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Vera Magalhães: Governo Johnny Bravo

O estilo de Bolsonaro guarda, de fato, semelhanças com o do topetudo personagem dos anos 1990, do Cartoon Network

De todas as declarações polêmicas que Jair Bolsonaro já deu nos seus oito meses de mandato, poucas competem em nonsense com uma do dia 6 deste mês. Questionado sobre a indicação de Eduardo Bolsonaro para a embaixada em Washington, se irritou com a imprensa e soltou essa: “A imprensa tem de entender que eu, Johnny Bravo, Jair Bolsonaro, ganhou, porra!”.

Exibir apelidos privados é algo que a maioria das pessoas procura evitar, pelo natural constrangimento. Bolsonaro não só demonstrou orgulho como repetiu a dose em outra ocasião – o que torna um pouco mais difícil que ele diga, agora, que não disse o que disse, outra de suas bossas recentes.

Johnny Bravo é um personagem dos anos 1990, do Cartoon Network. Seu character design é o de um sujeito marombado, narcisista, machista e burro. O que já torna estranho o orgulho de evocar a alcunha.

Há, inclusive, um episódio da segunda temporada em que Johnny Bravo ascende ao poder, meio por acaso. Todos os políticos da cidade são acometidos de uma intoxicação alimentar, e a legislação local determina que o “maior idiota da cidade” assuma.

Bravo, então, passa a governar segundo critérios estritamente pessoais: destrói uma livraria para construir uma esfinge com seu rosto, decreta que funcionárias devem trabalhar de biquíni, transforma um parque público num estacionamento e prende os oposicionistas. Até ser destituído.

O estilo de Bolsonaro guarda, de fato, semelhanças com o do topetudo. Suas declarações desde que revogou a comunicação institucional e inventou a paradinha do Alvorada versaram sobre temas como cocô, ataques à imprensa e à ciência, investida contra o pai assassinado do presidente da OAB e a acusação de que ONGs queimam a Amazônia.

Ao focar na exploração de terras indígenas na reunião de ontem dos governadores da Amazônia que deveria tratar da emergência ambiental, Bolsonaro fez com que os presentes saíssem de lá com a certeza de que sua pauta pessoal sempre estará acima das questões de Estado. “Foi bastante constrangedor ver o descolamento do presidente da realidade”, disse à Coluna um dos participantes (que, atenção, não era o comunista Flávio Dino).

Assim, não é de estranhar que ele se abespinhe quando questiona do sobre a indicação do filho, e que ache normal dar o “filé” ao rebento. A sem-cerimônia com que isso é defendido por Bolsonaro Bravo, no entanto, começa a preocupar os que têm de conviver institucionalmente com ele – prefeitos, governadores, funcionários públicos, congressistas, procuradores, ministros do Supremo… A lista é enorme, e ninguém fora do círculo dos puxa-sacos está disposto a aceitar coisas que seriam caricatas até em desenho animado, como ofender a mulher de um chefe de Estado e recusar dinheiro internacional por birra.

MEIO AMBIENTE: Ex-ministros pedirão a Maia ação do Congresso na crise

O presidente da Câmara, Rodrigo Maia, receberá hoje ex-ministros do Meio Ambiente, o presidente da OAB, Felipe Santa Cruz, e representantes do setor produtivo, que entregarão a ele carta pedindo a interferência do Congresso na crise ambiental desencadeada pelo desmatamento e agravada pelas queimadas na Amazônia. A entrada de Maia no debate na semana passada irritou Bolsonaro, que sugeriu que, se ele quer ajudar, deve destinar recursos do Fundo Partidário para conter as queimadas.

DINHEIRO SIM: Doria faz road show na Alemanha em busca de investimentos

E Bolsonaro acabou dando ao governador João Doria, seu potencial adversário em 2022, mais uma chance de fazer um contraponto a seu estilo. Enquanto o presidente se indispôs com a Alemanha (e Noruega, e França), o governador paulista inicia hoje um giro pelo país, com previsão de anúncios de investimentos de R$ 1 bilhão e criação de 400 novos empregos.


Vera Magalhães || Desinteligência ambiental

Desprezo a dados, gestão e retórica atabalhoadas estimulam crise ambiental internacional

O governo Jair Bolsonaro pode até enxergar uma conspiração internacional interessada em nos tomar a Amazônia, mas partiu dele um conjunto de erros que permitiu que a crise ambiental ganhasse o mundo e expusesse o Brasil a riscos concretos para seus negócios, sua imagem e acordos dos quais é signatário.

Tudo começou com o desprezo aos dados relativos ao desmatamento, com a investida de Bolsonaro e seu ministro de Meio Ambiente, Ricardo Salles, contra o Inpe, diante do silêncio conivente do dublê de ministro da Ciência e astronauta Marcos Pontes – aliás, uma figura ausente em todo o debate atual.

Não fosse o ataque deliberado de Bolsonaro a um instituto que tem reputação internacional, expertise em medição de desmatamento e um quadro técnico competente, sem que existisse absolutamente nada para se oferecer como alternativa, os olhos do mundo não teriam se voltado já antes do início da temporada de queimadas para a Amazônia.

