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Ricardo Noblat: Dada a largada para a primeira eleição do voto quase facultativo

Nunca se viu nada de parecido

O voto no Brasil é obrigatório há 74 anos. O Código Eleitoral prevê multa de 3% a 10% sobre o salário mínimo da região para os que deixarem de votar e não se justificarem.

Sem a justificativa e o pagamento da multa, o eleitor não poderá obter passaporte ou carteira de identidade e renovar matrícula em estabelecimento de ensino oficial ou fiscalizado pelo governo.

Mas como a punição pela abstenção é irrisória, o voto obrigatório é uma ficção. O prazo para justificar a abstenção é de 60 dias. E basta pagar uma multa de R$ 3,50 para que o eleitor fique quite.

Este ano, graças à crise sanitária, não votar e não ser multado ficou ainda mais fácil. Em cartório, o eleitor poderá depois justificar sua ausência dizendo que passou mal no dia da votação.

“Em algum lugar no futuro, idealmente, o voto deverá ser facultativo”, disse a este blog o ministro Luís Roberto Barroso, presidente do Tribunal Superior Eleitoral.

“Mas a nossa jovem democracia ainda terá que ter esse ajuda extra, lembrando que o voto facultativo dá protagonismo aos extremos, o que não é bom no momento que o país atravessa”.

Segundo a mais recente pesquisa Datafolha, por medo de ser contaminado pelo coronavírus, 1 em cada 5 moradores da cidade de São Paulo diz que pode deixar de ir votar em novembro.

34% dos eleitores afirmam que não se sentem nada seguros em sair para votar, 24% dizem se sentir muito seguros e os outros 42% sugerem ter pouca segurança.

Os eleitores mais ricos são os que revelam menor grau de insegurança (12%). A maior taxa (24%) está entre os que recebem até dois salários mínimos. A s mulheres são mais inseguras.

Nunca antes na história uma eleição mereceu ser chamada de atípica como esta. Ela se dará sob a convergência inédita de fatos extraordinários – o mais impactante deles, a pandemia.

O vírus que já matou quase 142 mil pessoas e infectou mais de 4 milhões e 730 mil transferiu para novembro a eleição que deveria acontecer em outubro e que poderá se estender até dezembro.

A crise econômica que o país enfrenta decorre da pandemia que aumentou também a polarização política. A briga pelo voto deixará as ruas e será travada em grande parte nas redes sociais.

Por ser municipal, a eleição de vereadores e prefeitos costuma girar em torno de problemas locais. A pandemia, a crise econômica e a polarização política nacionalizarão o discurso dos candidatos.

A abstenção será maior do que jamais foi. Tudo isso somado, os resultados tornam-se ainda mais imprevisíveis. Quem se disser capaz de prevê-los é porque está mal informado.


Ricardo Noblat: Bolsonaro assiste indiferente ao tiro que Michelle deu no próprio pé

Ele tem medo de quê?

O vídeo com a música “Micheque”, da banda de rock Detonautas, não parecia destinado a virar um campeão de audiência no Youtube quando ali foi postado no último dia 4.

De autoria de Tico Santa Cruz, vocalista da banda, a letra da música foi inspirada pela descoberta de que Fabrício Queiroz depositou 89 mil reais na conta de Michelle Bolsonaro.

Mas aí, na quinta-feira dia 25, a primeira-dama prestou queixa na Delegacia de Crimes Eletrônicos do Departamento Estadual de Investigações Criminais (DEIC), em São Paulo.

Ela quer que sejam processados por calúnia, injúria e difamação todos os que passaram a chamá-la de “Micheque” nas redes sociais, inclusive os roqueiros da banda. Resultado?

Foi um tiro no pé. Até a quinta-feira, a sátira dos Detonautas somava quase 700 mil visualizações. No início desta madrugada, ultrapassou a marca de 1 milhão e 330 mil. Um sucesso!

Não foi a música que colou em Michelle o apelido de “Micheque”. O apelido foi replicado quase 9 milhões de vezes no Facebook, Twitter e Instagram entre 22 de agosto e 21 de setembro.

A banda apenas surfou na onda e se deu bem. O que espanta é que ninguém no governo, nem mesmo o presidente Jair Bolsonaro, tenha aconselhado Michelle a não fazer o que fez.

A ira da primeira-dama é justa. Ela nada teve a ver com o dinheiro depositado em sua conta. Foi usada. Ao que tudo indica, o dinheiro era um negócio particular entre Queiroz e seu marido.

Bolsonaro poderia ter poupado a mulher do constrangimento a que se vê exposta. Por que não se apressou em esclarecer o motivo pelo qual Queiroz depositou 89 mil reais na conta dela?

Que tipo de vantagem política imagina extrair da iniciativa que teve Michelle de procurar a polícia? Por que insiste em permanecer calado? Está com medo do quê?


