STF
Eliane Cantanhêde: Bolsonaro depõe na PF sobre a PF, fala o que quer e Moro não pode questionar
Fatos desmentem a versão do presidente e confirmam a do ex-ministro Sérgio Moro
Eliane Catanhede: O Estado de S. Paulo
O “depoimento” do presidente Jair Bolsonaro à Polícia Federal sobre interferência política na própria PF contém histórias mal contadas e os fatos desmentem a versão de Bolsonaro e confirmam a do ex-ministro Sérgio Moro. Ele saiu do governo atirando e gerou o inquérito contra o presidente, mas nem ele nem seus advogados foram sequer avisados do depoimento.
Segundo o ex-delegado Jorge Pontes, que se formou no FBI, foi representante do Brasil na Interpol e fala o que os colegas da ativa não podem, o presidente apresentou uma “denúncia vazia” contra Moro, ao acusar o ministro de tentar chantageá-lo por uma vaga no Supremo.
É a palavra de um contra o outro, mas Moro tem um trunfo: gravou no celular a proposta da deputada bolsonarista Carla Zambelli de que, se voltasse atrás, teria o STF. Sua resposta: “Cara, eu não estou à venda”. Por que diria uma coisa para o presidente e outra para a deputada, de quem foi padrinho do casamento?
Bolsonaro disse que chamou o delegado Carlos Henrique Souza para “conhecê-lo melhor”, antes de mandá-lo para a PF no Rio, justamente onde corre o inquérito das rachadinhas contra a família. E alegou “falta de produtividade” para trocar a PF em Pernambuco, apesar de não ter a ver com isso e a gestão da delegada Carla Patrícia ser muito elogiada.
Moro acusou Bolsonaro de mexer no Rio e no diretor-geral, Maurício Valeixo, por questões políticas. Agora, às vésperas de se lançar ao Planalto, ele lembrou a reunião ministerial de 22 de abril de 2020, quando o presidente exigiu acesso a informações sigilosas e disse que não admitia investigações de pessoas próximas a ele.
Desde então, muita coisa mudou na PF, a começar do perfil do diretor-geral. Se Valeixo era um quadro interno, de operação, inteligência e administração, o escolhido para sucedê-lo, Alexandre Ramagem, era amigo dos Bolsonaro e o atual, Paulo Maiurino, fez carreira entre Judiciário, Legislativo e governos estaduais.
O perfil político se expande na cúpula e nas mudanças polêmicas no DF, no Amazonas e, novamente, no Rio. E com um hábito, que não é de hoje, de compensar os “próximos” com cargos e gordos salários em dólares no exterior. Exemplos: o ex-diretorgeral Fernando Segovia em Roma, Eugênio Ricca em Washington, Sandro Avelar em Londres.
Com todos os defeitos da era Lula, a PF teve autonomia para investigar mensalão e petrolão e indiciar o irmão do presidente, Vavá, por tráfico de influência. Agora, a “boiada” passa, para proteger os amigos do rei e recompensar “delegados políticos”. Mas governos vêm e vão, a PF fica. E é uma corporação sólida e orgulhosa.
Fonte: O Estado de S. Paulo
https://politica.estadao.com.br/noticias/geral,boiada-na-pf,70003891546
Vinicius Torres Freire: Bolsonaro pode ficar sem dinheiro para aprovar Auxílio Brasil
Governo ainda não diz para quem e como vai pagar benefícios e corre risco no Congresso
Vinicius Torres Freire / Folha de S. Paulo
O Auxílio Brasil ainda não existe. O dinheiro para pagar o Auxílio Brasil também não. Talvez não exista dindim para bancar a aprovação desse e outros gastos no Congresso. É difícil acreditar que deputados e senadores deixem de aprovar uma renda básica para pobres, faltando menos de um ano para a eleição. Mas o caldo político engrossou, há problemas na Justiça e os prazos para entregar o benefício ao povo miúdo estão quase estourados.
O Auxílio Brasil por ora é apenas uma medida provisória oca. Ali não se diz quanto será pago a cada família, nem exatamente para quais, nem como, afora para aquelas que já estão no Bolsa Família e olhe lá. Faltam poucos dias para definir isso tudo e muito mais.
O Congresso ainda está longe de chancelar a contabilidade criativa e o calote que vão financiar (também) o Auxílio Brasil. Sem isso, dá para pagar benefícios neste ano. Para 2022, só tem dinheiro para bancar o velho Bolsa Família (cerca de R$ 190 mensais para 15,6 milhões, não R$ 400 para 17 milhões, como quer o governo).
Cabalar votos com o dinheiro de emendas parlamentares ficou mais difícil. A ministra Rosa Weber, do Supremo, suspendeu o pagamento das "emendas de relator" (mudanças de destinação de verba do Orçamento definidas pelo parlamentar que redige a proposta final da lei orçamentária. Em geral, beneficiam os escolhidos pelos chefes do centrão).
As "emendas de relator", o Bolsolão, pagaram muitos dos votos que aprovaram na Câmara, em primeira rodada de votação, a Proposta de Emenda Constitucional (PEC) que formaliza o calote de parte dos precatórios e muda o reajuste do limite de despesas federais. Mas falta o segundo turno na Câmara, faltam dois turnos no Senado.