O negacionismo retórico puro e simples já dura meses e, desde então, não se produziu uma mísera evidência confiável que refutasse definitivamente os dados do Deter, que apontavam escalada do desmatamento neste ano.

Pelo contrário: a força das queimadas antes mesmo do mês de pico da estação de estiagem (setembro) mostra que sim, há uma situação de descontrole no desmate.

E, de novo, o governo não dispõe de informações oficiais básicas para enfrentar a situação: quem promove as queimadas e o desmatamento? Bolsonaro chuta que seriam ONGs interessadas em manchar a reputação internacional do Brasil. É constrangedor ver um presidente da República tão desaparelhado. Onde está o Sistema de Inteligência brasileiro que não municia o chefe de Estado de informações precisas a respeito de onde ocorrem derrubadas e queimadas, quem as promove, quais são as forças do Estado (Polícia Rodoviária Federal, Polícia Federal, Exército, Ibama, polícias estaduais) que serão recrutadas para resolver o problema?

A direita bolsonarista, que sempre criticou a tendência à vitimização da esquerda, chega ao poder e adota o mimimi como política de Estado. E mimimi em escala global, que é para aumentar a vergonha. Ao reagir às críticas de outros países ao Brasil, Bolsonaro poderia se servir de informações do Itamaraty, ou do Ministério da Agricultura, ou do competente secretário de Comércio Exterior, Marcos Troyjo. Todos eles têm diagnósticos técnicos acerca dos interesses comerciais e geopolíticos em jogo nas tentativas que países como França e Irlanda fazem de barrar tratados como o Acordo UE-Mercosul e a entrada de produtos brasileiros na Europa.

O presidente e seus filhos não precisariam dar o vexame de postar subnarrativa de YouTube em suas contas oficiais para refutar os ataques internacionais ao Brasil se usassem os dados à disposição do governo brasileiro. Inclusive a voluntariosa Secom, que se apressa em abrir canais para contar a “verdade dos fatos”, faria um serviço bem melhor se se socorresse desse aparato de Estado no lugar dos ideólogos de plantão. Bolsonaro demorou semanas para tomar as primeiras medidas concretas na crise ambiental, como se o fogo que queima a floresta e a imagem do País no exterior fosse se dissipar na base do gogó.

Outro efeito colateral que começa a colher pela dificuldade de gestão é a perda de apoio naquele que foi o primeiro setor organizado a apoiá-lo: o agronegócio. Diante da perspectiva da perda de negócios e de certificações que levaram anos de pesquisas e trabalho duro para serem obtidos, os produtores começam a perceber que o custo de uma guinada meramente ideológica e obscurantista em uma área – a questão ambiental – cada vez mais global e indissociável da economia pode ser irreversível.


Vera Magalhães || Jair em seu mundinho

Declarações do presidente indispõem o Brasil com outros países e ameaçam negócios

Não se tem notícia, entre a coleção aparentemente infindável de declarações sem pé nem cabeça que é capaz de produzir, que Jair Bolsonaro já tenha flertado com a teoria da terra plana. Mas a julgar pela visão de mundo que tem externado em falas, gestos e políticas de seu governo, o presidente brasileiro acha que o mundo é estreito e dividido toscamente entre esquerda e direita, amigos e inimigos, mocinhos e bandidos.

E nem na hora de catalogar os países e colocá-los nessas caixinhas ele demonstra alguma clareza. O nível dos impropérios dirigidos à Noruega e à Alemanha por Bolsonaro é difícil até de analisar. Diante da suspensão de quase R$ 300 milhões do Fundo Amazônia por esses dois países, o presidente se saiu com mitadas sem nexo, do nível que alunos da quinta série dirigem uns aos outros no recreio. Algo como: “Eles (os noruegueses vilões) que usem o dinheiro para reflorestar a Alemanha”. Pausa para constrangimento geral.

Desde 2009, os dois países já doaram (doaram, não emprestaram) R$ 3,4 bilhões para o fundo. A maior parte desse dinheiro vai para órgãos dos governos federal e estaduais, como o sucateado Ibama, e se destina a comprar veículos para fiscalização de ações de desmatamento, grilagem e outras práticas criminosas. Os recursos são administrados pelo BNDES.

Abrir mão desses recursos num cenário em que as restrições orçamentárias atingem mais fortemente pastas como a do Meio Ambiente, historicamente um patinho feio na Esplanada, não é nenhuma afirmação de soberania, não se trata de substituir uma “narrativa esquerdista” por outra de direita e nenhuma bobagem similar. Trata-se única e exclusivamente de rasgar dinheiro e passar vergonha diante do mundo. Esse que Bolsonaro teima em estreitar e perante o qual insiste em diminuir o Brasil.

O presidente e seu ministro do Meio Ambiente preferem mitar para a aldeia de convertidos, não se importando nem em ameaçar, no médio prazo, a reputação inclusive do agronegócio brasileiro, que teoricamente pretendem prestigiar. O 17.º Congresso Brasileiro do Agronegócio, realizado pela Abag (Associação Brasileira do Agronegócio), foi aberto por uma fala de Jingtao Chi, presidente da COFCO International, a maior estatal chinesa da área de processamento, fabricação e comercialização de alimentos. Em resumo, o maior comprador das commodities agrícolas brasileiras.