Ricardo Noblat: Governo ignora o que lhe cabe e se mete onde não deve

E segue o baile

Talvez o presidente Jair Bolsonaro não chegue ao ponto de ter vontade de sacar do revólver quando ouve falar em Cultura. Numa peça antinazista de Hanns Jost, encenada em Berlim em 1933, ano em que Hitler assumiu o poder, um personagem dizia: “Quando ouço alguém falar em Cultura, saco o meu revólver”.

Mas Cultura não é lá do agrado do ex-capitão, que já confessou que nunca leu um livro. “Tem muita letra”, queixou-se. “Precisa ter mais figuras”. Por extensão, Educação também não é. Em pouco mais de um ano e meio de governo, dois tristes nomes passaram pelo Ministério da Educação. E o terceiro começou mal.

O pastor presbiteriano Milton Ribeiro revelou-se um homofóbico logo em sua primeira entrevista desde que assumiu o cargo. Disse que a homossexualidade é uma “opção”, que ele atribui ao que chamou de “famílias desajustadas”. “Normalizar isso e achar que está tudo certo é uma questão de opinião”, declarou. Não é.

Pediu para receber uma dura resposta de qualquer dos seus antagonistas, e a recebeu do youtuber Felipe Neto (33 milhões de seguidores nas redes sociais), recém-incluído na lista das 100 pessoas mais influentes do mundo em 2020, segundo a insuspeita revista americana “Time”. Neto perguntou ao ministro:

“Se família desajustada gera homossexuais… Que tipo de família gera envolvimento com milicianos e desvio de verba de gabinete para compra de imóveis, além de lavagem de dinheiro?”

Ribeiro pensa o que disse, mas fez questão de dizer para reconciliar-se com Bolsonaro, irritado desde que ele recebeu em audiência um grupo de deputados federais da oposição – entre os quais, Tabata Amaral (PDT-SP). Foi na quarta-feira da semana passada, segundo contou Igor Gadelha, repórter da CNN Brasil.

Bolsonaro orientou Ribeiro a filtrar mais quem recebe no ministério. E, se tiver que receber opositores do governo por obrigação, que não saia divulgando positivamente esses encontros. Que não fosse ingênuo e não se auto sabote. Ribeiro explicou que os deputados integravam uma comissão da Câmara. E daí?

Além de preconceituoso, Ribeiro revelou-se ignorante ao sugerir na entrevista que seu ministério não está interessado em aperfeiçoar a tecnologia nas escolas. Para ele, por exemplo, a dificuldade do ensino a distância durante a pandemia do coronavírus é problema dos outros, dele não:

– A sociedade brasileira é desigual, e não é agora que a gente vai conseguir deixar todos iguais. Esse não é um problema do MEC, é um problema do Brasil.

É possível que um problema do país, tanto mais o do ensino à distância, não seja também problema do Ministério da Educação? A verdade fugiu à boca de Ribeiro. Por muito menos, ao falar sobre impostos em uma entrevista recente, o ministro Paulo Guedes, da Economia, foi arrancado de cena por um dos seus colegas.

Este é um governo que fecha os olhos ao que lhe compete e se envolve com o que nada tem a ver. A opção sexual de cada um é assunto privativo de cada um – ao governo só cabe respeitar. A destruição do meio ambiente é um problema de todos, mas incumbe ao governo liderar os esforços para combatê-la.

Ribeiro não se auto sabota quando aceita reunir-se com deputados da oposição – é dever do homem público porque o governo foi eleito por uns, mas governa para todos. Bolsonaro se auto sabota e, pior, sabota o país quando em meio a uma pandemia com mais de 140 mil mortos é capaz de dizer, como disse ontem:

“Fico vendo Brasília, não posso falar nomes aqui, mas a alta cúpula do poder, alguns do Executivo, Judiciário, Legislativo também, com máscara 24 horas por dia. Dormiam com máscara, cumprimentavam assim [com ombro], pegaram o vírus agora. Não adianta isso aí”.

Bons tempos para Bolsonaro graças aos mais pobres

Aproveite o quanto possa

De janeiro do ano passado quando tomou posse e até dezembro, a popularidade de Bolsonaro só fazia cair, bem como a confiança dos brasileiros nele e a aprovação do seu governo, segundo pesquisa Ibope encomendada pela Confederação Nacional da Indústria.

O que aconteceu de lá para cá que justifique o crescimento exponencial de Bolsonaro conferido pela mais recente pesquisa Ibope? Certamente não foi a alta da inflação, nem a saída de Sérgio Moro do governo, nem o aumento do desemprego.

Tampouco o desempenho desastroso do governo durante a pandemia que já matou quase 140 mil pessoas e infectou mais de 4.650.000. Foi basicamente o pagamento do auxílio emergencial de 600 reais para os brasileiros mais pobres.

Entre os eleitores com renda familiar de até um salário mínimo, a popularidade de Bolsonaro subiu de de 19% em dezembro para 35%. Entre os eleitores com menor grau de instrução, a avaliação de ótimo ou bom saltou de 25% para 44%.

