vacinação

Rubens Barbosa: Notas sobre a carta de Bolsonaro a Biden

Importante entender as entrelinhas. Não vai ser fácil o diálogo entre os dois governos

A carta do presidente Bolsonaro enviada a Joe Biden por ocasião da posse como presidente dos EUA, na forma, parecia ter sido escrita pelo velho Itamaraty ao descrever a relação entre os dois países. Os comentários sobre os valores compartilhados, as coincidências e os avanços recentes refletem as posições do atual Itamaraty durante o governo Trump e estão longe de poder ser associadas ao governo Biden, a menos que o texto indique uma bem-vinda correção de rumos na política externa brasileira… Importante é entender o que está nas entrelinhas da correspondência presidencial.

Uma primeira observação esclarecedora diz respeito à referência de que o atual governo “corrigiu os equívocos de governos brasileiros anteriores, que afastaram o Brasil dos EUA, contrariando o sentimento de nossa população e os nossos interesses comuns”. Como embaixador em Washington nos governos FHC e Lula (1999-2004), devo dizer que recebi diretamente dos dois presidentes instruções precisas para manter e ampliar as relações bilaterais, o que foi feito com resultados muito concretos para o Brasil durante os cinco anos em que lá permaneci. O posterior predomínio de considerações partidárias a partir de certo momento no governo Lula e no governo Dilma realmente afetou o relacionamento entre os dois países, como tive ocasião de prever e registrar em meu relatório final de gestão. A normalidade e o tratamento construtivo na relação entre os dois países foram retomados em seguida, com o governo Michel Temer.

A afirmativa de que “os empresários de nossos dois países têm interesse em um abrangente acordo de livre-comércio” exagera a vontade empresarial quanto a esse acordo amplo (como se vê pela relutância em avançar as negociações com a Coreia do Sul em decorrência da baixa competitividade brasileira), bem assim quanto à disposição do governo de Washington, que não tem nem mandato do Congresso, nem interesse em abrir negociações com o Brasil.

Nas organizações econômicas internacionais, a carta diz que “o Brasil está pronto para continuar cooperando com os EUA para a reforma da governança internacional. Isso se aplica, por exemplo, à OMC, onde queremos destravar as negociações e evitar as distorções de economias que não seguem as regras de mercado”. Essa ação proposta por Trump, e que deverá ser mantida por Biden, visa a atingir a China, não considerada pelos EUA como economia de mercado. Apoiada pelo Brasil até aqui, com base na coincidência com as políticas de Trump, vai continuar agora à luz da dependência do suprimento de vacinas e insumos chineses para combater a pandemia? O governo brasileiro vai mudar sua percepção negativa sobre o multilateralismo e seus efeitos maléficos sobre as nações e passar a apoiar a nova linha do governo Biden?

Resta saber se a afirmação de que “necessitamos também continuar lado a lado enfrentando as graves ameaças com que hoje se deparam a democracia e a liberdade em todo o mundo e que se tornam mais prementes no mundo pós-covid” será suficiente para justificar, apesar de tudo, convite ao Brasil para participar da grande conferência sobre democracia que Biden convocará neste ano.

O aspecto mais importante da correspondência se refere à “disposição a continuar nossa parceria em prol do desenvolvimento sustentável e da proteção do meio ambiente, em especial a Amazônia, com base em nosso Diálogo Ambiental, recém-inaugurado”. Em relação ao Acordo de Paris, “nota que o Brasil demonstrou seu compromisso com a apresentação de suas novas metas nacionais” e que, “para o êxito do combate à mudança do clima, será fundamental aprofundar o diálogo e aumentar a cooperação na área energética, visto ter o Brasil sido escolhido país líder para o diálogo de alto nível da ONU sobre Transição Energética”. A relevância desse trecho reside no fato de o Brasil ter dado o roteiro às demandas do governo Biden para que sejam apresentados resultados concretos na preservação da Amazônia (combate ao desmatamento, queimadas, garimpo ilegal e proteção das comunidade indígenas), conforme previsto pelo recém-firmado Diálogo Ambiental; para cobranças no aprofundamento das metas nacionais sobre redução de emissão de gases de efeito estufa, pois, contrariando o compromisso de 2015, ao invés de ampliar as metas, o governo promete emitir mais CO2 até 2030 e as condicionou a recursos externos, o que acarretou a exclusão do Brasil da Cúpula de Ambição Climática sobre mudança de clima; ao aceitar participar do Diálogo sobre Transição Energética, o Brasil será cobrado a apresentar propostas ambiciosas em políticas climáticas

O Congresso americano, com o novo governo, começou a rever o sistema geral de preferências para países em desenvolvimento, em que se prevê a exclusão de países que não implementarem políticas relacionadas às leis ambientais nacionais ou compromissos internacionais. Caso o Brasil seja excluído, empresas nacionais deixarão de exportar com tarifa zero mais de US$ 2,2 bilhões. Será mantida a decisão de o Brasil acompanhar os EUA e aprovar os princípios da política de rede limpa (clean network) para excluir empresas chinesas da concorrência para a instalação da plataforma 5G?

Não vai ser fácil o diálogo entre os dois governos.

*Presidente do IRICE


Ana Carla Abrão: Novos riscos globais expõem as fraturas sociais da pandemia

Não foi o coronavírus que gerou nossa desigualdade social. Mas ele a ampliou

Há 50 anos, o Fórum Econômico Mundial (WEF, da sigla em inglês) foi fundado. Desde então, governantes, agentes públicos e empresários do mundo todo se reúnem anualmente em Davos. A pequena cidade suíça tem seus dias de glória nos meses de janeiro, quando o mundo acompanha seu inverno frio e branco emoldurando discussões sobre o desenvolvimento econômico e social global. Este ano, como em tantos outros casos, Davos ficará vazia. Mas os debates não deixarão de acontecer. De outra forma, mas com grande ênfase.

É durante o WEF que se publica o Relatório de Riscos Globais (RRG). Já são 16 edições que anualmente busca apontar os maiores riscos e seus potenciais impactos sobre o mundo. O relatório veio a público esta semana trazendo a perspectiva de líderes públicos e privados sobre o que pode comprometer a prosperidade global em áreas como economia e meio ambiente, mas também geopolítica, questões sociais e tecnologia. Em 2021, o desafio nesse mapeamento foi maior. Afinal, não é fácil falar de riscos após o inesperado tsunami da covid-19. Não que esse risco estivesse completamente fora do radar. Mas sua ocorrência, severidade e impactos superaram as previsões do mais adverso dos cenários possíveis. 

Neste ano, o RRG identificou sete grandes riscos, classificados em ordem de probabilidade de ocorrência e de impacto. No primeiro grupo, riscos climáticos continuam se destacando, com eventos climáticos extremos, falhas nas ações de proteção ambiental e danos ambientais causados pela ação humana ocupando as três primeiras posições. 

Na sequência, temos os riscos de doenças infecciosas assumindo lugar que perda de biodiversidade ocupava em 2020. Esse vem adiante e é seguido por um novo e recentemente reconhecido temor relacionado à concentração do poder digital em grandes empresas de tecnologia. 