Na semana que vem, o Supremo deve decidir se barra de vez as "emendas de relator". Na melhor das hipóteses (para o governismo), a mera indefinição vai dificultar os negócios na Câmara e no Senado, já bastante indócil.
Além de reajustar o teto de gastos, a PEC autoriza o governo a deixar de honrar pelo menos R$ 47 bilhões dos R$ 89 bilhões de precatórios que deveria pagar em 2022, calote que não cai bem no Senado e pode terminar na Justiça. O reajuste do teto deve render quase outro tanto de dinheiro para o Orçamento federal.
No entanto, o governo precisa de R$ 47 bilhões extras apenas para pagar o Auxílio Brasil em 2022. Diz que vai precisar de outros R$ 24 bilhões extras para pagar reajustes de benefícios previdenciários (pois a inflação será maior do que a prevista pelo projeto de lei orçamentária).
Vai sobrar pouco para emendas parlamentares extras, de relator ou outra mumunha que inventem. Se o Supremo derrubar as "emendas de relator" e se o Congresso não fizer algum acordão de gastos, Jair Bolsonaro terá mais problemas para sustentar a "velha política".
Se a PEC dos Precatórios não passar ou for amputada de modo essencial, o governo terá de improvisar ainda mais, mais do que fez com o Auxílio Brasil, por incapacidade técnica, negligência e laborfobia. Teria então de pagar algum auxílio para os pobres com créditos extraordinários, o que é em tese ilegal. Sabe-se lá como arrumará dinheiro para bancar o reajuste extra dos benefícios previdenciários etc.
O pessoal do Congresso não nasceu ontem, quase sempre se arruma. A mutreta fiscal, judicial e política está meio liberada. Quase ninguém no sistema de poder quer degolar Bolsonaro na Justiça ou por impeachment, de resto. É verdade que o PIB de 2022 está sendo dissolvido no ácido dos juros da praça financeira, mas Bolsonaro e centrão não estão nem aí. No entanto, aumentou o risco de dar besteira até para a turma da safadagem.
Fonte: Folha de S. Paulo
https://www1.folha.uol.com.br/colunas/viniciustorres/2021/11/bolsonaro-pode-ficar-sem-dinheiro-para-pagar-centrao-e-aprovar-auxilio-brasil.shtml
Sergio Fausto: Por um patriotismo democrático
Patriotas são aqueles dispostos a colocar seus tijolos na construção de uma casa comum a todos
Sérgio Fausto / O Estado de S. Paulo
Bolsonaro se crê um patriota. O engano é evidente. O atual presidente não revela traço algum de quem ama o seu país. O desprezo pela vida dos brasileiros, demonstrado na pandemia, e o descaso com o meio ambiente, em geral, e a Amazônia, em particular, falam por si. Bolsonaro não conhece nem tem apreço pela cultura brasileira, na sua imensa riqueza e diversidade. Se dependesse dele, a natureza e a cultura, que dão corpo e alma a este país, não resistiriam. E nossa história ficaria aprisionada nos chavões de um autoritarismo primitivo.
E, apesar de tudo isso, o bolsonarismo tenta se apoderar de símbolos nacionais, como o hino, a bandeira e a camisa da seleção brasileira. Patriotismo excludente, movido a ódio, exterminador do futuro.
Nações são comunidades imaginadas, na definição de Benedict Anderson, autor de um livro clássico sobre as origens dos Estados nacionais e a difusão do nacionalismo. Existem não como um dado da geografia física, mas como construções políticas e culturais, pelo fazer, o falar, o atuar e o escrever constantes de muitos que compartem uma língua e vínculos concretos e simbólicos com um território delimitado e um passado em comum, vivendo sob as mesmas leis. Para subsistirem, as nações precisam ser periodicamente reimaginadas para projetar um destino em comum, melhor para todos.
Os mitos da nacionalidade brasileira – a democracia racial, o gigante pela própria natureza, o país do futuro, etc. – estão em mau estado. Não resistiram ao embate com a realidade de um país que, em 200 anos, resolveu bem suas questões de fronteira, ocupou seu território, se urbanizou e industrializou, tornou-se uma grande economia, mas não conseguiu entregar à grande massa de sua população condições aceitáveis de vida e um terreno firme e plano para o exercício da cidadania.
Quando terminou o regime autoritário (1964-1985), o Brasil figurava entre os países que mais haviam crescido ao longo do século prestes a terminar. Altas taxas de crescimento, porém, não produziram indicadores sociais compatíveis. Ao contrário, no fim da ditadura, 25% dos brasileiros ainda eram analfabetos, muitas crianças continuavam fora da escola (cerca de 30% nas regiões menos desenvolvidas), o ensino médio era ainda uma quimera para a grande maioria dos jovens e a mortalidade infantil se situava na casa dos 40 por mil nascimentos.
A democracia não resolveu todos esses problemas. Mas os colocou no centro do debate público e da agenda nacional e desobstruiu os canais para que a sociedade, nas suas múltiplas e contraditórias vontades e interesses, passasse a demandar soluções, sem bater às portas dos quartéis. A Constituição de 1988 assegurou liberdades e garantias individuais, estendeu o rol dos direitos fundamentais, incorporando a saúde pública e o ensino básico para todos, deu proteção constitucional ao meio ambiente e visibilidade e proteção a minorias antes marginalizadas do espaço público e criou mecanismos para a expressão e defesa de direitos difusos. Embora insuficientes, os avanços saltam aos olhos de quem tem olhos para ver.
