terceira via
Nas entrelinhas: Segundo turno entre Lula e Bolsonaro não é nova eleição
Luiz Carlos Azedo | Nas entrelinhas | Correio Braziliense
É um lugar comum nas campanhas eleitorais, principalmente de parte de quem está perdendo, a tese de que o segundo turno é uma nova eleição. Há controvérsias. As forças em movimento são as mesmas, porém, os dois primeiros colocados operam forte atração sobre as demais, por expectativa de poder, motivação ideológica e/ou emocional. Isso provoca o realinhamento eleitoral, cuja resultante será a formação de uma maioria de votos válidos, que garante a consagração inequívoca do presidente eleito.
A eventual mudança de posição entre os dois candidatos é resultado da inércia da primeira votação e da eventualidade de o líder não se dar conta de que a sua estratégia está sendo superada pelo segundo colocado. Estamos falando do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) e do presidente Jair Bolsonaro (PL), obviamente. O que ocorreu na reta final do primeiro turno, por isso, gera uma força de inércia que pode resultar numa troca de posições.
Na última semana da eleição, Lula perdeu posições e Bolsonaro avançou. Mais do que frustrar a expectativa petista de vitória no primeiro turno, o resultado da votação de domingo embalou a campanha de Bolsonaro e gerou perplexidade na campanha de Lula, ainda que ninguém queira passar recibo do que aconteceu. Com 96,93% das urnas apuradas, Bolsonaro recebeu 43,70% dos votos válidos, enquanto o Lula teve 47,85% dos sufrágios. Os candidatos Simone Tebet (MDB) e Ciro Gomes (PDT) obtiveram, respectivamente, 4,22% e 3,06% dos votos válidos.
Um bom exemplo dessa expectativa é a fotografia da manifestação petista na Avenida Paulista, no dia da eleição, com Lula ao lado da esposa Janja; da ex-presidente Dilma Rousseff; da presidente do PT, Gleisi Hoffman; do ex-senador Aloizio Mercadante e do seu vice, Geraldo Alckmin, quase um estranho no ninho. Era uma espécie de “Lula é meu e ninguém tasca”, armado na expectativa de que a eleição estava decidida. Entretanto, o resultado do primeiro turno exigia que o palanque fosse muito mais amplo.
Lembrei-me de certa passagem do romance Vida e Destino (Alfaguara), do escritor judeu ucraniano Vassili Grosman, que foi correspondente de guerra na Batalha de Stalingrado, na Segunda Guerra Mundial. A publicação do livro esteve proibida durante muito tempo e seu autor chegou a ser preso por causa dele. Grossman relata a experiência de guerra, os absurdos de seus efeitos sobre a vida das pessoas, com toda a inversão de valores que acarretou. Realista, mostra os bastidores da batalha no partidos e na antiga sociedade soviética. É uma descrição impressionante de como a resistência ao invasor alemão se transformou numa guerra patriótica, na qual o protagonismo popular foi decisivo na frente de batalha. Mas também desnuda o comportamento do aparelho partidário, que se recolhe à retaguarda e, no momento de virada da guerra, opera para colher os louros da vitória.
O palanque de Lula no domingo refletiu uma falsa expectativa, na qual não se levou em conta que a onda do voto útil havia se esgotado e fora protagonizada por formadores de opinião que já estavam no campo da esquerda. O alarido e a agressividade da campanha, porém, provocaram o voto útil reverso dos eleitores anti-petistas, que não desejavam votar em Bolsonaro, mas o preferem em relação a Lula.
É aí que mora o perigo de virada eleitoral logo no começo do segundo turno, porque a inércia desse movimento silencioso pode não ter se esgotado no dia da votação.
Alianças
O PT se movimenta em direção ao centro com dificuldades. Lula recebeu o apoio do PDT, com a aquiescência de Ciro Gomes, e do Cidadania, liderado por Roberto Freire, ambos duros desafetos, que ontem anunciaram formalmente o apoio a Lula no segundo turno. Esses apoios decorrem de um claro posicionamento contra Bolsonaro e não de uma negociação de ambos com o petista.
Lula espera obter o apoio de Simone Tebet, a candidata do MDB, com quem deve se encontrar para tratar dos termos do apoio. No dia da eleição, a senadora anunciou que não iria se omitir e aguardava um posicionamento firme do partido.
O deputado Baleia Rossi (SP), o presidente da legenda, que bancou sua candidatura, porém, deve anunciar a neutralidade do MDB. Houve uma forte mudança na composição da bancada, que passou a contar com maior participação de parlamentares bolsonaristas eleitos no Sul, Sudeste e Centro-Oeste, em contraponto aos representantes do Norte e Nordeste, aliados de primeira hora de Lula.
O governador do Rio de Janeiro, Cláudio Castro (PL), no domingo anunciou seu apoio a Bolsonaro, que ontem recebeu a adesão do governador de Minas, Romeu Zema (Novo), que o visitou no Alvorada. Ele ficou neutro no primeiro turno, apesar de Lula apoiar o ex-prefeito de Belo Horizonte Alexandre Kalil (PSD).
O governador do Rio de Janeiro, Cláudio Castro (PL), no domingo anunciou seu apoio a Bolsonaro, que ontem recebeu a adesão do governador de Minas, Romeu Zema (Novo), que o visitou no Alvorada. Ele ficou neutro no primeiro turno, apesar de Lula apoiar o ex-prefeito de Belo Horizonte Alexandre Kalil (PSD).
O governador de São Paulo, Rodrigo Garcia, que ficou fora do segundo turno, fechou o cerco ao anunciar, ontem, o apoio a Bolsonaro. O PSDB paulista apoiará Tarcísio de Freitas (Republicanos), candidato do presidente em São Paulo, mesmo tendo ele declarado que não deseja o apoio de Garcia. A. bancada do Cidadania, liderada pelo deputado paulista Alex Manente, que apoiará Tarcísio, anunciou neutralidade, contrariando a Executiva do partido.
Lula precisa dar guinada ao centro se quiser governar, dizem economistas
Alexa Salomão, Folha de S. Paulo
Logo após a contagem dos votos no primeiro turno das eleições neste domingo (2), o presidente Jair Bolsonaro (PL) atribuiu o resultado a sua bem-sucedida estratégia na economia, que elevou o valor do Auxílio Brasil, ao mesmo tempo em que reduziu o preço dos combustíveis e a inflação às vésperas do pleito. Economistas que acompanham a cena política discordam.
A economia até pode ter ajudado um pouco, como ocorre em qualquer eleição. No entanto, analistas atribuem a arrancada bolsonarista ao avanço da uma onda conservadora —e Luiz Inácio Lula da Silva (PT) vai precisar se adaptar a esse movimento para ganhar a eleição e, depois, governar com um Congresso mais a direita.
Terminada a contagem, Lula recebeu 48,4% dos votos válidos, resultado dentro da margem de erro sinalizada pelas pesquisas. Bolsonaro teve 43, 22%, uma diferença de quase sete pontos percentuais, que fortalece o presidente no segundo turno.
"Para ocorrer essa diferença no resultado do Bolsonaro em relação às pesquisas, cujos votos foram subestimados vergonhosamente, [o motivo] não foi a economia —o que estamos vendo é uma onda conservadora", afirma a economista e advogada Elena Landau, que coordenou o programa econômico de Simone Tebet (MDB).
"Tem o astronauta Marcos Pontes virando senador por São Paulo, Hamilton Mourão ganhando no Rio Grande do Sul, Magno Malta voltando pelo Espírito Santo, Eduardo Pazuello, o ex-ministro da Saúde, como deputado federal mais votado no Rio. Isso não tem nenhuma relação com a economia."
Elena sai satisfeita com o resultado de sua candidata. "Simone foi de completa desconhecida à terceira mais votada", afirma. No entanto, ela se declara muito preocupada com os futuros efeitos do conservadorismo em duas áreas específicas, caso Bolsonaro se reeleja: o meio ambiente e o STF (Supremo Tribunal Federal).
"O próximo presidente poderá indicar dois ministros para o Supremo", diz ela. "Imagine o efeito disso."