A lista se encerra com a desigualdade digital ocupando a 7.ª posição dentre os riscos globais mais prováveis. Na classificação por impacto, sem surpreender, o risco de doenças infecciosas ocupa o topo da lista e dois novos riscos são incorporados: i) as dificuldades de manutenção dos meios de sobrevivência, ligadas, por exemplo, ao desemprego – em particular da população jovem que chega ao mercado de trabalho – e à erosão das condições de emprego; e ii) a ameaça das armas de destruição em massa, reafirmando os temores presentes no topo das listas do RRG desde 2013.

Em 2021, segue o RRG, o cenário continuará marcado pelo impacto e pela severidade da pandemia. Certamente por menor espaço de tempo naqueles países que conseguirem avançar rapidamente com a vacinação em massa. Mas a covid-19 deixará marcas profundas em função das barreiras individuais e coletivas que a maior crise sanitária de todos os tempos nos legará. Esse é o alerta que emerge na escolha das quatro áreas centrais de preocupação: desigualdades digitais, privação de direitos pelos jovens, tensões geopolíticas e o aumento das pressões sobre os negócios.

Na digitalização, a aceleração motivada pelo isolamento social ampliou as diferenças entre indivíduos e países, com impactos duradouros sobre desigualdade por meio do seu canal mais poderoso: o acesso à educação – interrompido para tantas crianças e jovens. Além disso, polarização política e incertezas regulatórias acompanham o desenrolar de um mundo mais digital e mais conectado. 

Ainda para os jovens, o desafio se ampliou com a ausência de oportunidades de trabalho se juntando às angústias que se traduzem em revolta e descontentamento. Para as mulheres, anos de avanços de representatividade foram perdidos, na esteira de pressões culturais e oportunidades mais estreitas. No campo geopolítico, o fechamento de fronteiras, a luta pela vacina e os desafios diplomáticos exacerbaram tensões preexistentes e criaram novas. Não menos importante são a pressão sobre os negócios num mundo mais incerto, mais concentrado, mais consciente e em grande transformação.

Tudo isso se traduz em novas fraturas sociais, agora ainda mais expostas. Não só entre nações, mas principalmente dentro de cada país, as diferenças sociais se exacerbaram, ampliando as fendas existentes e impondo desafios maiores para o futuro. 

A mobilidade social, já baixa em tantos países, deverá ser ainda mais reduzida com o impacto da pandemia na educação, refletido no aumento da evasão escolar, na ausência de capacitação adequada e na consequente redução na empregabilidade. A falta de infraestrutura tecnológica continuará alijando famílias do acesso à informação de qualidade, assim como a falta de infraestrutura básica negará a elas condições de vida melhores. A pressão sobre os sistemas de saúde definirá caminhos e probabilidades distintas para camadas diferentes da população, numa separação cruel que se faz na partida da sua condição social. 

No Brasil, tudo isso é pior – e continuará sendo. Afinal, não foi a pandemia que gerou nossa desigualdade social. Mas ela a ampliou, agravando essa fratura que divide o País em dois e engrossando o lado da pobreza com mais um bocado de brasileiras e brasileiros. 

*Economista e sócia da Consultoria Oliver Wyman. 


Eliane Cantanhêde: Maricas, covardes, picaretas

Bolsonaro faz escola e até desembargador e enfermeira aderem ao baile funk na pandemia

O presidente Jair Bolsonaro cai nas pesquisas pelo negacionismo diante da pandemia e do desdém pelas vacinas. A Procuradoria-Geral da República pede e o Supremo autoriza a investigação do general da ativa Eduardo Pazuello pela falta de oxigênio e as mortes em Manaus. O deputado Rodrigo Maia aproveita sua última semana na presidência da Câmara para dizer que não há dúvida de que Pazuello cometeu crime e defender a criação da CPI da Saúde.

Falta, porém, responsabilizar autoridades e cidadãos que negam a pandemia, fazem campanha contra o isolamento social e a própria vacina, que são as únicas armas para salvar vidas, conter o vírus, aliviar a pressão sobre o sistema de saúde e, assim, normalizar a economia e o próprio País. Eles também têm culpa.

São magistrados, parlamentares, empresários e irresponsáveis em geral, até da área de saúde, movidos pelo negacionismo, a ideologia irracional, a falta de respeito e empatia com os quase 220 mil brasileiros mortos. Esse mau exemplo, que começa com o presidente da República e decanta pelos seguidores da sua seita, induz jovens, idosos, homens e mulheres a relaxar os cuidados na pior hora. Tome baile funk nas periferias! E barzinho cheio dos bairros chiques!

Ao assumir ontem a presidência do Tribunal de Justiça (TJ) de Mato Grosso do Sul, o desembargador Carlos Eduardo Contar pediu “o fim da esquizofrenia e palhaçada midiática fúnebre” e propôs que “desprezemos o irresponsável, o covarde e picareta da ocasião que afirma “fiquem em casa’”. Para Bolsonaro, o cidadão que se cuida e cuida do outro na pandemia é “maricas”. Para Contar, é “irresponsável, covarde e picareta”.

O desembargador não pronunciou uma palavra sobre os escândalos do Judiciário, onde pululam “penduricalhos”, enquanto milhões de brasileiros estão sem emprego, renda, até comida. Reportagem de Patrik Camporez, do Estadão, informa que ali do lado, em Mato Grosso, os 29 magistrados do TJ receberam, em média, R$ 262,8 mil em dezembro. Contar preferiu reclamar das “restrições orçamentárias” e o “exaurimento da capacidade humana” da corporação.

Pôs-se a criticar aqueles que creem na ciência, nas entidades de saúde, nas recomendações médicas como “rebanho indo para o matadouro”. E a atacar “a histeria coletiva, a mentira global, a exploração política, o louvor ao morticínio, a inadmissível violação dos direitos e garantias individuais, o combate leviano e indiscriminado a medicamentos”. A pandemia é uma “mentira global”?! Quem ele está papagaiando?

Isso lembra a comemoração de parlamentares bolsonaristas quando o governador do Amazonas, Wilson Lima, cedeu à pressão e recuou do lockdown. Mas, depois, não escreveram uma só linha sobre o resultado macabro: falta de UTI e oxigênio, pacientes morrendo asfixiados e transportados para outros estados às pressas. Nem o sistema funerário resistiu ao caos, que está sendo exportado para o Pará e Rondônia.Se o isolamento social tivesse sido levado a sério pelo presidente e todos os governadores, o Brasil não precisaria ter afundado tão dramaticamente em mortes e contaminações. E a dúvida, agora, é quanto às vacinas. A quantidade, a logística, a seriedade e o exemplo de cima – particularmente de Bolsonaro –, vão definir a luz no fim do túnel.

Por isso, dói na alma a enfermeira Nathanna Ceschim, do Espírito Santo, divulgar vídeos sem máscara no hospital e desdenhando: “Não acredito na vacina (...). Tomei foi água”. E por que tomou? Para se cuidar, preservar seus pacientes, pais, avós e amigos e em respeito aos colegas do Brasil inteiro que se arriscam para salvar vidas? Não. “A intenção era só viajar...” Com presidente, desembargador, parlamentares e gente assim, é difícil ser otimista.