A sustentabilidade esteve no centro do discurso do chinês, de tal forma enfatizada que chamou a atenção e preocupou os representantes do agronegócio brasileiro presentes na plateia. Ele deu uma mensagem clara: os chineses se preocupam com a origem sustentável dos alimentos que consomem. Não estamos falando da Europa para a qual Bolsonaro torce o nariz. Mas dos nossos maiores compradores.

Em outra frente, a forma truculenta com que Bolsonaro dá pitaco na eleição da Argentina, contrariando qualquer manual básico de diplomacia, começa a ameaçar inclusive a continuidade do Mercosul, caso a chapa Fernandez-Kirchner vença. A retórica incendiária vem depois da assinatura do acordo histórico entre o bloco e a União Europeia – acordo este, aliás, que tem uma série de obstáculos pela frente, inclusive referentes às mesmas questões ambientais, para ser plenamente referendado e entrar em vigor, algo previsto só para daqui a alguns anos.

Perante o mundo, uma política externa assim abilolada deteriora a imagem do Brasil, que passa a ser visto como um país que despreza acordos, trata parceiros como inimigos, debocha de aliados, se porta de forma subserviente em relação aos Estados Unidos e não tem nenhum plano de ação para conter o inconteste aumento do desmatamento que já nos faz perder dinheiro e pode nos levar no curto prazo a perder negócios.


Vera Magalhães: Quem paga o pacto?

A ideia de atrelar a discussão da reforma da Previdência a uma série de demandas de Estados e municípios, embalada pelos senadores como uma virtuosa repactuação federativa, nada mais é do que tentar fechar com rolha um dique que já está com fissuras por toda parte, empurrando os problemas fiscais graves desses entes com a barriga em vez de resolvê-los. E pior: colocando uma espada sobre o governo com o risco de atrasar a reforma com temas alheios a ela.

Se a discussão simultânea da indicação de Eduardo Bolsonaro para a embaixada de Washington já havia “encarecido” a reforma, como mostrei aqui, o pacotaço de bondades para Estados faz com que o céu seja o limite para essa conta.

Uma das medidas, que acaba com a Lei Kandir e permite a Estados tributarem as exportações com ICMS, vai contra um dos princípios da(s) reforma(s) tributária(s), de criar o IVA, e faz com que governos quebrados voltem a sanha arrecadatória para um dos poucos setores da economia que vão bem: o agronegócio exportador.

Enquanto a lei não acaba, no entanto, os Estados embutiram no pacotão do pacto federativo um repasse de R$ 4 bilhões relativos à compensação da Lei Kandir para já, afinal ninguém é de ferro.

Outro item do pacote, a ideia de empurrar para 2028 a decisão de que Estados e municípios precisam quitar sua dívida com precatórios, não resolve essa chaga, apenas a empurra para futuros governantes. Essa pode contar com a simpatia do governo federal, que anda preocupado com a possibilidade de ter de socorrer os entes, comprometendo ainda mais sua capacidade de cumprir a meta fiscal.

As propostas que dizem respeito à divisão da receita de royalties já tiveram manifestações favoráveis de Paulo Guedes, mas a ideia de condicionar a aprovação da Previdência a isso certamente não estava no horizonte do ministro, e faz com que a tramitação do texto na Casa, que se esperava que fosse rápida e menos controversa que na Câmara, já não seja mais um passeio tranquilo.

E o que seria apenas uma PEC paralela para tratar da inclusão de Estados e municípios nas regras da reforma, algo racional, virou um cipoal de PECs. A tentativa do governo será a de se mostrar simpático aos pleitos, mas desvincular as discussões.

PSDB: Aécio reage à ameaça de expulsão e finca pé
Aécio Neves está recluso, evita exposição e não fala sobre o ultimato que o PSDB lhe deu para que deixe a legenda sob pena de ser expulso. “Quem vai me expulsar?”, costuma perguntar o mineiro aos poucos que conversam com ele a respeito. Isso porque, até a queda no caso JBS, Aécio não só passou raspando da Presidência, mas era o senhor absoluto do PSDB. Sabe, portanto, tudo que os que hoje comandam o partido fizeram nos verões passados.

PSL: Janaina é Frota amanhã? Major Olímpio diz que não
A expulsão de Alexandre Frota do PSL paulista após sucessivos embates com a cúpula da sigla e a família Bolsonaro suscitou a pergunta: igualmente crítica, Janaina Paschoal corre o mesmo risco? Major Olímpio diz que a situação é “completamente diferente”: “Não tem nenhuma representação contra ela. Uma coisa é crítica construtiva, outra é ofensa, calúnia a membros do partido e se abster de votação em que o partido fechou questão”.


Vera Magalhães: Os 3 pilares da tributária

Contribuição sobre pagamentos seria casada com menor encargo trabalhista e fim de impostos

Com a transferência da reforma da Previdência do tapete verde da Câmara para o azul do Senado, a reforma tributária passa a ser o assunto prioritário da pauta econômica dos deputados no semestre. A dificuldade, até aqui, em se chegar a um texto de consenso entre o governo – e mesmo dentro dele – e o Parlamento, com o desafio extra de obter apoio dos Estados, deve fazer com que a nova batalha seja ainda mais difícil que a anterior.

