não terá nenhum para contra-atacar ou se defender. Para esses estrategistas, as redes sociais não têm poder de fogo para rebater uma campanha destrutiva.
Resta saber se todos vão resistir à tentação de um tête-à-tête com o primeiro colocado no páreo. Isso vale principalmente para Ciro Gomes (PDT), que pode querer aproveitar a ausência do candidato petista no confronto para ser o antípoda de Bolsonaro diante do eleitor de esquerda.
COMEÇA O JOGO
Alckmin na mira dos rivais por aliança com o ‘Centrão’
Se a imprevisibilidade de Jair Bolsonaro e da reação de seu “fã-clube” ditam alguma cautela, o mesmo não vale para Geraldo Alckmin. O tucano deve ser alvo de todos os adversários, inclusive do deputado do PSL. O acordo com o “Centrão” estará na mira de Bolsonaro, Ciro, Alvaro Dias e até Marina Silva. O que está em disputa, aí, é o eleitorado de centro. O único que adotará como procedimento não fazer ataques e apenas se apresentar será Henrique Meirelles.
DEBATE 1
Modelo privilegia confronto direto entre os candidatos
O formato do debate da Band privilegia o confronto direto entre os candidatos e não tem a camisa de força de eleições anteriores de que cada um só pode responder ao mesmo número de questões – o que obrigaria sempre a alguém perguntar o mesmo número de vezes para um dos principais candidatos e Cabo Daciolo, por exemplo. A emissora calcula em 80 o número de embates diretos entre os 8 participantes (perguntas, réplicas e tréplicas).
DEBATE 2
Band faz parceria com YouTube e Google para monitorar redes
Ao lado do estúdio do debate haverá outro, em parceria da Band com o YouTube e o Google Trends. O Google vai fornecer dados em tempo real sobre como o debate está sendo “visto” na internet. Eles serão divulgados na Band News e na transmissão pelo YouTube, mas não entram na dinâmica do debate. Funcionarão mesmo como “segunda tela”. É a primeira vez que o Google faz esse tipo de parceria num debate no Brasil.
Vera Magalhães: A imprensa como inimiga
A tática de minar a imprensa não é nova nem restrita aos polos estridentes da política
Jair Bolsonaro disse em sua entrevista à GloboNews que odeia o PT “em regra”. Pode até ser. Mas como o ódio é o oposto do amor, e ambos carregam em sua manifestação um tanto de paixão e irracionalidade, os dois extremos – Bolsonaro e PT – se encontram em uma série de manifestações. Uma das mais claras e recorrentes é o ataque sistemático à imprensa.
Para os eleitores convertidos e militantes dos dois lados, as críticas ao jornalismo são vistas como sinal de coragem ou independência, mas, da maneira como são feitas significam, na verdade, tentativa de intimidação e de desqualificação. E quando a política mira instituições para tentar enfraquecê-las o que sai arranhada, na verdade, é a democracia.
O PT passou 13 anos no poder, e continua agora, em sua fase penitenciária, vociferando sobre a existência de uma imprensa “golpista”. A narrativa tinha por objetivo vender aos fiéis que a revelação de escândalos como o mensalão, que teve na imprensa seu ponto de partida, era na verdade campanha contra o partido.
Como toda narrativa fake, esta foi derrubada pelas evidências. No caso do mensalão, saiu da boca de Duda Mendonça, o marqueteiro de Lula, todo o enredo de pagamentos no exterior, caixa 2, 3 e 4. Antes, Roberto Jefferson já havia dado a letra do samba.
Depois, foi o Congresso a chancelar a existência do mensalão, por meio da CPI dos Correios. Por fim, o Ministério Público fez a denúncia. E o Judiciário condenou a maioria dos implicados.
Portanto, a imprensa não inventou nada ali. Como também não o fez no petrolão, no qual, aliás, teve um papel mais de reportar os passos da Polícia Federal, do Ministério Público e do Judiciário, em vez de fornecer a eles matéria-prima, como acontecera no mensalão.
Portanto são muitas as instituições – livres, independentes – atuando em um processo que não envolve um só partido, mas praticamente todos.