Ricardo Noblat: O plano de Bolsonaro para chegar politicamente vivo em 2022

Evitar o impeachment é a prioridade número 1

Mesmo quando meia dúzia de pesquisas de opinião, aplicadas por institutos diferentes, coincidem em apontar na mesma semana determinado resultado, o entendimento dos especialistas no assunto aconselha esperar as próximas para conferir se isso indica uma tendência ou o registro apenas de um soluço.

Os institutos Paraná, Ipesp, IDEIA, Datafolha e Atlas atestaram nos últimos cinco dias a queda de popularidade do presidente Jair Bolsonaro. A reprovação a ele saltou de 32% para 40%, segundo o Datafolha. Mas só futuras pesquisas, respeitando o mesmo intervalo de tempo, confirmarão se Bolsonaro está ladeira abaixo.

Nem por isso o governo pode esperar para ver o que acontece. Bolsonaro não teve um plano para combater a pandemia da Covid-19. Ou melhor: seu plano era deixar que o vírus contaminasse mais de 70% dos brasileiros para que a partir daí a pandemia começasse a ceder. Resultado até agora: quase 220 mil mortos.

Mas plano para manter-se no poder e – quem sabe? – reeleger-se daqui a um ano, ele tem, e começa a ser executado. Primeiro ponto do plano: emplacar nomes de sua inteira confiança nas presidências da Câmara dos Deputados e do Senado. Os nomes: Arthur Lira (PP-AL) e Rodrigo Pacheco (DEM-MG).

O mais importante dos dois é Lira. Cabe ao presidente da Câmara aceitar a abertura de processo de impeachment contra o presidente da República. Há 56 pedidos na Câmara. Se eleito, Lira não aceitará nenhum. A não ser que Bolsonaro se enfraqueça ao ponto de tornar impossível a tarefa de sustentá-lo.

O segundo ponto do plano de Bolsonaro para continuar vivo: uma reforma ministerial de grande ou de médio porte. Servirá para que ele amplie sua base de apoio no Congresso mediante a entrega de mais cargos do governo a deputados e senadores, além de livrar-se de companhias consideradas hoje incômodas.

Uma das companhias: o general Eduardo Pazuello, ministro da Saúde, despachado para Manaus no fim da última semana sem bilhete de volta. Augusto Aras, Procurador-Geral da República, obteve junto ao Supremo Tribunal Federal a abertura de inquérito para apurar se Pazuello falhou na crise de Manaus.

Com isso, Aras ajuda a desimpedir o caminho para que Bolsonaro agradeça ao general pelos inestimáveis serviços prestados ao país e o devolva à caserna. Aras deixou Bolsonaro de fora do inquérito, é claro. Uma vez que deve a nomeação a ele e que sonha com uma vaga no Supremo… Sabe como são essas coisas.

O terceiro ponto do plano de Bolsonaro: aprovar no Congresso a recriação da Contribuição Provisória sobre Movimentação Financeira (CPMF). Se com esse ou outro nome, em nova versão, não importa. O novo/velho imposto sobre todas as transações financeiras abarrotaria de grana os cofres públicos.

Bolsonaro resistiu a comprar a ideia, mas o ministro Paulo Guedes, da Economia, o convenceu. O governo precisa de dinheiro para fazer face ao fim do pagamento do auxílio emergencial. Entre os brasileiros com renda de até dois salários mínimos mensais, a reprovação ao governo passou de 26% para 41%. Alerta vermelho!


Míriam Leitão: O projeto que foi sem nunca ter sido

O presidente Bolsonaro apoiou o senador Rodrigo Pacheco (DEM-MG) para a presidência do Senado e esse foi o detonador da saída de Wilson Ferreira da Eletrobras. Pacheco é velho adversário do processo pelo qual o governo venderia o controle da estatal de energia. Numa de suas entrevistas, ele avisou que a aprovação do projeto de lei que permitirá a privatização não é prioridade. Ferreira fez os cálculos e concluiu que, se não vender este ano, não venderá em ano eleitoral e resolveu sair. É isso que se conta nos bastidores da empresa.

Oficialmente, Wilson Ferreira falou de forma mais vaga. Citou “candidatos” à presidência do Congresso. Pacheco já fez parte de frentes antiprivatização do setor elétrico.

O anúncio da renúncia de Wilson Ferreira foi visto como algo maior no mercado. “É o fim do projeto liberal”, me disse ontem cedo um economista de banco. Isso se refletiu em Nova York. A ADR da Eletrobras, que já havia caído 5% na sexta-feira, abriu em queda de 5%, aprofundou para 10% e terminou o dia com desvalorização de quase 12%.

É um espanto que ainda se acredite que Bolsonaro seguirá algum projeto liberal. Neste espaço escrevi sobre meu ceticismo antes de o governo tomar posse. Um intervencionista não privatiza. E pode ser ainda pior, no caso da Eletrobras. Na companhia se acredita que o sucessor será escolhido entre executivos que estão lá e que são de carreira, ou entre os selecionados por um head hunter que será contratado pelo conselho de administração. O problema é que o cargo pode ser colocado no balcão, onde Bolsonaro tem posto muitas mercadorias. Para evitar, por exemplo, que surja algo como o impeachment do qual se fala no país.

O projeto da Eletrobras vem do governo Temer. A empresa estava em situação dramática. Na conversa com investidores e jornalistas, Ferreira contou que entrou na companhia em julho de 2016, no início do governo Michel Temer, e o quadro era assustador: o nível de alavancagem da Eletrobras era de quase nove vezes a sua geração anual de caixa. Um patamar altíssimo e que só não levou a empresa ao colapso porque ela era controlada pela União. Depois de cinco anos de reestruturação, o endividamento caiu para 2,5 vezes e a Eletrobras terminou 2019 com um lucro de quase R$ 11 bilhões, o segundo maior de sua história. Ele admitiu que não acredita mais que a empresa seja vendida no governo Bolsonaro.

O projeto arquitetado no governo Temer era de transformar a companhia numa corporação, como as grandes empresas elétricas. A EDP, Energia de Portugal, era estatal, foi sendo vendida aos poucos e agora o governo tem apenas uma golden share. A Enel, que é dona da Eletropaulo, tem 23% na mão do governo italiano, mas o resto está em mercado. A Engie, dona de Jirau, tem ações dos governos francês e belga.

A ideia era fazer uma chamada de capital, o governo não acompanharia, e sua participação cairia de 63% para 49%. Ele perderia o controle, mas continuaria sendo o maior acionista. O caminho da preparação foi longo. Primeiro foi preciso no governo Temer vender sete distribuidoras estaduais que haviam sido federalizadas. Foi preciso preparar um projeto de lei, e depois refazê-lo no governo Bolsonaro, com alguns aperfeiçoamentos. A Eletrobras pagaria R$ 15 bilhões pela outorga ao governo, depositaria R$ 3,5 bi num fundo para revitalizar o São Francisco e ainda faria depósitos na Conta de Desenvolvimento Energético (CDE), para atenuar os reajustes da tarifa de energia.

A mudança feita pelo governo Dilma no setor elétrico provocou um aumento grande no preço da energia. Para se ter ideia, de 2013 a 2019, o IPCA subiu 37%, o preço da energia foi de 111%, três vezes mais.