Jair Bolsonaro voltou a dizer na sexta-feira o que já avisara na campanha: nada de CPMF. Paulo Guedes vai se dedicar a uma batalha hercúlea nos próximos dias: convencer o presidente que a CP, Contribuição sobre Pagamentos, proposta por Marcos Cintra, não é a mesma demonizada CPMF.

A reforma que será enviada ao Congresso está estruturada em três pilares. O primeiro é baseado no estudo do Ipea “Uma Reforma Dual e Modular da Tributação sobre o Consumo no Brasil”, de setembro de 2018, assinado por uma série de economistas, entre eles o atual secretário Adolfo Sachsida, e que propõe a substituição dos impostos sobre consumo por um IVA dual e modular, semelhante ao modelo canadense.

Estados podem aderir ao modelo federal ou não – o que facilitaria a negociação no Congresso e evitaria que as questões federativas dificultassem a aprovação. A alíquota proposta seria de 15%, podendo chegar a 20%.

Nesse aspecto, a proposta do governo é um pouco diferente da do economista Bernard Appy, que embasa o projeto do deputado Baleia Rossi que já avançou na Câmara. Mas Paulo Guedes admite negociação para que se adote uma ou outra fórmula, ou um mix de ambas.

O segundo pilar é mais controverso e diz respeito aos impostos sobre renda e dividendos. A proposta do governo acaba com todas as deduções no IR e taxa dividendos, algo que deve causar ruído na classe média e mesmo com Bolsonaro, que tem dito que vai reduzir a tributação sobre renda.

Para a equipe de Guedes, o imposto sobre renda é menos regressivo que aqueles sobre consumo. Justamente por isso seu IVA proposto é menor que o do projeto de Appy.

O terceiro pilar é o que vai dar mais barulho político, pois é o que cria a tal CP, a Contribuição sobre Pagamentos. A alíquota seria de 0,2% em cada ponta (compra e venda) de todos os pagamentos, ainda que em espécie.

O convencimento terá de começar por Bolsonaro. Cintra voltou ao Twitter depois da manifestação do presidente para defender a CP, dizendo que ela nada tem a ver com a CPMF, a não ser o fato de ser um tributo do mesmo “gênero”.

O problema é que Bolsonaro prometeu de forma muito incisiva que não voltaria com nada próximo do “imposto do cheque”, que seus eleitores aprenderam a odiar quando da bem-sucedida campanha – encabeçada pela Fiesp, pelos bancos e pela oposição, e encampada com entusiasmo pela classe média – pela derrubada da CPMF em 2007, primeiro ano do governo Lula 2.

A nova CP foi concebida inicialmente como um imposto acoplado à adoção do novo regime de capitalização previdenciária. Como ele não passou na discussão da reforma da Previdência, sua natureza mudou. O argumento de Guedes e sua equipe é que ela permitirá aumentar a base tributária em até 30%, incluindo a economia informal e reduzindo a sonegação. O ministro dirá que vai reduzir toda a pesada tributação sobre folha de pagamentos, além de aliviar os impostos sobre consumo.

Resta saber se a sociedade vai entender a mudança de discurso: empresários e políticos que antes demonizavam a CPMF, agora passarem a defender o caráter virtuoso da nova cobrança sobre pagamentos. O primeiro a ser convencido, diga-se, será o presidente, que costuma ser cabeça-dura quanto a suas convicções. Vem uma batalha hercúlea por aí.


Vera Magalhães: Presidente age para desgastar ministro, e depois assopra

Por ora, o presidente mantém o auxiliar na base do esquenta-esfria da frigideira

De ministro “indemissível” e candidato – com direito a anúncio público – à “primeira vaga” que houvesse no Supremo Tribunal Federal, Sérgio Moro passou a ser alvo das famosas “caneladas” de Jair Bolsonaro, seja em declarações públicas, em críticas reservadas ou mesmo em ações para enfraquecê-lo.

Agora que admite abertamente sua candidatura à reeleição em 2022, Bolsonaro age deliberadamente para, vendo o sangue do auxiliar e potencial rival na água graças ao vazamento de mensagens com procuradores da Lava Jato, aumentar seu desgaste.

O presidente já advertiu que Moro não poderia destruir provas da Operação Spoofing, age nos bastidores para que Roberto Leonel, nomeado por ele para o Coaf, seja afastado – depois que o diretor criticou decisão de Dias Toffoli que paralisou investigação sobre Flávio Bolsonaro que teve como base um relatório de atividades financeiras do ex-assessor Fabrício Queiroz feito pelo órgão – e, agora, coloca o pacote anticrimes na geladeira.

Não custa lembrar que, quando quis levar sua base às ruas para pressionar o Congresso, o bolsonarismo usou o discurso – com os perfis do presidente e dos filhos à frente – de que seria perfeitamente possível à Câmara tocar de forma concomitante a reforma da Previdência e o pacote anticrimes, algo que nós, da imprensa, sempre dissemos que não era simples nem eficaz.

Por ora, o presidente mantém o auxiliar na base do esquenta-esfria da frigideira. Depois das declarações em que aumentava a fritura, o levou de coadjuvante na live semanal do Facebook, o que já é por si só uma demonstração de quem é que depende de quem agora.