Devemos valorizar e compreender essa experiência em toda a sua importância. Para isso, é preciso conhecer e discutir criticamente o nosso passado. Não para nos imobilizar na purgação dos nossos muitos pecados, mas porque saber de onde viemos é essencial para definir aonde queremos chegar.
Constituição não é Bíblia. Ela já sofreu mais de 100 emendas e deverá sofrer outras para reduzir o seu detalhismo e a sua incidência excessiva em questões que devem ser resolvidas na e pela política, no âmbito da legislação complementar. A nossa Constituição, porém, nos oferece o que outras, louvadas por serem mais enxutas, não entregam. Ela projeta a utopia viável de um país mais igualitário e inclusivo, democrático no funcionamento das suas instituições políticas e na oferta de bens públicos, conhecedor e zeloso da sua biodiversidade, orgulhoso da sua diversidade cultural e racial. E nos dá a gramática para processar os conflitos inerentes à busca, na democracia, pela concretização progressiva dessas aspirações.
Podemos divergir sobre a velocidade e os meios para avançar, ainda mais, no caminho que a Constituição aponta, desde as questões mais abrangentes sobre o papel do Estado, do mercado e da sociedade até suas expressões mais concretas em torno da tributação e do gasto público, passando por todas as áreas das políticas públicas, inclusive a política externa.
O importante é convergirmos em relação aos valores fundamentais da Constituição e as regras democráticas que ela estabelece para resolvermos as nossas diferenças.
A Nação não tem dono. Patriotas são aqueles e aquelas que estão dispostos(as) a colocar seus tijolos – de cores e formatos diferentes – na construção nunca terminada de uma casa comum que seja de todos(as) que aqui vivem e viverão um dia, gente que não conheceremos, mas que terão o mesmo amor por esta “comunidade imaginada”, mas bem real, chamada Brasil.
*Diretor-Geral da Fundação FHC, é membro do Gacint-USP
Fonte: O Estado de S. Paulo
https://opiniao.estadao.com.br/noticias/espaco-aberto,por-um-patriotismo-democratico,70003890677
'Desinformação cerceia o direito do eleitor', diz Fachin, próximo presidente do TSE
Ministro do STF afirma que candidatos que recorrerem a esta estratégia em 2022 'poderão ter o mandato cassado'
Mariana Muniz / O Globo
BRASÍLIA - Próximo presidente do Tribunal Superior Eleitoral (TSE), cujo comando assume em fevereiro, o ministro do Supremo Tribunal Federal (STF) Edson Fachin diz que a disseminação de desinformação tem impacto negativo nas eleições e contribui para cercear o direito de escolha do eleitor.
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A seguir, os principais trechos da entrevista, concedida por escrito:
Como as fake news podem impactar no processo eleitoral brasileiro?
A desinformação tende, sem dúvida, a impactar de forma muito negativa os processos eleitorais. Em primeiro lugar, prejudica o direito de escolha, na medida em que obsta o acesso a informações adequadas. Dentro dessa visão, o eleitor que seleciona candidatos com base em mentiras manufaturadas tem, a rigor, cerceado o seu direito de escolher em liberdade. Numa outra dimensão, a desinformação afeta um elemento essencial para a legitimidade das eleições: a igualdade de oportunidades entre os candidatos. Não há dúvida de que os candidatos que jogam à margem da legalidade acumulam vantagens indevidas. Essas são algumas das razões pelas quais, dentro de certas circunstâncias, os candidatos que recorrem a estratégias de desinformação poderão ter os mandatos cassados pela Justiça Eleitoral.
A propagação dessas notícias falsas e de maneira massiva já provocou impactos em pleitos realizados em outros países?
A produção de desinformação em escala industrial tem sido reproduzida, por efeito mimético, em competições eleitorais de todo o globo. A questão ainda carece de algumas respostas, como, o dimensionamento da capacidade específica de modulação de votos. Os efeitos negativos, no entanto, revelam-se claros e tangíveis e extrapolam o contexto eleitoral. Damos por certo o fato de que a desinformação é elemento responsável por outras espécies de danos sociais, entre os quais o incremento do radicalismo e da violência política, na esteira de um processo de polarização.
Como o TSE pode atuar no combate às fake news de forma efetiva?
A Justiça Eleitoral tem plena consciência de que o enfrentamento à desinformação deve ser levado a efeito em termos compatíveis com a preservação da garantia fundamental da liberdade de expressão. Com esse espírito, o Programa de Enfrentamento à Desinformação do Tribunal Superior Eleitoral atua a partir da premissa de que a desinformação deve ser combatida com a informação.
Recentemente, o TSE sinalizou que adotará posições mais duras contra a propagação de informações falsas. Quais outras medidas o senhor observa no horizonte da Corte?
Se havia dúvidas quanto ao enquadramento da desinformação no arco proibitivo das práticas de abuso de poder, essas dúvidas não existem mais. Todos os atores interessados têm, a partir de agora, conhecimento inequívoco acerca da ilicitude dos atos e, ademais, acerca da gravidade de suas consequências. Nesse panorama, a tendência é que o eleitor brasileiro seja brindado, no próximo ano, com uma dieta informativa mais saudável do que aquela servida no pleito passado.