Depois, eventualmente, se o governo quisesse vender mais ações poderia inclusive ganhar com a valorização da empresa. Mas o fato é que nada andou. No Congresso, o projeto de lei não teve nem relator. Por outro lado, no governo todo dia Bolsonaro dá mais um sinal de populismo econômico. Ameaçou demitir o presidente do Banco do Brasil porque ele queria fechar agências, na quinta-feira reduziu a tarifa de importação de pneus a pedido dos caminhoneiros, os preços do óleo diesel e do GLP acumulam defasagem.

Enfim, o projeto liberal no governo Bolsonaro é como a viúva Porcina. Foi, sem nunca ter sido. Mas isso estava na cara. Acreditou quem quis.


Carlos Andreazza: Plano nacional pró-pandemia

Governo trabalha para que a peste permaneça

O fenômeno reacionário que Bolsonaro encarna precisa de imprevisibilidade para prosperar. Nada melhor do que uma pandemia artificialmente prolongada. O governo trabalha para que a peste permaneça. Isto é verificável.

Por exemplo: o caso do consórcio Covax, de abril de 2020. O Brasil tinha a opção de adquirir doses para cobrir até 50% de sua gente. Optaria, contudo, pela cota mínima — 10% de alcance. A justificativa foi que montara estratégia dedicada a acordos bilaterais, com os quais teria melhores condições para preço e transferência de tecnologia. Ok.

O mundo real, entretanto, impôs-se. E chegamos a 2021 com apenas uma parceria bilateral firmada — para a vacina de Oxford. Só em 22 de janeiro as primeiras duas milhões de doses decorrentes desse contrato pousaram no país. Volume modesto fabricado na Índia, pelo qual se pagou duas vezes mais que membros da União Europeia pelo mesmo imunizante. Um acordo bilateral que — até aqui — custou caro e entregou pouco. E que não pôde ainda honrar a parte do pacto relativa à transferência de tecnologia; impossibilidade prática derivada da inexistência de insumos para o trabalho da Fiocruz.

Estamos no fim da fila de vacinação por ação deliberada do governo; por gestão do presidente. Não temos vacinas a contento hoje, nem sequer contratos que projetem no futuro a cobertura vacinal da população, porque Bolsonaro não quis.

Pazuello, cavalo do presidente, não camufla a instrumentalização da incompetência. “Em janeiro, começo de fevereiro, vai ser uma avalanche de laboratórios apresentando propostas”, declarou no último dia 21. Que tal? Este é o cultor do atraso cujo ministério receitou cloroquina até para bebês. Aquele que, já sabedor da escassez de oxigênio em Manaus, visitou a cidade apregoando feitiçaria a título de tratamento preventivo. Um militar, general da ativa, que preferiu propagandear uma modalidade de prevenção que garantiria a propagação da peste. Este é o cultor do atraso que insiste na mentira mercadológica de que o Brasil será assediado por ofertas de vacinas; algo que não ocorreu nem sequer aos EUA.

O governo opera para que o país não apenas não tenha carga de vacinas suficiente para imunizar os brasileiros, como só tenha sua cota de mixaria o mais tarde possível. A sustentação do estado de calamidade informal — a preservação da pandemia como solo competitivo — forja dificuldades que atraem as respostas populistas. A ver o auxílio emergencial. Deixou-se que acabasse, mesmo com o vírus recrudescente e o acirramento da miséria. Sob pressão que ele próprio induz, Bolsonaro fará a derrama de dinheiros, sem planejamento, sem revisão de benefícios ineficazes, sem o mais mínimo estudo para flexibilizar o teto de gastos. Em vez de um debate para reformá-lo à luz da realidade, o improviso voluntarioso que o aterrará.

O improviso voluntarioso — semeador de demoras e gerador de urgências e oportunidades — com vista a 2022. A propósito, o caso da importação da vacina de Oxford desde a Índia merece reconstituição. Em novembro de 2020, em reunião com o chanceler indiano, Ernesto Araújo, mesmo tendo o combate à doença na agenda, e ciente de que falava com um país grande produtor de imunizantes, não tocou no assunto. Preferiu criticar o governador de São Paulo, por considerar eleitoreira a atividade daquele sem cujo empenho ainda não haveria brasileiro vacinado.

Em 13 de janeiro último, porém, o governo anunciou o envio de um avião à Índia para buscar as doses. A meta era fazer Bolsonaro vacinar antes de João Doria. Não daria certo. (Como certo não dará um programa de imunização que dependa de só dois fabricantes; tudo o que ora temos: AstraZeneca/Fiocruz e Sinovac/Butantan, incapazes de oferecer o que se demanda.) Armou-se um avião publicitário pronto a decolar para recolher um imunizante indisponível. O Brasil passaria vergonha ministrada pela Índia, então com outras prioridades. (No mundo real, antes viriam as necessidades do vizinho Butão.) E diga-se que fora o próprio governo a divulgar a fantasia de que teríamos a primazia. As doses só chegaram quase dez dias depois.

O episódio com a Pfizer não deixa dúvida sobre a existência de um plano nacional de sustentação da pandemia. Data de setembro de 2020, a carta do CEO do laboratório a Bolsonaro. A missiva, nunca respondida, pedia ao presidente que fechasse logo um acordo com a farmacêutica, conforme já haviam feito EUA, União Europeia, Reino Unido, Canadá e Japão. A demanda seria grande — e poderíamos ficar para trás. Ficamos. Escolha do Brasil. O governo criou empecilhos e tentou desacreditar a vacina. E todas as suas manifestações posteriores sobre por que assim procedera, inclusive em nota oficial, configuram provas em que se confessa um crime.

Bolsonaro não é somente um mentiroso; o maior influenciador antivacinação do mundo. É o líder de um governo que optou por não enfrentar o coronavírus. É o responsável — agente direto — pelo atraso do Brasil em vacinar a população; e nisto vai colecionando delitos. Crimes comuns; não somente os de responsabilidade. Bolsonaro tem lugar no Código Penal. Ocorre que, de novo, o mundo real se impõe — e nem sempre para prejudicá-lo. Afinal, tem também Augusto Aras e — cada vez mais forte para presidir a Câmara — Arthur Lira.

Será difícil, sobretudo para os pobres.


Luiz Werneck Vianna: As velas pandas de Ulisses Guimarães

A posse de Joe Biden na presidência dos EUA, a rigor uma solenidade cívico-religiosa concebida para reanimar as crenças nos temas e ideais fundadores da sua sociedade, ao menos por ora afasta em todos os quadrantes os riscos para a segurança comum representados pelo que foi o governo Trump em sua versão degradada do nacional-populismo. De fato, há o que comemorar, embora não se possa desconsiderar que Trump, mesmo que amplamente derrotado nas urnas, obteve mais de 70 milhões de votos e uma legião de fanáticos seguidores, uma parte deles organizados em milícias, vistas a olho nu na tentativa insurrecional de 6 de janeiro de barrar a certificação eleitoral da vitória de Biden. E, para eles, deixou suas últimas palavras de que por algum modo, voltaria.