Justamente porque Moro precisa ficar no cargo, uma vez que abriu mão da magistratura, e o STF é, cada vez mais, um sonho distante. Se continuar no cativeiro bolsonarista, também o será a candidatura em 2022.


Vera Magalhães: Racionamento de combustível

Adversários começam a discutir meios de reduzir o estoque eleitoral que vão dar ao presidente falastrão

Diante da evidência de que Jair Bolsonaro já está em campanha para 2022, como ele mesmo admitiu nesta terça-feira, 6, e de que não há alternativas no centro e à esquerda a ele, adversários começam a discutir meios de reduzir o estoque de combustível eleitoral que vão dar ao presidente falastrão.

As reformas já estão precificadas, mas a ideia de um grupo amplo de parlamentares é não dar “dinheiro novo” que irrigue a economia rapidamente e dê gás a Bolsonaro.

Nesse quadro, é a pauta de privatizações, sobretudo as mais ambiciosas, que entra na mira. Haverá resistência a empreitadas como a venda da Eletrobrás, uma das prioridades de Paulo Guedes.

“É loucura imaginar que o Congresso vai facilitar o plano de Bolsonaro para aniquilar não só os adversários, mas a política”, disse à coluna um dirigente de uma das siglas do que se convencionou chamar de centrão.

Para avançar na agenda pós-Previdência, inclusive no sentido de unificar os esforços na reforma tributária, Guedes não terá a mesma facilidade de transitar como se fosse um corpo estranho liberal num governo de corte autoritário.

A escalada de palavras e ações de Bolsonaro aumenta na Câmara o desejo de resguardar as prerrogativas do Legislativo, inclusive limitando a edição de medidas provisórias, e também reduz a disposição de manter a “separação" entre a política econômica e o resto. “À medida que Bolsonaro usa Guedes como Cavalo de Troia para invadir a cidadela da democracia, temos de nos opor”, observa um parlamentar.

TERMÔMETRO:
Recesso sem protestos deu tranquilidade a deputados

A volta às chamadas bases eleitorais tranquilizou deputados logo após a votação da reforma da Previdência. Na volta a Brasília, o que mais se via eram rodinhas de parlamentares de várias siglas um tanto espantados com a acolhida receptiva que observaram ao fato de terem referendado a medida, algo inimaginável há alguns anos. Isso facilitou os acordos para liquidar logo a fatura do segundo turno, até para que os deputados possam se debruçar sobre a pauta própria do parlamento.

ACABOU A MAMATA?
Oposição vai enfatizar contradição com discurso da nova política

Além do fim da boa vontade generalizada com a agenda econômica do governo, a estratégia ainda incipiente de uma oposição totalmente desarticulada para conter Bolsonaro deverá ser focar mais nas evidentes e crescentes contradições da prática de governo com o discurso moralista da “nova política” vendido na campanha.

A avaliação é que os arroubos politicamente incorretos têm menos potencial de estrago na estrutura de apoio ao presidente que episódios como a nomeação de parentes no atacado nos gabinetes da família, a nomeação do filho para a Embaixada de Washington, o uso do helicóptero da FAB para transportar a primaiada, o fantasma Fabrício Queiroz, que segue pairando como um estigma apesar do refresco dado pela decisão de Dias Toffoli e todo o chorume que ele pode trazer à tona quanto a ligações do clã com as milícias no Rio de Janeiro.

Começarão a ser frequentes os discursos chamando o Ministério Público do Rio à responsabilidade de não aceitar que o caso Queiroz seja abafado.


Vera Magalhães: Onde está o centro?

Reações ainda tímidas aos arroubos autoritários de Bolsonaro mostram falta de alternativas

As últimas semanas foram inquietantes pela investida de Jair Bolsonaro, em ações e palavras, contra instituições, a ciência, o conhecimento, os fatos históricos e princípios como os da humanidade e impessoalidade. As reações começam a surgir por parte dos demais Poderes, como em boa hora mostrou o Supremo Tribunal Federal. Mas a maneira ainda tímida com que os partidos e lideranças políticas do chamado centro democrático se comportam diante dos arreganhos do presidente mostra que o Brasil está muito longe de construir uma alternativa viável a uma radicalização cada vez mais perigosa.

Na centro-direita, o governador João Doria Jr. e o ex-presidenciável João Amoêdo tratam de procurar se distanciar de Bolsonaro, delimitando as diferenças entre o discurso e a prática dos partidos que lideram e o bolsonarismo. Mas tanto o PSDB quanto o Novo estão entre as legendas que mais apoio empenharam aos projetos do governo no Congresso.

Imbuídos do dever de apoiar a pauta econômica de viés liberal de Paulo Guedes, os partidos de centro e de centro-direita muitas vezes dão maior sustentação às votações do Executivo que o canhestro PSL, balaio de gatos formado por pessoas que se filiaram na última hora para surfar a onda do “mito”.

O apoio no Congresso não impede que integrantes desse centro sejam diariamente hostilizados pelas hordas bolsonaristas a serviço da destruição de biografias, e que os partidos sejam estigmatizados como venais, fisiológicos, corruptos e outras tantas pechas – muitas das quais fizeram historicamente por merecer.