Decisão de Rosa Weber de suspender pagamentos do 'orçamento secreto' divide o STF
Decisão de Weber tende a ser mantida, porém, com um resultado apertado, disputado voto a voto
Weslley Galzo e Vinícius Valfré / O Estado de S.Paulo
BRASÍLIA - A decisão da ministra Rosa Weber de suspender temporariamente os repasses feitos pelo governo Jair Bolsonaro a parlamentares da base aliada por meio do orçamento secreto tende a gerar um racha entre os ministros do Supremo Tribunal Federal (STF). Um julgamento no plenário virtual vai revisar a ordem liminar na próxima terça-feira, 9.
Ao Estadão, interlocutores dos ministros afirmaram que a decisão de Weber tende a ser mantida, porém, com um resultado apertado, disputado voto a voto, diante das pressões exercidas por parlamentares que se beneficiam da distribuição sigilosa de emendas do relator-geral do orçamento (RP-9).
O esquema do orçamento secreto foi revelado pelo Estadão em uma série de matérias iniciada em maio. A chance de pedidos de vista (suspensão) ou destaque (encaminhamento ao plenário físico) surgirem durante o julgamento é considerada remota, sobretudo, por se tratar de uma decisão provisória em um contexto com implicações diretas na dinâmica entre o Executivo e o Legislativo.
A possibilidade de o julgamento terminar empatado é aventada por pessoas próximas aos ministros por causa da falta de consenso sobre o orçamento secreto. Neste cenário, caberia a um novo ministro, indicado pelo presidente Jair Bolsonaro para a cadeira vaga depois da saída de Marco Aurélio Mello, decidir os rumos do esquema que sustenta a governabilidade do Planalto. Para o cargo, foi indicado André Mendonça, mas seu nome ainda depende de sabatina no Senado e enfrenta resistências na Casa.
LIRA
Segundo o Estadão apurou, interlocutores do presidente da Câmara, Arthur Lira (Progressistas-AL) têm tentado convencer os ministros do STF de que a decisão de Weber pode ser correta do ponto de vista da publicidade dos gastos, mas avança sobre prerrogativas do Legislativo e do Executivo.
A eventual manutenção do entendimento da ministra afeta o poder de Lira em Brasília. Ele e o governo usam as emendas de relator para reunir maiorias na Câmara. Por isso, o deputado alagoano estaria decidido a reverter o quadro para garantir a influência sobre o plenário não apenas no segundo turno da PEC dos Precatórios, mas na apreciação de futuras matérias.
O líder do governo na Câmara, Ricardo Barros (Progressistas-PR), disse estar confiante na aprovação da PEC dos Precatórios em segundo turno, apesar da suspensão das emendas de relator. “Não é baseado nisso que construímos a nossa base. Temos uma relação ampla com a base do governo e essa relação não se restringe a emendas” afirmou.
Para o deputado Alan Rick (DEM-AC) a suspensão das emendas mexe na relação do plenário com o governo, mas ainda não é possível saber o nível da mudança. “Muita gente apoia o governo por convicção, mas outros querem ajudar seus Estados.”
RELATÓRIO
Foi distribuído entre os ministros do STF um relatório preparado por consultores da Câmara, a pedido do deputado licenciado Rodrigo Maia (sem partido-RJ). A intenção é municiar com informações as autoridades sobre o funcionamento do orçamento secreto.
Segundo a reportagem apurou, o documento da consultoria da Câmara distribuído entre os ministros do STF cita, por exemplo, a aprovação da Emenda Constitucional nº 2019, que impediu a conversão da execução orçamentária em uma ferramenta de gestão de coalizão.
“A utilização das emendas de relator como uma forma travestida de ressuscitar o caráter discricionário e politicamente orientado das emendas individuais viola de maneira frontal essa regra constitucional aprovada de maneira quase unânime na Câmara, diga-se de passagem”, consta no documento. “É necessário, ainda, ter presente as nefastas consequências sistêmicas desse expediente”.
“Num quadro de elevada rigidez orçamentária (...) fica patente o potencial danoso do abuso de RP-9. Ele tende a desorganizar os programas estruturais de políticas públicas, escoando os parcos recursos disponíveis ao Poder Executivo para ações que não pensam de forma sistêmica a realidade regional e nacional, limitando-se a atender interesses”, diz outro trecho.
Além de ordenar que nenhum recurso indicado por parlamentares via emendas de relator seja liberado até que o plenário do STF se manifeste sobre o tema, a ministra determinou que o valor dos repasses e os nomes dos responsáveis pelas indicações passem a ser amplamente divulgados em “plataforma centralizada de acesso público”. Desde o início da série de reportagens do orçamento secreto, o Estadão aponta para a falta de transparência na alocação dos recursos via RP-9.
“Causa perplexidade a descoberta de que parcela significativa do orçamento da União Federal esteja sendo ofertada a grupo de parlamentares, mediante distribuição arbitrária entabulada entre coalizões políticas, para que tais congressistas utilizem recursos públicos conforme seus interesses pessoais, sem a observância de critérios objetivos destinados à concretização das políticas públicas a que deveriam servir as despesas, bastando, para isso, a indicação direta dos beneficiários pelos próprios parlamentares, sem qualquer justificação fundada em critérios técnicos ou jurídicos, realizada por vias informais e obscuras, sem que os dados dessas operações sequer sejam registrados para efeito de controle por parte das autoridades competentes ou da população lesada”, escreveu a ministra.