Aproveite Bolsonaro o tempo das vacas gordas. Em breve elas poderão emagrecer quando ao invés dos 600 reais, os contemplados com o auxílio passarem a receber só 300, e quando depois o auxílio cessar por falta de dinheiro.


Alon Feuerwerker: A luta do centrismo

O objetivo é construir a base de alternativas competitivas para 2022

Uma característica destas eleições municipais, além da pulverização das candidaturas a prefeito trazida pelo fim das coligações para vereador, é a movimentação do centrismo para construir a base de alternativas competitivas na eleição presidencial. Acontece na esquerda e na direita. Nesta, nota-se a atração mútua entre PSDB, MDB e Democratas. Naquela, entre PSB e PDT.

O objetivo de cada um é quebrar a hegemonia em seu campo. Na direita, reina soberano por enquanto Jair Bolsonaro. Na esquerda, apesar dos pesares, nenhum desafiante chega perto de Luiz Inácio Lula da Silva, mesmo consideradas as atribulações jurídicas do ex-presidente. Ciro Gomes ainda consegue alguma musculatura. Mas João Doria come poeira. E Sergio Moro até agora é uma incógnita.

Em condições normais de temperatura e pressão, a primeira fila no grid para 2022 estará, portanto, ocupada. Mas o que pode mudar? No centrismo de esquerda, uma esperança é que, desta vez, o eleitorado de Lula, se ele não puder concorrer, não marche para o candidato de Lula. No centrismo de direita, o sonho é que Bolsonaro seja removido antes da largada por algum fato ainda fora do radar.

Daí que, num apenas aparente paradoxo, o foco da pancadaria de cada um seja o “aliado” potencial, e não o adversário eleitoral. O objetivo principal de tucanos, democratas e emedebistas nesta eleição para prefeito e vereador é derrotar o bolsonarismo. E o esforço maior de pessebistas e pedetistas é maximizar as dificuldades político-eleitorais do PT para impor ao partido de Lula o maior desgaste possível.

Observadores cartesianos da cena podem até achar estranho, mas assim é a política. Qualquer análise desta que não tenha como centro a luta crua pelo poder é desperdício de tempo e energia intelectual. E ninguém alcança um segundo turno sem passar pelo primeiro. E o principal obstáculo no primeiro turno costuma ser exatamente aquele “amigo”, o eleitor a quem você vai ter de pedir apoio e voto quando chegar a hora da decisão.

Daí por que se compreende o presidente da República resistir a colocar o cacife dele na mesa dos primeiros turnos nos municípios. A não ser quando for importante para, desde agora, enfraquecer diretamente seus possíveis adversários em 2022. Já no caso de Lula, a prioridade parece ser evitar que o PT se dilua em alianças que podem fortalecer quem deseja aposentar o ex-presidente.

Não que ambos, Bolsonaro e Lula, dependam tanto assim do resultado deste novembro. Ele é vital para seus concorrentes, mas os dois podem sobreviver bastante bem a reveses de sua tropa. Pois eleição presidencial tem características de eleição solteira. O eleitor não vota no presidente porque o deputado ou o governador mandaram, mas pode muito bem decidir votar no governador ou no deputado porque são apoiados pelo candidato a presidente.

E tem outra: quanto mais cada partido, o bolsonarista e o lulista, vier a sofrer agora, mais precisará do líder para comandar a colheita na urna daqui a dois anos. Fica a dica.


Ricardo Noblat: Como cobra, o general troca de pele para melhor servir ao capitão

Mourão quer ser vice outra vez. Pegou gosto

Procura-se alguém do Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais que prioriza a divulgação de dados negativos sobre as queimadas que devastam a Amazônia e o Pantanal. Só nos últimos 14 dias, o número de focos de incêndios na Amazônia superou o total de focos registrados nos 30 dias de setembro do ano passado.

Que alguém é esse que tanto se procura? Vice-presidente da República e comandante do Conselho da Amazônia, o general Hamilton Mourão não faz ideia de quem seja. Ou se faz não quer dizer. Foi ele que falou do alguém que prioriza a divulgação de dados negativos. Mas não apresentou provas de que ele exista.

O provável é que o general tenha posto a circular mais uma teoria conspiratória tão ao gosto do presidente Jair Bolsonaro e dos seus filhos. Porque não é preciso que nenhum alguém divulgue dados negativos ou positivos sobre o meio ambiente. Os dados do instituto, com base em imagens de satélites, estão na internet.

Na semana passada, Mourão confessou que está em campanha para continuar vice de Bolsonaro caso ele se reeleja. Mourão troca de pele como as cobras. Na campanha de 2018, comportou-se como o general linha dura que foi. Eleito, pôs a máscara de liberal e passou a fazer contraponto a Bolsonaro. Carlos não gostou.

Então, aos poucos, Mourão foi mudando de postura. Trocou a máscara de liberal pela de tradutor condescendente de Bolsonaro, atenuando suas declarações mais explosivas. E, agora, vestiu a máscara de aliado incondicional do seu chefe e ex-companheiro de armas. Ambos já foram punidos quando serviram ao Exército.

