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Vera Magalhães: Educação em pé de guerra

Mais de um mês depois de assumir o Ministério da Educação – depois da passagem desastrosa de Ricardo Vélez Rodríguez pela pasta –, Abraham Weintraub enfrenta nesta quarta-feira uma convocação para depor no plenário da Câmara dos Deputados sobre cortes de recursos na pasta que estão envoltos em uma cortina de desinformação.

Primeiro, o ministro anunciou que cortaria recursos de universidades que fizessem “balbúrdia”. Depois, anunciou um contingenciamento linear de recursos para o ensino superior. Diante da reação, passou a restringir o montante a 3,4% das receitas globais da pasta – ou 30% daquelas chamadas discricionárias, que corresponderiam a 12% do total.

Diante de um mar de retórica desencontrada temperada com ressentimento e ideologia, com direito a chocolates, o dia de ontem foi marcado por mais confusão: enquanto o ministro da Educação concedia uma entrevista defendendo o contingenciamento, líderes que participaram de uma reunião com Jair Bolsonaro diziam, no plenário, que o presidente ligou para o ministro na frente deles e mandou sustar qualquer corte.

Como o contingenciamento já foi feito, por determinação do Ministério da Economia, a Casa Civil e o próprio Ministério da Educação correram para negar a suspensão determinada pelo presidente Jair Bolsonaro.

Entenderam?

Talvez não. Realmente, não é difícil a compreensão de tanta bateção de cabeça por parte das autoridades.

TEMPESTADE PERFEITA?
Greve e depoimento de ministro acendem alerta no Planalto

O fato é que o governo está preocupado com a greve prevista para esta quarta-feira, suas consequências para a popularidade de Bolsonaro e sua já desgastada imagem no exterior – no momento em que o presidente vai aos Estados Unidos num “plano B” para fugir de Nova York. O depoimento de Weintraub também acendeu o alerta máximo no Planalto. Assessores presidenciais lembravam ontem que foi numa circunstância assim que Cid Gomes foi degolado ao vivo quando Dilma Rousseff vivia às turras com o Congresso.

ÓLEO E GÁS
Setor de energia vê embate entre ministérios por regulação

Está em curso nos bastidores da Esplanada dos Ministérios uma disputa entre as pastas da Economia e de Minas e Energia pelo controle da agenda de energia no governo Bolsonaro. O ministro Bento Costa Lima (MME) enfrenta tentativas de interferência em sua pasta. Paulo Guedes encomendou ao professor Carlos Langoni um plano para o mercado de gás com o objetivo de reduzir o custo do insumo à metade. Sem dizer como conseguirá isso, o plano, segundo representantes do setor, deve desencadear uma chuva de ações judiciais, a exemplo do que ocorreu quando Dilma Rousseff decidiu intervir no setor elétrico. Nos combustíveis acontece coisa parecida. Depois que o MME lançou o programa Abastece Brasil para atrair mais investimentos às áreas de refino e logística, a direção-geral da ANP tem tentado aprovar no CNPE uma agenda que contraria o setor e tem potencial, de acordo com empresas, de criar instabilidade jurídica e afugentar investimentos.


Vera Magalhães: Bolsonaro deixa Moro mais de um ano na chuva

Jair Bolsonaro parece ter pretendido acalmar Sérgio Moro ao dizer em entrevista que vai nomeá-lo para a primeira vaga que aparecer no Supremo Tribunal Federal. O presidente pareceu querer dar uma satisfação à opinião pública de que seu ministro mais popular tem seu aval e, ao mesmo tempo, dizer ao auxiliar para aguentar o tranco do desgaste político porque, ao fim e ao cabo, o tão esperado prêmio da Mega Sena virá.

Será que o presidente é tão ingênuo assim politicamente? Porque ao tornar pública uma promessa que, agora revela, fez em público a Moro quando do convite para que ele aceitasse ser seu ministro da Justiça, Bolsonaro acaba por desgastá-lo ainda mais.

A ficha de Moro também demorou a cair. Em entrevista a uma rádio paranaense, recostado confortavelmente numa cadeira e esboçando um risinho orgulhoso, o ex-juiz parecia feliz com a promessa pública do presidente em entrevista na manhã de ontem.

Depois, diante da evidência de que anúncio tão prematuro o expõe e o deixa ao sabor das intempéries políticas por mais de um ano, Moro passou a dizer que a futura ida ao Supremo não foi condicionante para que aceitasse a Justiça.

É óbvio: ao associar os dois movimentos, Bolsonaro deixa Moro ao sabor das teorias de que agiu politicamente quando juiz da Lava Jato, transforma uma das pastas mais importantes de seu próprio governo num mero pedágio para um objetivo maior e dá tempo aos que não toleram Moro de tramar algo para dinamitar seu caminho ao Supremo nesse longo período de exposição.

Esse último movimento já começou: parlamentares se movimentam para aprovar nova extensão na idade compulsória para aposentadoria de magistrados, de 75 para 80 anos, para tentar tirar de Bolsonaro a prerrogativa de indicar o sucessor de Celso de Mello.