Elena aguarda a posição de sua candidata no segundo turno, que deve ser divulgada até terça-feira. Se Simone apoiar Lula, existe a expectativa de que parte de suas propostas para a economia possa ser levada para o PT.
O economista Nelson Marconi, que atuou na coordenação econômica nas campanhas de Ciro Gomes (PDT) em 2018 e 2022, também não acredita que a melhora da economia explique o resultado.
"No levantamento que encomendamos, dá para ver que o governo Bolsonaro injetou cerca de R$ 450 bilhões na economia neste segundo semestre, com medidas em diferentes áreas, então, as pesquisas teriam de estar muito erradas para não captarem isso antes", diz Marconi. "Acredito que ocorreu outro movimento, mais ligado a agenda dos costumes."
Marconi garante que o seu candidato não vai apoiar Bolsonaro, mas ainda não tem uma definição sobre um eventual apoio a Lula.
O economista Edmar Bacha, um dos pais do Plano Real, espera uma reação petista nos próximos dias. "Lula precisa dar uma guinada dramática ao centro se quiser segurar essa onda conservadora", diz Bacha, histórico apoiador do PSDB que participou da campanha de Tebet para "ajudar na construção da terceira via".
Para o economista, Lula precisa atuar para fortalecer sua coalizão no segundo turno.
Membro da Academia Brasileira de Letras, Bacha tem forte atuação nos bastidores do debate econômico como sócio-fundador do Casa das Graças, um instituto de estudos de política econômica no Rio de Janeiro voltado à promoção de debates sobre o desenvolvimento do Brasil. Neste ano, no entanto, preocupado com os rumos da política, assumiu uma posição mais pública.
Bacha diz que o primeiro passo do PT é concentrar esforços em São Paulo, onde Fernando Haddad (PT) chega ao segundo turno com 35,70% dos votos válidos, abaixo do que previam as pesquisas. O ex-ministro de Infraestrutura, Tarcísio de Freitas (Republicanos), apoiado por Bolsonaro, terminou o primeiro turno na frente, com 42,32%.
"Foi isso que fez a diferença para Bolsonaro, e será preciso reverter essa situação", afirma ele.
Petista histórico e ex-ministro do Planejamento e da Fazenda, o economista Nelson Barbosa, costuma estar em campos opostos aos colegas egressos do PSDB. Desta vez, porém, concorda com a importância das alianças mais amplas.
"Pelo aspecto político, o resultado indicou que Lula estava certo em construir uma frente ampla, pois só assim há chance de derrotar Bolsonaro", afirma Barbosa, que é colunista da Folha.
No segundo turno, Barbosa acredita, essa frente será mais ampla, com colaboração de pessoas que apoiavam Tebet e Ciro.
O economista Arminio Fraga, ex-presidente do BC (Banco Centra) e colunista da Folha, destaca que uma revisão na estratégia do PT é importante também por causa do perfil que a eleição deu ao Legislativo. "Bolsonaro sai muito forte no Congresso", diz ele. "Erros monumentais precisam ser corrigidos."
Cartas pró-democracia são lidas na Faculdade de Direito da USP
O PL de Bolsonaro ganhou ao menos 23 deputados, chegando a 99. Tornou-se a maior bancada eleita na Câmara nos últimos 24 anos. A sigla terá praticamente um em cada cinco votos , consolidando-se como um ator essencial nas negociações políticas entre os deputados. Terá praticamente um em cada cinco votos entre os deputados, consolidando-se como um ator essencial nas negociações políticas.
Um terço do Senado foi renovado, e.o resultado também consolida o PL como a maior bancada. Terá 14 cadeiras, 5 a mais do que tinha no primeiro semestre deste ano, e ainda pode chegar a 15. Entre os eleitos estão ex-ministros bolsonaristas, como Damares Alves (Republicanos-DF) e Rogério Marinho (PL-RN).
Sócio-fundador da Gávea Investimentos, Fraga prefere a a discrição e não gosta de exposição pública. Neste ano, porém, à medida que o cenário político ficava mais tenso, aderiu a movimentos de apoio ao equilíbrio institucional.
Em agosto, numa atitude inédita, discursou no evento da Faculdade de Direito do Largo São Francisco, da USP (Universidade de São Paulo), em que foi lançado um manifesto de apoio à democracia.
O economista Bernard Appy, que foi secretário de Política Econômica do Ministério da Fazenda na gestão de Lula, chama a atenção para a necessidade de alianças mais conservadoras para exercer o governo em caso de vitória.
"Será preciso levar a coalizão mais para o centro não apenas para ganhar a eleição, mas para garantir a governabilidade em caso de vitória", afirma ele. "Há muito a ser feito, em várias áreas, principalmente na economia, que depende do Legislativo."
Diretor do CCiF (Centro de Cidadania Fiscal), Appy integra o Grupo de Seis, que redigiu propostas de reformas para os presidenciáveis em diferentes áreas. Também fazem parte os economistas Francisco Gaetani, Marcelo Medeiros e Pérsio Arida, o professor Carlos Ari Sundfeld (FGV Direito SP) e o cientista político Sérgio Fausto. Eles redigiram uma proposta de governo com reformas, entregue aos presidenciáveis
*Texto publicado originalmente na Folha de S. Paulo
No Jornal Nacional, Simone Tebet acena a mulheres e defende liberalismo econômico
Redação de Brasil de Fato*
Na última entrevista da série de sabatinas com os presidenciáveis mais bem posicionados nas pesquisas eleitorais, a senadora do Mato Grosso do Sul e candidata do MDB, Simone Tebet foi a entrevistada. Durante os 40 minutos da entrevista, ela disse priorizar a educação, fazendo alusão a propostas de entidades que defendem maior participação privada na gestão do ensino, e afirmou em mais de uma ocasião contar com uma equipe de "economistas liberais" para tratar do financiamento das suas propostas.
No início, ao ser perguntada sobre a desunião do MDB em torno da sua candidatura, Tebet apontou ter vencido uma "maratona com muitos obstáculos para consolidar a pretensão presidencial. "Tentaram puxar o meu tapete há até pouco tempo atrás", pontuou. "Tentaram levar o partido para o ex-presidente Lula, judicializaram minha candidatura."
Os apresentadores do Jornal Nacional insistiram na questão sobre a desunião dentro da legenda, com William Bonner lembrando que nove diretórios de estados e um do Distrito Federal anunciaram que não a apoiariam. "A polarização faz com que alguns companheiros sejam cooptados", justificou. A emedebista também foi perguntada sobre o fato de o próprio candidato ao governo do Mato Grosso do Sul de sua legenda, André Puccinelli, ter relativizado o apoio a ela.
"Por exemplo, se você vota no Lula, eu vou te matar para que não vote no Lula? Não. Democracia é isso. Vamos sugerir [o nome da Simone], mas não impor", afirmou o candidato em julho.
Ao JN, Tebet respondeu: "A minha candidatura não vem pra dividir. Sabemos das dificuldades regionais, venho de um estado conservador e tenho que dar liberdade pros meus companheiros."
Quando questionada sobre o envolvimento de integrantes da sigla com escândalos de corrupção, a parlamentar argumentou que "o partido não é mais fisiológico", afirmando que, para compor o ministério de um eventual governo, iria contar com os "partidos que somam conosco" e que os requisitos dos titulares das pastas seriam dois: "ser honesto e ser competente".
Participação feminina e propostas
Na entrevista, ela tentou sinalizar para o público feminino. "Se eu virar presidente, primeiro projeto que vou pautar é a igualdade salarial entre homens e mulheres", sustentou.
Quando perguntada sobre a baixa participação de candidaturas femininas no MDB, a candidata usou uma argumentação confusa. "Sou privilegiada por que estou diante de um partido que saiu na vanguarda e teve a coragem de lançar, nesse momento mais difícil do Brasil, uma mulher candidata à Presidência da República. Isso é inédito, é inédito na história", pontuou, possivelmente se referindo a seu partido.