O augúrio fúnebre tem como ser evitado, as forças democráticas foram testadas em sua vitoriosa campanha eleitoral em que deram provas de sabedoria política, agora confirmada pela decisão de apresentar o impeachment ao senado, e sobretudo pelas medidas de impacto já efetivadas nas frentes sanitária e econômica com que se espera diluir a influência do trumpismo. O processo do impeachment, como se sabe, pode culminar com a interdição definitiva de Trump da vida política. Caso bem-sucedidas, tais intervenções benfazejas põem por terra o projeto de arregimentar em novo partido com os salvados do trumpismo, o Patriota, de óbvia má índole fascista.

Nada disso é estranho à nossa sorte. Uma das marcas do trumpismo esteve na sua tentativa de criar uma internacional reacionária, missão confiada ao ex-estrategista do governo Trump, Steve Bannon, perdoado do crime de fraude num dos seus últimos atos, que conta entre seus aderentes personagens do governo Bolsonaro e da sua família. Tal como a  Hidra de Lerna, o trumpismo tem várias cabeças e somente pode ser exterminada com a amputação delas cauterizadas as suas feridas, sem o que renascem como na mitologia. O governo Bolsonaro é um sobrevivente da debacle do trumpismo nesta nossa América Latina que reinicia seu encontro com sua história de luta por liberdades. Barrar seu caminho importa, além de outros motivos relevantes impedir que nosso país se torne um reduto da central reacionária do trumpismo nesse sub-continente.

Na hora da partida para essa navegação difícil que temos que começar mesmo que ainda incertos os resultados pela miséria da nossa política, ouvem-se as lamúrias do Velho do Restelo para que recolhamos as velas e nos conformemos ao que aí está, por que tudo pode piorar.  Mas como as velas já se enfumam, como as queria Ulisses Guimarães, e de toda parte se ouvem os brados de basta, fora já? Bem mais arriscado do que o da hora presente foi o cenário do movimento das anti-candidaturas de Ulisses e Nelson Carneiro, apenas uma manifestação de força moral, com que se abriu, mais tarde, a via para o movimento em favor das diretas já que desaguou na derrota do regime militar em 1985.

Desde Maquiavel, que estudou as grandes batalhas da Antiguidade em Arte da Guerra, ecoam as lições de que os resultados das batalhas não se podem prever de antemão, eles se decidem no fragor da luta. No nosso caso, o teatro de operações que se tem pela frente, bem distante de desfavorável, apresenta-se como propício, quer pela conjuntura internacional, quer pela catástrofe sanitária a que estamos expostos pelo governo Bolsonaro. A rota do impeachment recém-descoberta como recurso de legitima defesa da sociedade ganha o caminho das ruas com as carreatas que proliferam e o adensamento da opinião pública em seu favor. Diante da miséria política do país, entretanto, nada garante a ela um final feliz.

As longas marchas começam com um pequeno passo. Logo ali, na próxima esquina, nos espera a próxima sucessão presidencial. A envergadura da frente política que ora se ensaia, com o movimento em favor do impeachment consiste no primeiro e decisivo teste que ela enfrentará naquele momento de importância capital. Quanto mais ela se ampliar politicamente, e mais se enraizar capilarmente na vida social em ações de protesto e de recusa a um governo maligno nas lutas imediatas atuais, maiores serão suas possibilidades de dar um fim – se não conseguir antes por outros meios –  ao pesadelo atual. É verdade que nos faltam Ulisses Guimarães e Tancredo Neves, mas contamos com suas histórias exemplares que bem poderiam emular o que nos sobrou.

Mas, entre tantas faltas a lastimar, não se pode deixar de contar com as novas presenças que nos vêm da vida do associativismo popular, dos profissionais e intelectuais das atividades da saúde, da nova safra de artistas populares e dos que se dedicam com brilho ao colunismo na imprensa e aos comentaristas políticos na TV e no rádio. Nesse rol igualmente devem ser mencionados os parlamentares e os partidos políticos que com sua resistência ao autoritarismo honram seus mandatos, sobretudo os ministros do STF que preservam a integridade da nossa Constituição. São eles que abastecem de oxigênio uma sociedade exangue por falta de ar.

Aos poucos se desvanecem as ameaças que nos prometiam a destruição da obra da nossa civilização, ainda incompleta e precária como se sabe, mas que aos trancos e barrancos teimávamos edificar. A resistência a este novo autoritarismo em nosso país, em meio a uma cruel pandemia, mostrou, mais uma vez, ser eficaz. Tudo somado nesses tempos sombrios, pode-se constatar que, dos salvados do incêndio com que pretendiam nos destruir, salvou-se a nossa alma da sanha de Bolsonaro, Paulo Guedes, Ernesto Araújo et caterva. Não é pouco para quem vivia como nós sob a ameaça de extinção dos nossos valores e das nossas melhores tradições.

*Luiz Werneck Vianna, sociólogo, PUC-Rio  


Monica de Bolle: Virologia Econômica - Os riscos que as mutações do coronavírus oferecem à economia

Não há economia sem saúde. O choque econômico proveniente de uma variante mais transmissível e traiçoeira do SARS-CoV-2 seria catastrófico para o Brasil

Que a saúde e a economia não são separáveis já deveria estar claro para todos depois de quase um ano de pandemia. Mas o que a virologia tem a ver com isso? O que essa área tão complexa e repleta de minúcias sobre redes de sinalização moleculares, receptores e proteínas, mutações e vigilância genômica tem a ver com a economia? Por que, mais do que nunca, é preciso entender essas relações com urgência?

Ao longo de 2020 fomos testemunhas do estrago causado por uma fita de RNA. A atividade econômica mundo afora entrou em colapso com os cordões sanitários da primeira onda pandêmica. Com seu colapso, a taxa de desemprego disparou, centenas de milhões de pessoas perderam fontes de renda. No Brasil, o PIB registrou queda de mais de 10% no segundo trimestre e as marcas da desigualdade e da pobreza, que sempre caracterizaram o país, ficaram ainda mais visíveis. Na época, grupos da sociedade se mobilizaram junto ao Congresso para erguer o auxílio emergencial, a única política pública que o Brasil desenhou para dar apoio direcionado à economia durante a primeira onda pandêmica. A medida foi possível após a emissão de Decreto de Calamidade, que permitiu a suspensão do teto de gastos durante sua vigência. O decreto expirou em 31 de dezembro de 2020, e com ele se foi o auxílio emergencial. O momento não poderia ter sido mais infeliz, uma vez que, ao longo de novembro e dezembro do ano passado, já se constatava a chegada de uma nova onda da covid-19.

Houve outro fato marcante nos últimos meses de 2020. O vírus, que até então acumulava cerca de duas mutações relevantes por mês, começou a mutar mais. Mutações são variação genéticas aleatórias que ocorrem quando o vírus se replica. Mutações relevantes são aquelas que podem conferir ao vírus certas vantagens, como maior transmissibilidade, ou mesmo capacidade de evadir nosso sistema imune com mais facilidade. Evasão imune é sempre uma preocupação, pois não só eleva os riscos de reinfecção como faz com que o vírus assuma características mais adaptadas aos novos hospedeiros: no caso, todos nós. Em novembro começaram a sair as primeiras notícias de que uma variante nova do SARS-CoV-2, o vírus causador da covid-19, estava circulando no Reino Unido. Logo em seguida, soubemos que outra nova variante havia sido identificada na África do Sul. Por fim, há poucas semanas, veio à tona a crise humanitária em Manaus, associada a uma terceira nova variante. Variantes são versões do SARS-CoV-2 que descendem de um ancestral, mas que dele são distintas o suficiente para chamar a atenção da comunidade científica. As três novas variantes, a do Reino Unido, a da África do Sul e a de Manaus, não compartilham o mesmo ancestral e pertencem a linhagens diferentes. Mas o que realmente assusta nessas três variantes é que, ao contrário dos padrões que vinham sendo observados, elas acumularam não duas, mas mais de uma dezena de mutações relevantes, sendo algumas semelhantes, outras distintas.