Ainda assim, se tenta vender a farsa de que a imprensa age para “criminalizar" o PT e os petistas, como se eles próprios não tivessem feito isso largamente. Líder nas pesquisas em que Lula não aparece, Bolsonaro mimetiza sua estratégia de tentar constranger o jornalismo, colocar seus seguidores contra os jornalistas – incentivando, com esse comportamento, ofensas pessoais que muitas vezes resvalam até para a ameaça nas redes sociais – e se colocar como vítima de perseguição.
Puro truque
O deputado tenta chamar de “pegadinhas” ou “armadilhas” questões essenciais a alguém que quer ser presidente da República. Questionado sobre quais impostos manteria caso fosse eleito, uma vez que seu “posto Ipiranga” mencionou 15, abespinhou-se.
Perguntado sobre sua política para o salário mínimo – algo básico e que diz respeito à grande maioria da população –, esquivou-se e preferiu atirar nos mensageiros, os jornalistas que o atacavam.
A tática de minar a imprensa não é nova nem restrita aos polos estridentes da política brasileira. Atualmente tem no presidente norte-americano Donald Trump seu maior propagandista em escala mundial.
Millôr tem uma das melhores definições sobre o papel do jornalismo, que ouvi pela primeira vez na faculdade e que me acompanha como um mantra ao longo desses 25 anos de exercício de profissão: jornalismo é oposição; o resto é armazém de secos e molhados.
Políticos que não têm apreço ao contraditório e não gostam de ser escrutinados vão sempre procurar levar o jornalismo para o terreno do armazém. Mas a imprensa livre continuará perguntando, escarafunchando suas vidas, apontando lacunas, cobrando explicações.
Nas vezes em que se tentou calar o jornalismo o resultado foi ditadura.
Que o Brasil não flerte com mais esse retrocesso.
Vera Magalhães: ‘Lacração’ x propostas
O saldo final do Roda Viva foi positivo para Jair Bolsonaro. Submetido a duas horas de entrevista em rede nacional de TV, conseguiu seu objetivo principal: não perder exércitos nesta fase ainda inicial do jogo de War.
Confrontar Bolsonaro com temas como ditadura militar, cotas, homofobia e racismo é dar espaço para que ele se reafirme como antípoda da esquerda – a principal razão de voto do seu eleitor – e, colateralmente, até se mostre mais “moderado” que no passado sobre esses temas. Quem se choca com o que ele diz sobre isso já não vota nele.
Os momentos em que o deputado do PSL se sai pior são aqueles em que é questionado sobre suas propostas caso seja eleito presidente da República – cargo sobre o qual recaem atribuições que ele insiste em dizer que não domina e que não tem nada a ver com a maior parte dos temas em que ele pretende “lacrar”. Nesse aspecto a entrevista foi pobre. Tanto na ausência de mais perguntas quanto no total despreparo demonstrado nas respostas.
A peroração de Bolsonaro sobre as causas do aumento da mortalidade infantil poderiam ter saído da boca de Dilma Rousseff naqueles momentos clássicos do “dilmês”. Além de atribuir as causas a clichês desconexos entre si, ele não foi capaz de elencar uma mísera ação do Estado (em saneamento, pré-natal e saúde preventiva) que pudesse reverter a alta do indicador.
O mesmo vale para sua resposta constrangedora sobre ciência e tecnologia – com a insistência na caricatura do astronauta para ministro – e as tergiversações sobre Previdência, que não escondem o fato de que ele não admite rever privilégios de corporações como policiais e militares.
O uso de Paulo Guedes como uma espécie de supertrunfo do qual ele se vale para o fato de não conhecer nada de macroeconomia mesmo depois de 28 anos como congressista poderia ser desmistificado com mais perguntas que mostrassem a contradição entre a prática do candidato e a teoria do economista.
Adversários têm a pretensão de “desconstruir” Bolsonaro ao longo da campanha. A entrevista mostrou que não será fácil. Naquilo em que “lacra”, na visão de seu eleitor convertido, trata-se de enxugar gelo. Nas demais questões, a nova pose de humilde que vai delegar a quem entende funciona como vacina. Uma espécie de posto Ipiranga da ignorância.