Além de já ter havido uma presidenta da República no Brasil, Dilma Rousseff (PT), as eleições presidenciais de 2022 têm outras três candidatas: Vera Lúcia (PSTU), Sofia Manzano (PCB) e Soraya Thronicke (UB).
A candidata se comprometeu a priorizar a educação caso vença as eleições. "Não falta dinheiro pra educação, falta vontade", vaticinou, emendando que "não há trabalho e qualificação, sem educação. É o que garante o aluguel e a comida na mesa". Também prometeu recriar o Ministério da Segurança Pública, quando questionada sobre perguntas sobre essa área.
*Texto publicado originalmente em Brasil de Fato
Nas entrelinhas: Simone Tebet completa a fila de largada da campanha
Luiz Carlos Azedo | Nas entrelinhas | Correio Braziliense
A confirmação da candidatura de Simone Tebet, ontem, pela convenção nacional do MDB e da coligação que a apoia, integrada pela federação PSDB-Cidadania, completou a fila de largada das eleições deste ano. O cenário mantém como tendência principal a polarização entre o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT), com 44% das intenções de voto, e o presidente Jair Bolsonaro (PL), com 35%, segundo a pesquisa XP/Ipespe divulgada na segunda-feira. O que pode alterar esse quadro, ou consolidá-lo, será a propaganda eleitoral de rádio e tevê, que começa em 16 de agosto.
O ex-ministro Ciro Gomes (PDT), com 9%, a senadora Simone Tebet (MDB), com 4%, e André Janones (Avante), com 2%, são os candidatos mais bem posicionados para construir uma terceira via, alternativa muito difícil. Nenhum dos três, até agora, definiu o vice. Simone contava com o apoio do senador Tasso Jereissati (PSDB-CE), mas o tucano histórico, mais uma vez, movimenta-se em função da política do Ceará. A senadora Eliziane Gama (Cidadania-AM) pleiteia a vaga. Pablo Marçal (Pros) e Luiz Felipe d’Avila (Novo) têm 1%. Vera Lúcia (PSTU), Sofia Manzano (PCB), Luciano Bivar (União Brasil), Eymael (DC) e Leonardo Péricles (UP) completam a fila de largada, com menos de 1% cada.
Votos nulos ou que não votariam em nenhum dos candidatos somam 4%. Não sabem/não responderam representam apenas 2% dos entrevistados, o que indica um cenário de grande participação eleitoral. Ontem, o Datafolha divulgou uma pesquisa entre jovens eleitores, que confirmou o que já se previa: o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) tem a preferência no eleitorado adolescente e jovem nas 12 maiores capitais do país, com 51%. Jair Bolsonaro (PL) tem 20%. Depois, vem Ciro, com 12%. São jovens de São Paulo, Rio, Belo Horizonte, Salvador, Fortaleza, Recife, Porto Alegre, Curitiba, Goiânia, Brasília, Manaus e Belém. A margem de erro é de três pontos para mais ou para menos. A pesquisa eleitoral completa do DataFolha sobre as eleições presidenciais deve ser divulgada hoje.
Nenhuma grande alteração no quadro deve ocorrer até o horário eleitoral, pois a prioridade dos candidatos agora é a articulação dos palanques regionais, resolvendo conflitos e recolhendo náufragos das alianças. Como o registro das candidaturas deve ocorrer até 5 de agosto, muita água vai rolar ainda nos estados, e os candidatos terão de conciliar as articulações de campanha com a própria movimentação eleitoral. Lula passa a ter a segurança sob responsabilidade da Polícia Federal. Como ex-presidente, já tinha esse direito, mas, agora, o esquema será reforçado em razão dos riscos de atentado.
Regras do jogo
Bolsonaro passa à desvantagem de ter que se comportar de acordo com as regras eleitorais, ou seja, será tratado como os demais candidatos, estando sujeito a punições toda vez que sair das regras do jogo. Como está em guerra com o Supremo Tribunal Federal (STF), pode ser que queira esticar a corda, para passar por vítima e ilustrar a narrativa de que não existe imparcialidade da Corte. Entretanto, essa postura aumenta seu risco eleitoral, porque a opinião pública confia na Justiça Eleitoral, e isso gera grandes desgastes políticos.
Por exemplo, o manifesto em defesa do Estado de direito organizado por juristas e estudantes da tradicional Faculdade de Direito do Largo do São Francisco (USP), berço da elite política e jurídica paulista, com apoio de empresários, intelectuais e artistas, subscrito por três mil personalidades, em 24 horas obteve a adesão de mais de 100 mil representantes da sociedade civil. Entre os signatários estão os ex-ministros do STF Carlos Ayres Britto, Carlos Velloso, Celso de Mello, Cezar Peluso, Ellen Gracie, Eros Grau, Marco Aurélio Mello, Sepúlveda Pertence, Sydney Sanches, além de artistas, intelectuais, executivos, empresários e até banqueiros. É o tipo de fato político que pode impactar negativamente a candidatura de Bolsonaro em que ela é mais forte: os eleitores com renda acima de 10 salários mínimos.
No rastro do encontro com diplomatas no qual levantou suspeitas sobre a urna eletrônica e atacou a Justiça Eleitoral, Bolsonaro vive, também, a rebordosa da reação negativa da comunidade internacional. A mais importante foi o pronunciamento do secretário de Defesa dos Estados Unidos, Lloyd Austin, na terça-feira, durante a 15ª Conferência de Ministros da Defesa das Américas, em Brasília: “Os nossos países não estão ligados apenas pela geografia. Também somos atraídos pelos interesses e valores em comum, pelo nosso profundo respeito pelos direitos humanos e pela dignidade humana, pelo nosso compromisso com o Estado de direito e por nossa devoção à democracia”, disse.
MDB rachado e presidenciável com pouco voto: uma história recorrente
Glauco Faria*, Brasil de Fato
Caso não haja nenhuma surpresa, o MDB deve confirmar hoje a candidatura à Presidência da República da senadora do Mato Grosso do Sul Simone Tebet. Mas, de saída, a legenda já sai rachada. Líderes emedebistas de onze estados manifestaram apoio à candidatura do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva e, embora o presidente nacional da sigla, Baleia Rossi, tenha declarado que a candidatura da parlamentar tem o apoio de 19 diretórios estaduais, a divisão já é evidente.
Não que isso seja novidade na história da legenda. Partido que antagonizava com a Arena no período da ditadura civil-militar, o PMDB da pós-democratização chegou a eleger todos os governadores do país, exceção ao de Sergipe, em 1986, fazendo ainda 38 dos 49 senadores e 261 dos 487 deputados federais naquele ano. Mesmo com tamanho poderio, não chegou forte e tampouco unido nas primeiras eleições presidenciais diretas após o fim do regime autoritário, em 1989.
Àquela altura, o "Senhor Diretas", presidente da Assembleia Constituinte e figura histórica da luta contra a ditadura, Ulysses Guimarães, foi o candidato de uma legenda castigada pela impopularidade do governo Sarney e pelo papel dúbio que exercia frente à opinião pública. No ano da eleição, a sigla havia se retirado do governo, mas mantinha alguns ministérios e cargos importantes.
E se Ulysses seria o nome certo da legenda em uma eventual eleição direta em 1985, a história foi bem diferente em 1989. Em 29 de abril daquele ano, o PMDB realizou sua convenção nacional com quatro candidatos. No primeiro turno da escolha, Ulysses Guimarães foi o mais votado com 302 votos, seguido pelo então governador da Bahia Waldyr Pires, com 272, vindo em seguida Iris Rezende (251) e Álvaro Dias (72). Para evitar um segundo turno, Ulysses e Waldir formaram uma chapa única, que na prática não representou a unidade esperada, ainda mais por conta de uma parte significativa da sigla sonhar com a candidatura do governador paulista Orestes Quércia.
O presidenciável peemedebista foi "cristianizado" e viu muitos daqueles que deveriam ser seus correligionários aderirem a outras candidaturas, em especial a de Fernando Collor (PRN). Ao fim, terminou a eleição com parcos 4,6%, ficando em sétimo lugar. Ao menos o jingle de sua campanha, "Bote fé no velhinho", entrou para a história como um dos mais bem marcantes das campanhas eleitorais.