Moro é neófito na política, daí por que os tombos que vem levando nessa relação sejam compreensíveis. Bolsonaro, não. Que erre tanto e de forma tão sistemática em tudo que exige um mínimo de sofisticação de raciocínio é um bom indicador de por que seu governo patina tanto nesse começo.


Vera Magalhães: Todos à mercê

O clima em Brasília é péssimo. Os ataques desferidos pelo guru Olavo de Carvalho aos militares em geral, e ao general Eduardo Villas Bôas, em particular, disseminaram na Esplanada dos Ministérios a sensação generalizada de que nenhum auxiliar, nem o amigo mais próximo, conta com o aval do presidente Jair Bolsonaro, e que todos, indiscriminadamente, estão à mercê da máquina de moer reputações do bolsonarismo.

Ouvi de um ministro que existe um grupo de radicais encastelado no governo que acha que o Brasil votou em Bolsonaro por “pura ideologia”, o que não corresponderia à verdade.

Entre civis e militares prepondera a avaliação segundo a qual Olavo não manteria as comportas de impropérios abertas sem a anuência velada ou explícita do presidente. O comportamento ambíguo de Bolsonaro, pedindo trégua ao mesmo tempo em que condecora e elogia alguém capaz de atacar um amigo próximo como Villas Bôas, leva indignação ao time do governo.

No Congresso, reina a incredulidade. Mesmo deputados e senadores de oposição têm dificuldade de compreender como o governo cria para si tamanhas dificuldades políticas num momento de estrangulamento orçamentário pela questão fiscal e estagnação da economia real, que cobram seu preço na forma da impopularidade presidencial.

Enquanto o governo ateia fogo às próprias vestes, suas ações em pastas importantes como Educação e Meio Ambiente fomentam protestos nas ruas e nos fóruns internacionais, com mais potencial de estrago para a imagem de Bolsonaro.

PSDB
Debandada ameaça partido, que discute fusão com DEM

Antonio Anastasia (MG) não é o único nome de peso a cogitar deixar o PSDB. Ainda no Senado, Tasso Jereissati (CE), outro peso-pesado, também avalia o caminho de saída. Na raiz da insatisfação estão, de um lado, a permanência de figuras como Aécio Neves, que promete lutar contra as tentativas de forçá-lo a se afastar ou de expulsá-lo, e divergências quanto aos rumos que João Doria Jr. quer imprimir ao partido, deslocando-o para a centro-direita. Quem se movimenta para atrair os descontentes é Gilberto Kassab, que tenta blindar seu PSD contra a fusão PSDB-DEM.

MINISTÉRIO PÚBLICO
Sucessão de Dodge pode ser teste para Bolsonaro no Senado

Muito se fala, inclusive no governo, que Jair Bolsonaro pode indicar um procurador-geral da República que não seja subprocurador (posto máximo da hierarquia do Ministério Público Federal) nem indicado pela lista tríplice dos procuradores. De fato, nem uma coisa nem outra está prevista na Constituição. Porém, há dúvida no interior do Ministério Público Federal, no Legislativo e no próprio governo sobre se a escolha de um nome ligado à ala mais ideológica do bolsonarismo teria condições de ser aprovado no Senado. Um olavista, ainda mais nesse momento em que o guru da Virgínia empreende uma guerra aos militares, teria grande chance de ser derrubado em votação. Daí porque se aposta que Bolsonaro pode escolher alguém identificado como de centro-direita, mas não militante. Nessa linha, cresce o nome de Bonifácio Andrada, subprocurador conservador e católico, mas respeitado pelos pares pelo perfil técnico, discreto e firme em matéria penal.


Vera Magalhães: O paradoxo de Paulinho

O ‘sincericídio’ tosco do deputado mostra um risco real para a reforma da Previdência

Paulo Pereira da Silva deve ter dito a primeira coisa sincera em todos os Primeiros de Maio nos quais discursou ao longo da vida de dublê de dirigente sindical e deputado federal – um posto se retroalimentando do outro, num círculo nada virtuoso.

Nesse surto de sincericídio, enunciou o que pode ser batizado daqui para a frente do “paradoxo de Paulinho”: os deputados sabem que precisam aprovar a reforma da Previdência, mas hesitam em apoiar uma proposta robusta, pois ela pode significar o triunfo político de Jair Bolsonaro, sua eventual reeleição e, por consequência, mais quatro anos de infortúnio para a classe política.

Trata-se, por óbvio, de um raciocínio abjeto. Reduz a mero cálculo político um tema crucial para que o País saia do lodaçal econômico e social em que se encontra pelo menos desde 2014, um buraco cavado diligentemente pelo PT sob Dilma Rousseff.

A economia real está parada. Empregos, produção industrial, investimentos, tudo espera algum sinal de que o Brasil vai conseguir romper com o ciclo de escalada da dívida e de produção de déficits fiscais que já dura cinco anos e está contratada para pelo menos mais três – isso se tudo correr conforme o previsto, ou seja, num cenário positivo.

Portanto já não se trata de discutir a necessidade de se reformar a Previdência, que vai consumir R$ 750 bilhões do Orçamento só neste ano, mas de que maneira fazê-lo: se de forma mais robusta, aprovando uma proposta próxima à enviada pelo governo, que permita uma “economia” em dez anos de algo acima de R$ 800 bilhões, ou uma meia sola a la Paulinho para dar alguma satisfação ao eleitor mas deixar o jogo eleitoral em 2022 aberto.