NOVELA SEM FIM
Aldo e Ana Amélia lideram ‘bolsa’ para vice de Alckmin
A escolha do vice de Geraldo Alckmin afunilou para os nomes de Aldo Rebelo (SD) e Ana Amélia (PP). Como os dois ainda sofrem resistências, os articuladores não descartam uma “surpresa”, mas as conversas hoje orbitam entre o ex-deputado e a senadora gaúcha.
O tucano prefere Ana Amélia, mas ela ainda sofre oposição do Centrão, notadamente em seu próprio partido. Aldo enfrenta desconfiança pelo seu passado de comunista – o que pode afugentar o eleitor “azul’ que Alckmin precisa conquistar para ir ao segundo turno.
Os que advogam pelo ex-deputado dizem que ele tem bom trânsito com militares e no agronegócio, o que funcionaria como antídoto para seu passado esquerdista. Ana Amélia, por outro lado, poderia ajudar mais Alckmin no primeiro turno, por trazer votos das mulheres e na Região Sul (onde Alckmin enfrenta concorrência de Bolsonaro e do senador Alvaro Dias). A ideia da aliança é anunciar o nome amanhã à tarde.
Vera Magalhães: O eleitorado cinza
Entre antipetistas/bolsonaristas e lulistas há metade do eleitorado, que definirá o jogo
Existe um elemento ainda em grande parte inescrutável nesta eleição de 2018: o eleitor. Até aqui, foi possível conhecer os dois extremos desse contingente. De um lado, aqueles que se lembram do governo Lula com saudosismo, porque achavam que sua vida estava melhor. Nesse grupo estão os petistas ideológicos, mas não só. De outro, os antipetistas empedernidos. Mas entre o preto e o branco há toda a paleta de cores. E aí vai se definir a eleição.
Ouvi de um pernambucano uma frase que me ajudou a entender um pouco a resiliência de Lula mesmo preso, mesmo após o petrolão, mesmo após o impeachment de sua escolhida Dilma Rousseff. “As pessoas estão escovando os dentes com água do São Francisco no sertão da Paraíba. Para o nordestino, isso é a realização da profecia de Conselheiro”, me disse esse observador, que não é petista, aliás.
É uma dimensão difícil de alcançar por nós, jornalistas, cientistas políticos, especialistas em pesquisa urbanos, que falamos, escrevemos e analisamos a partir do Sudeste e de um conjunto de fatores – corrupção, Lava Jato, papel do Estado, aparelhamento das instituições, patrimonialismo – que nada tem a ver com algo que mistura numa só imagem altas doses de messianismo e “a vida como ela é”. Para mim foi importante esta perspectiva.
O grupo dos lulopetistas persistentes abrange também uma certa classe média urbana que ou foi contra o impeachment no primeiro momento ou se convenceu de que ele foi um erro por obra e graça de Michel Temer, que conseguiu a façanha de superar Dilma em impopularidade, não entregou a propalada recuperação econômica e se arrasta como um zumbi num fim de mandato irrelevante e melancólico.
No outro extremo do espectro do eleitorado está o antípoda desse lulista resiliente. O antipetista radical, que enxerga justamente as variáveis que listei três parágrafos atrás – corrupção, Lava Jato, papel do Estado, aparelhamento das instituições, patrimonialismo – como as razões do atraso brasileiro, e as considera obra do lulopetismo. O que de fato são. Treze anos de Lula e Dilma condenaram o País ao buraco de hoje. Inclusive legaram Temer, que os dois extremos renegam.
Esse eleitor revoltado vai de Jair Bolsonaro. Professa essa fé quase como um soco na cara. Manifestações como o autoritário “é melhor jair se acostumando” nada mais são do que um grito de “agora chegou nossa vez, petistas”.
Os dois extremos respondem por 46% do eleitorado que já manifesta sua intenção em pesquisas. Há, portanto, metade do eleitorado cuja opinião é matizada, não se encaixa nos polos.