Fonte: O Estado de S. Paulo
https://politica.estadao.com.br/noticias/geral,decisao-de-rosa-weber-de-suspender-pagamentos-do-orcamento-secreto-divide-colegiado-do-supremo,70003891656
Ministra do STF determina suspensão de gastos de orçamento paralelo
Medida vem sendo usada para turbinar sem transparência emendas de parlamentares aliados do governo
André de Souza / O Globo
BRASÍLIA — A ministra Rosa Weber, do Supremo Tribunal Federal (STF), mandou suspender "integral e imediatamente" a execução das chamadas "emendas de relator" no orçamento de 2021. Essas emendas compõem o "orçamento paralelo", que tem sido usado pelo governo do presidente Jair Bolsonaro para turbinar as emendas parlamentares de aliados no Congresso. Como não há transparência sobre os gastos, também é conhecido como "orçamento secreto".
A decisão é liminar, ou seja, temporária, e vale até o julgamento definitivo da ação, quando ela poderá ser mantida ou modificada. O presidente do STF, ministro Luiz Fux, já marcou uma sessão extra da Corte para julgar o caso nos próximos dia 9 e 10. A ministra é relatora de três ações sobre o tema, apresentadas pelos partidos Cidadania, PSB e PSOL. A determinação é direcionada ao Senado, à Câmara, à Presidência da República, à Casa Civil da Presidência da República e ao Ministério da Economia.
Rosa Weber também determinou que todas as demandas de parlamentares voltadas à distribuição de emendas de relator sejam registradas em plataforma eletrônica centralizada do órgão central do Sistema de Planejamento e Orçamento Federal. O objetivo é assegurar "amplo acesso público, com medidas de fomento à transparência ativa, assim como sejam garantidas a comparabilidade e a rastreabilidade dos dados referentes às solicitações/pedidos de distribuição de emendas e sua respectiva execução, em conformidade com os princípios da publicidade e transparência". O prazo para isso é de 30 dias.
Ela também deu 30 dias para que "seja dada ampla publicidade, em plataforma centralizada de acesso público, aos documentos encaminhados aos órgãos e entidades federais que embasaram as demandas e/ou resultaram na distribuição de recursos das emendas de relator".
Rosa criticou o sigilo do orçamento paralelo: "Enquanto a disciplina normativa da execução das emendas individuais e de bancada (RP 6 e RP 7) orienta-se pelos postulados da transparência e da impessoalidade, o regramento pertinente às emendas do relator (RP 9) distancia-se desses ideais republicanos, tornando imperscrutável a identificação dos parlamentares requerentes e destinatários finais das despesas nelas previstas, em relação aos quais, por meio do identificador RP 9, recai o signo do mistério."
Deputados pedem anulação da votação da PEC dos Precatórios no STF
Parlamentares questionam manobras adotadas por Arthur Lira (PP-AL), para garantir a aprovação da matéria
Luana Patriolino / Correio Braziliense
Seis deputados de diferentes partidos entraram com uma ação no Supremo Tribunal Federal (STF) para tentar anular a votação da Proposta de Emenda à Constituição 23/21, conhecida como PEC dos Precatórios. O projeto foi aprovado em primeiro turno em sessão da Câmara dos Deputados na última quarta-feira (3/11) para permitir o remanejamento de gastos do governo federal para alocá-los em programas de cunho eleitoral, como o Auxílio Brasil.
Os parlamentares avaliam que o governo só conseguiu a votação necessária porque o presidente da Câmara, Arthur Lira (PP-AL), adotou manobras controversas na votação. Assinaram o documento: Alessandro Molon (PSB-RJ), Fernanda Melchionna (PSol-RJ), Joice Hasselmann (PSDB-SP), Kim Kataguiri (DEM-SP), Marcelo Freixo (PSB-RJ) e Vanderlei Macris (PSD-SP).
A PEC foi aprovada em primeiro turno, por 312 votos a 144, na madrugada de quinta-feira (4). Eram necessários 308 votos favoráveis. De acordo com a manifestação, uma das manobras adotadas pela Mesa Diretora da Câmara foi a validação de votos de parlamentares licenciados por exercício de missão diplomática, o que contraria o Regimento Interno, para aprovar emendas para as quais não haveria quórum. A publicação do ato saiu no Diário Oficial da Casa minutos antes do início da sessão, ainda na noite de quarta-feira.
Para a deputada federal Fernanda Melchionna, Lira tem agido para elevar a popularidade do presidente Jair Bolsonaro. “Lira está fazendo de tudo para possibilitar a continuidade do governo Bolsonaro e tornar viável a reeleição do presidente. Para isso, está usando manobras que são evidentemente ilegais e abre precedentes perigosos”, destaca.