A variante identificada em Manaus contém uma mutação que torna o vírus mais transmissível. Essa mesma mutação também foi sequenciada na variante do Reino Unido. Além dessa, a variante de Manaus ainda apresenta uma mutação contida na variante da África do Sul e que pode estar relacionada à evasão imune. Portanto, há razões para crer que a variante de Manaus pode ser mais perigosa do que a do Reino Unido e a da África do Sul. Contudo, essa possibilidade, a ser investigada, tem sido tratada de forma circunscrita aos meios científicos e não tem merecido a mesma atenção pública que teve a variante do Reino Unido antes mesmo que se tivesse certeza da sua maior transmissibilidade. Não a contemplar é um perigo por diversas razões.

Se a variante de Manaus for não somente mais transmissível, como também mais capaz de evadir o sistema imune, a população suscetível inclui não apenas aqueles que não tiveram covid-19, mas, potencialmente, todos aqueles que já pegaram a doença. Ou seja, existe a possibilidade de que toda a população seja novamente vulnerável ao vírus, como era no início de 2020. São importantes as implicações econômicas dessa hipótese, pois não só teríamos de adotar novas medidas sanitárias extremamente restritivas, como teríamos de fazê-lo em momento de grande fragilidade econômica. A taxa de desemprego no Brasil permanece muito elevada, sobretudo quando se consideram as dezenas de milhões de pessoas que desistiram de procurar trabalho porque não acreditam mais na possibilidade de encontrá-lo. Aqueles que puderam sobreviver graças ao auxílio emergencial já não podem contar com o benefício. Como não temos mais decreto de calamidade, o teto de gastos voltou a vigorar, estrangulando o Orçamento da Saúde. Os recursos disponíveis para o SUS em 2021 são inferiores aos valores de 2020 em cerca de 35 bilhões de reais.

Por tudo isso, o choque econômico proveniente de uma variante mais transmissível e traiçoeira do SARS-CoV-2 seria catastrófico para o país. Além de mais um ano de fortíssima recessão, sofreríamos todas as suas consequências nefastas, agora magnificadas: o aumento da pobreza extrema, da fome, da desigualdade.

Mas e as vacinas? Por ora, não há evidências de que essas novas variantes, inclua-se na lista a de Manaus, afetam a proteção conferida pelos imunizantes recém-aprovados para uso emergencial pela Anvisa. No entanto, nesse instante a constatação traz pouco alento, já que sequer começamos a campanha ampla de vacinação. A razão principal é que o Governo teve dificuldades para adquirir tanto as doses da vacina da AstraZeneca/Oxford que recebera da Índia quanto os insumos importados da China para a fabricação de mais doses da CoronaVac pelo Instituto Butantan. Nesse ínterim, corremos o risco de que surjam ainda outras variantes, pois, com a pandemia fora de controle no Brasil, abundam oportunidades de mutações mais adaptadas. Para frear o vírus precisaríamos pensar em medidas para interromper as cadeias de transmissão. Não o estamos fazendo, e, mesmo que estivéssemos, precisaríamos que as eventuais medidas viessem acompanhadas de outras destinadas a proteger a capacidade de subsistência das pessoas e a economia.

Não há economia sem saúde. Também não há entendimento possível do o cenário econômico sem prestar atenção no que a virologia pode nos ensinar.

Monica de Bolle é economista, PhD pela London School of Economics e especializada em medicina pela Harvard Medical School. É professora da Universidade Johns Hopkins e Pesquisadora-Sênior do Peterson Institute for International Economics.


Bruno Carazza: Cheiro de reforma no ar

Não importa quem vença, Bolsonaro terá que mudar

Arthur Lira (PP) ou Baleia Rossi (MDB)? Simone Tebet (MDB) ou Rodrigo Pacheco (DEM)? A disputa para o comando da Câmara e do Senado entra na semana decisiva, e o envolvimento direto do presidente da República nas negociações comprova que tudo voltou ao normal na política brasileira.

A Lava-Jato abalou as estruturas do sistema partidário, e a eleição de Bolsonaro foi anunciada como o fim da “velha política”. Apenas dois anos depois, o presidencialismo de coalizão, explicado lá atrás, em 1988, por Sérgio Abranches, dita mais uma vez o ritmo de funcionamento da nossa instável democracia.

A partir da próxima segunda-feira a (01/02) o destino do país estará nas mãos de filhos de políticos tradicionais - Benedito de Lira, Wagner Rossi e Ramez Tebet. Pacheco, por sua vez, vem de uma família de proprietários de empresas de ônibus, um setor tradicionalmente dependente e credor de poderosos. Brasília girou, girou, e parou no mesmo lugar.

Também não é estranho que os quatro principais candidatos à presidência das Casas Legislativas venham de partidos herdeiros dos dois grandes blocos conservadores sob os quais se estruturou nosso sistema político desde a ditadura militar. Enquanto PP e DEM são filhos legítimos da Arena, o MDB de hoje, apesar de ter se despido do “P”, nunca deixou de ser o que restou de mais retrógrado da legenda original de Ulysses Guimarães e Tancredo Neves.

Como um pêndulo, todos os presidentes brasileiros desde a redemocratização tiveram que recorrer aos filhotes da velha Arena ou do velho PMDB para se equilibrar no poder - embora nem todos tenham conseguido completar a travessia sem cair.

Sarney convocou, em diferentes momentos, caciques como Jorge Bornhausen, Hugo Napoleão e Prisco Viana (egressos da Arena) e Iris Rezende (PMDB) para tentar dar base de sustentação ao Plano Cruzado (1986), influenciar a nova Constituinte para obter um quinto ano de mandato (1987/1988) ou abafar uma CPI e um pedido de impeachment (1989).

Quando as denúncias de corrupção começaram a pipocar, no início de 1992, Collor, que se elegeu prometendo que “um novo tempo iria começar”, trouxe para seu governo raposas como Célio Borja, Affonso Camargo e Reinhold Stephanes. Tudo em vão.

Fernando Henrique se elegeu anunciando uma “aliança programática” do PSDB com o PFL (atual DEM). Porém, à medida em que as reformas emperravam, ou a sua popularidade afundava com as denúncias de compra de votos para a reeleição e as crises do Real, teve que ir fazendo concessões e abrigar em seu ministério figuras como Renan Calheiros (Ministro da Justiça), Eliseu Padilha (Transportes) e Ney Suassuna (Integração Nacional).

Lula e o PT também chegaram ao Planalto garantindo renovação, mas já ao fim do primeiro ano tiveram que aceitar Eunício Oliveira e Alfredo Nascimento. Veio o mensalão e embarcaram Saraiva Felipe, Hélio Costa, Márcio Fortes e Silas Rondeau e companhia limitada. No segundo mandato ainda se juntaram Carlos Lupi, Geddel Vieira Lima e Wagner Rossi - tudo em nome da governabilidade.