Na hora do vamos ver esse contingente vai se alinhar segundo a divisão levada em conta pelos partidos, entre direita e esquerda? Ou no pós-Lava Jato essa decisão será mais entre candidatos do sistema (ou da velha política) e os antissistema (ou que pregam o “novo”)?
A presença forte do PT nas pesquisas parece apontar para a primeira hipótese – na qual aposta todas as fichas Geraldo Alckmin (PSDB), que acredita que, se assim for, caberá a ele a outra vaga no segundo turno, contra o candidato petista, repetindo 1994, 1998, 2002, 2006, 2010 e 2014. A cristalização do voto em Bolsonaro e também o recall duradouro de Marina Silva, no entanto, parecem mostrar que a busca por um candidato antissistema pode não ser apenas um “modismo” da Lava Jato e das redes sociais. E, neste caso, estaríamos diante de uma ruptura real de paradigmas do que foram as últimas eleições.
Só o início “oficial” da campanha, com a propaganda da TV na rua, a cobertura mais massiva da imprensa, os debates e os palanques finalmente formados responderão para onde vai esse eleitor que ainda não “falou” nas pesquisas. E que enxerga o cinza, para além de branco e preto.
Entre antipetistas/bolsonaristas e lulistas há metade do eleitorado, que definirá o jogo
Existe um elemento ainda em grande parte inescrutável nesta eleição de 2018: o eleitor. Até aqui, foi possível conhecer os dois extremos desse contingente. De um lado, aqueles que se lembram do governo Lula com saudosismo, porque achavam que sua vida estava melhor. Nesse grupo estão os petistas ideológicos, mas não só. De outro, os antipetistas empedernidos. Mas entre o preto e o branco há toda a paleta de cores. E aí vai se definir a eleição.
Ouvi de um pernambucano uma frase que me ajudou a entender um pouco a resiliência de Lula mesmo preso, mesmo após o petrolão, mesmo após o impeachment de sua escolhida Dilma Rousseff. “As pessoas estão escovando os dentes com água do São Francisco no sertão da Paraíba. Para o nordestino, isso é a realização da profecia de Conselheiro”, me disse esse observador, que não é petista, aliás.
É uma dimensão difícil de alcançar por nós, jornalistas, cientistas políticos, especialistas em pesquisa urbanos, que falamos, escrevemos e analisamos a partir do Sudeste e de um conjunto de fatores – corrupção, Lava Jato, papel do Estado, aparelhamento das instituições, patrimonialismo – que nada tem a ver com algo que mistura numa só imagem altas doses de messianismo e “a vida como ela é”. Para mim foi importante esta perspectiva.
O grupo dos lulopetistas persistentes abrange também uma certa classe média urbana que ou foi contra o impeachment no primeiro momento ou se convenceu de que ele foi um erro por obra e graça de Michel Temer, que conseguiu a façanha de superar Dilma em impopularidade, não entregou a propalada recuperação econômica e se arrasta como um zumbi num fim de mandato irrelevante e melancólico.
No outro extremo do espectro do eleitorado está o antípoda desse lulista resiliente. O antipetista radical, que enxerga justamente as variáveis que listei três parágrafos atrás – corrupção, Lava Jato, papel do Estado, aparelhamento das instituições, patrimonialismo – como as razões do atraso brasileiro, e as considera obra do lulopetismo. O que de fato são. Treze anos de Lula e Dilma condenaram o País ao buraco de hoje. Inclusive legaram Temer, que os dois extremos renegam.
Esse eleitor revoltado vai de Jair Bolsonaro. Professa essa fé quase como um soco na cara. Manifestações como o autoritário “é melhor jair se acostumando” nada mais são do que um grito de “agora chegou nossa vez, petistas”.
Os dois extremos respondem por 46% do eleitorado que já manifesta sua intenção em pesquisas. Há, portanto, metade do eleitorado cuja opinião é matizada, não se encaixa nos polos.