Melchionna aponta que o comportamento do presidente da Câmara tem sido recorrente. “Ele tem atropelado e mudado o regimento para diminuir a possibilidade de resistência da oposição. Não aceitaremos isso calados. A PEC dos Precatórios é vendida por Bolsonaro como uma possibilidade de ajudar os mais pobres, mas é uma mentira. Ela vai apenas abrir ainda mais espaço no orçamento público para as emendas secretas, que estão sendo usadas para comprar votos", aponta.
A deputada Joice Hasselmann afirma que o documento impetrado pretende questionar supostas irregularidades. “Houve um desrespeito flagrante ao regimento, que, em seu artigo 235, especifica em quais casos o parlamentar está licenciado, afastado. No caso de viagens internacionais, o parlamentar está licenciado, está afastado. Se ele está afastado, ele não pode votar”, pontua.
Fonte: Correio Braziliense
https://www.correiobraziliense.com.br/politica/2021/11/4960898-deputados-pedem-anulacao-da-votacao-da-pec-dos-precatorios-no-stf.html
Orçamento: Juristas e políticos de oposição apoiam liminar de Rosa Weber
Decisão da ministra foi saudada por líderes de bancadas no Congresso, procuradores, juristas e presidente da OAB
Redação / O Estado de S. Paulo
Juristas e políticos apoiaram na noite desta sexta-feira a decisão liminar (provisória) da ministra Rosa Weber, do Supremo Tribunal Federal, que suspendeu os empenhos e pagamentos das emendas de relator-geral. Identificadas pelo código RP-9, as emendas estão na base do orçamento secreto. Além de suspender os pagamentos, Weber também determinou que o Executivo dê transparência à execução das verbas e torne públicos os ofícios por meio dos quais deputados e senadores fazem as indicações do dinheiro, geralmente para pequenas obras ou equipamentos, como tratores, em suas bases eleitorais.
A decisão de Rosa Weber foi tomada em uma ação de Arguição de Descumprimento de Preceito Fundamental (ADPF) formulada pelo PSOL e apresentada em junho deste ano. Posteriormente, os partidos Novo, Cidadania e PSB também solicitaram a suspensão da execução das emendas de relator-geral, os pedidos passaram a tramitar em conjunto no Supremo.
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Pouco depois da decisão da ministra, o presidente do STF, Luiz Fux, marcou para a próxima 3ª feira, dia 9, o início do julgamento do caso no plenário virtual da Corte.
“A liminar concedida pela ministra Rosa Weber vem para confirmar o que sempre dissemos: as emendas de relator promovem sigilo sobre o orçamento, dificultando seu acompanhamento e fiscalização. Além disso, esta decisão é extremamente importante para a proteção da democracia e do funcionamento do Congresso Nacional. O orçamento público não pode ser usado para influenciar no resultado de votações no Parlamento, e nem ser manipulado secretamente. Um escândalo, que precisava acabar”, disse o líder da Oposição na Câmara, Alessandro Molon (PSB-RJ).
“A decisão da ministra Rosa Weber foi uma vitória importante da nossa luta contra o orçamento secreto e a política do toma-lá-da-cá. Uma prática escandalosa que dá sustentação à base do governo Bolsonaro no Congresso. A fonte de recurso para Arthur Lira e o Centrão poderem comprar apoio aos seus projetos está secando. Agora esperamos que o STF tome uma decisão definitiva sobre o tema, no sentido de acabar de vez com esse absurdo que é a execução de emendas do relator”, disse a líder do PSOL na Câmara, Talíria Petrone (RJ).
“A decisão da ministra Rosa Weber recoloca o Orçamento nos devidos padrões constitucionais. A transparência é o melhor remédio para evitar desperdício e corrupção. Será possível saber, por exemplo, quem foram os beneficiários dos mais de 1 bilhão pagos nas vésperas da votação da PEC do calote”, disse o senador Alessandro Vieira (Cidadania-SE) sobre a decisão de Weber.
“Rosa Weber deu basta às emendas de relator, 18 bi, usadas pra comprar votos favoráveis a projetos obscuros, privados no interesse, nocivos para o coletivo. Além de cheques em branco, sem controle e fiscalização, elas dão origem a tratoraços superfaturados. Não mais”, disse a senadora Simone Tebet (MDB-MS).
“É uma decisão importantíssima que merece ser comemorada, já que acaba com o ‘orçamento secreto’. Ainda esta semana, no plenário, durante votação da Proposta de Emenda à Constituição (PEC 23), também conhecida como PEC do Calote, a bancada defendeu o fim dessa prática obscura, que tem servido para barganha política a fim de beneficiar o governo Bolsonaro e sua base aliada no Congresso”, disse, em nota, o líder do PT na Câmara, deputado Bohn Gass (RS).
“O orçamento da União foi sequestrado por um esquema que compra votos com emendas de relator. Rosa Weber decidiu parar esse trator”, disse a deputada Perpétua Almeida (PCdoB-AC), vice-líder da Oposição na Câmara. “É o fim do governo Bolsonaro. Quem vende voto ficará exposto, e muito do que já foi votado ainda não foi pago, ou seja, os vendedores de voto ainda levarão calote. A melhor decisão do STF em tempos”, disse o deputado Kim Kataguiri (DEM-SP), do Movimento Brasil Livre (MBL).
O advogado Felipe Santa Cruz, presidente nacional da OAB, escreveu em uma rede social: “Decisão histórica para nossa Democracia. A execução orçamentária das emendas exige transparência e não pode servir às barganhas do momento. Somos um País pobre e as poucas verbas para investimento devem ser acompanhadas por todos. Necessária a decisão da Ministra Rosa Weber”.