Ao dizer em público o que políticos de vários matizes cochicham nos corredores de Brasília, o deputado do Solidariedade mostra que os proclamados esforços do governo de construir uma base parlamentar sólida ainda não surtiram efeito. Estigmatizados como expoentes da velha política, colocados todos no mesmo balaio dos Paulinhos da vida, deputados e senadores não acreditam que tudo vá mudar a partir de agora.

Existe um fosso real, resultado do fato de que Bolsonaro e seu núcleo mais próximo nutrem desprezo pela atividade política institucional, e os representantes de partidos veem no presidente uma ameaça a sua própria sobrevivência.

Numa forma ainda mais dramática que a enunciada pelo deputado da Força, é comum ouvir de outros parlamentares coisas do gênero: “Vou dar ao Bolsonaro uma arma para ele me matar no meu Estado na minha reeleição”, em referência à Previdência.

Como assim? O deputado de partidos do centro raciocina que vai votar uma medida impopular, que dará ao presidente um ambiente econômico positivo, sobretudo na reta final do mandato, e será “brindado” com tentativas de desconstrução feitas por aliados do presidente em sua base, sem que tenha postos de comando ou “entregas”, na forma de recursos, para se apresentar ao eleitor.

É a política real batendo à porta e ameaçando de forma muito concreta a aprovação da reforma da Previdência. Reverter esse ambiente só é possível se o governo conseguir construir uma relação de confiança com o Congresso, em que os parlamentares sejam incluídos na narrativa como co-partícipes do esforço para tirar o País do buraco. Na metáfora cara ao bolsonarismo, seria apresentar os congressistas como “combatentes”, “patriotas”, “soldados”, e não párias em busca de boquinhas.

A fala supersincera de Paulinho é paradoxal, entre outras razões, porque não ajuda nada a melhorar a imagem da classe política. Mas, sem que se construa essa relação entre Executivo e Legislativo, a Previdência corre sério risco.


Vera Magalhães: Arroubos x cautela

Reações do presidente Jair Bolsonaro contrastam com o tom da ala militar do governo sobre a crise na Venezuela

Diante da exortação de Juan Guaidó a que as pessoas fossem às ruas para depor o ditador Nicolás Maduro na Venezuela, seguiram-se dois tipos de reação de autoridades brasileiras. Jair e Eduardo Bolsonaro desde cedo usaram as redes sociais para manifestar a torcida pela transição democrática no país e associar, em seguidos posts, a ditadura chavista ao PT de Lula e Dilma Rousseff.

Já a ala militar adotou tom mais cauteloso. Desde cedo, o general Augusto Heleno, chefe do Gabinete de Segurança Institucional, evitava exagerar no entusiasmo diante da exortação de Guaidó e sua afirmação de que as Forças Armadas, agora, estariam com a oposição a Maduro. Disse que essa avaliação dependeria da “qualidade” e da “quantidade” desse apoio entre os militares do país vizinho.

Ambas as reações demonstram que o Brasil recebeu algum tipo de informação prévia de que o grupo de Guaidó tentaria nova ofensiva. Mas o pé atrás de Heleno mostra que também falta “qualidade” a esses informes, dada a interdição de canais entre o governo brasileiro e o regime de Maduro.

Por isso, é acertada a posição reiterada por Heleno e pelo vice-presidente Hamilton Mourão: descartar qualquer possibilidade de intervenção militar brasileira no vizinho.

Mas ela parece ter irritado o presidente, que à noite foi de novo ao Twitter dizer que qualquer decisão seria tomada EXCLUSIVAMENTE por ele, ouvido o Conselho de Defesa. Arroubo despropositado. Levou uma invertida do presidente da Câmara, Rodrigo Maia, que precisou lembrá-lo de que qualquer decisão dessa natureza depende de aval do Congresso.

EDUCAÇÃO
Ministro, que relata perseguição, deve evitar agir por revanchismo

O ministro Abraham Weintraub sempre relata episódios em que diz ter sofrido perseguição funcional na Unifesp, universidade federal paulista na qual ele e o irmão são docentes, por questões ideológicas. Pois ideias que ele começa a externar (e executar), como a de estrangular financeiramente instituições por um critério não mensurável como “balbúrdia”, parecem mostrar a tentação ao revanchismo por parte de quem prometeu suprimir o aparelhamento do MEC – e não trocar o seu sinal da esquerda para a direita.

JUSTIÇA
Falta a Moro uma bancada que o defenda no Congresso

Quando decidiu trocar a magistratura pelo Executivo – como funcionário, e não como mandatário eleito –, Sérgio Moro talvez não tenha calculado corretamente o risco político que estava assumindo. Sendo, como é, alguém com uma dimensão maior que qualquer dos agentes políticos com os quais teria de passar a lidar, seria naturalmente alvo de constantes iniciativas para lhe cortar as asas. É isso que vive desde janeiro, com movimentos que partem ora do presidente, ora do Congresso. Mesmo no STF, onde já não esconde que gostaria de chegar, Moro não tem exatamente um fã-clube. A única forma de não ver suas iniciativas caírem por terra uma a uma é se articular politicamente, criando uma “bancada morista” no Congresso, e usar o aval da opinião pública para se cacifar nesses embates – como o atual, em torno da permanência ou não do Coaf em sua pasta. Ou então será sempre tolhido por aqueles que querem reduzir seu tamanho, adquirido na Lava Jato.