Em 1994, um novo revés do PMDB
Se Ulysses seria um nome natural para uma eleição direta que não aconteceu em 1985, a candidatura mais forte da legenda em 1989 talvez fosse a de Orestes Quércia. Mas quando ele se tornou de fato presidenciável em 1994, seu tempo tinha passado. Àquela altura já havia sofrido com inúmeras denúncias de irregularidades que abalaram sua popularidade, tendo ainda problemas internos em São Paulo e desavenças com seu ex-afilhado político, o então governador Luiz Antônio Fleury.
Disputou a prévia com o ex-governador do Paraná Roberto Requião e saiu vitorioso. A declaração de seu rival após o resultado já dava o tom que iria imperar nas hostes da sigla dali em diante. "Com Quércia concorrendo à Presidência, o PMDB mostra sua face horrível e corrupta", disse Requião.
O CPDOC da Fundação Getulio Vargas relembra a divisão naquele momento, apontando o alto índice de abstenção daquela prévia, sobretudo no Rio Grande do Sul, foco da dissidência comandada por Antônio Brito e Pedro Simon, e no Maranhão, reduto do ex-presidente José Sarney. "O senador José Fogaça, dissidente da bancada gaúcha, lamentou que o ex-presidente do PMDB não tivesse compreendido, antes da convenção, o 'desajuste' provocado por sua candidatura e afirmou que Quércia era 'sinônimo de inadequação ao pensamento político do partido, uma dificuldade de contexto'."
Seu último comício, na Praça da Sé, em São Paulo, marcou o fim de uma campanha melancólica em 30 de setembro. Na ocasião, atacou o candidato tucano Fernando Henrique Cardoso afirmando que "o PSDB é um partido fraco, sem tradição, sem estrutura. Com Fernando Henrique, quem vai comandar? O governo vai ser como um monstro, com várias cabeças e vários braços". E não poupou seu colega de legenda José Sarney, que apoiava FHC, chamando-o de "canalha".
Quércia terminou a eleição com 4,38%, atrás de Enéas Carneiro, do Prona. Talvez um dos fatos mais lembrados daquela disputa presidencial tenha sido seu embate com o jornalista Rui Xavier no programa Roda Viva, da TV Cultura, com um desfile de xingamentos, ofensas e ameaças nada usual na grade televisiva.
Sem candidatos do PMDB
A candidatura presidencial de Quércia foi a última do PMDB durante um bom período. Em 1998, a base da legenda aliada a FHC conseguiu barrar a candidatura própria na convenção realizada em março daquele ano. O placar de 389 contrários com 303 a favor já deixava à vista o diagnóstico recorrente de desunião. "Houve uma descortesia. Humilharam o Itamar Franco. Vai ser difícil reconstruir a unidade do partido", disse o senador Ronaldo Cunha Lima, defensor da candidatura própria, em referência ao ex-presidente que acabou candidato vitorioso ao governo de Minas Gerais. O partido não fechou apoio formal à reeleição do tucano, mas a maioria seguiu esse caminho.
Já em 2002, com a implosão da aliança dentre o então PFL, hoje DEM, e o PSDB, os peemedebistas indicaram a deputada federal capixaba Rita Camata como vice na chapa de José Serra. Mais uma vez a tese da candidatura própria foi vencida, assim como a pretensão renovada de Itamar Franco de ser o candidato peemedebista. Em 2002, nova derrota para os defensores de um presidenciável da sigla: a disputa teve a ala governista (agora pró-Lula) com 351 votos contra 303, mas não houve a formalização da aliança.
Em 2010, a vitória dos governistas foi expressiva, com 560 dos 660 votos apurados na convenção nacional optando pela coalizão com o PT e a indicação de Michel Temer para vice de Dilma Rousseff. O ex-governador do Paraná, Roberto Requião, e Antônio Pedreira, do PMDB do Distrito Federal, que buscavam a vaga para disputar a Presidência, conseguiram 95 e 4 votos, respectivamente. Em junho de 2014 a manutenção da aliança foi aprovada com 69,7% dos votos dos convencionais. Ali, Temer fez um discurso profético por vias tortas ao seus correligionários pedindo unidade (que efetivamente não ocorreu).
"Uma maior presença do PMDB na área social, assim como teve no passado. São ações relativas à saúde, à educação, à integração nacional, entre outras”, prometeu o vice.
A falta de um projeto nacional
"O atual MDB já há algumas eleições tem mostrado que não tem um projeto nacional. Ou ele embarca numa candidatura a vice ou em uma candidatura como a do Henrique Meirelles que não chegava a ser sequer uma aventura, com números insignificantes para um partido que ainda tem uma bancada de senadores e deputados federais expressiva", explica a cientista política e professora da PUC-SP Rosemary Segurado, em entrevista ao Jornal Brasil Atual. "Fica sempre numa negociação ou de uma candidatura à vice-presidência ou numa composição governamental em que possa ter alguns ministérios. Parece que isso lhe é suficiente. Um partido que tem uma história importante, desde antes da democratização."
Rosemary faz referência à candidatura do ex-ministro do impopular governo Temer às eleições de 2018, que cumpriu o rito de candidatos pouco expressivos ao Planalto por parte da sigla, marcando então o pior desempenho de um presidenciável do partido. Henrique Meirelles, mesmo tendo investido R$ 54 milhões em sua própria campanha, teve somente 1,2% dos votos válidos, finalizando sua participação atrás do Cabo Daciolo (Patriotas).
Henrique Meirelles investiu pesado, mas ganhou poucos votos em 2018 / Antonio Cruz/Agência Brasil
Com a candidatura de Simone Tebet, o desempenho deve ser pouco melhor que o da última eleição, mas nada que inspire possibilidade de vitória. "Uma das perguntas é como o MDB vai fazer para manter essa candidatura, até porque tem questões relacionadas ao recebimento do fundo eleitoral, que são importantes para o partido, mas certamente esse desembarque da candidatura da Simone Tebet é anterior ao embarque porque parte expressiva do MDB atual não vê essa candidatura com nenhuma possibilidade de representar o partido nacionalmente", aponta Segurado, destacando que a política local também se torna determinante para o apoio ou não a um presidenciável.
"O que um candidato do MDB em determinado estado olha: quem vai alavancar minha candidatura? É Simone Tebet ou o ex-presidente Lula? E as pesquisas estão mostrando que a influência de Lula em algumas regiões pode ser decisiva para os candidatos a governador. Obviamente aquele candidato do MDB e aqueles acordos locais estão olhando para sua própria sobrevivência", pontua.
A questão local é vital para a sobrevivência não apenas de políticos em determinadas regiões, mas do próprio poderio da legenda. O partido continua sendo o líder no ranking de prefeituras comandadas no Brasil, mas viveu um recuo expressivo em 2020, passando de 1044 em 2016 para 784. Isso pode ser um indicativo de redução de bancadas, com a perda de espaço para outras agremiações, em especial do chamado Centrão. No Senado, os emedebistas ainda são a maior sigla com 12 parlamentares, mas na Câmara ocupam um hoje modesto sétimo lugar, com 37 deputados.
O que pode ser dado como certo, independentemente dos resultados de 2022, é que parte do MDB deve buscar compor com um novo governo. Como lembra o professor de História do Sul e Sudeste do Pará (Unifesspa) Cássio Augusto Guilherme, sem contar a gestão de Fernando Collor e o período inicial do primeiro governo Lula, até 2017 o PMDB permaneceu por 28 anos em coalizões governistas. Nisso, a história também pode se repetir.