O capitão acompanha a metamorfose do general. Por enquanto, ela o satisfaz.


Ricardo Noblat: O que confere sentido às aparentes ações desconexas de Bolsonaro

Candidato a pai dos pobres, sem desprezo aos ricos

Algum sentido deve fazer o presidente da República vetar parte de uma lei aprovada pelo Congresso e recomendar a derrubada do seu veto, a Amazônia e o Pantanal arderem em chamas e o orçamento do Ministério do Meio Ambiente acabar reduzido, a pandemia ainda infectar e matar milhares de brasileiros e um general especialista em logística ser nomeado ministro da Saúde.

Qual sentido? É tentador concluir que o único sentido capaz de dar sentido a tantos passos em contrário é o desejo do presidente Jair Bolsonaro de se reeleger daqui a dois anos. Desejo supremo que orienta todas as suas ações. Não importa o mal que muitas delas causem ao país para sempre, desde que algum bem faça a Bolsonaro. Reeleição acima de tudo, só abaixo de Deus – e olhe lá!

O presidente vetou o trecho da lei que isentava as igrejas da Contribuição Social sobre o Lucro Líquido e anulava as multas já aplicadas pelo não pagamento dessa contribuição. Se não o fizesse, se arriscaria a ser acusado por crime de responsabilidade ao desrespeitar regras do Orçamento para a concessão de benefício tributário. E o que ele fez em seguida?

Recomendou por escrito a deputados e senadores que derrubem o veto. Disse que se ainda fosse deputado era isso o que faria. Jogada esperta para livrar-se do desgaste de uma decisão que desagradou os líderes religiosos que o apoiam. Se sua recomendação não for atendida, a culpa será do Congresso. Se for atendida, ele lucrará à custa do rombo de 1 bilhão de reais a ser produzido no Orçamento.

A maior planície alagável do planeta, o Pantanal, pega fogo. O desmatamento na Amazônia deverá destruir mais florestas este ano do que no ano passado, o primeiro do governo Bolsonaro. Por causa disso, países da Comunidade Econômica Europeia ameaçam não ratificar o acordo comercial firmado com o Mercosul, até aqui o único feito diplomático da diplomacia bolsonarista.

O que Bolsonaro ganha com tudo isso? Estreita suas relações com os militares, devotos da teoria de que a Amazônia deve ser ocupada e explorada economicamente por ser uma região plena de riquezas naturais. Danos ao meio ambiente poderão ser reparados no futuro. Enquanto isso, passe livre para que garimpeiros, empresas de mineração e pecuaristas façam a festa. Afinal, 2022 é logo ali.

Valeu a pena para Bolsonaro livrar-se dos ex-ministros da Saúde Luiz Henrique Mandetta e Nelson Teich, ambos médicos que se opunham à aliança do governo com o coronavírus para que morressem os que um dia acabariam morrendo de qualquer jeito. Ministro interino da Saúde no auge da pandemia, o general Eduardo Pazuello comportou-se no cargo ao gosto do chefe.

Nada mais natural, portanto, que fosse promovido à condição de titular. Um militar a mais ou a menos não fará diferença para o governo mais militarizado desde o fim da ditadura de 64. Os brasileiros já deram a pandemia como vencida. De resto, se bem não fez a Bolsonaro, tampouco lhe fez mal sabotar o confinamento, desprezar o uso da máscara e receitar a cloroquina.

Bolsonaro descobriu os pobres e a vantagem de socorrê-los. Quem um dia chamou o programa Bolsa-Família de Bolsa-Farelo está atrás de algo semelhante para imprimir suas digitais. Eleito pelos mais ricos e escolarizados quer ser reeleito agora também com o voto dos mais pobres e menos escolarizados. Da Avenida Brigadeiro Faria Lima, em São Paulo, às palafitas de Manaus.


Ricardo Noblat: Presidente recomenda ao Congresso que anule o que ele decidiu

Que país é este?

Antes já se viu presidente da República orientar seus aliados no Congresso para votarem contra projetos que ele mesmo propôs. Alguns fizeram isso, mas de maneira discreta. Jair Bolsonaro é o primeiro a recomendar publicamente aos seus aliados que derrotem uma decisão que ele não gostaria de ter tomado.

Trata-se do veto à parte da anistia concedida pelo Congresso a tributos que deveriam ser pagos por igrejas, medida que poderia produzir um impacto de R$ 1 bilhão no Orçamento da União. Para superar o que ele sentiu-se obrigado a fazer, Bolsonaro mandará ao Congresso uma Proposta de Emenda à Constituição.