Dilma já iniciou seu mandato com um amplo ministério que mesclava petistas-raiz com uma ampla base onde cabiam Edison Lobão, Garibaldi Alves, Fernando Bezerra, Mário Negromonte, Carlos Lupi e Alfredo Nascimento. Quando sua popularidade despencou, teve que nomear Marcelo Crivella, Gilberto Kassab, Helder Barbalho, Armando Monteiro e Henrique Eduardo Alves. Nada disso impediu sua queda no início de 2016.

A história brasileira demonstra que crises econômicas, aprovação popular em baixa e dificuldades de sustentação no Congresso sempre forçam o presidente da República a ceder à “velha política” - representada tanto pelo Centrão quanto pelo “pemedebismo”, como diria Marcos Nobre, atual presidente do Cebrap e que por muito tempo ocupou este espaço.

Desde a posse, Bolsonaro mexeu pouco no seu time, na maioria das vezes motivado por intrigas internas (Bebianno, Santos Cruz, Abraham Weintraub e Marcelo Álvaro Antônio) ou desentendimentos com o ex-capitão (Mandetta e Moro). À exceção da nomeação de Fábio Faria, até hoje o presidente resistiu a abrir as portas de seu primeiro escalão para construir alianças partidárias.

Com índices de rejeição em alta e os colapsos na saúde e na economia, Bolsonaro certamente terá que engolir em seco e fazer como todos os seus antecessores para dissipar a tempestade perfeita que se forma no horizonte.

Olhando o ministério atual, há postos cativos de militares, evangélicos, olavistas, agronegócio e da predileção pessoal do presidente - além de Paulo Guedes, que anda bastante sumido ultimamente. Numa eventual reforma ministerial, pastas com grande orçamento em tempos de pandemia e de uma eventual terceira onda do auxílio-emergencial serão bastante cobiçadas pelo Centrão: Saúde, Educação e Cidadania.

Independentemente de quem vença as eleições para as presidências da Câmara e do Senado, Bolsonaro certamente sairá perdendo.

*Bruno Carazza é mestre em economia, doutor em direito e autor de “Dinheiro, Eleições e Poder: as engrenagens do sistema político brasileiro”


Sergio Lamucci: A volta do auxílio emergencial

Retorno faz sentido, com piora da pandemia e vacinação incerta

A volta do auxílio emergencial se torna cada vez mais provável, devido ao recrudescimento da pandemia e ao ritmo lento e incerto da vacinação contra a covid-19. A economia brasileira vai sofrer o golpe dessa combinação, devendo encolher no primeiro trimestre. O aumento do número de casos e mortes começa a levar a medidas mais fortes de restrições à mobilidade, como as anunciadas pelo governo de São Paulo na sexta-feira. As perspectivas para o mercado de trabalho, que já não eram das melhores, tendem a piorar, afetando o consumo das famílias. O quadro também é negativo para o investimento, dadas as incertezas sobre a vacinação e a possibilidade de que outros Estados e municípios adotem novas medidas de isolamento social, ainda que menos rigorosas do que as implementadas em março e abril do ano passado.

Com isso, as perspectivas para o crescimento em 2021 começaram a se deteriorar, e números na casa de 2% a 3% já aparecem em algumas estimativas de bancos e consultorias, apesar da elevada herança estatística que 2020 deixará para este ano. Nesse ambiente, cresce a pressão pela renovação do auxílio, uma medida que faz sentido, num ambiente de desemprego altíssimo. A volta do benefício, porém, precisa ser muito bem comunicada e acompanhada por medidas que indiquem o compromisso com a sustentabilidade fiscal, com reformas que enfrentem o aumento das despesas obrigatórias, como os gastos com pessoal.

O Ministério da Economia resiste ao retorno do auxílio, encerrado em dezembro. O risco é ser atropelado pelo Congresso e ver aprovado um benefício de valor mais alto, por um prazo longo e para um público mais amplo do que o recomendável num momento em que a dívida bruta é de quase 90% do PIB, enquanto a média dos emergentes é um pouco menor que 63% do PIB.

Na declaração da equipe do Fundo Monetário Internacional (FMI) ao fim da missão que fez o raio-X da economia brasileira no ano passado, divulgada em outubro, ficou evidente o dilema para a política fiscal do país. O Fundo elogiou o compromisso do governo com o teto de gastos e ressaltou a importância do mecanismo. Ao mesmo tempo, afirmou que, se “a evolução das condições sanitárias, econômicas e sociais” fosse “pior do que o esperado pelas autoridades”, elas deveriam “estar preparadas a prestar mais apoio fiscal”.

O FMI sugeriu a realocação de recursos dentro do teto, para fortalecer a rede de proteção social de modo permanente. Essa teria sido a melhor solução, unificando programas sociais como o Bolsa Família, o abono salarial, o salário família e o seguro-defeso, conforme a proposta dos economistas Fernando Veloso, Marcos Mendes e Vinicius Botelho. Isso exigiria, porém, a disposição para tomar medidas corajosas e politicamente difíceis, algo que não faz parte do repertório do presidente Jair Bolsonaro.

O problema é que a pandemia não acabou com o ano-calendário, como tem dito o diretor-executivo da Instituição Fiscal Independente (IFI), Felipe Salto. Há uma segunda onda em curso, provavelmente mais grave que a primeira, o que também se observa em diversos outros países, com impactos sobre o ritmo de crescimento global no primeiro semestre. O dramático no Brasil é a atitude de Bolsonaro, que não reconhece a gravidade da doença, questiona a eficácia das vacinas e não planeja a imunização.

Com o recrudescimento da epidemia e as incertezas sobre a vacinação, retirar os estímulos fiscais abruptamente tende a levar a uma desaceleração expressiva da economia. Sem o auxílio, haverá uma queda de renda significativa dos grupos mais vulneráveis. Isso justifica mais apoio fiscal, como recomendado pelo próprio FMI, insuspeito de leniência fiscal. Além da volta do auxílio, podem ser necessários mais recursos para a saúde e para a compra de vacinas.

A questão é como fazer isso num país que tem de fato uma situação fiscal delicada. O comportamento do câmbio e das taxas de juros de longo prazo reflete a incerteza sobre a trajetória das contas públicas. A renovação do auxílio e eventuais novos gastos com saúde precisam ser comunicados com cuidado, ou o impacto sobre as condições financeiras vai dificultar ainda mais a retomada da atividade. Além disso, um câmbio muito desvalorizado colocará mais pressão sobre os preços, podendo exigir do Banco Central (BC) elevações mais fortes dos juros.

A situação exige uma sintonia fina. É preciso cautela ao retirar os estímulos fiscais, sem que isso seja visto como o fim do compromisso com o ajuste das contas públicas. Uma opção é usar a abertura de créditos extraordinários para financiar despesas como o auxílio. Salto observa que se trata de um instituto previsto na Constituição e que pode ser utilizado mesmo sem a presença do decreto do estado de calamidade pública, “como acontece em maior ou menor grau todo ano”. Segundo ele, o crédito extraordinário, desse modo, pode resolver a questão do teto, que limita o crescimento das despesas da União à inflação.

