STF
Ruy Castro: Aos biógrafos de Bolsonaro
O trabalho deveria começar por seus antepassados: Hitler, Jack o Estripador, Drácula, Herodes e Belzebu
Sempre achei um risco biografar gente viva. Não por medo do biografado ou de sofrer um processo, mas por motivo mais sério: como contar uma história que ainda não terminou? Imagine se, no dia seguinte ao lançamento de uma biografia, o biografado comete algo terrível, como estrangular seu papagaio ou fugir com a mãe de sua mulher. Em um segundo lá se vai o trabalho de anos do biógrafo —por que ele não previu que seu biografado seria capaz daquilo? Donde o certo é esperar que o fulano abotoe naturalmente o paletó, para só então mergulhar na investigação de sua vida.
Mas, com Jair Bolsonaro, não se pode mais esperar que ele vá para o diabo que o carregue. É urgente começar a biografá-lo porque, pela velocidade de sua trajetória —não passa um dia sem praticar um crime contra a democracia, a saúde, a educação, a ciência, a cultura, a economia, a ecologia, a diplomacia, a Justiça, os direitos humanos e a vida—, em breve ela não caberá em um volume. E isso apenas desde que assumiu a Presidência.
Ai está. Uma biografia de Bolsonaro deveria recuar aos seus antepassados, como Hitler, Jack o Estripador, Drácula, Herodes e Belzebu; explorar suas origens em Glicério (SP), burgo de 2.000 habitantes em 1955, onde depositaram o ovo do qual ele nasceu— e chegar à sua infame carreira militar e ascensão política. Vai-se revelar o seu longo e meticuloso processo de corrupção de colegas, servidores, generais, policiais e juízes, e, de passagem, descobrir como construiu seu patrimônio imobiliário e transferiu esse know-how para filhos e mulheres.
O importante é que, em alguma etapa, surja algo que explique o seu grau de desumanidade estudada, demência, crueldade e ódio.
Pelo que sei, já há profissionais biografando Bolsonaro. Só garanto que não sou um deles. Há um limite para a náusea, e basta-me ter ânsias de vômito quando o vejo na televisão.
Bruno Boghossian: Decantação da pandemia no eleitor deve definir novo presidente
Divisão entre medidas de saúde e efeitos na economia pode permanecer até 2022
Quando os americanos foram às urnas em novembro do ano passado, as mortes por Covid-19 voltavam a se aproximar de 1.000 por dia nos EUA. O coronavírus foi um dos temas mais presentes da eleição presidencial, com uma característica que se tornou a marca política da pandemia: a divisão entre as mortes e seus impactos sobre a economia.
A atuação de Donald Trump e os efeitos da doença no mercado de trabalho racharam o país. Entre os eleitores que consideravam a economia uma prioridade, 78% votaram no republicano, segundo pesquisas de boca de urna. Para aqueles que diziam que o importante era conter o vírus, 79% escolheram Joe Biden.
O democrata ficou em vantagem porque mais americanos achavam importante salvar vidas (52%) do que recuperar a atividade econômica (42%). No Brasil, a escalada da doença e a decantação da crise no humor do eleitorado podem definir o próximo presidente.
A questão central é se a pandemia e seus efeitos serão tópicos relevantes até lá. A depender do cenário do país, o eleitorado pode usar o voto para julgar a conduta de Jair Bolsonaro, pode ir às urnas para escolher outro rumo na administração da crise ou pode ignorar a doença em nome de outros interesses.
Bolsonaro desdenhou da morte de milhares de brasileiros porque acreditava que seus efeitos políticos seriam limitados. Em sua matemática, faria mais sentido oferecer a bandeira da defesa da economia a qualquer custo, em contraponto a personagens como João Doria e Luiz Henrique Mandetta.
O resultado dependerá da situação econômica e de quanta responsabilidade o eleitor atribuirá ao governo. Bolsonaro só será beneficiado se o eleitor enxergá-lo como um nome capaz de liderar a recuperação.
A volta de Lula bagunça o jogo porque o petista tenta aliar o discurso da saúde a uma pauta de proteção aos mais pobres e de enfrentamento das dificuldades econômicas. Se a plataforma vingar, ele será um rival de Bolsonaro em duas frentes.
Janio de Freitas: Justiça com injustiça é impostura
O que já é conhecido na conduta de Moro não suscita suspeita, induz certeza
As duas ações em que Edson Fachin emitiu decisão e Gilmar Mendes proferiu voto, apesar de formalmente separadas, tratam do mesmo tema.Na aparência, a conduta ilegal e persecutória de Sergio Moro nos processos com que retirou o candidato Lula da Silva (39% das preferências) da disputa pela Presidência em 2018, encaminhando a eleição de Bolsonaro (18%). A rigor, o que está na essência das ações judiciais é uma operação de interferências distorcivas no processo eleitoral que comprometeram, por inteiro, a legitimidade de uma eleição presidencial.
Nem Sergio Moro é “caso de suspeição”, nem a ocupação da Presidência por Bolsonaro, mesmo que vista como legal, tem legitimidade.
O que já é conhecido —e falta muito— das violações do Código de Processo Penal, da Lei Orgânica da Magistratura e da própria Constituição na conduta judicial de Sergio Moro não suscita suspeita, que é dúvida: induz certeza. São fatos. Não retidos em memória, mas em diferentes registros comprovadores e consultáveis, muitos de longo conhecimento em tribunais e em parte da população.A torrente desses fatos no voto de Gilmar Mendes sufoca qualquer dúvida sobre sua caracterização: são atos deliberados, planejados, combinados, marginais às normas e à moralidade judicial.
Nessa delinquência de cinco anos, do princípio de 2014 ao fim de 2018, a ação julgada por Edson Fachin refere-se à preliminar de quatro inquéritos contra Lula, entre eles os do apartamento de Guarujá e do sítio de Atibaia. Quando se vê a razão de Fachin para anular essas condenações, fica quase impossível acreditar que tais processos tramitassem por anos. Dessem em condenações por SergioMoro. Até em aumento das penas pelo Tribunal Federal Regional do Rio Grande do Sul, o TRF-4, com base em relatório pouco menos do que ininteligível de um desembargador idem, João Gebran.