Quer dizer: ele concorda em bancar o impacto R$ 1 bilhão no Orçamento. Só vetou porque o projeto de lei aprovado pelo Congresso “apresentava obstáculo jurídico incontornável”. Se o sanciona, poderia ser acusado de “crime de responsabilidade”. Bolsonaro escreveu nas redes sociais:

– Confesso. Caso fosse deputado ou senador, por ocasião da análise do veto que deve ocorrer até outubro, votaria pela derrubada do mesmo.

Bolsonaro não quer ficar mal com sua base de apoio evangélica. Vinha sendo pressionada por ela a não vetar. A Frente Parlamentar Evangélica do Congresso é composta por 195 dos 513 deputados e por oito dos 81 senadores. Esse pessoal tem muita bala na agulha – Isto é: muito voto a dar a candidatos necessitados.

O governo avalia que, apesar da revolta dos religiosos com o veto, eles dificilmente romperão com Bolsonaro porque não haverá em 2022 candidato mais afinado com suas ideias do que o atual presidente. Que trabalhem, pois, para derrubar o veto. E segue o baile. Situação sob controle, só não se sabe exatamente de quem.

Bolsonaro torce por Lula livre e candidato em 2022

Depende de Celso de Mello

Só se realmente preferir, o presidente Jair Bolsonaro será interrogado presencialmente por delegados da Polícia Federal e advogados de defesa do ex-ministro Sérgio Moro no processo que apura se ele de fato tentou interferir onde não devia – no caso, na Polícia Federal que queria pôr sob seu controle.

Como Bolsonaro tem a prerrogativa de escolher dia e hora para cumprir a ordem do ministro Celso de Mello, do Supremo Tribunal Federal, poderá empurrar a decisão com a barriga. Até que Celso se aposente, em outubro. E até que os demais ministros do tribunal confirmem ou revoguem a ordem dada por ele.

Bolsonaro está sendo aconselhado a valer-se de recursos judiciais e a ganhar tempo à espera do adeus de Celso. Vozes isoladas a quem ele dá ouvidos sugerem o contrário para que não corra o risco de comprometer a melhora nas suas relações com o tribunal, agora sob o comando do ministro Luiz Fuz, recém-empossado.

Para Celso, tanto faz como tanto fez. Cumpriu sua missão no processo. De resto, a competência para denunciar Bolsonaro ou absolvê-lo da acusação feita por Moro não é sua, é do Procurador-Geral da República, Augusto Aras. Parece remota a hipótese de Aras denunciar Bolsonaro, a quem deve seu cargo.

Celso tem mais o que fazer antes de começar a limpar as gavetas do seu gabinete. A defesa de Lula levantou a suspeição de Moro nos processos que o condenou. A questão será examinada pela Segunda Turma do tribunal. O placar, ali, está empatado – 2 a 2. Caberá a Celso desempatar, talvez seu último voto como ministro.

Se desempatar contra Lula, tudo fica como está. Ou seja: com seus direitos políticos cassados, Lula, um ficha suja, não poderá ser candidato às próximas eleições. Se Celso desempatar a favor de Lula, a eleição de 2022 oferecerá aos brasileiros fortes emoções. Bolsonaro torce em silêncio para que dê Lula na cabeça de Celso.

Lula livre e ainda por cima candidato significaria a esquerda rachada e menos espaço para o surgimento de um nome do centro capaz de tirar Bolsonaro do segundo turno. Não teria para mais ninguém. Mamão com açúcar. Polarização acirrada, bem ao gosto de Bolsonaro. Reeleição à vista. É, pelo menos, o que ele imagina.


Ricardo Noblat: O teatrinho de Bolsonaro para enganar seus devotos mais uma vez

Guedes, o coadjuvante

O que o presidente Jair Bolsonaro diz ou faz não deveria mais causar espanto aos que discordam dele. Porque não é para eles que Bolsonaro fala e faz, mas para os que o elegeram e estão dispostos a reelegê-lo. Simples assim. Uma banalidade, ou quase isso.

“Estamos praticamente vencendo a pandemia”, afirmou Bolsonaro em mais uma viagem ao Nordeste, o mais novo alvo de sua caça permanente a votos. “O Brasil foi um dos países que menos sofreu dada às medidas tomadas pelo governo federal”.

Verdade ou mentira? Grossa mentira. A pandemia ainda está longe de ser vencida. E quando for, o governo federal não terá sido o maior responsável, pelo contrário. A levar-se em conta o número de mortos e de infectados, o Brasil é o segundo país que mais sofre.

Sim, mas, e daí? Os devotos de Bolsonaro querem escutar que ele lhes diz, querem acreditar em suas palavras, quando nada para concluírem que seu voto valeu a pena. Assim procedem nos Estados Unidos, por exemplo, os eleitores de Trump.

No momento, Bolsonaro e Paulo Guedes, ministro da Economia, encenam a farsa sobre a “crise do arroz”. Guedes reclama porque o Ministério da Justiça pediu explicações para a alta do preço do produto. Bolsonaro diz que autorizou que o pedido fosse feito.