Vera Magalhães: Planos do Cebolinha

Elucubrações de olavetes e derivados se assemelham cada dia mais aos planos ‘infalíveis’ dos gibis: bem maquinados, mas fadados ao fracasso à primeira coelhada

A experiência internacional recente do surgimento e êxito de uma nova direita mundial indica que o parquinho ideológico montado pela autoproclamada ala antiestablishment do bolsonarismo (que tem representantes no governo e na família presidencial) não vai cessar sua guerra de guerrilha, tendo alvos distintos.

Pode ser. Mas essas elucubrações de olavetes e derivados se assemelham cada dia mais, quando cotejadas à realidade econômica, social e política de um país como o Brasil, aos planos “infalíveis” do Cebolinha nos gibis: bem maquinados, com uma lógica própria, mas fadados ao fracasso à primeira coelhada. A Mônica, no caso, são os militares.

Os generais tiveram importância muito maior para a construção que levou à vitória de Jair Bolsonaro que livros e vídeos de Olavo de Carvalho. Enquanto o último animava uma militância aguerrida nas redes sociais – o que, claro, teve um peso na vitória –, coube aos militares reabilitar um ex-capitão que deixou o Exército sem honras, tido como agitador sindical, e passou as décadas seguintes como um deputado folclórico.

Foram os militares que viram em Bolsonaro, a quem antes destinavam certo desprezo condescendente, a melhor possibilidade de derrotar o PT em 2018. A importância que teve a fala do general Villas Bôas, então comandante do Exército, em abril do ano passado, por ocasião do julgamento do habeas corpus de Lula, levantando o risco de crise institucional caso o ex-presidente fosse solto, ainda está por ser devidamente contada, numa reconstituição de bastidores daqueles dias e dos subsequentes.

Que uma pessoa que vive entre rifles na Virgínia e tem contato com o Brasil pela tela de computador rebaixe o papel dos militares em benefício próprio se entende. Que integrantes do governo e da família de Bolsonaro incorram no mesmo erro, passa a ser risco de instabilidade constante para o governo e prova de uma leitura muito caolha da realidade.

Para registro: nas questões que realmente importam até agora, os militares vencem de goleada os olavetes e demonstram pragmatismo para ler a conjuntura. A embaixada do Brasil em Israel ainda não mudou para Jerusalém, não houve nem haverá intervenção militar na Venezuela e Vélez Rodríguez, um filho que Olavo se recusa a assumir, caiu sem deixar saudades.

PREVIDÊNCIA
Governo tem chance de aprender com erros da CCJ

Se a votação da reforma da Previdência pode ser comparada a um campeonato de futebol, com cada etapa representando uma partida, Jair Bolsonaro – ou quem quer que assuma a função de técnico do time do governo – deveria reunir seus jogadores, no caso os novatos deputados do PSL, e exibir os vídeos da Comissão de Constituição e Justiça (CCJ) para que aprendam com os muitos erros que cometeram e bolas nas costas que tomaram. Lições a serem tiradas: deputado governista não se preocupa em falar, falar, falar sem parar e gravar vídeos, se ocupa de votar; provocar a oposição e o Centrão não é bom negócio, porque dá a eles a chance de obstruir as discussões. Ler o regimento interno da Câmara deveria ser lição de casa básica. E, principalmente: deputados governistas têm de decidir se são base aliada ou representantes de corporações de servidores contrárias à reforma. Ter sabotares no próprio time, que passam a estratégia ditada no vestiário para o inimigo, pode ser fatal.

LULA
Decisão do STJ não é tão boa notícia para ex-presidente

Como tudo que envolve Lula, a decisão de ontem da 5.ª Turma do STJ ao agravo interposto em recurso especial contra a condenação no caso do triplex gerou comoção descabida nas redes sociais. Não se trata de nenhum golpe ou maquinação nem de uma inconteste vitória para o ex-presidente. Por várias razões:

1. Foi a segunda instância colegiada (a primeira foi o TRF-4) a endossar a sentença condenatória de Lula dada por Sérgio Moro. Ficam enfraquecidas a narrativa da perseguição política e a tese “intermediária” de Dias Toffoli de que a prisão deveria se dar após análise de recurso especial ao STJ;

2. Não caiu a condenação por lavagem de dinheiro, como esperavam vários advogados criminalistas que atuam na Lava Jato;

3. Não colou a tentativa de jogar o caso para a Justiça Eleitoral,

4. E, por fim, a pena fixada pelos ministros do STJ não difere muito da aplicada por Moro, o que mostra que se trata de uma questão técnica quanto ao cálculo da dosimetria


Vera Magalhães: Arquivem o inquérito

Recuo na censura a veículos foi correto, mas risco de arbítrio segue

Passada a Páscoa e serenados os ânimos, a dupla José Antonio Dias Toffoli e Alexandre de Moraes poderia iniciar a nova semana no Supremo Tribunal Federal anunciando o arquivamento do inquérito 4.781, aquele com mil e uma utilidades, nenhuma delas justificável sob a luz do bom senso e dos limites que devem ser respeitados numa democracia.