Na hora do vamos ver esse contingente vai se alinhar segundo a divisão levada em conta pelos partidos, entre direita e esquerda? Ou no pós-Lava Jato essa decisão será mais entre candidatos do sistema (ou da velha política) e os antissistema (ou que pregam o “novo”)?
A presença forte do PT nas pesquisas parece apontar para a primeira hipótese – na qual aposta todas as fichas Geraldo Alckmin (PSDB), que acredita que, se assim for, caberá a ele a outra vaga no segundo turno, contra o candidato petista, repetindo 1994, 1998, 2002, 2006, 2010 e 2014. A cristalização do voto em Bolsonaro e também o recall duradouro de Marina Silva, no entanto, parecem mostrar que a busca por um candidato antissistema pode não ser apenas um “modismo” da Lava Jato e das redes sociais. E, neste caso, estaríamos diante de uma ruptura real de paradigmas do que foram as últimas eleições.
Só o início “oficial” da campanha, com a propaganda da TV na rua, a cobertura mais massiva da imprensa, os debates e os palanques finalmente formados responderão para onde vai esse eleitor que ainda não “falou” nas pesquisas. E que enxerga o cinza, para além de branco e preto.
Vera Magalhães: Tutela e intervencionismo
A proposta de governo do PT é um programa intervencionista, mas que é vendido por Fernando Haddad como um 'diálogo com a modernidade da base para o topo'
No roadshow que promoveu na função de dublê de coordenador de programa de governo e candidato a candidato real à Presidência pelo PT, Fernando Haddad usou sua conhecida ironia para dizer que a proposta de governo do partido promoveria um “choque de liberalismo”.
Trata-se, isso sim, de um libelo em favor do intervencionismo estatal, da tutela a instituições públicas e privadas e até a outros Poderes e da reedição da política econômica de Dilma Rousseff que mergulhou o País na recessão.
Haddad diz que falta regulação às concessões de comunicações, mas, quando se põe a detalhar sua proposta, revela a intenção de controle sobre o conteúdo da imprensa, ao falar em espaço para “representatividade étnica”, “liberdade de expressão para camadas vulneráveis” e “compromisso com a diversidade”, todos eles conceitos subjetivos o suficiente para abranger alta carga de ideologização e partidarização.
Da mesma maneira, quando fala em controle “social” do Judiciário e do Ministério Público, resta subjacente a intenção de tutela do Poder e da instituição que nos últimos anos foram escolhidos pelo PT como inimigos, que promoveriam uma suposta perseguição ao partido.
A proposta petista de redução dos spreads bancários aumentando a tributação remete ao ápice da tese dilmista de baixar juros ou preço de tarifas na canetada. “Conceitualmente a proposta está errada porque usa um instrumento (tributo) para atingir um objetivo (reduzir o poder de mercado dos bancos) que não é atendido pelo instrumento. Tributo não é instrumento de elevação de competição”, diz o economista Samuel Pessôa.
O PT chegou ao poder em 2002 com um discurso, aí sim, pró-mercado, expresso na tal carta ao povo brasileiro. Colhido pelo mensalão e o petrolão e apeado do poder depois de 13 anos pelo impeachment de Dilma, o partido retroage às ideias econômicas pré-2002 – que, empregadas no governo dela, deram em desastre.
Na política, mira as instituições com tutela para tentar atribuir a um complô o fato de seus principais líderes estarem presos ou denunciados.
O resultado é um programa intervencionista, mas que é vendido por Haddad como um “diálogo com a modernidade da base para o topo”.
ENTREVISTA
Mauro Benevides Filho, economista do presidenciável Ciro Gomes (PDT)
‘As nossas propostas agora são consenso’
O economista Mauro Benevides Filho, coordenador do programa de governo de Ciro Gomes, responde a objeções do PT a propostas apresentadas pelo candidato pedetista ao Palácio do Planalto.
• O que achou do programa de governo do PT, detalhado por Fernando Haddad? Ele criticou a proposta de reforma da Previdência de Ciro Gomes.
Acho engraçado que, aos poucos, nossas propostas, antes consideradas absurdas, vão virando consenso. Taxar dividendos e lucros agora é consenso. A mesma coisa com heranças. A capitalização como novo regime de Previdência não é consenso ainda, mas vai ser.