“A decisão é correta, pois impugna um ato obscurecido, opaco. Os representantes do Legislativo têm suas prerrogativas, mas estas não conferem ao Legislativo a possibilidade de ocultar a motivação dos seus atos. Considero uma decisão prudente e compatível com a missão do Poder Judiciário”, disse o jurista Mauro Menezes, ex-presidente da Comissão de Ética da Presidência da República.
“A decisão da ministra deve ser comemorada por todos que lutam contra a corrupção!”, celebrou Lucas Furtado, subprocurador-geral da República junto ao Tribunal de Contas da União e autor de algumas das representações que levaram o tribunal a investigar o caso. “Excelente decisão da Ministra Rosa Weber. As bilionárias emendas de relator RP9 são inconstitucionais e nocivas para a democracia”, disse o também procurador junto ao TCU, Júlio Marcelo de Oliveira.
“A ministra Rosa Weber impediu a continuidade do ‘Jabá orçamentário bilionário’. O STF confirmou o que todos sabiam. As emendas de relator são inconstitucionais. O pior e mais promíscuo instrumento de barganha entre o Executivo e o Legislativo das últimas décadas foi, enfim, interrompido pelo STF”, disse o economista Gil Castelo Branco, fundador da ONG Contas Abertas.
“A decisão da ministra Rosa Weber é uma vitória da cidadania. Reconhece o dever de transparência como princípio do Estado de Direito e confirma que a prática do orçamento secreto agride os valores democráticos e republicanos que são os pilares da Constituição”, disse Heleno Taveira Torres, professor titular de direito financeiro da Universidade de São Paulo (USP).
A reportagem procurou o Planalto e os líderes do governo no Parlamento, bem como os presidentes da Câmara e do Senado. O senador Fernando Bezerra Coelho (MDB-PE) disse que “um bom diálogo e respeito as autonomias constitucionais dos poderes certamente construirá uma solução equilibrada para essa questão”. Segundo ele, “Tudo o que precisamos é harmonia entre os poderes da república”.
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Rosa Weber suspende emenda parlamentar estratégica para Bolsonaro
Ministra do STF cita falta de transparência; decisão que atinge Congresso será analisada pelo plenário da corte
Matheus Teixeira e Thiago Resende / Folha de S. Paulo
A ministra Rosa Weber, do STF (Supremo Tribunal Federal), determinou nesta sexta-feira (5) a suspensão das emendas parlamentares que são pagas a deputados e senadores e controladas pelo relator-geral da lei orçamentária que passa pelo Congresso.
Essas emendas têm sido manejadas por governistas com apoio do Palácio do Planalto às vésperas de votações importantes para o Executivo.
Antes da aprovação da PEC dos Precatórios, por exemplo, foi liberado R$ 1 bilhão em emendas desta natureza. Essa proposta permite a expansão de gastos públicos e viabiliza a ampliação do Auxílio Brasil prometido pelo presidente Jair Bolsonaro em ano eleitoral.
A decisão foi tomada em uma ação apresentada em junho pelo PSOL. A ministra afirmou que a suspensão é necessária porque esses recursos controlados pelo relator criam "um grupo privilegiado de parlamentares que poderá destinar volume maior de recursos a suas bases eleitorais".
A magistrada disse ainda que falta transparência na destinação dessas emendas.
"Não há como saber quem são, de fato, os deputados federais e senadores da componentes desse grupo incógnito, pois a programação orçamentária utilizada por esse fim identifica apenas a figura do relator-geral", disse.
A decisão será analisada pelo conjunto do STF na próxima semana. O julgamento será virtual e os ministros terão os dias 9 e 10 para subirem seus votos no sistema.
A suspensão dessas emendas, caso seja mantida pela corte, deve ampliar as dificuldades do governo para emplacar suas pautas no Parlamento.
A magistrada determinou que as emendas relativas ao exercício financeiro deste ano deverão ser "suspensas integral e imediatamente" até que o Supremo dê uma palavra final sobre o tema.
Como mostrou a Folha nesta quinta-feira (4), foram empenhados quase R$ 1 bilhão em emendas de relator entre os dias 28 de outubro e 3 de novembro, quando a PEC foi votada. O empenho é a primeira fase do processo para o dinheiro chegar nas bases eleitorais.
O texto-base foi aprovado em primeiro turno por 312 a 144. A expectativa é que os destaques e o segundo turno sejam apreciados na terça-feira (9).
Na semana passada, o governo não conseguiu alinhar a base da Câmara, presidida por Arthur Lira (PP-AL), para conseguir os 308 votos necessários para aprovar a proposta. Foi necessário ampliar a articulação com partidos aliados e também com deputados de siglas independentes e até de oposição.
O valor de R$ 1 bilhão, por exemplo, equivale ao que foi empenhado em todo o mês de setembro como emenda de relator.
As emendas liberadas às vésperas de votação PEC dos Precatórios atendem principalmente a obras (especialmente ligadas a estradas e asfaltamento), projetos no agronegócio e a área de saúde.