Quisesse, ou não, dar uma sentença que preservasse Sergio Moro do processo sobre a suspeição que é certeza, Edson Fachin viu-se com uma constatação indescartável: “não restou provado vínculo” entre os benefícios atribuídos a Lula, tanto na acusação como na condenação, e negócios ou desvios na Petrobras.
Logo, esses processos foram criados e receberam sentença ilegalmente em juízo restrito a desvios na estatal. Convém enfim realçar: a anulação das condenações de Lula por Moro não decorreu, portanto, apenas de incompetência geográfica da 13ª Vara Criminal do Paraná, como tem parecido. Procedeu, também, da violação deliberada de Moro às leis processuais e penais. Com o fim de fazer a prisão de um candidato à Presidência, o que daria a vantagem a outro. Crime, pois não?
Nada se deu sob sigilo nessa delinquência contra as instituições do Estado de Direito e a eleição legal. Muito ao contrário, a construção do escândalo era um componente planejado da operação.Gilmar falou, a propósito, em conluio e consórcio Lava Jato-“mídia”. Não dispensou nem as orientações de um repórter aos dallagnóis. Incontestável, como mais um capítulo eleitoral da imprensa/TV. Mas uma ressalva é de justiça: em meio à enorme pressão pró-Lava Jato, a Folha pode ter pecado de corpo, mas não renegou a velha alma. Os poucos juristas, advogados e comentaristas da casa que apontaram a delinquência e as arbitrariedades da Lava Jato tiveram espaço e liberdade assegurados nestas páginas.
Não é menos justo, em sentido oposto, dizer que os Conselhos Nacionais do Ministério Público e da Justiça, assim como o Supremo Tribunal Federal, souberam sempre o que se passava na Lava Jato. Por experiência no Judiciário e no MP, por informações, por muitos recursos processuais de advogados e pelos poucos trabalhos da “mídia” fora da moda. Ao seu dever fiscalizador preferiram o silêncio e a inação, traindo-se e traindo a Justiça e o Estado de Direito.
Se tudo precisar de recomeço, que seja. Importante é que a Justiça está se despindo de uma impostura, ao tempo mesmo em que se reergue na defesa dos cidadãos e do país sob ataque da doença e do governo, ambos letais.
Brasil corre risco de ter maior número absoluto de mortes por Covid, diz revista da FAP
Editorial da Política Democrática Online de março critica erros do presidente Bolsonaro
Cleomar Almeida, Coordenador de Publicações da FAP
O governo do presidente Jair Bolsonaro (sem partido) errou de forma costumaz na falta de implementação de política nacional de enfrentamento à pandemia da Covid-19 e persiste nos seus erros. A análise é do editorial da revista Política Democrática Online de março.
A revista mensal é produzida e editada pela FAP (Fundação Astrojildo Pereira), sediada em Brasília e vinculada ao Cidadania. Todos os conteúdos podem ser acessados gratuitamente na versão flip, disponível na seção de revista digital do portal da entidade.
“Com o sucesso da campanha de vacinação nos Estados Unidos, corremos o risco de ver em pouco tempo nosso país como número um no mundo em número absoluto de óbitos”, afirma um trecho do editorial. A doença já matou mais de 275 mil brasileiros.
“Percurso trágico”
De acordo com a revista, tentar evitar esse resultado é premente para o país. “Igualmente importante, contudo, é deixar claro, para o conjunto dos cidadãos, os verdadeiros responsáveis pelo percurso trágico que estamos a seguir”, enfatiza.
A tarefa de todas as forças democráticas, nos estados, nos municípios, em todas as instâncias do Legislativo, segundo o editorial, é persistir na resistência para suprir a omissão e a oposição do governo para trabalhar em prol de medidas contra a Covid-19.
As medidas, de acordo com a revista, incluem distanciamento social, uso de máscaras, obtenção no número suficiente de doses das vacinas disponíveis, assim como o acesso ao auxílio emergencial por parte daqueles que dele necessitam.
Variantes do coronavírus
“A circulação do vírus por grandes concentrações de pessoas, sem vacina e sem distanciamento social, parece ter propiciado o surgimento das novas variantes, capazes de infectar novamente pacientes já curados”, observa o editorial.
O texto diz, ainda, que a ilusão da imunidade natural da população ao preço alto de milhares de óbitos evaporou-se. “Os óbitos aconteceram, mas nenhum benefício perdurou, e o Brasil é hoje potencial fonte de risco para os países que lograram êxito no enfrentamento da pandemia”, critica a revista.
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Luiz Werneck Vianna: 'Desertificação da política é o legado da Lava Jato',
Para cientista político, operação ‘morre’ pelos próprios erros, como ações 'messiânicas' e querer 'salvar o País'
Wilson Tosta, O Estado de S. Paulo
RIO - Depois que o ministro Edson Fachin, do Supremo Tribunal Federal, anulou as condenações do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva e considerou a 13.ª Vara Federal em Curitiba incompetente para julgá-lo, o cientista político Luiz Werneck Vianna afirmou ao Estadão que a Lava Jato "morreu de morte morrida". Para o professor da PUC-Rio, a ação dos procuradores da força-tarefa e do então juiz Sérgio Moro tinha objetivo "messiânico" – mudar o País pelo Código Penal –, durou demais e deu errado. Vianna descartou ainda a possibilidade de Moro ser candidato à Presidência, e disse que o combate à corrupção será tema "lateral" em 2022.
Que balanço faz desse processo, com a decisão de Fachin?
Demorou muito. Não é a primeira vez que a Justiça tarda e falha. Mas o fato é que a decisão é inatacável do ponto de vista jurídico. A Lava Jato não podia assimilar todos os casos de corrupção que estavam ocorrendo no País. Desde o começo, foi um erro monumental, em que juízes e procuradores jovens, eu diria provincianos, assumiram o papel de salvadores do País. Andaram estudando a operação que transcorreu na Itália (Mãos Limpas) e aplicaram aqui. Fizeram uma leitura descontextualizada da situação italiana. E mobilizaram a mídia como peça de sustentação. Acho que foi um erro.