Eis uma armadilha crucial, da qual o tal centro parece longe de se livrar: ao apoiar, acertadamente, os projetos da pauta econômica liberal necessária para tirar o País da recessão legada pelo PT, está criando as condições para que Bolsonaro diga que fez tudo sozinho – afinal, ele não tem uma coalizão política – e se sinta “liberado” para impor sua agenda em todas as demais áreas.

Daqui a três anos, quando começar o processo sucessório, qual será a narrativa dessas siglas? Que projeto alternativo o centro terá apresentado a este que está em curso, que nega a ciência, o conhecimento, as liberdades, estigmatiza e persegue dissidentes, faz o elogio sem ressalvas de práticas como tortura, nepotismo, perseguição ideológica e aparelhamento do Estado? Que sucumbe e apequena as Forças Armadas? Que testa audaciosamente os limites dos demais Poderes, como bem salientou o decano do STF a este jornal?

Não adiantará apresentar vários nomes, com perfis e eleitorado que se sobreponham, e elencar as vezes em que, aqui e ali, soltaram notas oficiais ou repudiaram comportamentos específicos do presidente.

Bolsonaro só se transformou de deputado folclórico em presidente, numa trajetória que passou ao largo do radar de nós da imprensa e de seus pares da política, porque começou a caminhada anos antes, construiu uma base social sólida, encaixou um discurso (o antipetismo, de um lado, e a crítica difusa a um tal “politicamente correto”, de outro) e foi beneficiado pela perda de foco dos adversários.

Até aqui, ele segue firme nessa estratégia, mesmo blefando que não tem nenhuma, enquanto seus potenciais oponentes pisam em astros distraídos, ao centro, na centro-direita e, principalmente, na patética esquerda lobotomizada pelo “Lula livre”.

Nessa toada, os longos três anos e 5 meses que nos separam de 2022 serão esse desfile canhestro de imposturas presidenciais sem que o eleitorado que não coaduna com elas se veja representado por alguém que aponte um caminho em que a defesa do liberalismo econômico não seja desculpa para que se passe pano para o indefensável em todas as demais esferas da vida pública.


Vera Magalhães: Freios e contrapesos

Com militares acuados, cabe ao Congresso e ao STF mostrar ao presidente limites institucionais

Peço desculpas ao leitor acostumado às colunas das quartas-feiras, em que costumo “quebrar” os textos em várias notas, de cunho mais informativo. A escalada da retórica autoritária e sem compromisso com fatos e com a verdade do presidente da República, desde há algumas semanas, me obriga a fazer deste texto uma continuação da minha coluna de domingo, em que alertei para o crescimento do cordão dos puxa-saco que cerca Jair Bolsonaro e dos riscos que isso traz para o debate público e para o próprio ambiente democrático.

Duas perguntas têm sido repetidas nas conversas que tenho com políticos, outros formadores de opinião, leitores, ouvintes, familiares, ministros do Supremo e toda uma gama de pessoas preocupadas com as diatribes bolsonaristas: 1) qual o limite para o que ele pode dizer?, e 2) como fazê-lo parar? Nos dois casos tenho respondido, entre constrangida e preocupada: não dá para saber.

Dizer que tudo bem usar helicóptero para levar a parentada cafona ao casamento do filho futuro embaixador nos Estados Unidos parecia um recorde. Quebrado no mesmo dia com a ameaça a um jornalista, dizendo que ele poderia pegar “cana”. Superado dois dias depois pela indignidade dirigida ao presidente da OAB. Reiterada duas vezes e superada por relativização (comemoração?) pelo assassinato de um cacique indígena e o massacre de 57 presos – que, não custa ser pleonástica, estavam sob custódia do Estado.

Portanto, não é possível dizer qual o limite para um presidente que não tem a menor noção do decoro que o cargo exige dele, nem das obrigações que recaem sobre seus ombros desde que jurou seguir a Constituição – que veda, um a um, esses comportamentos que ele exibe enquanto corta o cabelo.

E quem vai enumerar esses limites e alertar para os riscos de manter essa corda institucional assim esticada? Deveriam ser os militares. Foi este o grande trunfo, alardeado por mim, inclusive, na primeira hora, da nomeação de tantos generais para o primeiro escalão: eles incutiriam em Bolsonaro a noção de republicanismo que ele nunca teve, nem quando era capitão, nem como deputado.

Talvez por isso tenham sido eles, os militares, os primeiros alvos da máquina de moer reputações do bolsonarismo montada sob os auspícios do guru da Virgínia, Olavo de Carvalho, com direito a honrarias do próprio presidente, de seus assessores palacianos e da família.

Agora, entre acuados e desmoralizados, os militares pensam duas vezes antes de contrapor os absurdos que saem diariamente da boca presidencial.

Sem os militares em cena, cabe ao Congresso e ao Supremo Tribunal Federal a missão de fazer valer o sistema de freios e contrapesos da democracia, limitando por meio dos instrumentos de que dispõem a tentação onipotente de Bolsonaro. O Congresso já derrubou dois decretos do presidente, tornou o Orçamento mais impositivo e articula em frentes diferentes novas derrotas ao presidente, em temas como a portaria do Ministério da Justiça sobre deportações e a restrição radical à edição de medidas provisórias.