*Texto publicado originalmente no Brasil de Fato. Título editado
Nas entrelinhas: No meio do caminho tem um Janones
Luiz Carlos Azedo | Nas entrelinhas | Correio Braziliense
O presidente Jair Bolsonaro vive o rescaldo da grande convenção de domingo que oficializou sua candidatura. Seu discurso no Maracanãzinho mirou aquilo que as pesquisas estão mostrando e seus marqueteiros também: (1) precisa do voto das mulheres, daí o discurso de Michelle, a primeira-dama, na convenção, dirigido ao mundo evangélico para chegar ao eleitorado feminino; (2) está em franca desvantagem junto à população de mais baixa renda, em que o ex-presidente Lula nada de braçadas, situação que tenta reverter prometendo manter o Auxílio Brasil no valor de R$ 600 após as eleições (apesar de a equipe econômica só conseguir garantir R$ 400 remanejando o Orçamento da União de 2023); e (3) sonha com os votos de classe média que recebeu em 2018 e está perdendo, por causa de seu radicalismo, principalmente nos estados do Sudeste. Jovens e o Nordeste são batalhas perdidas.
Acontece que Bolsonaro não se aguenta e fala o que realmente pensa, não o que as pesquisas qualitativas da equipe de campanha estão mostrando: na convenção, fugindo ao script, partiu novamente para cima do Supremo Tribunal Federal (STF) e das urnas eletrônicas, o que é um tiro no pé, porque reforça a imagem de candidato perdedor e a ideia de que prepara um golpe de Estado, ainda mais depois de ter feito uma nova convocação para mais uma manifestação contra o Supremo no 7 de Setembro.
O Dia da Independência pode ser um Rubicão. É aí que o papel do candidato a vice, general Braga Netto, precisa ser observado com atenção. Além de ser o responsável pelo programa de governo, que promete entregar nas próximas semanas, ascendeu à condição de articulador da campanha e está viajando aos estados. O ex-ministro da Defesa transita muito bem no universo de apoiadores de Bolsonaro, não esconde sua afinidade com as teses golpistas e é o mais preparado para cuidar, com outros militares, da mobilização da militância de campanha. Como todos sabem, Bolsonaro tem uma milícia política armada.
Ciro Gomes (PDT), Simone Tebet (cuja candidatura sofre um ataque da ala lulista do MDB, às vésperas da convenção para homologar seu nome) e André Janones (Avante), juntos, somam de 12% a 13%, o suficiente para levar a eleição ao segundo turno e manter Bolsonaro dois dígitos distante de Lula, caso a polarização entre ambos se mantenha. Mesmo que esse quadro não se altere a favor de uma terceira via, são candidaturas que têm um papel a cumprir no debate político e na negociação do segundo turno, porque forçariam um entendimento em direção ao centro. Entretanto, temos uma eleição com forte tendência de polarização, com 70% do eleitorado supostamente já definido, que pode registrar o voto útil tanto em favor de Bolsonaro como de Lula na reta final do primeiro turno.
Esse é um tipo de aposta incorporada à narrativa da frente de esquerda que apoia Lula, para vencer no primeiro turno, alimentada pelos arreganhos autoritários de Bolsonaro e da extrema direita que o apoia. Mas não existe eleição decidida de véspera, os 45 dias de campanha de rádio e televisão tanto podem abduzir completamente os candidatos de terceira via como provocar o contrário, com um dos três postulantes à terceira via se beneficiando do aumento da rejeição aos dois candidatos, em razão da pancadaria entre Lula e Bolsonaro.
David contra Golias
A candidatura do deputado André Janones à Presidência da República foi oficializada no sábado. A convenção foi em Belo Horizonte, com o grande Teatro do Minascentro lotado. Advogado, filho de uma empregada doméstica, Janones é um fenômeno das redes sociais, seu primeiro emprego foi como cobrador de ônibus. Nas pesquisas divulgadas ontem, figurava com 2% de intenções de votos; vem sendo assim, teimosamente. Ele é um fenômeno da antipolítica: em 2016, quando se candidatou à Prefeitura de Ituiutaba pelo PSC, perdeu; em 2018, surfou a greve dos caminhoneiros e foi o terceiro mais votado nas eleições para deputado federal em Minas. Disputa pela primeira vez a Presidência da República, é um David contra Golias.
Janones é uma pedra no caminho do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva, porque a resiliência de seus eleitores pode inviabilizar uma vitória do petista no primeiro turno, somada aos votos de Ciro Gomes (PDT) e Simone Tebet (MDB). O candidato do Avante tem seu discurso na ponta da língua: “Só de eu poder dizer que nós temos de fato um projeto para o país, para mim, já fez tudo valer a pena. Hoje, nós temos um projeto que contempla todas as áreas: saúde, segurança, educação, agro… Todas as áreas e todos com a mesma mensagem, com o mesmo objetivo: a diminuição da desigualdade social no nosso país, a diminuição da distância entre os mais ricos e os mais pobres”, explica.
O deputado mineiro defende um programa de combate à pobreza, financiado por uma reforma tributária, para taxar lucros e dividendos, e criar um imposto sobre grandes fortunas, rever os atuais incentivos fiscais, sem sacrificar a classe média com mais tributação. Na convenção, André Janones defendeu a democracia; em entrevistas, já disse que não apoiará Bolsonaro, no segundo turno. O Avante tem oito deputados federais, 16 deputados estaduais, 82 prefeitos e 1.074 vereadores.
Nas entrelinhas: Simone Tebet vive semana decisiva no MDB
Luiz Carlos Azedo | Nas entrelinhas | Correio Braziliense
A uma semana da convenção eleitoral do MDB, a candidatura da senadora Simone Tebet (MS) à Presidência da República vive uma semana decisiva, com muitas articulações políticas contrárias, mas em condições de derrotar a ofensiva dos caciques do MDB que desejam remover sua candidatura e apoiar o ex-presidente Luiz Inácio lula da Silva já no primeiro turno. Na segunda-feira, 11 representantes de diretórios regionais, a maioria do Nordeste, se reuniram com o PT para consolidar a dissidência que apoia Lula. Ontem, o ex-presidente Michel Temer e o presidente da legenda, deputado Baleia Rossi (SP), com apoio de 19 diretórios, reafirmaram a candidatura. A conta não fecha. São 27 diretórios.
Os senadores Eduardo Braga (AM), Renan Calheiros (AL), Veneziano Vital do Rêgo (PB), Rose de Freitas (ES) e Marcelo Castro (PI); o governador de Alagoas, Paulo Dantas; e os ex-senadores Eunício Oliveira (CE) e Edison Lobão (MA), além do presidente do diretório estadual do MDB no RJ, Leonardo Picciani, participaram do encontro com Lula. O governador do Pará, Helder Barbalho, e o ex-senador Garibaldi Alves (RN), aliados do petista, não compareceram.
Ontem, Eduardo Braga, Renan Calheiros, Rose de Freitas, Marcelo Castro, o deputado federal Isnaldo Bulhões (AL) e o ex-governador Moreira Franco (RJ) se reuniram com Temer, no seu escritório, no Itaim Bibi, em São Paulo. O ex-presidente é uma peça-chave no tabuleiro das relações entre os caciques emedebistas. Até agora, o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva vem trabalhando para dividir o MDB e não procurou Temer, principalmente por causa dos ressentimentos petistas em razão do impeachment da presidente Dilma Rousseff.
Temer anda descontente com a situação da candidatura de Simone Tebet, que não decolou nas pesquisas. A senadora pantaneira, porém, se beneficiou diretamente do fato de a cúpula do PSDB ter removido a candidatura do ex-governador João Doria e desistido da chapa própria. O Cidadania, liderado por Roberto Freire, que integra a federação com o PSDB, é a única legenda que se engajou na candidatura de Tebet, apesar de alguns deputados de sua bancada se fingirem de mortos. O PSDB, cuja cúpula chegou a anunciar o apoio a Tebet, não se mobiliza para a campanha da emedebista. Os tucanos vivem um salve-se quem puder, especialmente em São Paulo, onde o governador Rodrigo Garcia está em dificuldade para se reeleger.
Um balanço da situação interna do MDB mostra, porém, que Tebet ainda tem o apoio da maioria dos estados e dificilmente sua candidatura seria deslocada sem uma negociação muito ampla com o PT, para atrair Temer, o que é improvável. Uma ala que apoia a candidatura do presidente Jair Bolsonaro também não tem força para impor essa orientação. Por essa razão, prefere manter a candidatura de Tebet e barrar o apoio formal a Lula, o que daria muito tempo de televisão ao petista.