Mas tudo que o STF está revendo foi aprovado pelo próprio STF. Por que a mudança agora?
Não creio que tenha sido uma manobra conspiratória. A Lava Jato… ela durou demais. Nasceu de uma concepção abstrusa, em que um pequeno núcleo de procuradores e juízes assumiu um papel messiânico, de salvação da política. Querer fazer política pelo Judiciário é um caminho ruim. E foi o que a “República de Curitiba” tentou. Pelo processo formal, os processos não deveriam ser vinculados a Curitiba, mas à Justiça Federal. Houve um erro humano. Desqualificou-se a política, os partidos, e ficamos em um deserto. O legado da “República da Lava Jato” é a desertificação da política.
Qual foi o ponto de virada, no qual se notou que a Lava Jato estava indo além do que poderia?
Foi um processo. Começa com a revisão da política da chamada condução coercitiva. Havia as prisões demoradas, a que eram submetidos os indiciados nas ações, ações cercadas de espetaculosidade. A mídia participou disso, de uma forma inteiramente franca e aberta. Não existiria "República de Curitiba" sem a mídia.
Essas prisões prolongadas muitas vezes foram confirmadas pelo Supremo…
Mas de outras vezes, não. A sociedade também não estava atenta ao que se passava, na medida em que a luta contra a corrupção encontrou guarida na alma popular. Encontrou legitimidade nos anseios escondidos, ocultos, da sociedade.
Os integrantes da Lava Jato atendiam a uma demanda social?
É, eles foram levados à desgraça pelo sucesso. Foi um grande sucesso, não é? Chegou-se até a especular uma candidatura de Moro a presidente da República.
Isso está afastado?
Está. Moro sai desse processo inteiramente desqualificado como juiz. Ele foi parcial.
Que saldo fica?
O saldo primeiro, para mim, é o de que não se deve combinar ação política com ação judiciária. São duas dimensões: a política é uma coisa, a Justiça é outra. Houve essa combinação esdrúxula, e deu no que deu.
Mas isso, de certa forma, continua, não? Porque agora, com a decisão de Fachin, a Justiça também interveio na política...
Ah, continua. Isso agora faz parte do nosso DNA. A política se judicializou no Brasil. Por falta de política, falta de partido. Não se veem medidas judiciais interferindo na questão sanitária brasileira? Na compra de vacina? No lockdown? Isso foi trazido para a política pelos erros da própria política. E agora dificilmente sai.
Quais são as consequências do retorno de Lula à política?
O fato é que, para escapar da polarização extremada, Bolsonaro e Lula, seria preciso que as forças do centro tivessem outra capacidade de interferir nos acontecimentos. Mas o centro está fraco também!
Existe centro na política, com chances de sucesso eleitoral?
Não sei se o centro vai se reconstituir. Ele pode se reconstituir para ter um papel marginal. Penso que, se o PT tiver maior lucidez, não vai ser o protagonista da sucessão. Seria, nessa minha projeção utópica, o construtor de uma frente de centro-esquerda. Ele participaria, evidentemente, ativamente. Agora, sem o papel principal. É possível? Ele não tem história disso. Sempre procurou ser o protagonista. E ficou claro, no discurso de Lula, que isso vai persistir.
Voltando à Lava Jato: a postura messiânica do Ministério Público e da Justiça acabou?
A Lava Jato está acabada. Morreu de morte morrida.
Não foi de morte matada?
Não.
Não foi o STF que matou?
Pode ter sido um golpe de misericórdia, mas estava morta. Passou da conta. Foi um projeto messiânico de salvação do Brasil pela reparação da criminalidade, pela punição, pela extirpação do crime. Isso é uma proposta fora de sentido. Os males do Brasil não são esses. Tem corrupção, sempre teve. É necessário que se combata a corrupção de outra forma, não de uma forma que comprometa todo o tecido político, como se fez. Queriam salvar o País por mecanismos judiciários, pelo Código Penal. Não é por aí.
Em 2022, um candidato com a bandeira do combate à corrupção seria então enfraquecido?
Olha, a bandeira da luta contra a corrupção não fará parte da próxima sucessão eleitoral de forma protagônica. Vai ser um tema adjetivo, lateral.
Um dos mais citados em julgados do STF, Marco Marrafon defende educação pública
Diretor executivo da FAP teve nome listado em pesquisa sobre controle de constitucionalidade concentrado
Cleomar Almeida, Coordenador de Publicações da FAP
Na interiorana cidade de Juara, a 700 quilômetros de Cuiabá, um menino começava a cursar o ensino fundamental nos bancos da sala de aula da Escola Estadual Oscar Soares, ainda no ano de 1985. Nem imaginava que em 2021, 36 anos depois, estaria na 30ª posição entre 114 constitucionalistas de todo o Brasil mais citados pelo STF (Supremo Tribunal Federal).
Diretor executivo da FAP (Fundação Astrojildo Pereira), o advogado Marco Aurelio Marrafon, que é advogado constitucionalista há 19 anos, está na relação dos juristas brasileiros citados pelo STF em julgados em sede de controle concentrado de constitucionalidade. A pesquisa foi divulgada, no início deste mês, pelo Portal Justiça em Foco.
“Estar entre os 30 mais citados no STF é uma grande honra e demonstra que o conteúdo que produzimos está dando o devido retorno à sociedade, servindo como base para as garantias constitucionais do país”, aponta. Ele, que já publicou quatro livros e mais de 50 artigos, é presidente da ABDConst (Academia Brasileira de Direito Constitucional).
“Transmitir conhecimento”
O nome de Marrafon foi citado 17 vezes desde 2013, o que, em média, equivale a mais de duas vezes por ano, até 2020, limite da pesquisa. Ele é professor de Direito e Pensamento Político na graduação, no mestrado e no doutorado em Direito da Uerj (Universidade do Estado do Rio de Janeiro).
“Isso é um dos grandes motivos pelos quais a gente estuda e um professor se dedica, porque a gente pensa em transmitir conhecimento para que se chegue àqueles que têm condição de fazer um mundo melhor”, comemora, sem esconder a alegria pelo reconhecimento.