No STF, cresce a disposição de acatar a interpelação do presidente da OAB, Felipe Santa Cruz, para que Bolsonaro seja instado a dizer o que sabe do desaparecimento de seu pai ou se retratar. Seria uma linha riscada no chão, como a dizer de forma didática e eloquente ao presidente que existe um limite que ele não pode extrapolar: o princípio da moralidade, consignado na Constituição, que obriga a que a palavra do presidente tenha lastro na verdade fática e histórica e no mínimo de humanidade dirigida àqueles que governa, mesmo aqueles que ousam dele divergir. Afinal, estamos numa democracia.


Vera Magalhães: O cordão dos puxa-saco

Acólitos aplaudem patrimonialismo, nepotismo e ataques à ciência e à liberdade de imprensa

Minha avó paterna era uma carioca do samba. Adorava entoar marchinhas, com seu vozeirão rouco, a cada vez que um fato lhe chamava a atenção. Nas últimas semanas, me vem à mente dona Alduína cantando uma das suas favoritas, braços erguidos como se estivesse no bloco: “Lá vem/ O cordão dos puxa-saco/ Dando viva aos seus maiorais/ Quem está na frente é passado para trás/ E o cordão dos puxa-saco / Cada vez aumenta mais”.

O puxa-saquismo do Brasil de 2019, que ela não viveu para ver, aceita condescender com patrimonialismo e nepotismo explícitos, ataques à ciência, manifestações de preconceitos variados, desrespeito diário à liberdade de imprensa e tentativas de suprimir atribuições de órgãos, agências e até outros Poderes. Em resumo: exercícios de um crescente autoritarismo para ver se cola. E com muita gente tem colado. Na base da passação de pano, se aperta uma casa no cinto do que passa a ser considerado “o novo normal”.

Jair Bolsonaro só pode avançar de nariz empinado e com a arrogância dos que acham que não devem satisfações a ninguém porque se cercou de acólitos que só lhe dizem amém. Os seis primeiros meses de governo tiveram como uma de suas marcas o banimento de todo aquele que ousou questionar atos, comportamentos e decisões do presidente.

Foram para a Sibéria bolsonarista nomes como Gustavo Bebianno e Carlos Alberto Santos Cruz, no primeiro escalão, e outros menos conhecidos em estamentos inferiores do governo, sempre despachados com direito a esculhambação e destruição de reputações.

A maioria de quem sobrou entendeu que, ou se enquadra, ou dança. A exceção em termos de licença para divergir e tocar seu barco com liberdade, até aqui, tem sido Paulo Guedes, o “PG” na forma carinhosa pela qual é tratado por Bolsonaro. Mesmo quando interveio na seara do titular da Economia, como no caso em que tentou a todo custo arrancar vantagens para os policiais na reforma da Previdência, o presidente o fez com cerimônia e cuidado para não desautorizá-lo.

Por quê? Porque o futuro político do bolsonarismo depende de a economia dar certo. E porque Guedes não precisa do cargo de ministro para ter um futuro. E isso lhe dá liberdade para dizer “não” a Bolsonaro quando acha que deve, hoje em dia um privilégio quase exclusivo no primeiro escalão.

Pegue-se o exemplo de nomes como o general Augusto Heleno e mesmo o ministro Sérgio Moro. O primeiro assumiu com a fama de que seria o conselheiro de Bolsonaro. Exerceu essa missão com desvelo no início, ao dissuadir o presidente de ideias como a transferência da embaixada do Brasil em Israel para Jerusalém e de flertar com a ideia de uma aventura militar na Venezuela. Mas se acanhou diante dos ataques das milícias bolsonaristas aos militares, que ceifou seu amigo Santos Cruz e direcionou suas bazucas contra ele próprio e o porta-voz Rêgo Barros.

Já Moro, tragado para a crise da Vaza Jato, penhorou na loja bolsonarista boa parte do capital político e social que construiu como juiz. Se quando aceitou o ministério havia uma análise de que era indemissível e Bolsonaro dependia mais dele que o contrário, hoje a cada dia o ministro depende mais do presidente e ata seu futuro ao do chefe.

Se formos descer a nomes menos brilhantes, as manifestações de puxa-saquismo são bem mais explícitas e constrangedoras. Aqueles que emprestam suas biografias a justificar até as decisões mais estapafúrdias do chefe deveriam prestar atenção à segunda parte da marchinha da minha avó: “Vossa Excelência / Vossa Eminência/ Quanta referência nos cordões eleitorais / Mas se o ‘doutor’ cai do galho e vai pro chão/ A turma logo evolui de opinião/ E o cordão dos puxa-saco cada vez aumenta mais”.


Vera Magalhães: Dois fronts no Senado

A decisão, além de tudo extemporânea, de Jair Bolsonaro de indicar o filho Eduardo para a embaixada do Brasil em Washington encarece a tramitação da reforma da Previdência no Senado e faz com que o governo tenha de se desdobrar em dois fronts – quando não tem demonstrado capacidade de organização nem para um.