Guedes sabe que Bolsonaro jamais cairia da arapuca de tabelar preços. Bolsonaro sabe que Guedes sabe disso. Mas para o público de Guedes, os empresários, pega bem que ele reclame. E para os pobres que Bolsonaro quer conquistar, que ele cobre explicações.

E segue o baile. Cada um com o seu papel e a situação sob controle. À falta de oposição, o céu é de brigadeiro para eles.

A corrupção sequestrou a política do Rio e tão cedo a libertará

Futuro com cara de presente

A corrupção emporcalhou de tal maneira a imagem política do Rio de Janeiro que o bacharel em Direito Eduardo Paes, duas vezes prefeito da cidade do Rio e candidato, este ano, ao mesmo posto, teria razões de sobra para comemorar o fato de ter-se tornado réu por irregularidades em contratações antigas.

A situação dele não é nada má se comparada, por exemplo, com a de Wilson Witzel, afastado do cargo por 180 dias e ameaçado de impeachment por desvio de dinheiro da Saúde. Ou com a situação do governador interino Cláudio Castro, investigado por ter recebido propina na época em que era vereador.

Paes parece menos enrolado do que o seu sucessor, o atual prefeito Marcelo Crivella, candidato à reeleição, acusado de fraude em licitações e lavagem de dinheiro. E do que o secretário estadual da Educação e a ex-deputada federal Cristiane Brasil, ambos presos ontem, suspeitos de desvio de 117 milhões de reais.

Só nesta semana, no Rio, foram três operações policiais contra corrupção em apenas quatro dias. Houve agente e promotor que participarem de duas em menos de 48 horas. Cansativo. Nem por isso há sinais de que o futuro possa ser o oposto do presente. O crime infiltrou-se no aparelho do Estado e sequestrou a política.


Ricardo Noblat: Que saudade Bolsonaro sentirá de Dias Toffoli

O que Fux promete
A entregar pelo menos em parte tudo o que prometeu no seu discurso de posse, ontem, como novo presidente do Supremo Tribunal Federal, o ministro Luiz Fux fará o presidente Jair Bolsonaro sentir falta, muita falta do ministro Dias Toffoli.

Há dois anos, ao ser empossado no cargo que cedeu a Fux, Dias Toffoli prometera tirar o tribunal da boca do palco da política, reduzindo seu protagonismo. Fez o contrário. E surpreendeu seus pares e o próprio governo aliando-se a Bolsonaro.

Fux comprometeu-se também com uma “intervenção minimalista” em assuntos sensíveis. “Menos é mais”, enfatizou. Repetiu o truísmo da necessária independência entre Poderes, mas acrescentou: “Com altivez” e não com contemplação e subserviência.

Sentado ao seu lado e usando máscara porque todos, ali, também usavam, Bolsonaro não foi alvo de tratamento especial, nem de salamaleques. Ouviu do ministro Marco Aurélio Mello que deve governar para todos os brasileiros, e não só para os que o elegeram.

Ouviu de Fux, no trecho mais aguardado do seu discurso, uma defesa enfática do combate à corrupção. O ministro citou a Lava-Jato mais de uma vez, exaltando seus resultados. Fez por merecer o que o ex-juiz Sérgio Moro vaticinou em 2016:

– Excelente. “In Fux we trust” (‘em Fux nós confiamos’)

Histórias do Brasil

O alô do prefeito e o mico do general

Dez de março passado, uma segunda-feira. Manhã, bem cedo. Na casa do empresário Rafael Alves, na Barra da Tijuca, Rio de Janeiro, toca seu celular. Ao ouvir “alô”, o prefeito Marcelo Crivella (Republicanos), autor da chamada, foi logo perguntando:

– Bom dia, Rafael. Está tendo uma busca e apreensão na Riotur [empresa de turismo do município]? Você está sabendo?

Não foi Rafael que atendeu a ligação, mas o delegado Clemente Nunes Machado Braune, um dos responsáveis pela primeira fase da Operação Hades que investiga um esquema de pagamento de propinas a funcionários da prefeitura.

Naquele instante, a casa de Rafael estava sendo vasculhada por policiais em busca de documentos e de objetos. O delegado disse ao prefeito quem era e por que estava ali. Sem falar mais uma só palavra, Crivella desligou rapidamente.

Segundo o delegado, a forma de tratamento, o horário da chamada e o assunto em questão deixaram clara a relação de confiança entre o prefeito e o empresário, que teve o celular apreendido. Seu conteúdo deflagrou, ontem, a segunda fase da operação.

Desta vez, foram cumpridos 22 mandados de busca e apreensão, três deles em endereços de Crivella: seu apartamento na Barra da Tijuca, seu gabinete na sede da prefeitura, e o Palácio da Cidade, usado por ele para reuniões e eventos.

O prefeito estava em casa quando os policiais chegaram. Seu celular foi confiscado, embora, por orientação de advogados, ele tenha se recusado a fornecer a senha. Depois da batida, Crivella foi ao encontro do presidente Jair Bolsonaro num quartel da Marinha.