Rubicão
Segundo o senador Eduardo Braga, que lidera a dissidência, o grupo ainda não tem posição definida sobre como pretende se comportar na convenção. As disputas no MDB costumam ser resolvidas na base da Lei de Murici, “cada um cuida de si”. O partido é uma federação de grupos regionais, cujas lideranças convivem na divergência há muitos anos. De um lado, o grupo do ex-presidente José Sarney e de Renan Calheiros, aliados de Lula desde 2002; de outro, o grupo de Michel Temer e Moreira Franco, que se aliou a Lula em 2006 e fez parte da chapa de Dilma Rousseff em 2010 e 2014. Em 2016, Temer e Moreira romperam com Dilma Rousseff e aderiram às articulações do impeachment, o que a cúpula petista não perdoa.
A sete dias da convenção, o grupo pró-Lula ainda busca convencer Temer a aceitar a aliança, mas isso depende de uma iniciativa pessoal e pública de Lula, que mantém distância regulamentar do ex-presidente da República. A sorte de Tebet, mesmo estagnada nas pesquisas, é que o MDB também gosta de cristianizar seus candidatos, como fez com Ulysses Guimarães, em 1989; Orestes Quércia, em 1994; e mais recentemente, em 2018, com Henrique Meirelles.
A candidata do MDB ainda tem condições de tentar crescer nas pesquisas. Tebet é leve nas ruas, onde não é hostilizada, podendo circular nos eventos sem grandes aparatos, o que não acontece com Bolsonaro nem com Lula. Mesmo Ciro Gomes, candidato do PDT, tem mais dificuldades que ela, quando nada porque não leva desaforo para casa ao sofre provocações de petistas e bolsonaristas.
A convenção do MDB, marcada para o dia 27, será virtual. É um jogo de cartas marcadas, ou seja, a favor de Tebet ou contra ela, tudo será acertado antes. Do ponto de vista de sua candidatura, é um Rubicão, porque isso garantirá acesso ao tempo de radio e televisão quando a propaganda política começar para valer, em 15 de agosto. A distribuição de tempo entre os principais candidatos será a seguinte: Lula (PT) terá 3 minutos e 10 segundos a cada um dos dois blocos de 12 minutos e 30 segundos; Bolsonaro (PL), 2 minutos e 50 segundos; Bivar (União Brasil), 2 minutos por bloco; Simone Tebet (MDB), 1 minuto e 50 segundos; e Ciro Gomes (PDT), 50 segundos.
Por que tanto Biles?
Tibério Canuto*, Esquerda Democrática
Artigo de Marco Aurélio Nogueira publicado no Estadão de sábado [ver abaixo "Uma oportunidade a mais"] provocou ira nas brigadas lularianas que poluem as redes sociais. Tudo porque Marco, um cientista político de primeira linha, formado politicamente na boa e velha escola do Partidão, afirmou que Simone poderia qualificar a disputa presidencial, assim como Ciro Gomes. Entendia que essas duas candidaturas poderiam tirar os dois presidenciáveis que lideram as intenções de voto da zona de conforto. Não no sentido de subtrair-lhes o favoritismo para ir ao segundo turno. Mas de levá-los a explicitar seus programas, para além de platitudes, como no meu governo eu fiz isso, fiz aquilo. Não há como negar, há um pacto não escrito e implícito entre os dois para congelar a disputa eleitoral no oceano de obviedades.
Sobraram cobranças para Simone e sobretudo xingatórios e mentiras. Foi acusada de defensora do extermínio do meio ambiente, de índios e de golpista, como se o palanque que Lula está montando só tivesse puros e bons. E ninguém que tivesse apoiado o impeachment de Dilma. Aí vale a lógica, quem hoje está do meu lado, não importa o seu passado. É só elogio. E quem não está do meu lado, eu desconstruo, o transformo em um cão chupando manga.
Nessa visão distorcida que divide a política entre anjos e demônios sobrou até para Milton Lahuerta, outro intelectual respeitado. O conheço desde os tempos da militância no Partidão. Milton não é eleitor de Simone, longe disso. Mas não faz política à base de Fla-Flu e elogiou o artigo de Marco, reproduzindo-o em seu Face. Imediatamente surgiram cobranças a Simone e a ele. A ponto de Milton ter postado em comentário a famosa frase de Ulysses: “política cisca-se para dentro, quem cisca para fora é galinha”. E tem razão. Recomenda-se aos simpatizantes da candidatura Lula pensar no momento seguinte, na hipótese de um segundo turno, onde, por óbvio precisará do apoio de quem ficou de fora. Estigmatizar Simone ou Ciro é ciscar para fora, é inviabilizar possíveis pontes que se farão necessárias.
Já tinha notado a onda “Simonofóbica” desde quando publiquei um post dizendo que fiquei impressionado com seu desempenho na entrevista a Renata Lo Prete. Tanto na minha página como nas redes sociais lularianas choveram impropérios contra a candidata. Não discutiram as ideias programáticas que Simone defendeu na entrevista. Uma velha amiga dos tempos do Partidão, hoje convertida ao credo petista, disse desconfiar da candidata porque desconfia de quem fala manso, insinuando que isso era a prova dos nove de que Simone é falsa.
Uma outra, que conheci nas manifestações do impichi de Dilma. Vestida de amarelo e não dando um pio contra o grito dos manifestantes de “minha bandeira jamais será vermelha”, virou anti-Simone histérica. Esse é o problema de cristão novo. Para purgar seus pecados, renega tudo que fez e vira mais cristão do que Jesus Cristo. Não vou estigmatizá-la por ter mudado a cor de sua camisa. Eu mesmo já mudei de opinião várias vezes na minha vida. Já fui um “revolucionário bravo”, hoje sou um reformista flor de laranjeira. Ela tem o direito de mudar, assim como Geraldo Alckmin tem o de estar no mesmo palanque de Lula, apesar de no passado recente ter afirmado que Lula queria voltar ao lugar do crime, além de ter sido árduo defensor do impichi de Dilma. Ele e um monte de gente que hoje está no palanque de Lula. Mas vão ser renegados por causa disso? Seria uma estupidez.
Política se faz olhando para a frente, pois quem vive de passado é museu. Nada a obstar quanto ao arco que Lula está construindo. Posso achar que ele é insuficiente, ainda é marcadamente uma frente de esquerda, mas não faço a crítica religiosa de que ele se juntou aos “impuros”.
Confesso não entender por que tanto fel contra Simone. Não é pelo fato de ela ter vínculos com o agronegócio. Até porque dos governos petistas participaram Roberto Rodrigues e o então maior produtor de soja do mundo, Blairo Maggi. E o que dizer de Kátia Abreu, que virou amiga de Dilma quando foi ministra da Agricultura? Olha que há pouco tempo Katia ganhou o troféu “motosserra do ano”.
Vamos deixar de cretinice. O agronegócio é positivo para o País, os grãos são os principais produtos da nossa pauta de exportação, geram empregos e impostos. Ele não pode ser tratado como inimigo e nem Lula cometerá tamanho desatino. Agora o que não pode é adotar a hipocrisia de muitos petistas. Xingam o agronegócio no palanque eleitoral, mas buscam seu apoio no escurinho do cinema. Ou Lula não despachou emissários para conversar com eles?
Há agronegócio destruidor do meio ambiente? Há. Mas não é a maioria. Seu polo dinâmico já percebeu que o meio ambiente é um ativo e que a exportação de seus produtos pode ficar comprometida. O capitalismo, meus caros, guia-se pela lógica implacável do lucro, já dizia aquele velho barbudo nascido na Alemanha. Ora, na medida em que a destruição do meio ambiente e o extermínio passam a comprometer seus negócios, eles deixam para trás sua prática predatória. É o que vem acontecendo com a agricultura de fronteiras plenamente estabelecidas, como o centro-oeste. Na entrevista a Renata Lo Prete expressou muito o pensamento desse polo mais avançado. Quem dera se a maioria do agronegócio deixasse de apoiar Bolsonaro e passasse a apoiar a presidenciável do MDB. Isso seria um avanço!