• Haddad diz que ela, no curto prazo, aumenta o problema fiscal.
Não é preciso ser doutor em ciência atuarial para saber que o regime de repartição está falido. Acho engraçado que a imprensa se inibe de perguntar que conta é essa que mostra que a transição para o regime de capitalização é cara. Que conta é essa? Ninguém fez. Nós fizemos, e o Ciro vai mostrar no fim do mês, quando vai mostrar a proposta fechada de reforma da Previdência que defendemos.
• Sem alianças e com as declarações polêmicas, Ciro pode perder lugar no segundo turno para o PT?
Não tem isso de falar demais. Ciro será o próximo presidente. Quem tem compromisso com rigor fiscal maior que ele? Quem resgatou a dívida mobiliária de seu Estado antecipadamente quando governou? Ciro é o único que tem dito como vai fazer, com números: quanto vai arrecadar com cada imposto, quanto e de onde vai cortar benefícios.
Vera Magalhães: Uma nova lógica
Força inédita do Centrão é chave para entender as chances do presidente eleito governar
O Centrão já teve várias encarnações e várias conformações, mas sua atual composição e a maneira como negociou o apoio a um candidato a presidente seguem uma nova lógica, que leva em conta, mais do que outros fatores que tradicionalmente pesam nessas escolhas, a nova regra de desempenho dos partidos que passa a vigorar a partir dessas eleições.
Só terá direito ao fundo partidário e ao tempo de propaganda a partir de 2019 o partido que receber 1,5% dos votos válidos nas eleições para a Câmara, distribuídos em ao menos nove Estados, com um mínimo de 1% em cada um deles. Outro critério válido é ter conseguido eleger ao menos 9 deputados federais, distribuídos em 9 unidades da federação.
A exigência vai aumentando gradualmente a cada quatro anos até 2030, quando a cláusula de desempenho passa a ser ter no mínimo 3% dos votos válidos e 9 Estados, com 2% dos votos válidos em cada um, ou eleger 15 deputados federais em 9 Estados.
Não é a primeira vez que se tenta criar uma barreira à existência de partidos nanicos e sua participação no bolo de recursos eleitorais. Mas desta vez as siglas pequenas e médias parecem estar se preparando para de fato cumprir a regra – e não tentar derrubá-la em nova reforma eleitoral ou por meio de recursos ao Judiciário.
Isso ajuda a explicar por que o bloco de partidos que se aglutinou na Câmara em torno da liderança de Rodrigo Maia (DEM) se transpôs também em um blocão para a negociação de apoio nas eleições. Juntos esses partidos imaginam que têm mais cacife para negociar espaços nas chapas estaduais que lhes permita cumprir as novas normas.
Mais: a união, neste caso, projeta a possibilidade de fusão futura das siglas que saírem vitaminadas das urnas com aquelas que, estando sob o mesmo guarda-chuva, não conseguirem cumprir os pré-requisitos para continuar existindo.
Isso ajuda a explicar algo que não se consegue entender levando-se em conta apenas questões ideológicas ou programáticas: por que partidos como DEM, PP, PR, SD e PRB poderiam, a depender da circunstância, estar numa coligação tanto com Geraldo Alckmin (PSDB) quanto com Ciro Gomes (PDT), cujas propostas para o País são na maior parte dos temas antagônicas.
Pesou um mix de fatores: estar fortes para cumprir a cláusula de barreira, garantir um bloco monolítico que assegure a esses partidos o comando do Legislativo a partir de 2019, arranjos estaduais satisfatórios e espaços de poder no futuro governo.
Ainda assim, esse último aspecto é menos relevante. Isso porque, estando unidos, os partidos do Centrão estarão em qualquer governo. Isso torna menos crucial, para eles, Alckmin vencer ou não.