Ricardo Noblat: TV Globo ignora pegadinha de Bolsonaro, mas dá o troco

Panelaço ocupa mais tempo do Jornal Nacional do que o discurso presidencial de 7 de setembro

Em tempos normais, o pronunciamento do presidente da República, no dia em que o país celebrou mais um aniversário de sua independência, teria merecido no Jornal Nacional mais do um resumo de 38 segundos, quando nada porque ele exaltou o golpe militar que implantou no país uma ditadura de 21 anos.

Mas os tempos não são normais, como o presidente também não é. Jair Bolsonaro tentou aplicar uma pegadinha na Globo, e ela não caiu. Na parte do discurso que se referia ao golpe, chamado por ele de revolução de 64, Bolsonaro valeu-se de trechos de um editorial do jornal O Globo publicado em 1984.

Segundo Maurício Stycer, colunista da Folha de S. Paulo e autor da descoberta, o editorial, assinado por Roberto Marinho, dono do jornal, começava assim:

“Participamos da Revolução de 1964, identificados com os anseios nacionais de preservação das instituições democráticas, ameaçadas pela radicalização ideológica, greves, desordem social e corrupção generalizada”.

Em sua fala de ontem, transmitida em cadeia nacional de rádio e televisão, Bolsonaro disse:

“Nos anos 60, quando a sombra do comunismo nos ameaçou, milhões de brasileiros, identificados com os anseios nacionais de preservação das instituições democráticas, foram às ruas contra um país tomado pela radicalização ideológica, greves, desordem social e corrupção generalizada”.

Não foi a primeira vez que Bolsonaro provoca a Globo. A primeira foi em agosto de 2018 quando era candidato a presidente. Em entrevista à GloboNews, ele citou o mesmo editorial. Levou como resposta que o jornal “O Globo” revira sua posição sobre o golpe cinco anos antes, e que como golpe o tratava desde então.

A resposta da Globo à pegadinha foi sutil, embora tenha sido mais incômoda para Bolsonaro. Por mais de 60 segundos, o Jornal Nacional mostrou imagens do panelaço ouvido em todas as regiões do país no exato momento do discurso presidencial. Quem dá recebe, quem pede tem preferência.


Ricardo Noblat: Vinte anos depois, Fernando Henrique Cardoso admite que errou

A reeleição foi um passo em falso

Vem tarde e dará em nada o “mea culpa” do ex-presidente Fernando Henrique Cardoso por ter aceitado a aprovação pelo Congresso da emenda constitucional que permitiu sua reeleição. A emenda foi proposta por Mendonça Filho, um deputado pernambucano que à época estreava na Câmara. Ninguém deu bola para ela. Até que um dia se deu.

Disse Fernando Henrique, em artigo que alcançou larga repercussão no fim da última semana, que a emenda foi aprovada porque se temia a eleição de Lula, derrotado por ele em 1994, e, antes disso, por Fernando Collor de Mello em 1989. Houve denúncias de que a reeleição fora comprada. Ele nega seu envolvimento com a compra de votos. E mais não disse.

Não disse, por exemplo, que a proposta de reeleição presidencial só foi engolida pelo Congresso porque passou a abranger a reeleição para os governos de Estados e as prefeituras. Por dever de justiça, diga-se em seu socorro que ele era contra. Mas, e daí? Se ele podia, por que os outros não? Onde se abre uma brecha, a manada faminta avança em louca disparada.

Em seu ato de contrição, Fernando Henrique também omitiu que o presidente Itamar Franco, desconfiado, chamou-o para uma conversa reservada antes de indicá-lo à sua sucessão. Itamar queria saber se caso fosse eleito, Fernando Henrique se contentaria em governar por um mandato ou se passaria a flertar com a possibilidade da reeleição.

Itamar era tudo, menos bobo. Já ouvira falar a respeito. E pensava em ser candidato à sucessão de Fernando Henrique, pois se limitava a completar metade do mandato de Collor, derrubado por um pedido de impeachment. Fernando Henrique respondeu a Itamar que era contra a reeleição, que sempre fora e que seria. Itamar nunca o perdoou por causa disso.

Por uma diferença mínima de votos, Fernando Henrique escapou de ser obrigado a disputar com Lula o segundo turno da eleição de 1998. Foi um susto e tanto que ele e seus apoiadores levaram. Mas dali a mais quatro anos, tendo realizado um segundo governo pior do que o primeiro, Fernando Henrique assistiu impotente a eleição de Lula. Até gostou. Quem sabe não o venceria em 2006?

O fim da reeleição não foi bandeira de campanha de Lula na versão paz e amor do marqueteiro Duda Mendonça, mas ele dizia ser contra governar por oito anos consecutivos. Nada fez, porém, para acabar com a reeleição, nem para si nem para quem o sucedesse. Assim como Dilma nada fez. Bolsonaro, sim, usou e abusou em campanha da promessa de acabar com a reeleição. E, agora…

Agora é só no que pensa. Não governa para outra coisa. Cada medida que baixa leva em conta seus efeitos sobre o que de fato importa para ele e seus milicianos – ficar no poder o maior tempo possível, pelo bem ou pelo mal. Pelo bem sendo reeleito democraticamente, como deseja. Pelo mal, forçando sua recondução ao cargo por meio de trapaças.