Na relação da pesquisa realizada pela advogada Daniela Urtado e pelo bacharel em Direito Diego Kubis Jesus, Marrafon aparece ao lado de nomes os de José Afonso da Silva, Gilmar Mendes, José Alfredo de Oliveira Baracha, Ingo Wolfgang, Ives Gandra Martins, Paulo Bonavides e o paranaense Clèmerson Merlin Clève.
“Muito além do reconhecimento acadêmico, uma das coisas que me deixaram mais feliz e lisonjeado é a possibilidade de produzir conhecimento que gere impacto e que, efetivamente, faça a diferença na vida das pessoas”, agradece Marrafon.
Análise de dados
Os pesquisadores analisaram os dados a partir de julgados em sede de controle concentrado de constitucionalidade, no período de 01 de janeiro de 2013 a 31 de dezembro de 2020. O estudo foi realizado nos meses de janeiro e fevereiro de 2021.
A pesquisa analisou 1.147 julgados. Foram 733 ADIs (Ações Direito Inconstitucionalidade), 47 ADPFs (Arguições de Descumprimento de Preceito Fundamental), 11 ADCs (Ações Declaratórias de Constitucionalidade) e 3 ADOs (Ações Diretas de Inconstitucionalidade por Omissão). Todas separadas em procedentes e parcialmente procedentes.
Os julgados improcedentes totalizaram 317 ADIs, 25 ADPFs, 1 ADC e 4 ADOs. Os pesquisadores consideraram somente uma citação por acórdão para cada autor, ainda que mais de uma obra tenha sido citada na decisão.
Nomes influentes
Os autores classificaram como constitucionalista quem tem produção acadêmica direcionada ao Direito Constitucional ou que esteja vinculado, institucionalmente, à área. Eles consideraram, ainda, nomes influentes do Direito brasileiro, como Ruy Barbosa, Vicente Ráo, Pontes de Miranda, entre outros.
“Recebi a notícia com muita alegria, porque é o coroamento de uma carreira que mostra a importância da educação pública”, diz Marrafon. De Juara, ele se mudou para Cuiabá para cursar o ensino médio e, depois, estudar Direito na UFMT (Universidade Federal de Mato Grosso), concluindo a graduação em 2002.
Depois, ele se tornou mestre (2005) e doutor (2008) em Direito do Estado pela UFPR (Universidade Federal do Paraná), com estudos doutorais (sanduíche) na Università degli Studi di ROMA TER, na Itália, sob orientação do professor Eligio Resta.
“Educação transforma”
"É o conhecimento que mostra que a educação transforma e dá possibilidades de um menino que fez ensino fundamental no interior de Mato Grosso chegar a grandes centros e trazer conhecimento que possa ser produtivo e útil a toda sociedade brasileira”, alegra-se.
Ele atua, principalmente, nos temas sobre Direito Constitucional, organização do Estado, federalismo e desenvolvimento regional, efetividade das políticas públicas, Teoria da Constituição e Jurisdição Constitucional, democracia e direitos fundamentais, hermenêutica jurídica e decisão judicial.
Respeitado por juristas, Marrafon tem trajetória marcada pela produção de conhecimento útil e que reforça “a importância da educação como movimento de transformação”, como ele mesmo diz.
Veja a lista completa dos constitucionalistas citados na pesquisa
Face deletéria de Bolsonaro é destaque da Política Democrática Online de março
Esperança com a tecnologia de vacinas contra Covid e violação a direitos das Forças Armadas estão entre os 15 conteúdos na nova edição
Cleomar Almeida, Coordenador de Publicações da FAP
A “face mais deletéria” do presidente Jair Bolsonaro (Sem partido), a política de armamento da população como violação ao papel constitucional das Forças Armadas, a tecnologia de vacina contra Covid como luz sobre doenças graves são os principais destaques da edição de março da revista Política Democrática Online, lançada neste sábado (13/3).
A revista mensal é produzida e editada pela FAP (Fundação Astrojildo Pereira), sediada em Brasília e vinculada ao Cidadania. Todos os conteúdos podem ser acessados gratuitamente na versão flip, disponível na seção de revista digital do portal da entidade.
Nesta edição, análises sobre política nacional e internacional, meio ambiente, economia, ciência, literatura e cinema em 11 artigos, uma entrevista exclusiva, uma reportagem especial, além do editorial e charge de JCaesar.
“Enfraquecimento da democracia”
Principal destaque desta edição, entrevista exclusiva sobre avaliação do governo Bolsonaro foi concedida pelo mestre e doutor em História pela USP (Universidade de São Paulo), Alberto Aggio. Ele é professor titular em História pela Unesp (Universidade Estadual Paulista), com pós-doutorado nas universidades de Valência (Espanha) e Roma3 (Itália).
“Acho que o Bolsonaro se configura como um governo, se não ameaçador à nossa democracia, pelo menos um governo que visou, desde o início, a um enfraquecimento dela”, critica Aggio. “Bolsonaro é a face mais deletéria, mais grave da política da Nova República”, avalia o professor da Unesp.
No editorial de sua 29ª edição, a revista Política Democrática Online faz crítica incisiva à falta de política nacional de enfrentamento à pandemia da Covid, com reflexos nas mais de 275 mil mortes de brasileiros por causa de complicações da doença.
“Não é possível subestimar a responsabilidade do governo federal pela situação de vulnerabilidade crescente em que os cidadãos brasileiros se encontram hoje”, diz um trecho. “Todos os itens da agenda negacionista foram por ele perseguidos com empenho”, emenda.
“Novas tecnologias”
Já a reportagem especial desta edição mostra estudos sobre vacinas da Covid em andamento com técnicas genéticas que podem ser aplicadas em tratamento contra doenças graves, como câncer e esclerose múltipla.
“Novas tecnologias para produção de vacinas, notadamente aquelas que usam o material genético do vírus Sars-Cov-2, podem rapidamente ser adaptadas para novos agentes causadores de doenças”, afirma um trecho da reportagem.
Em um dos artigos de destaque, o ex-deputado federal e ex-ministro da Defesa e extraordinário da Segurança Pública do governo Michel Temer (MDB) Raul Jungmann diz que o armamento da população, como pretende Bolsonaro, significa também ferir o papel constitucional das Forças Armadas.