“O problema é que o déficit público previsto já é alto”, diz Salto. “Para o déficit, são necessárias outras medidas, ou pelo menos contas mostrando como ele seria afetado e como o país voltará, e em que prazo, à estabilidade da relação dívida/PIB.” Com isso, o crédito extraordinário poderia ser um caminho para a volta do auxílio, desde que acompanhado por outras medidas mostrando a sustentabilidade da dívida, como reformas que apontem para redução de gastos obrigatórios, caso das despesas com pessoal, avalia Salto, ressaltando que essa é uma das opções na mesa. “A falta de planejamento é um pecado mortal quando se está numa crise como esta. Em tempos normais, passa como um pecado venial, mas, no quadro atual, tudo muda de figura.”

O orçamento deste ano, ainda não aprovado, não tem espaço para mais gastos. O risco de paralisação dos serviços públicos já é elevado mesmo sem novas despesas, diz Salto. Para acomodar novos gastos, uma outra saída terá que ser adotada, além do corte de despesas discricionárias, como o custeio da máquina e os investimentos.

Os candidatos à presidência da Câmara e do Senado têm se mostrado a favor da volta do auxílio, em maior ou menor grau, indicando que ele deverá ser renovado. O benefício terá que ser menor que os R$ 600 que vigoraram de abril a agosto - de setembro a dezembro, o valor foi de R$ 300 -, e voltado a um grupo mais restrito. Em alguns meses, ele chegou a quase 68 milhões de pessoas. O prazo também não poderá ser dos mais longos.

Para que seja viável um auxílio por um período menor, porém, é fundamental que a vacinação deslanche. Sem isso, a economia não voltará à normalidade.


Catarina Rochamonte: Direita sem Bolsonaro

Liberais e conservadores precisam avançar pelo caminho da racionalidade que exige o respeito às instituições

O campo liberal-conservador engajou-se outrora na campanha pelo impeachment de uma presidente de esquerda. Agora, não faltam razões para se posicionar contra um presidente de direita que fez retroceder as pautas anticorrupção e que —em momento de clamor nacional devido à pandemia— após ter demitido dois ministros da Saúde que não se curvaram às suas idiossincrasias, ocupa-se em questionar a eficácia das vacinas, atrasar sua compra, reforçar narrativas conspiratórias que põem em xeque as instituições, alimentar a histeria nas redes sociais e bajular com oferta de cargos a ala fisiológica e podre da política (o tal do establishment que prometeu combater).

Ainda pior que Bolsonaro é o bolsonarismo, ideologia que, à semelhança do lulismo, mantém-se com base no culto à personalidade do líder. Esse fanatismo bizarro —que foi a estranha resposta dos brasileiros à hipocrisia da esquerda, aos excessos do progressismo e à avassaladora corrupção da era petista— tem se expressado pela incivilidade, boçalidade, selvageria e intolerância.

Os liberais e os conservadores precisam se afastar dessa ideologia malsã e avançar pelo caminho da racionalidade que exige o respeito às instituições e a preservação da saúde coletiva, ameaçada pela incúria presidencial. Caso contrário, a centro-direita deixará a esquerda oportunista confortável na prática da sua política nebulosa, que levanta a bandeira do impeachment ao mesmo tempo em que PT e PDT fazem o jogo de Bolsonaro, apoiando seu candidato a presidente do Senado.

Felizmente cresce o engajamento nesse sentido, como se pode notar pelo abaixo-assinado lançado por João Amoêdo, Vem pra Rua e MBL e pela carreata realizada domingo (24), em prol do impeachment. É lamentável, porém, que nomes respeitáveis, fortes e promissores do espectro político mais à direita permaneçam reticentes. A direita liberal humanista não pode restar ao lado de Bolsonaro com os sectários de sempre e os cúmplices de ocasião.


Celso Rocha de Barros: A vacina deu a medida de Bolsonaro

Governo é o único do mundo que viu no início da vacinação como uma crise

O início da vacinação no mundo deu ao público brasileiro algo que ele ainda não tinha: uma medida precisa de como a atuação de Jair Bolsonaro no combate à pandemia de Covid-19 foi pior do que a dos outros governantes.

Por maiores que fossem os números de mortos brasileiros, não era fácil para boa parte do público compará-los com os de outros países, quanto mais relacioná-los às políticas de combate à pandemia adotadas em cada um deles. O desastre nos Estados Unidos, de longe o país estrangeiro sobre o qual os brasileiros têm mais informação, permitia aos bolsonaristas mentir que a tragédia brasileira era inevitável. Quantos brasileiros sabem que a bem governada Nova Zelândia voltou à vida normal antes da vacina por ter feito o exato contrário do que fez Bolsonaro?

A vacina mudou tudo isso. É muito fácil saber que países vacinaram e que países não vacinaram. As imagens das pessoas sendo vacinadas nos fazem, imediatamente, voltar a imaginar uma vida sem o vírus, e, nesse momento, intuitivamente, se entende o que os especialistas dizem desde o começo, contra Bolsonaro, contra Paulo Guedes, contra a burguesia da morte que apoia o governo: a vida normal só voltará com a vacina, só voltará quando o vírus tiver sido derrotado.

E o fato de haver vacinas disponíveis ao redor do mundo nos faz perguntar: por que não há vacinas no Brasil? Por que a Índia, um país muito mais pobre do que nós, não só tem vacina como produz e vende vacinas? Por que vizinhos nossos como a Argentina já estão vacinando há várias semanas? O fato de o governador de São Paulo ter conseguido comprar vacinas prova irrefutavelmente que o governo federal poderia ter comprado vacinas.

Bolsonaro não comprou vacinas. Bolsonaro fez campanha contra as vacinas. Bolsonaro torceu contra a “vacina chinesa” e negou uma oferta da Pfizer que já nos teria garantido dois milhões de doses para agora. Para puxar o saco de Trump, Bolsonaro fez com que o Brasil fosse o único país em desenvolvimento que se opôs à Índia em uma discussão sobre patentes de, acredite se quiser, vacinas; agora temos que mendigar vacinas na Índia, e estamos no fim da fila. Os bolsonaristas fazem campanha diária contra a China, um parceiro comercial com quem não temos qualquer disputa estratégica; agora precisamos mendigar vacinas e ingredientes para fazer vacinas na China, e estamos no fim da fila.

O governo brasileiro é o único do mundo que viu o início da vacinação como uma crise, e respondeu como sempre responde a crises: com ameaça de golpe de Estado e aparelhamento. O procurador-geral Augusto Aras lançou a ameaça de estado de defesa. Ao mesmo tempo, segundo reportagem do Correio Braziliense, Bolsonaro planeja retaliações contra Doria. Por vacinar gente.

Enquanto isso, os ventos da economia internacional começam a soprar a favor do crescimento. Quem vai aproveitar melhor essa maré favorável será quem puder botar gente vacinada na rua para trabalhar e consumir. Se qualquer outro idiota tivesse vencido a eleição de 2018, seríamos nós. Entretanto, no que depender de Bolsonaro, passaremos a próxima alta das commodities doentes em casa, ou nos matando uns aos outros na sucessão de crises políticas cada vez piores que o presidente contrata diariamente.