O tal inquérito multiuso foi o caminho que aliados hoje menos expostos sopraram nos ouvidos de Toffoli para se contrapor a ameaças – a maioria delas imaginária, fruto de uma paranoia hoje disseminada nos meios políticos e que atinge também os tribunais, como se vê – à Corte e seus integrantes. Incluiu de lambuja os “familiares”. Como paranoia costuma se expandir sem controle, por “ameaça” pode-se entender desde investigações de órgãos como a Receita Federal até xingamentos em aviões, passando por reportagens, iniciativas do Ministério Público e manifestações de cidadãos comuns nas redes sociais.

Nem com muita ginástica argumentativa alguém com um mínimo de honestidade intelectual pode defender que um artigo do regimento interno do Supremo Tribunal Federal confere legitimidade jurídica a um inquérito assim tão amplo, mantido sob sigilo, com objeto indefinido, alvos indistintos e duração elástica.

O recuo quanto à censura à revista Crusoé e ao site O Antagonista foi correto, dadas as circunstâncias. Funcionou como a saída honrosa a que me referi na coluna de quarta-feira passada, quando apontei o desgaste para o STF advindo da teimosia da dupla Toffoli-Moraes em manter o inquérito e as decisões arbitrárias tomadas em seu escopo.

Mas só esse recuo não elimina o risco de novas decisões autoritárias, uma vez que Moraes ignorou as razões evocadas pela Procuradoria-Geral da República quanto à inconstitucionalidade da investigação que comanda, e Toffoli tratou de prorrogar a iniciativa por 90 dias.

A justificada indignação nacional com a censura à imprensa fez com que quase passasse batido o absurdo da decisão do dia seguinte de Moraes, que determinou busca e apreensão na casa de um grupo aleatório de pessoas que, ainda que use – e usa – as redes sociais para disseminar desinformação e sandices como a defesa do fechamento do Supremo, não pode ser considerado uma ameaça à estabilidade do Poder Judiciário e à segurança dos seus integrantes. Cotejar as medidas determinadas pelo ministro, como a suspensão das contas dessas pessoas nas redes sociais e no WhatsApp, e as postagens bizarras elencadas como justificativas dá a medida do caminho sem volta pelo qual o Supremo envereda com esse inquérito. Um caminho de descolamento dos ministros em relação à realidade e ao escrutínio que a sociedade tem do Judiciário. O mesmo Toffoli que investe neste caminho, no fim de semana passado celebrava pesquisa Datafolha que mostrava índices mais amigáveis de aprovação ao trabalho do STF pela sociedade. Se a mesma pesquisa fosse feita neste feriado, o que ela mostraria?

Ao assumir a presidência do Supremo, Toffoli prometeu seguidas vezes tirar o tribunal do papel de última instância geral de conflitos políticos. Foi uma daquelas promessas que não duram um dia. Desde que foi feita, viu-se chegar ao paroxismo a tomada de decisões monocráticas por ministros – muitas delas revogadas depois por outros, também monocraticamente. E, agora, tem-se esse inquérito vale-tudo pairando como uma espada sob a cabeça da sociedade. Só o arquivamento desse instrumento fará com que o STF encontre a saída honrosa para esse lodaçal institucional em que foi enfiado pela sanha paranoica de alguns de seus integrantes. E possa, depois da ressaca com o episódio, assumir o papel de garantidor das liberdades e da Constituição, e não de seu fator de risco.


Vera Magalhães: Saída honrosa

Recurso de Raquel Dodge deverá ser apresentado ao plenário do STF, forçando os demais ministros da Corte a se posicionarem

Diante do impasse institucional entre o Supremo Tribunal Federal (STF) e a Procuradoria-Geral da República em razão do “inquérito multiuso” instaurado na Corte e comandado pelo ministro Alexandre de Moraes, integrantes das duas instituições e observadores externos, inclusive dos demais Poderes, se preocupam em tentar enxergar uma “saída honrosa”.

A procuradora-geral da República, Raquel Dodge, deverá recorrer da decisão de Moraes, que, por sua vez, decidiu ignorar o arquivamento do inquérito determinado por ela. O recurso deverá ser apresentado ao plenário do STF, forçando os demais ministros da Corte a se posicionarem quanto ao mérito do inquérito e de algumas das medidas polêmicas tomadas nele – como a censura à revista Crusoé e ao site O Antagonista e as buscas e apreensões e restrições ao uso de redes sociais de pessoas aleatórias por declarações ou postagens contra o Supremo ou seus ministros.

Outro caminho seria o ministro do STF Edson Fachin conceder uma cautelar na Ação de Descumprimento de Preceito Fundamental impetrada pela Rede Sustentabilidade, algo considerado menos provável pelo potencial de mal-estar entre integrantes da Corte.

Por fim, expoentes do Congresso e do governo já discutem a possibilidade de apresentação de alguma emenda à Constituição resguardando de maneira mais clara o direito à opinião e rechaçando iniciativas que resvalem para censura ou restrição a liberdades individuais.