Uma das fraquezas da democracia é que a liberdade por ela assegurada, se exercida na contramão do bom senso, pode voltar-se contra ela mesma. Não é o que ocorre escandalosamente nos Estados Unidos, o berço da democracia, desde que Trump se elegeu? Jamais se viu um presidente americano culpar a fraude por uma derrota que ainda não colheu. É o que se está a ver.

Richard Nixon, do mesmo partido de Trump, renunciou porque cometeu o pecado mortal de mentir ao país, não porque mandou espionar o escritório do Partido Democrata no edifício Watergate. Trump é o presidente campeão de mentiras. É capaz de negar o que disse e que foi gravado em vídeo. Ameaça contestar os resultados das urnas se não for reeleito em novembro próximo.

Não bastasse, vai além: ao mesmo tempo em que se apresenta como vítima de uma eventual fraude se derrotado, incentiva desde já uma fraude ao seu favor. Aos eleitores do Estado da Carolina do Norte, na semana passada, ele simplesmente aconselhou que votassem duas vezes pelo correio, o que configura crime. Seu objetivo? Ora, anular votos que poderão lhe ser adversos.

O comportamento de Trump enfraquece a democracia dentro e fora dos Estados Unidos, e infla de gás uma seleta estirpe de governantes conhecida pela alcunha de “Trump Boys”. Alguns desses aspirantes a ditadores têm suas próprias ideias. Outros (e você sabe a quem me refiro neste caso) clonam as ideias de Trump e o amam acima de tudo, só abaixo de Deus.

Segundo Fernando Henrique, seria ingenuidade imaginar que “os presidentes não farão o impossível para ganhar a reeleição”. Em um mundo carente de estadistas, só o voto corrige o estrago que o próprio voto produziu. A democracia não garante sempre a escolha do melhor, apenas permite que se continue tentando, tentando, tentando até acertar.


Ricardo Noblat: Ministério da Saúde inunda o país com hidroxicloroquina

Bolsonaro, o garoto propaganda da droga, agradece

Jamais se viu e dificilmente se verá algo que supere o absurdo protagonizado pelo presidente Jair Bolsonaro e os que o ajudam a governar ou a desgovernar o país. Verdade que ele seguiu os passos de Donald Trump a quem imita por falta de referência que mais o agrade. Verdade também que Trump recuou ao ver a enrascada em que se metera. Bolsonaro segue em frente como um celerado.

Em questão, o uso da hidroxicloroquina no combate a Covid-19. O mal começou a preocupar o mundo quando fez suas primeiras vítimas na China ainda em novembro do ano passado. Oito meses depois, não surgiu um único estudo científico que tenha comprovado a eficácia da droga contra a doença que ganhou status de pandemia. Nem por isso Bolsonaro desistiu dela.

A Organização Mundial de Saúde, em junho último, interrompeu os testes com o remédio para tratamento do coronavírus após revisão de estudos não atestar efeitos positivos. Um mês depois, a Sociedade Brasileira de Infectologia divulgou um comunicado em que propõe que as medicações com a hidroxicloquina sejam abandonadas “no tratamento de qualquer fase” da doença. E daí?

Daí que o governo não ligou a mínima. Durante a pandemia, o Ministério da Saúde quintuplicou a distribuição da droga a estados e municípios. E agora tenta desovar na rede pública doses em estoque doadas pelo governo dos Estados Unidos depois que Trump mudou de lado. Foi o que apurou o jornal Folha de S. Paulo por meio da Lei de Acesso à Informação.

De março a julho deste ano, já foram enviados 6,3 milhões de comprimidos de cloroquina, na dosagem de 150mg, para abastecer as unidades do Sistema Único de Saúde. Segundo o jornal, é 455% a mais do que o repassado no mesmo período do ano passado (1,14 milhão), quando a aplicação se dava apenas em terapias contra a malária e outras doenças.

Até julho, cerca de 5 milhões de comprimidos foram remetidos pelo ministério só para uso em pacientes com o novo coronavírus. As remessas cresceram em maio e junho graças ao papel desempenhado por Bolsonaro de garoto propaganda do remédio. No período, foram afastados dois ministros de Saúde contrários ao aumento do uso do medicamento – Mandetta e Nelson Teich.

Disciplinado, o atual ministro interino da Saúde, general Eduardo Pazuello, não se opôs à vontade de Bolsonaro. Missão dada, missão cumprida. No final de junho, o Ministério da Defesa informou que havia 1,8 milhão de comprimidos de cloroquina em estoque no Laboratório do Exército. O valor representa cerca de quase 20 vezes a produção anual da droga nos anos anteriores.