Os prognósticos quanto à facilidade ou dificuldade de aprovação de Eduardo na Comissão de Relações Exteriores (que não é condição para que seu nome vá a plenário) e no conjunto da Casa variam entre governistas e oposicionistas. Mas a avaliação de que essa discussão atrapalha o debate da reforma é consensual.

“Bolsonaro mostrou qual é sua prioridade ao aventar essa possibilidade justamente no momento em que a reforma está a caminho do Senado”, constatou um senador simpático ao governo, mas crítico da indicação do filho.

As contas sobre a acolhida na CRE ao nome do filho “03” do presidente para Washington variam. O líder do PSL no Senado, Major Olímpio (SP), me disse que Eduardo terá ao menos três votos de vantagem. Já senadores do bloco de oposição e do DEM fazem uma avaliação coincidente: haveria hoje um empate, e o presidente do colegiado, Nelsinho Trad (MS), pode dar o voto de Minerva em favor de Eduardo.

Em pleno recesso, partidos discutem a troca de integrantes da comissão como forma de facilitar a chancela ao nome do terceiro filho para o posto diplomático mais importante do País no exterior.

A indicação ainda não foi oficializada. Aliados acham que Bolsonaro vai “sentir o pulso” do Senado antes de enviá-la. E nessa medição a figura fundamental é Davi Alcolumbre (DEM-AP). O presidente da Casa já foi consultado pessoalmente por Bolsonaro, e foi cauteloso.

A batalha em plenário também é imprevisível: enquanto oposicionistas dizem que podem conseguir até 42 votos para derrubar a indicação, Olímpio prevê um placar mais tranquilo que na comissão.

Um fator, no entanto, pode atrapalhar os planos do governo: oposicionistas vão replicar a estratégia usada na eleição da presidência da Casa, quando abriram os votos. Contam com a pressão da opinião pública para pressionar os novatos da bancada bolsonarista, eleitos em cima do discurso da moralização das práticas políticas, uma vez que a indicação do filho caiu muito mal mesmo entre eleitores do presidente.

INAUGURAÇÃO
Postura de petista ameniza desgaste de Bolsonaro na Bahia

A conduta do governador Rui Costa (PT), que, depois de anunciar que não compareceria à inauguração do aeroporto de Vitória da Conquista, suprimiu deliberadamente a PM da Bahia do esquema de segurança do evento, ajudou a amenizar o desgaste de Jair Bolsonaro no Estado, algo que vem desde as eleições e se acentuara com a declaração do presidente sobre os Estados nordestinos semana passada.

A ausência do petista facilitou a dobradinha circunstancial de Bolsonaro com ACM Neto, prefeito da vizinha Salvador. E permitiu que o presidente ficasse à vontade para seu discurso de “reconciliação” com os nordestinos, em que usou a ascendência da filha para falar que sua família também tem sangue de cabra da peste. Um fator local pouco explorado ajuda a explicar as decisões desastrosas de Costa: ele está mal avaliado em Conquista, e seu estafe temia que ele fosse mal recebido pelo público – selecionado a partir de um cerimonial conjunto da Presidência e do prefeito da cidade, Herzem Gusmão (MDB), seu adversário.


Vera Magalhães: Fracassa acordo com policiais na reforma

Fracassou a tentativa, encabeçada por Jair Bolsonaro, de um acordo para flexibilizar as regras para policiais federais, rodoviários e legislativos na reforma da Previdência. Isso pode salvar a reforma, mas depende de o governo garantir os votos.

Presidente na linha. Bolsonaro não resistiu a alguns gritos de “traidor” e já cedeu. Telefonou ao relator, Samuel Moreira, sugerindo que tentasse uma solução para os policiais. Mas o acordo emperrou na regra de transição para quem já está nas cadeiras: as entidades queriam uma regra semelhante à que está no projeto dos militares, mas o relator só aceitou abrandar a idade mínima para a aposentadoria (de 55 anos para ambos os sexos para 53 para homens e 52 para mulheres).

Dia da Marmota. O vaivém dos policiais consumiu um dia inteiro, sendo que o prazo para que se cumpra o plano de encerrar a votação da reforma na Câmara antes do recesso já está para lá de exíguo. Enquanto esta newsletter é fechada para chegar ao leitor a quente, a comissão especial discute todas as tentativas de adiamento e obstrução. Mas o texto da reforma só deve ser votado, com sorte, na quinta-feira. Isso se até lá não aparecer outra crise.

E agora, presidente? Coube a Hugo Leal (PSD-RJ) apresentar um destaque com o pleito dos policiais. E cabe ao governo deixar claro se vai exigir dos seus deputados o voto para assegurar a reforma de R$ 1 trilhão ou se vai abrir a fenda pela qual podem passar todas as corporações —e toda a economia fiscal.

E quem foi às ruas? O saldo imediato da ação direta do presidente para beneficiar uma categoria da qual é historicamente próximo é péssimo na semana subsequente às manifestações em que pessoas foram às ruas entoar o grito da reforma de um trilhão e colocar a culpa pelo atraso do País no parlamento. Afinal, não foi Rodrigo Maia, e sim Bolsonaro, quem cedeu às pressões dos policiais e colocou em risco a espinha dorsal da reforma de Paulo Guedes.