PODERES EM TRANSE
STF agrava seu desgaste e tira Bolsonaro do foco

A escalada de decisões controversas tomadas nesta semana pela dupla Dias Toffoli-Alexandre de Moraes tirou o foco do governo numa semana de más notícias na economia, como a projeção negativa do PIB do primeiro trimestre, o anúncio de que não haverá aumento real do salário mínimo e o impasse provocado pela intervenção no preço do diesel. De quebra, a censura determinada pelo STF à imprensa deu a Jair Bolsonaro a chance de, corretamente, se colocar como defensor da liberdade de expressão.

PREVIDÊNCIA
Governo vê PR, PRB e PP como ‘núcleo duro’ da resistência

O governo mapeou aquele que seria o “núcleo duro” que atrapalha a tramitação da reforma da Previdência fora da oposição. Embora seja creditada genericamente ao “Centrão”, a resistência ao projeto estaria concentrada na trinca PP, PR e PRB. Os demais seriam satélites, com queixas mais pontuais e fáceis de equacionar. Esses são os partidos que gostariam, segundo os negociadores da reforma, de forçar Jair Bolsonaro a definir uma “regra do jogo” para a sua participação no governo – algo que não se dará “na marra”, alertam os mesmos articuladores. “Os outros partidos entendem que o momento de discutir as divergências é na Comissão Especial”, diferenciou para a Coluna um dos responsáveis pela interlocução. O trabalho de impedir o caminho da PEC, observam integrantes do governo, é facilitado pelo “desastre” dos líderes do governo e do PSL que, a despeito das patentes de major e delegado, não têm autoridade alguma sobre as bancadas.


Vera Magalhães: Liberal até a página 2

Conversão de Bolsonaro não resistiu ao primeiro teste simples

O projeto de ensino domiciliar que o governo vai enviar ao Congresso prevê que, caso reprovado, o aluno terá de frequentar uma escola regular. Jair Bolsonaro, que insiste em se gabar de não entender de economia, teria de abdicar das aulas particulares de liberalismo de Paulo Guedes e ir estudar numa escola depois da lambança com que terminou a semana que marcou seus cem dias de governo.

A conversão de Bolsonaro no altar do liberalismo não resistiu ao primeiro teste simples. Aliás, só se surpreendeu quem quis ser ludibriado: aqui se enfatizou, desde a campanha, qual era a convicção real do “capitão”, que tem uma vida dedicada à defesa de privilégios aos militares, manutenção de empresas estatais e subsídios e contra privatizações, reformas e cortes de gastos.

Não por outra razão sempre foi uma aposta de risco que Guedes, um trader de sucesso, visse em alguém com esse histórico o veículo para a implementação do receituário liberal no Brasil. O ministro é plenamente ciente das diferenças de pensamento entre a ala que ele comanda e os demais estamentos do governo que integra. Para justificar a junção, formulou a teoria da aliança de conservadores e liberais e adora citar A Sociedade Aberta e os Seus Inimigos, obra mais conhecida do austríaco Karl Popper. É a “dinâmica de uma sociedade aberta”, segundo um dos trechos preferidos de Guedes, que valida a aliança entre conservadores e liberais e a disputa política para se atingir os princípios dos primeiros. Haja fé para que o ministro continue vendo este caminho depois de o presidente ter passado a mão no telefone na última quinta-feira, telefonado para o presidente da Petrobrás, Roberto Castello Branco, e mandado suspender o reajuste do diesel.

A Petrobrás vinha num processo de recuperação da pilhagem promovida pelo PT na empresa, em conluio com o PMDB, o PP e as empreiteiras, no petrolão. Também se reergue a duras penas do intervencionismo de Dilma Rousseff, que levou à fixação do regime de partilha no pré-sal, no lugar do de concessão; à política de conteúdo local e à mão grande do Executivo no preço dos combustíveis. A ação voluntarista de Bolsonaro compromete esse último pilar da adequação da empresa a boas práticas de mercado e mostra que há muito mais semelhanças entre o “Mito” e Dilma Rousseff do que gostariam de admitir os seguidores fanáticos de um e de outra.

Por mais que eleitores de centro-direita e o mercado tenham decidido, na reta final do primeiro turno, que Bolsonaro era o único capaz de derrotar o PT, fechando os olhos e o nariz para tudo que ele disse, votou ou defendeu ao longo da vida, sempre esteve claro que ele era o que demonstrou no episódio do diesel: autoritário, intervencionista e adepto do receituário populista.

Afinal, se os caminhoneiros ameaçam com outra greve para paralisar o País, o que fazer? Ceder graciosamente, claro. Ainda mais porque, neste caso, há um agravante adicional (e também conhecido, é sempre bom lembrar aos que agora se fazem de escandalizados): Bolsonaro insuflou a greve dos caminhoneiros, surfou sua onda como forma de desgastar o governo Temer e a classe política, e hoje é refém de seus métodos de arregimentação via WhatsApp e de sua pauta.

Diante da forma desabrida com que o presidente interveio na Petrobrás, humilhou seu presidente e desautorizou o “posto Ipiranga”, os caminhoneiros podem se recostar na boleia e comemorar: toda e qualquer ameaça que fizerem será seguida de uma capitulação de Brasília.