Registro de armas de fogo
“Segundo a Polícia Federal, em 2020, o registro de armas de fogo cresceu 90% em relação ao ano anterior, o maior crescimento de um ano para outro já registrado pela série histórica”, afirma. Jungmann também é ex-ministro do Desenvolvimento Agrário e ex-ministro extraordinário de Política Fundiária do governo FHC.
Em um dos artigos, o economista Guilherme Acciolly avalia que o avanço do desmatamento é incentivado por se dar majoritariamente sobre terras públicas e crescentemente sobre áreas protegidas. Portanto, segundo ele, “com custo de aquisição nulo”.
O conselho editorial da revista Política Democrática Online é formado por Caetano Araújo, Francisco Almeida e Luiz Sérgio Henriques.
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Marcus Pestana: Nada é tão ruim que não possa piorar
A democracia moderna nasceu nos escombros do feudalismo para dar vazão ao nascente capitalismo. A monarquia absolutista, as barreiras comerciais, a fragmentação territorial eram obstáculos à expansão da livre iniciativa que demandava liberdade para que empresários, trabalhadores e consumidores se movimentassem livres e descentralizadamente no mercado. Na Inglaterra, na França e nos EUA moldou-se a democracia, com o Estado laico e liberal, eleições livres, separação dos poderes e partidos políticos como instrumentos de disputa política. Ao sistema político caberia arbitrar os conflitos e apontar os rumos.
No Brasil, temos uma democracia consolidada, mas jovem. Períodos democráticos são raros: apenas o interregno de 1945 a 1964 e a Nova República, de 1985 a 2021, podem ser caracterizados como ciclos democráticos. O Estado sempre foi forte e a sociedade frágil. O populismo, o caudilhismo, o autoritarismo, o personalismo tiveram presença central na história política brasileira.
Agora, em plena crise que se abateu sobre nós – sanitária, econômica, política e social, bastou o Ministro Edson Fachin devolver a elegibilidade ao ex-presidente Lula, para fervilhar no mundo político uma absurda antecipação da sucessão presidencial, dentro da camisa de força maniqueísta da polarização dos extremos. À sociedade não interessa, neste momento, a candidatura de ninguém. As pessoas estão preocupadas com vacina, emprego, sobrevivência e auxílio emergencial.
Descobri cedo a distância entre modelos ideais e a política real. Se dependesse de mim e das minhas convicções, já teríamos um sistema parlamentarista baseado no voto distrital misto proporcional e um quadro partidário consistente e racional. Nada mais distante de nossa realidade.
O presidencialismo americano se organiza em torno de dois grandes partidos – democratas e republicanos. Na Assembleia Nacional Francesa, há a presença de 15 partidos políticos, mas o “A República em Marcha”, do Presidente Emmanuel Macron, ocupa 303 das 577 cadeiras, garantindo estabilidade e governabilidade. O Congresso espanhol tem 16 partidos, mas a dinâmica política gira em torno de 4 grandes partidos (PSOE, PP, Vox, Podemos). Na Itália, a mesma coisa, as colunas vertebrais são o Movimento 5 Estrelas, Liga Norte, PD e Força Itália. Não é diferente em Portugal, com o PS e o PSD dominando a cena.
Aqui no Brasil, a situação é sui generis. São 24 partidos representados no Congresso, sendo que o próprio Presidente da República está sem partido e a fragmentação é total. Os dois maiores partidos na Câmara dos Deputados, PSL e PT, têm pouco mais de 50 cadeiras num total de 513. Qualquer governo terá imensa dificuldade de formar maioria sólida e estável.
Mas, nada é tão ruim que não possa piorar. O parlamentarismo já levou duas lavadas nos plebiscitos de 1962 e 1993. Fui o autor da PEC do voto distrital misto na reforma de 2015, que precisava de 307 votos e só teve 99. Salvamos dois avanços: a cláusula de desempenho e o fim das coligações proporcionais, o que a longo prazo, esperamos racionalizar o quadro partidário brasileiro e sua representação.
Não é que o “Centrão” começou a se movimentar para acabar com esses dois pequenos avanços já em 2022 e retrocedermos à situação anterior. Como disse Tom Jobim, definitivamente “O Brasil não é para principiantes”.
*Marcus Pestana, ex-deputado federal (PSDB-MG)
Adriana Fernandes: É o fim da linha daqui para frente da agenda econômica
PEC foi última chance para Guedes aprovar cortes permanentes de gastos
A PEC do auxílio emergencial aprovada esta semana pelo Congresso foi a última chance real do ministro Paulo Guedes de aprovar medidas de corte de despesas permanentes até o término do governo Jair Bolsonaro.
É fim de linha daqui para frente nesse campo da agenda econômica. A equipe de Guedes optou e brigou até o último momento para amarrar a concessão do auxílio a um conjunto de medidas que desse um norte para a trajetória das contas públicas nos próximos anos.
Não ganhou tudo. Nem perdeu todo o pacote, como disse o próprio presidente Jair Bolsonaro a Guedes para justificar a sua atuação na linha de frente para desidratar os gatilhos, que são as medidas fiscais a serem acionadas no futuro para o controle de despesas. Acabou sendo liberada a progressão automática nas carreiras, permitindo aumento nos salários.
Bolsonaro subiu no muro se equilibrando entre a base eleitoral e a (falsa) narrativa de responsabilidade fiscal que ele abraça toda vez que o mercado financeiro entra em turbulência com alta do dólar, dos juros e queda da Bolsa. O saldo final poderia ter sido o auxílio sem as tais contrapartidas fiscais, que o ministro colocou na mesa de negociação num jogo de tudo ou nada. Não foi 8 nem 80.
Como o cenário pior (de fatiamento da PEC) não se concretizou, o Ministério da Economia comemora e monta agora uma força-tarefa para mostrar que foi aprovada uma “boa PEC”, com a derrubada de vários destaques retirando todos os gatilhos.