Como candidato nenhum imagina governar de costas para o agronegócio, não é por causa disso que Simone Tebet vem sendo demonizada pelas hostes lularianas. Ninguém chuta cachorro morto, diz o velho e sábio ditado. Ora, se Simone tem apenas 1% nas intenções de voto no Datafolha ou no máximo 3%, segundo o Ideia Data, por que escorre tanto fel pelo canto da boca das brigadas virtuais da candidatura Lula?
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Não é por geração espontânea. Trata-se de uma ação articulada e vejo duas hipóteses não excludentes e complementares como explicação. A primeira é que nos cálculos petistas a candidatura Simone provoca temores no arraial petista. Não no sentido de alterar radicalmente o quadro, mas de ter um potencial de crescimento e de puxar o PT para uma disputa num terreno para o qual o PT não se preparou: o da disputa das ideias. Em sendo assim, é melhor matar essa ameaça logo no matadouro, daí a metralhadora giratória gastar pólvora, chumbo e bala em uma candidatura com apenas 1% das intenções de voto.
A segunda hipótese é o velho cacoete autoritário de querer instituir o pensamento único. No mundo binário, que vem desde o “nós contra eles” pregado por Lula lá em 2006, só existe o bem e o mal, o preto e o vermelho. E não há na política colorações multifacetadas. Eles são a encarnação do bem e quem não adere a eles é a própria encarnação do mal.
Voltando ao artigo de Marco Aurélio. Ele prova que ainda tem intelectuais inteligentes neste País. Parece redundância, mas não é. Num País onde uma Márcia Tiburi diz que quem não votar em Lula no primeiro turno é fascista e a plateia petista ainda aplaude e pede bis, faz bem à nossa alma ter um intelectual de cabeça altiva como Marco. Ele nos inspira a não nos deixarmos intimidar pelas patrulhas ideológicas – de direita ou de esquerda.
*Jornalista
Tudo conspira a favor de Moro: crise tucana, filiação de Santos Cruz, renúncia de Mandetta
Ciro Gomes pode ter perdido o terceiro lugar para Moro; outro adversário, o PSDB, parece um bêbado
Eliane Cantanhêde / O Estado de S. Paulo
O lançamento de Sérgio Moro pelo Podemos chacoalhou o tabuleiro de 2022, já se reflete nas pesquisas e confirma que a eleição não será uma mera guerra entre o presidente Jair Bolsonaro e o ex-presidente Lula. A sociedade e a movimentação política estão mostrando que o céu é o limite para uma terceira via.
Tudo vem favorecendo Moro: a filiação de ontem do general da reserva Santos Cruz ao Podemos é uma isca para o eleitorado de Bolsonaro, particularmente os militares; a desistência de Luiz Henrique Mandetta é uma questão de tempo e abre as portas do União Brasil (DEM e PSL) para Moro; a bagunça das prévias do PSDB enfraquece, e muito, o partido mais natural para ocupar a terceira via.
Bastou Moro se desvencilhar da consultoria internacional, tirar a gravata, passar a falar como político e até sorrir, que tudo parece conspirar a favor dele, que tem uma marca, a marca do combate à corrupção, ainda tão cara à sociedade e, portanto, ao eleitorado brasileiro. E já monta grupos de debate e discute nomes para a equipe.
Ciro Gomes (PDT) parou de falar e ninguém mais fala nele, que pode ter perdido o terceiro lugar para Moro. Outro adversário forte na terceira via, o PSDB, parece um bêbado e o fiasco das prévias não foi só uma “enrascada tecnológica”, como dizem os tucanos, mas uma demonstração de incompetência que fomenta a guerra interna.
Crescem as acusações de fraudes, chantagens e compra de votos entre as turmas de João Doria e Eduardo Leite, o que não só enfraquece o candidato, seja quem for, como implode as condições para a união na campanha.
Com Leite e Doria se engalfinhando, FHC e José Serra doentes, Geraldo Alckmin de namorico com Lula e Aécio Neves liderando uma bancada federal de viés bolsonarista, vai ter pena para todo lado. E pode ter tucano voando para o ninho de Moro.
No União Brasil, o PSL está dividido entre ser ou não Bolsonaro e o DEM virou uma massa disforme. Com a renúncia de Mandetta – inevitável –, o novo partido tende a esperar para ver que bicho vai dar no PSDB, ou pode deslizar para Moro. Mandetta e Moro são próximos e o PSL disparou com Bolsonaro e na onda anticorrupção – bandeira de Moro.
A entrada de Moro também atiçou Rodrigo Pacheco, que é do PSD e presidente do Senado, mas... não tem marca. Dá para alguém dizer por que votaria em Moro, PSDB, Ciro, Bolsonaro ou Lula. Mas por que em Pacheco?
Nem tudo são flores, muito menos certezas, para Moro. Até onde ele, e a própria terceira via, terão força para tirar Bolsonaro ou Lula do segundo turno? Mas o fato é que a chegada dele chacoalhou a eleição. Moro está no páreo.
Fonte: O Estado de S. Paulo
https://politica.estadao.com.br/noticias/geral,tudo-conspira-a-favor-de-moro-crise-tucana-filiacao-de-santos-cruz-renuncia-de-mandetta,70003909011
Terceira via para as eleições 2022 tende a ser dominada por ex-bolsonaristas
A vaga aberta no segundo turno estará no campo da direita, não da esquerda
João Villaverde* / O Estado de S.Paulo
Há apenas uma vaga disponível no segundo turno das eleições presidenciais. E ela não está aberta para a esquerda. É importante ter isso claro quando o assunto é “terceira via em 2022”. O ex-presidente Lula estará lá: o PT terminou todas as eleições desde 1989 em primeiro ou segundo lugar.
Dado que o contingente de 35-38% do eleitorado simpático a Lula dificilmente mudará de opinião até outubro, a disputa se dará principalmente sobre os eleitores que já se desgarraram de Bolsonaro e aqueles que ainda podem abandoná-lo. Esse universo não costuma votar na esquerda, mas na direita.
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Em lento derretimento popular, Bolsonaro se aproxima dos 20%. Quando a campanha adensar e diversos candidatos lembrarem o eleitorado da flagrante sabotagem da vacinação, as diversas crises institucionais por Bolsonaro provocadas e a inflação descontrolada, é razoável esperar perda adicional de votos.
Ex-ministros de Bolsonaro, como Sérgio Moro e Luiz Henrique Mandetta, trazem apelo a esse eleitorado (a “direita ex-bolsonarista”). Aceitaram trabalhar para Bolsonaro e romperam por razões distintas, mas seguem no mesmo campo.
Moro, que larga à frente nesse grupo, acredita que 2022 será uma repetição dos “símbolos” de 2018. Se ele estiver certo, bastará dobrar a aposta em sua canção de uma nota só (“corrupção, corrupção, corrupção”) e agregar os indefectíveis clichês eleitorais (“queremos educação de qualidade” etc).
No PSDB, a disputa inevitavelmente se dará contra Moro e Bolsonaro pela vaga final no segundo turno. O governador João Doria (SP), fez uma campanha abertamente bolsonarista em 2018. Desde então se distanciou, e seu esforço pela vacina é um trunfo eleitoral.
Já o governador Eduardo Leite (RS) foi menos bolsonarista, mas também correu nesta raia em 2018. Ao contrário das promessas não cumpridas de Paulo Guedes, Leite aprovou reformas previdenciária e administrativa, além de privatizações.
Ciro Gomes foi o primeiro a perceber que a vaga aberta no 2.º turno estará no campo da direita, não da esquerda. Por isso, calibrou sua campanha para a centro direita, mas é difícil imaginar que isso baste para convencer o eleitorado mais conservador. Resta ainda Simone Tebet, correndo por fora no MDB.