Para um governo eleito com o discurso da ordem e da mudança radical de tudo que o PT fez, é um investimento na desordem social, com uma categoria emparedando o governo, de um lado, e um elogio da mão grande estatal, bem à moda petista, de outro.


Vera Magalhães: Projetos desconexos para vencer impressão de paralisia

Empacotamento de medidas díspares evidencia ansiedade de mostrar que a gestão vai sair da paralisia provocada por excesso de polêmicas ideológicas

O que fica do discurso de pouco mais de quatro minutos de Jair Bolsonaro na solenidade de lançamento de um pacote desconexo que junta medidas importantes e outras irrelevantes por ocasião dos cem dias de governo é frase do presidente de que sua administração navega em “céu de brigadeiro”.

Trata-se de uma boa dose de desconexão da realidade que marcou os três meses inaugurais de seu mandato. O empacotamento de medidas tão díspares, no entanto, trai as palavras do presidente e evidencia uma ansiedade generalizada de mostrar que a gestão vai sair da paralisia provocada por excesso de polêmicas ideológicas bestas e inexperiência da equipe —a começar do comandante.

Entre as medidas relevantes estão o projeto que dá autonomia ao Banco Central, o acordo de cessão onerosa com a Petrobras, a uniformização de regras para nomeações de dirigentes de bancos públicos com as exigências que já vigoram para instituições privadas e o “revogaço” que vai limpar a burocracia estatal de uma série de normas já caducas.

São importantes porque estão em linha com promessas de campanha de destravar a economia, dando-lhe uma diretriz liberal e pró-investimento e porque sinalizam o caminho, também vendido como promessa por Bolsonaro, de profissionalizar a gestão pública.

Há aquelas medidas-pegadinha, que querem afetar grande importância quando não têm a mínima. Nesse rol estão a extinção de cargos que já estavam vazios e de conselhos criados pelo assembleismo petista que estavam desativados e —ao contrário do que podem pensar os bolsonaristas iludidos— não implicavam em jetom para os integrantes.

Há ainda as medidas que são meros “calhaus”, jargão jornalístico para uma notícia ou anúncio que você encaixa para tapar buraco numa página. Nesse grupo estão coisas exóticas como a uniformização do domínio “.gov” nos sites oficiais e a mudança na forma de tratamento nas comunicações oficiais.

E existem, por fim, anúncios que têm de ser analisados melhor porque podem significar retrocessos, como a lei que institui o ensino domiciliar, que deve gerar controvérsia com o STF, e a conversão de multas ambientais, que pode virar senha para um vale-tudo na área.

O fato é que a grande medida que se espera do governo são as reformas estruturantes. Bolsonaro falou na Previdência e prometeu empenho —que, diga-se, vem dedicando em doses maiores nas últimas semanas. Mas urge profissionalizar o acompanhamento de votos na Câmara dos Deputados, planilhando os apoios, monitorando as bancadas e se antecipando às tentativas, que virão, de desidratar o texto.

A reforma, por ora, não navega em mar de brigadeiro. Para piorar as marolas, o secretário da Receita, Marcos Cintra, tratou de jogar um arremedo de CPMF na praça ao antecipar o esboço da reforma tributária.

Claro que a Previdência não será o único projeto de todo o governo, e é compreensível a necessidade de marcar a efeméride dos cem dias com algo propositivo depois de tanta crise. Mas ou o governo volta sua energia para colocar a proposta em marcha de uma vez —até agora ela patina numa CCJ circense — ou não haverá pacote que ajude a melhorar a avaliação periclitante que Bolsonaro tenta negar.


Vera Magalhães: Males do aparelhamento

Se novo ministro conseguir livrar MEC do aparelhamento sempre tão condenado pela direita, mas praticado sem moderação quando ela assumiu o poder, estará no caminho virtuoso

O fiasco da curta passagem de Ricardo Vélez Rodríguez pelo Ministério da Educação poderia ter ensinado uma importante lição ao governo de Jair Bolsonaro, que hoje completa 100 dias: o aparelhamento ideológico, sempre tão combatido e associado à esquerda pelo hoje presidente ao longo de sua carreira na oposição, é, de fato, deletério para a administração pública.

Balcanizado entre “olavetes”, militares e evangélicos, com um núcleo técnico espremido nessa maçaroca ideológica, o MEC produziu uma sucessão de episódios grotescos numa pasta que, no curto mandato de Michel Temer, tinha colhido avanços concretos na área mais crucial para que o País almeje algum futuro mais promissor.

O substituto de Vélez na pasta, Abraham Weintraub, é identificado com a mesma matriz ideológica que endossou a nomeação do seu antecessor. Tem um histórico de declarações voltadas a defender o combate ao tal “marxismo cultural” como missão da Educação.

Encontrará agora, no entanto, um transatlântico para pilotar e um iceberg no caminho, que o desastre Vélez tratou de aproximar.

As tarefas da Educação são tão concretas e urgentes que, se Weintraub quiser entregar números melhores que os antecessores – os tais “esquerdistas” – terá de se dedicar a elas, e não à guerra cultural, sob pena de ir à deriva.