Num ambiente de traições dentro do próprio governo, os integrantes da equipe econômica partiram para a negociação direta no Congresso nos dias da votação, entre eles, Roberto Campos Neto. O presidente do Banco Central foi vítima até mesmo de fake news de que estaria de acordo com a blindagem aos servidores das Forças militares. Teve de ir a campo para desmentir e apoiar a PEC com os gatilhos.
Agora, eles trabalham para dar luz aos ganhos da PEC, mostrar o que “ninguém está vendo”: o resto da PEC. A narrativa é que o texto aprovado muda toda a trajetória de despesas, como aconteceu com a reforma da Previdência, aprovada no primeiro ano do governo. Assim como a Previdência, a PEC fiscal não promove a queda das despesas, mas desacelera.
Como muitos economistas mostraram, porém, não há redução de despesas obrigatórias para já, uma vez que as contrapartidas se transformaram em expectativa de melhoria da despesa futura. O teto de gastos também continuará pressionando o Orçamento, uma vez que não houve abertura de espaço nas despesas obrigatórias, como se esperava no início da discussão da PEC.
As condições aprovadas no texto só garantem o acionamento dos gatilhos entre 2024 e 2025, preservando 2022 (ano de eleições) de medidas mais duras. O reforço do programa Bolsa Família, outro problema para os políticos, tudo indica estará resolvido no segundo semestre com a “economia” que será feita durante o pagamento das parcelas do novo auxílio emergencial.
Após a votação da PEC, a equipe econômica quer partir com tudo para a reforma administrativa como prioridade da agenda. Mas a proposta não afeta os servidores atuais e tampouco terá foco de corte de gastos. Restará ampliar a linha de defesa para evitar aumento de gastos e perda de arrecadação num ambiente contaminado pela disputa eleitoral. No jogo, vai ter de trabalhar na retranca para os gastos não explodirem nem ter perda de arrecadação com mais benesses.
Para as lideranças, o Congresso fez a sua parte aprovando a PEC. Está todo mundo exausto desse debate e querendo virar a página. A antecipação das eleições de 2022 é a principal razão para a pauta de ajuste fiscal minguar entre os governistas, que querem reforçar o “cheque” ao presidente para ganhar a eleição.
Guedes e o seu discurso de ajuste em nada ajudam nesse caminho. A articulação do presidente durante a votação ampliou ainda mais o divórcio do Palácio do Planalto com as medidas da política econômica do início do governo.
Daí que, à boca pequena, no mundo político de Brasília, o que se fala, desde as eleições para as presidências da Câmara e do Senado, é que o Centrão “daria” a Guedes a aprovação de mais “uma ou duas reformas” antes da sua saída do governo, que estaria contratada pelo próprio presidente. É provável que essa espada no pescoço do ministro fique pairando no ar para ele ceder e ceder cada vez mais.
João Gabriel de Lima: Só os ingênuos acham que a campanha será em 2022
Se postulantes não colocarem logo os blocos na rua, Lula e Bolsonaro brincarão sozinhos o carnaval das eleições
A ideia de que é cedo para iniciar uma campanha presidencial, dado que temos uma pandemia para combater, é politicamente ingênua. Em democracias, os eleitores estão sempre julgando potenciais candidatos. Para os governantes, fazer a coisa certa em situações de crise é parte da campanha. Se os resultados aparecem, aumentam as chances de reeleição.
O raciocínio vale para os opositores. Nas situações de crise, eles têm a oportunidade – e a obrigação – de fiscalizar e criticar. Devem também apresentar alternativas, para que o eleitor acredite que farão melhor caso conquistem o poder.
Tal regra básica das democracias merece ser lembrada nesta semana, em que o ex-presidente Lula, para usar uma expressão dele próprio, colocou seu bloco na rua. Fez um discurso clássico de candidato dois dias depois da decisão do juiz Edson Fachin – tão clássico que não assumiu ser candidato. Em sua fala, colocou-se na posição de antagonista preferencial do atual presidente, Jair Bolsonaro – que está em campanha desde o primeiro dia de governo.
O editor Daniel Bramatti, da área de jornalismo de dados do Estadão, analisou no domingo, dia 7, uma pesquisa em que Lula lidera o potencial de voto para 2022. Em segundo lugar aparece Bolsonaro. No levantamento feito pelo instituto Ipec, os dois têm uma certa folga sobre o segundo pelotão – composto por Sérgio Moro, Luciano Huck, Fernando Haddad e Ciro Gomes. Teríamos um segundo turno já desenhado para 2022?
A resposta é não se considerarmos outra pesquisa – esta qualitativa, realizada nas classes A e B e patrocinada pela fundação alemã Friedrich Ebert. Ela mostra falta de convicção entre os potenciais eleitores de Lula e Bolsonaro. No levantamento, feito no fim do ano passado, o eleitor à direita já criticava Bolsonaro pelo desastre no combate à pandemia.
Do outro lado, segundo a pesquisa, há desconforto com o projeto hegemônico do PT e a falta de renovação nas esquerdas. “Políticos jovens como Guilherme Boulos aparecem como opções até entre eleitores de centro”, diz a cientista política Camila Rocha, coordenadora do levantamento ao lado da socióloga Esther Solano. Ela é a personagem do minipodcast da semana.
Camila Rocha transita por várias correntes ideológicas, com interlocutores à esquerda e à direita. Ela é autora de “Menos Marx, Mais Mises”, uma tese de doutorado sobre os liberais brasileiros da nova geração (um livro baseado na tese sairá no segundo semestre pela Editora Todavia). O sentimento que captou entre integrantes dos dois campos foi de “orfandade”. “Há ainda muitos eleitores em busca de candidatos que os representem”, diz Camila Rocha.
O cruzamento das duas pesquisas, a quantitativa e a qualitativa, sugere que o presidente e o ex-presidente lideram porque foram os primeiros a “colocar o bloco na rua”. Os levantamentos mostram que muitos brasileiros votarão em Lula ou Bolsonaro. Há, no entanto, um enorme contingente em busca de alternativas. Cabe aos demais partidos suprir a demanda dos “órfãos”. No Brasil os pleitos são livres e quem não se apresenta ao escrutínio do eleitor não tem o direito de reclamar. Assumir a candidatura é o primeiro passo, mas não basta. É preciso apresentar ideias.