*PROFESSOR E DOUTORANDO EM ADMINISTRAÇÃO PÚBLICA E GOVERNO NA FGV-SP
Fonte: O Estado de S. Paulo
https://politica.estadao.com.br/noticias/geral,terceira-via-para-2022-tende-a-ser-de-ex-bolsonaristas-leia-analise,70003909003
Entrada de Moro na política divide siglas da terceira via
Ex-juiz da Lava Jato se filiou ao Podemos e aparece em terceiro lugar nas intenções de voto
Lauriberto Pompeu / O Estado de S. Paulo
BRASÍLIA — A filiação do ex-ministro da Justiça Sérgio Moro ao Podemos, com discurso de candidato à Presidência, mudou o xadrez da terceira via. Na lista dos partidos que querem fugir da polarização entre o presidente Jair Bolsonaro e o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva, em 2022, não são poucos os que veem com desconfiança a entrada do ex-juiz da Lava Jato na política.
“A candidatura de Moro só vai agravar sua crise de identidade. Ele vivia disfarçado de juiz e agora quer se disfarçar de político para resolver suas enormes contradições. Nenhuma das vestes lhe cabe”, provocou o pré-candidato do PDT, Ciro Gomes. O senador Cid Gomes (PDT-CE), irmão dele, foi na mesma linha. “Se tem mais gente para dividir, é claro que isso atrapalha e faz o jogo do Bolsonaro”, disse Cid.
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Na semana passada, Ciro havia suspendido a candidatura depois que a maioria da bancada do PDT votou a favor da Proposta de Emenda à Constituição (PEC) dos precatórios. Nesta terça-feira, 9, porém, o partido mudou de posição, conforme queria Ciro, e decidiu se posicionar contra a PEC. A proposta fura o teto de gastos públicos, com o objetivo de abrir espaço fiscal para o pagamento do Auxílio Brasil de R$ 400 até o fim de 2022, de emendas parlamentares e do fundo eleitoral destinado às campanhas.
O presidente do PSD, Gilberto Kassab, descartou de antemão uma aliança com Moro e disse não vê-lo como o nome mais agregador. “Eu acho que o perfil vencedor será aquele que representa a união do País, a pacificação, o compromisso com a solução dos problemas da saúde, em especial com essa questão da pandemia, e a melhoria na educação pública”, afirmou Kassab, que defende a candidatura do presidente do Senado, Rodrigo Pacheco (PSD-MG).
Crescimento. Pesquisa da Genial/Quaest divulgada nesta quarta-feira, 10, mostra que Moro está em terceiro lugar na disputa ao Palácio do Planalto, com 8% das intenções de voto, despontando como potencial nome da terceira via na polarização entre Bolsonaro e Lula. Na prática, Moro aparece empatado, na margem de erro, com Ciro Gomes, que tem 7%. Bolsonaro alcança 21% e Lula continua na dianteira, com 48%.
Congestionado, o campo da terceira apresenta atualmente outros dez nomes, incluindo três tucanos que vão disputar as prévias do PSDB para escolha do candidato, no próximo dia 21 — os governadores João Doria (São Paulo), Eduardo Leite (Rio Grande do Sul) e o ex-prefeito de Manaus Arthur Virgílio.
Na semana passada, o presidente do PSDB, Bruno Araújo, conversou com Moro por telefone. O tucano disse que o Podemos “sempre foi um parceiro” da terceira via, que o ideal é ter o menor número possível de candidatos nesse campo, mas evitou prever uma aliança. "Nosso foco agora são as prévias do PSDB, daqui a poucos dias", insistiu Araújo.
O deputado Luciano Bivar (PE), presidente do PSL e futuro comandante do União Brasil – fusão do partido com o DEM –, adotou o mesmo tom de cautela. “O MDB, o PSDB e o União Brasil estão juntos para montar uma candidatura de terceira via. Se o Sérgio Moro quiser entrar nesse bloco também, a gente vai discutir em conjunto", argumentou Bivar. “Não existe veto.”
Na avaliação do presidente do Cidadania, Roberto Freire, o ex-juiz da Lava Jato pode ser uma opção. "É mais um componente de alternativa à polarização Lula e Bolsonaro. Como o Cidadania desde sempre afirma que nós não podemos ter veto algum, vamos dialogar com essa candidatura. Vamos ver o que vai acontecer", disse ele.
Freire observou, porém, que a dianteira do ex-juiz em relação a outros nomes do grupo da terceira via não necessariamente vai se manter no ano que vem. "Qual o cenário de 2022? Pesquisa agora é uma fotografia de um processo que mal se iniciou".
O Cidadania lançou o senador Alessandro Vieira (SE) como pré-candidato ao Planalto, mas ele mesmo admite que pode desistir, caso surja um nome que una o campo. "Eu não tenho nenhuma exigência de ter meu nome em chapa ou nominata. Quero ver as ideias bem representadas e a gente só sabe disso mais adiante", argumentou Vieira. "Ele (Moro) está começando agora essa caminhada e desejo boa sorte. Quanto mais nomes surgirem, mais ideias", ponderou o senador.
Não é o que diz seu colega Cid Gomes. “Para mim, o Lula tem um lugar no segundo turno e um terceiro nome disputa o lugar com Bolsonaro", previu. “Se o Moro não quer ajudar o Bolsonaro, acaba ajudando.”
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STF agravou a briga dentro do Centrão pelo acesso ao cofre aberto por Bolsonaro
Wlliam Waack / O Estado de S. Paulo
O orçamento secreto agora não tão secreto vai continuar por outros meios, mas a decisão do STF garantiu a briga no consórcio montado para gastar à vontade em ano de eleição. Os consorciados são parlamentares do Centrão e Jair Bolsonaro.
O processo que levou ao orçamento secreto agora não tão secreto começou lá atrás, ainda durante Dilma, e tinha como objetivo limitar a capacidade do Executivo de manipular votos no Parlamento via distribuição de emendas. Foi “aperfeiçoado” por Rodrigo Maia e Davi Alcolumbre dentro do mesmo espírito, ou seja, o Legislativo avançando em suas prerrogativas.
Coube ao “gênio” político Jair Bolsonaro consumar a entrega de fatia importante de seus poderes – a alocação de recursos através do Orçamento – aos chefões do Centrão, hoje os verdadeiros donos das principais decisões de governo. Eles já estavam em rota de colisão entre si por conta do único fator que lhes interessa, que é acesso aos cofres e máquina públicas.
A disputa tinha sido trazida a público no começo da semana pelo chefão do PL, ao qual Bolsonaro pretende se filiar, e que já tem um pedaço do Palácio do Planalto. Concorre ali com o chefão do PP, dono de um outro pedaço. O enfraquecimento de outro chefão do PP, o presidente da Câmara, trazido pela decisão do STF de suspender em parte o orçamento secreto, complica o jogo entre esses senhores.
Que já era intrincado o suficiente considerando-se o papel do Senado, do qual depende agora a tramitação da PEC dos precatórios e seus R$ 90 bilhões de “espaço fiscal” (na verdade, uma gambiarra despudorada). Apenas nas aparências o presidente do Senado manifestou muxoxo com o ataque do STF ao orçamento secreto que ele diz que não existia. Na prática, seu poder político de barganha aumentou consideravelmente.
Há quem enxergue na decisão claramente política do STF de suspender as emendas do relator um esforço de “salvar” a democracia e princípios da Constituição. O que o Direito não consegue, porém, é salvar o Brasil do seu próprio sistema político, que funciona (desde sempre?) para alimentar grupos privados (partidos políticos) que se juntam para apropriar-se de recursos públicos (estruturas do Estado e fundos) em benefício próprio.
O resultado dessa confusão, em parte um espelho da confusão mental de Bolsonaro, e da qual o grande público está alheio, é uma considerável paralisia política agravada por um quadro econômico que permanece em crescimento muito abaixo do necessário com medíocre recuperação de emprego e renda. O consórcio Centrãobolsonaro tem condições apenas de agravar esse quadro.
Fonte: O Estado de S. Paulo
https://politica.estadao.com.br/noticias/geral,consorcio-falido,70003895257