O ministro parece ter se dado conta da realidade que enfrentará. Tanto que seu discurso de posse foi focado na defesa de uma gestão técnica na pasta. Repetiu o mesmo à Coluna. Questionado sobre se readmitirá os “olavetes” demitidos por Vélez e promoverá um expurgo dos militares, negou que pretenda fazê-lo. Também refuta a análise de que sua assunção representará uma derrota para os militares. “O momento é de serenidade, pacificação e GESTÃO”, me disse ele, assim mesmo em maiúsculas, numa troca de mensagens ontem.

Se conseguir livrar o MEC do aparelhamento sempre tão condenado pela direita, mas praticado sem moderação quando ela assumiu o poder, estará no caminho virtuoso.

O mesmo deveria ser feito urgentemente na Apex, agência que tem a missão de promover as exportações brasileiras, mas se transformou num antro de intrigas e favorecimentos da corte olavista, em que diretores que gozam da intimidade do chanceler Ernesto Araújo recebem dele prerrogativas à revelia da direção do órgão.

A Apex é financiada com recursos de uma fonte que os bolsonaristas adoram fustigar: a chamada “farra do Sistema S”. Recebe fartos repasses – algo como R$ 500 milhões ao ano para custear feiras e viagens de seus diretores –, oriundos da contribuição compulsória das empresas. Como está parcialmente paralisada pela guerrilha interna, tem muito dinheiro “entesourado” em caixa e pouca ação prática.

A Apex já era um prêmio de consolação para aliados no governo Dilma Rousseff. Um dos seus presidentes foi o fiel Alessandro Teixeira, um dos coordenadores da campanha da petista. Na gestão Temer, passou para o guarda-chuva do Itamaraty apenas para engrossar o poder de José Serra na pasta. Agora, vira parquinho ideológico da juventude olavista.

Pelo receituário liberal do governo, uma agência financiada dessa forma e gerida na base do compadrio deveria ser extinta, em nome da eficiência. Ou ter sua gestão profissionalizada, com mandatos para os diretores e metas a serem atingidas.


Vera Magalhães: Ver para crer

O sentimento dominante entre os presidentes e líderes de partidos antes da conversa marcada para amanhã com Jair Bolsonaro é de ceticismo. Ao marcar uma série de audiências em sequência, no mesmo dia, com representantes de siglas que integram, grosso modo, o chamado Centrão, o presidente pretende dar uma demonstração de que aceitou os apelos pela necessidade de iniciar uma articulação política mais consistente com o Parlamento.

Mas a ausência de pontes nos três primeiros meses de governo, somada ao discurso voltado a estigmatizá-los nas redes sociais, deixou os políticos ressabiados. Alguns me dizem que não irão sozinhos ao encontro de Bolsonaro, e chamaram deputados e senadores como “testemunhas”. “Sei lá se o presidente vai sair de lá dizendo que pedimos isso e aquilo”, diz um dos convidados.

Outros duvidam da real disposição de Bolsonaro de tornar o diálogo com os políticos constante e efetivo. “Enfileirar seis conversas num dia mostra que não se quer conversar, mas sim posar para fotos”, me diz um presidente de legenda.

Mas o que seria, para a classe política, o tal diálogo profícuo? O consenso reinante nos partidos é de que ele pressupõe gestos de “carinho”, recursos na base e divisão de espaços de poder. A execução orçamentária, afirmam, está parada. Os gestos são apenas de ataques. E os postos nos Estados seguem fechados ao compartilhamento. Daí porque, até amanhã, o clima geral seja de não botar muita fé de que algo vá mudar na relação entre Executivo e Legislativo.

INQUIETAÇÃO
Militares aguardam por desagravo a Santos Cruz

Jair Bolsonaro será instado pelos seus conselheiros militares a fazer um desagravo ao ministro Carlos Alberto dos Santos Cruz, da Secretaria de Governo, alvo de uma campanha de difamação por parte do polemista Olavo de Carvalho. Há um inconformismo nas três Forças diante da baixeza dos ataques, sem contraponto de Bolsonaro. O que se ouve é que, dado o trânsito do ideólogo com pessoas próximas ao presidente e sua família, o silêncio quanto a um ministro palaciano será lido pela sociedade como aquiescência, o que é considerado inadmissível.

PREVIDÊNCIA 1
Presidência de comissão será de deputado não governista

Rodrigo Maia (DEM-RJ) está propenso a acolher a indicação do governo e trabalhar pelo tucano Eduardo Cury (SP) para a relatoria da reforma da Previdência na Comissão Especial da Câmara, onde o “bicho” vai pegar. Mas o presidente do colegiado, responsável por determinar o ritmo e o formato da discussão, não precisa ter “empatia” com o governo: será escolhido no grupo mais identificado com o presidente da Câmara, no bloco que atuou pela sua reeleição para o posto.

PREVIDÊNCIA 2
‘Jogo duplo’ de governadores constrange deputados

Deputados de vários partidos relatam desconforto com o que consideram jogo duplo dos governadores, principalmente os de oposição, na discussão da reforma: enquanto Paulo Câmara (PE) e Rui Costa (PT), por exemplo, dão declarações públicas de apoio à emenda, que pode aliviar a situação fiscal dos Estados, deputados do PT e do PSB ocupam os holofotes para bombardear a proposta.