Em coluna recente na Folha de S. Paulo, o economista Marcos Lisboa apontou como uma série de circunstâncias políticas levou a que o Brasil caminhasse para uma espécie de parlamentarismo na prática, em que o antes onipotente presidente perdeu poder, tanto pelo quórum constitucional exigido para aprovar reformas quanto pela regulamentação das medidas provisórias, antes usadas para driblar dificuldades de se obter maiorias.
É bem verdade que, chacoalhado por Lava Jato, impeachment, prisão de Eduardo Cunha, denúncias contra Michel Temer e recessão econômica, o atual Congresso pouco fez valer esse poder. Coube ao Judiciário, nos últimos anos, o protagonismo em questões-chave do País.
Mas os partidos perceberam que, para sobreviver e manter o acesso ao dinheiro que os sustenta precisam retomar peso relativo. Ao fazer Alckmin e Ciro se lançarem a um leilão em que topavam tudo que lhes fosse imposto, o Centrão mostrou força inédita. E ela vai ser importante para entender as chances de qualquer presidente eleito governar ou não a partir de janeiro.
Vera Magalhães: Alckmin joga com o regulamento
Presidenciável do PSDB aposta nos pilares da política tradicional para ganhar eleições e deixou para trás uma conhecida característica sua: a de jogar parado
Desde o início de sua segunda caminhada para tentar chegar ao Planalto, Geraldo Alckmin apostou nos pilares que vigoraram na política brasileira até aqui: estrutura partidária e política faz diferença; grandes alianças asseguram grande tempo de TV, e isso é importante; e a definição das chances de cada um só se dá depois do início oficial da campanha.
Por ora, ele vai conseguindo confirmar uma a uma de suas convicções, repetidas à exaustão naquele tom paciente à imprensa e a potenciais aliados, a princípio céticos, mas que acabaram por caminhar em sua direção nesta semana.
Para fechar em torno de si o apoio do Centrão —agora dá para usar a terminologia do grupo que se ergueu em torno da liderança de Eduardo Cunha, pois é praticamente o mesmo, apenas trocando o comando do MDB pelo do PSDB— Alckmin deixou uma de suas características: a de jogar parado.
O ex-governador de São Paulo viu a possibilidade de o grupo fechar com Ciro Gomes (PDT) e se dedicou exclusivamente a conversas com seus expoentes nos últimos dias. Foi decisiva a interferência junto a Valdemar Costa Neto, “dono" do PR, que entrou por último no bloco, mas teve papel decisivo e vai indicar o vice, Josué Gomes.
A aposta numa ampla aliança com partidos com imagem desgastada perante o eleitor por escândalos de corrupção é a única estratégia que Alckmin poderia adotar: integrante do PSDB, que juntamente com o PT exerce a hegemonia política no País desde 1994, ele tinha de tentar juntar em torno de si as grandes legendas para manter essa posição, ameaçada pelo desgaste que as duas siglas sofreram com a Lava Jato.
A operação, aliás, é o componente novo que vai determinar se a aposta de Alckmin num jogo usando o regulamento ainda é capaz de assegurar a vitória na disputa presidencial brasileira.
Neste caso, a força de uma coligação que lhe assegura 43% do tempo de propaganda na TV, quase 3.000 prefeitos e 277 deputados federais seria capaz, no entendimento de Alckmin, de superar o estrago causado pelas acusações contra Aécio Neves, réu por corrupção, e outras acusações.
É uma estratégia que vai na contramão da de Jair Bolsonaro, que por ora lidera as pesquisas com base em um discurso de “outsider” (mesmo sendo político com mandato há décadas), com forte apelo nas redes sociais em detrimento da TV e sem nenhuma aliança.
O próximo indicador a ser buscado pelos aliados agora convertidos ao alckmismo será os índices nas pesquisas. Mas todos reconhecem que vai demorar para que a grande aliança se traduza em crescimento nas intenções de voto. Isso só deve se mostrar eficiente ou não depois do início da propaganda na TV, em 25 de agosto.
Até lá, a aposta de Alckmin será crescer em São Paulo, Estado que governou por quatro mandatos, colando sua campanha à de João Doria Jr. —operação agora facilitada pelo fato de ambos terem um apoio partidário robusto, e praticamente com as mesmas siglas.