Em plena pandemia, a campanha está a todo vapor. Se os postulantes não colocarem logo seus blocos na rua – e se não perceberem a urgência dessa tarefa –, Lula e Bolsonaro brincarão sozinhos o carnaval das eleições.
Ascânio Seleme: Lula em 13 pontos
O discurso do ex-presidente foi o fato da semana, não custa destrinchar o seu teor para tentar melhor entendê-lo
O fato da semana foi o discurso de candidato proferido pelo ex-presidente Lula dois dias depois de o STF ter anulado as penas a que foi condenado. Não custa destrinchar o seu teor para tentar melhor entendê-lo.
1 - Arrebentado (de tantas chibatadas); razão para ter mágoas - Lula se queixou por ter apanhado muito ao longo dos anos. É verdade, mas ele não disse que havia motivos para apanhar. Seu governo produziu o mensalão e iniciou a partilha da Petrobras entre o PT e os demais partidos da sua base. O ex-presidente também foi julgado, condenado e preso por se beneficiar de vantagens indevidas de empreiteiras. Isso dói e magoa. Contudo, ele disse que não tem mais espaço nem tempo para guardar rancor. Só mais adiante vai se saber se o Lulinha Paz e Amor voltou mesmo.
2 - Reconhecida sua inocência - Lula inventou que foi inocentado nos casos do tríplex, do sítio e do instituto que leva o seu nome. Suas condenações foram anuladas e ele deve ser julgado por outro juiz. Pode tanto ser inocentado quanto ter sua pena prescrita ou ser condenado outra vez. Além disso, os processos do mensalão e do petrolão geraram cassações de mandatos e prisões em escala industrial na base de seu governo e no da sua sucessora Dilma Rousseff.
3 - Marisa morreu por pressão (da Lava-Jato) - Chute do ex-presidente. Mas não se pode negar que a ex-primeira-dama estava muito angustiada e pressionada em razão dos escândalos em que o marido e os filhos estavam metidos.
4 - Prato de feijão e farinha; picanha e cerveja - Lula retomou o discurso contra a fome que ajudou a elegê-lo em 2002, aproveitando o empobrecimento generalizado dos brasileiros. Falou no idioma que mais se entende no Brasil. Tem um legado importante na questão da inclusão social no Brasil para explorar no futuro.
5 - Armas para PM e Forças Armadas - O candidato afagou as instituições oficiais de segurança para corretamente descer o pau na política armamentista de Bolsonaro.
6 - O planeta é redondo - Mesmo ao ridicularizar o terraplanismo e o olavismo de Bolsonaro, Lula usou um tom sério porque não era hora de fazer graça.
7 - Citações e agradeci mentos - Foi honesto ao não esconder seu apreço à esquerda global, que sempre esteve ao seu lado. Até o famoso Foro de São Paulo ele citou. Lula não é extremista, mas claro que é de esquerda.
8 - Não ao liberalismo econômico - O ataque de Lula a Guedes (“Esse governo não tem ministro da Economia”) mostrou que seu caminho será outro. Neste discurso, e no que fez no Congresso do PT de novembro do ano passado, o ex-presidente não deixou dúvida sobre seu apetite intervencionista. Usou ainda o desgastado discurso antiamericanista (“Quando é que eu vou acordar de manhã sem ter que pedir licença para respirar ao governo americano") que ainda agrada a uma grande parcela da população.
9 - Preço da gasolina - No mesmo tom intervencionista, Lula atacou o preço dos combustíveis (“Por que cobrar em dólar se o Brasil não importa gasolina?”) e ainda se apropriou do discurso bolsonarista a favor de caminhoneiros.
10 - Imprensa - Atacou jornais e jornalistas, mas elogiou a edição do Jornal Nacional do dia em que o ministro Edson Fachin anulou suas condenações. Deixou claro que gosta mesmo é de imprensa a favor, chapa branca. Já se viu isso antes, nenhuma novidade.
11 - Vacina e máscaras - Sua posição no quesito pandemia lhe deu tantos pontos que até Bolsonaro correu para usar máscara e falar em favor da vacinação. Um dos maiores líderes da história política do país deu um exemplo a ser seguido. Falou o que o Brasil precisa ouvir. Deixou Bolsonaro pequeno, insignificante.
12 - Conversar com políticos e empresários - Lula disse que vai usar a sua maior habilidade, falar com todo mundo. Das muitas diferenças que o separam de Bolsonaro, esta é a mais visível. Lula sabe conversar, e bem. Sabe negociar e, mesmo contrariado, sabe ceder.
13 - Convite para mudar o país - O tom de candidato esteve presente em todo o discurso, mas no final ele foi emblemático. No convite para mudar o país usou a conhecida fórmula de quem diz conhecer o caminho e pede apoio do povo para conduzir o país nessa direção.
Não acabou
Ninguém mais tem dúvida de que Sergio Moro extrapolou do seu papel de juiz na operação Lava Jato. Os diálogos com os procuradores da força tarefa deixam evidente a promiscuidade do relacionamento do juiz com os acusadores que formularam as denúncias. Até aqui, contudo, o argumento dos que apoiam a tese de que Moro deve ser considerado suspeito faz menção apenas ao julgamento e às condenações do ex-presidente Lula, em razão do teor das conversas reveladas na Vaza Jato. Mas há também quem queira ir mais longe. Aceitando-se a tese de que a operação foi feita para tirar Lula da eleição de 2018, todas as sentenças proferidas por Moro estariam contaminadas por esta premissa, alegam. Prender donos e executivos de empreiteiras, tesoureiros de partidos políticos, deputados, senadores, diretores e funcionários da Petrobras serviria para robustecer a denúncia contra Lula. Essa polêmica não vai acabar na segunda turma do STF, vai para o plenário.
Som de avalanche
Os números de Sergio Moro durante os anos em que julgou os casos da Lava Jato são impressionantes. Segundo o G1, o juiz proferiu 46 sentenças e condenou 123 réus, entre eles Lula, a 1.861 anos de cadeia antes de deixar a função para ser ministro de Bolsonaro. Advogados preveem que, quando Moro for considerado suspeito nos julgamentos de Lula pela segunda turma, uma avalanche de ações vai desabar sobre o STF para reverter penas em andamento e para tentar desbloquear bens congelados ou reaver somas subtraídas de contas privadas pelas sentenças do ex-juiz.
Outro lado
Chato para a defesa de Lula é ter que dividir seus argumentos com gente ilibada como Arthur Lira e Renan Calheiros, além, é claro, de Eduardo Cunha, Geddel Vieira Lima, Sergio Cabral e outros tantos da mesma cepa. Mas, fazer o quê? É assim que se joga este jogo.
Supremo respeito
Você pode discordar do STF, você pode criticar o STF, mas você terá que respeitar e cumprir sempre as decisões do STF, que são terminativas. Os ministros não são santos, nem deuses, mas vestidos com a toga, depois de apontados pelo chefe do poder executivo e aprovados pelo poder legislativo, passam a ser os legítimos intérpretes da lei e da Constituição. Juízes passam, a instituição permanece.
Ódio por ódio
Se o ódio a Lula elegeu Bolsonaro em 2018, nada impede que o ódio a Bolsonaro eleja Lula em 2022. Mas o Brasil será feliz mesmo quando o seu presidente voltar a ser eleito por amor.
Nosso Rio 1
Menos de uma semana depois de impor algumas restrições no Rio como forma de preservar o funcionamento em condições próximas do normal da rede pública de saúde, Eduardo Paes flexibilizou as medidas. Fez um make up, aumentando por uma semana o decreto, mas errou majestosamente ao estender o horário de funcionamento de bares e restaurantes até as 21h. Acertaria se fosse mais rigoroso. Foi menos. Alegou que assim retira a pressão sobre o horário de rush e viabiliza economicamente os estabelecimentos comerciais. Em junho do ano passado, quando o Rio contabilizava menos de duas mil mortes por Covid, todo o comércio foi fechado. Hoje, a cidade registra o maior número de mortes do país, 19,2 mil, ou 70 a cada dia, e tudo bem. Paes diz que pode rever o plano “se houver alguma mudança brusca”. Precisa?
Nosso Rio 2
Anote. Havendo sol, as praias da cidade vão bombar neste último fim de semana de verão. Pistas fechadas, quiosques, barracas e ambulantes liberados. Vai ser uma festa. Ah, não, festas estão proibidas. Vai ser uma farra.
Nosso Rio 3
Bolsonaro, que atacou os governadores do Distrito Federal e de São Paulo por terem decretado toque de recolher e fechado lojas, bares, restaurantes e shoppings, deveria elogiar o prefeito do Rio. Ele merece.
Nosso Rio 4
Na Nova Zelândia, a primeira-ministra Jacinda Ardern voltou a decretar bloqueio total em Auckland porque três (eu disse três) novos casos de infecção foram registrados em fevereiro. Mas não se pode exigir tanto por aqui. Afinal, Rio é Rio e Auckland é Auckland.
Liberou geral
Nem parecia a mesma Anvisa que no ano passado suspendeu o andamento dos testes do Instituto Butatan com a Coronavac por causa do suicídio de uma das pessoas que estavam sendo testadas; ou a que negou o registro da Sputnik se antes não fossem feitos testes no Brasil. Na coletiva de ontem, a agência liberou geral. Convidou até mesmo uma vacina que não solicitou o registro a se apresentar para ganhar o seu aval. Inclusive o remédio do Trump foi liberado. Esse vai-e-vem, igual ao do capitão, mostra como a Anvisa se identifica com Bolsonaro.
Marco Antonio Villa: Impeachment antes que seja tarde
Bolsonaro é um convicto defensor da ditadura, da censura aos meios de comunicação, do fechamento do STF e do Congresso Nacional
Jair Bolsonaro é a maior ameaça ao Brasil. E não é de hoje. Atacou as instituições e propagou o ódio durante três décadas. Não foi levado a sério.
A leniência do Estado democrático de Direito cobrou um alto preço. Assim como os nazistas que usaram da Constituição de Weimar para chegar ao poder e, a posteriori, destruir seus postulados, Bolsonaro seguiu pelo mesmo caminho. Se tivesse sido processado pelas falas inconstitucionais poderia – a probabilidade era alta – terminar na cadeia e sem direitos políticos. Contudo foi tratado como um falastrão quando era, na verdade, um inimigo visceral das liberdades democráticas.
Hoje continua o mesmo. A diferença — e que diferença! — é que está comandando o Executivo federal com todos os poderes concedidos pela Constituição. E o presidencialismo brasileiro acaba amarrando as mãos dos cidadãos mesmo quando há um governo que comete sucessivos crimes de responsabilidade. Enquanto no parlamentarismo quando o gabinete perde sustentação parlamentar é substituído por outro governo, no presidencialismo resta a processo de impeachment que é relativamente lento, tanto no caso de crime de responsabilidade (como com Fernando Collor e Dilma Rousseff) ou infração penal comum (o que nunca ocorreu até hoje).
Disse recentemente o senador Tasso Jereissati que “é preciso parar esse cara.” Poucos discordam. Mas como parar se o próprio senador é contra o processo de impeachment? É descartada possibilidade de que Bolsonaro se converta à democracia. Para ele — e sua história demonstra isso de forma inequívoca – não há nenhum caminho de Damasco. Bolsonaro é um convicto defensor da ditadura, da censura aos meios de comunicação, do fechamento do Supremo Tribunal Federal e do Congresso Nacional. Nesse sentido ele é absolutamente transparente. Volto à questão: parar como, senador? Estimular que ele renuncie? É improvável que vá aceitar. Só pensaria nesta possibilidade se visse ameaçado seus direitos políticos em um processo de impeachment.
Esta crise é a mais complexa da história republicana. Em 1992 e 2016 tivemos a conjunção de crise econômica com crise política. Aí veio o impeachment. Agora temos um fator complicador e ausente nas crises anteriores: o isolamento diplomático. Mas o pior é a segunda diferença: a pandemia que completou um ano e nada indica que deva estar encerrada nos próximos meses. Continuar assistindo a derrocada do governo sem nada fazer é um crime de lesa-pátria. Sem ação política Bolsonaro vai caminhar para a ditadura.