Para justificar a decisão, Rosa Weber citou relatório do TCU (Tribunal de Contas da União) sobre os recursos controlados pelo relator da lei orçamentária e afirmou que "causa perplexidade a descoberta de que parcela significativa do orçamento da União Federal esteja sendo ofertada a grupo de parlamentares, mediante distribuição arbitrária entabulada entre coalizões políticas".
O parecer da corte de contas mencionado afirma que houve um aumento em relação ao ano passado de 523% em relação às emendas de relator apresentadas e de 379% nas dotações consignadas.
"Enquanto no triênio 2017-2019 as emendas de relator-geral somaram R$ 165,82 bilhões, o que representou, em média, 70,3% do total de emendas apresentadas, em 2020, aquelas emendas totalizaram R$ 151,33 bilhões", afirmou o TCU.
A ministra afirmou ainda que existe uma "diferença substancial" na execução das demais emendas em relação às de relator.
"Enquanto a execução das emendas individuais e de bancada permite a verificação da autoria das despesas e da equidade na distribuição dos recursos, o regramento pertinente às emendas do relator distancia-se desses ideais republicanos, tornando imperscrutável a identificação dos parlamentares requerentes e destinatários finais", afirmou.
Rosa Weber afirmou que a destinação dos recursos ocorrem "por meio de acordos informais".
Ela também disse que as verbas vinculadas às emendas de relator estão ocultadas em uma "rubrica orçamentária envergonhada de si mesma, instituída com o propósito de esconder por detrás da autoridade da figura do relator-geral do orçamento uma coletividade de parlamentares desconhecida".
Esses recursos destinados aos parlamentares, segundo a magistrada, violam o princípio republicano e o regime de transparência no uso dos recursos públicos.
"Em suma, há uma duplicidade de regimes de execução das emendas parlamentares: o regime transparente próprio às emendas individuais e de bancada e o sistema anônimo de execução das despesas decorrentes de emendas do relator".
Segundo a ministra, essas emendas foram instituídas em 2006 com o propósito de "conferir ao relator-geral do projeto de lei orçamentária os poderes necessários à organização do conjunto de modificações introduzidas na proposta legislativa inicial".
Em 2020, elas ganharam novo formato. "Até o exercício financeiro de 2019, as despesas oriundas de emendas do relator não possuíam indicador de classificação orçamentária próprio", disse.
Segundo ela, isso significa que, uma vez aprovado o projeto de lei orçamentária, "já não mais possível distinguir se as despesas nela previstas resultaram do projeto original ou de emenda do relator".
A ministra afirma que as emendas de relator têm "expressivo valor de recursos públicos" que são executados sem observar "quaisquer parâmetros de equidade ou padrões de eficiência na eleição dos órgãos e entidades beneficiários dos recursos alocados".
Com este argumento, a magistrada afirma que cabe ao STF derrubar a execução dessas verbas porque elas violam os princípios constitucionais da "legalidade, impessoalidade, moralidade, publicidade e eficiência".
Fonte: Folha de S. Paulo
https://www1.folha.uol.com.br/poder/2021/11/rosa-weber-do-stf-suspende-emendas-de-relator-no-congresso.shtml
Vera Magalhães: Rosa Weber pode frear poder de Lira
Ministra Rosa Weber é a relatora das ações que discutem a legalidade das chamadas emendas de relator
Vera Magalhães / O Globo
Com os partidos postulantes a uma cada vez mais distante terceira via despejando votos a favor de Jair Bolsonaro, o Tribunal de Contas da União “integrado” ao governo, como disse o presidente, e o orçamento secreto de Arthur Lira comendo solto, quem poderá frear o vale-tudo visto para a aprovação da excrescência batizada de PEC dos Precatórios?
Como sempre, os olhos estão voltados para o Supremo Tribunal Federal. Primeiro na análise da constitucionalidade da emenda que, numa só tacada, deu um calote no pagamento de precatórios e arrombou o teto de gastos. Ela é flagrantemente inconstitucional nessas duas pontas. A primeira já foi objeto de julgamento do próprio STF.
Mas não é essa a única providência que pode — e deve — partir do STF. Está tardando muito para que a ministra Rosa Weber, relatora das ações que discutem a legalidade das emendas do relator ao Orçamento, vulgo orçamento secreto, leve esse caso essencial para o país ao plenário da Corte.
A invenção de uma modalidade de emenda que é um fast-track de recursos orçamentários para as bases dos deputados e senadores, sem muita ingerência dos órgãos de controle e fiscalização, está não só colocando em xeque as contas públicas, como deturpando fortemente a governabilidade e, no limite, a democracia.
Se antes a sociedade se chocou quando Roberto Jefferson denunciou o mensalão, que consistia no uso de agências de publicidade para pagar a deputados em troca de apoio no governo Lula 1, que dizer de uma engrenagem que, sem intermediários, irriga prefeituras e empresas ligadas aos mesmos parlamentares, com fortes indícios de que parte desses bilhões volta para os beneméritos?
Trata-se de um modelo de cooptação de apoio no Congresso sem precedentes em matéria de volume de recursos e efetividade. Tanto é assim que a votação desta quarta-feira comprovou o que já venho escrevendo há tempos: graças ao controle que exerce sobre as emendas do relator, em que o relator é só um laranja, Arthur Lira é hoje o homem mais poderoso do Brasil.
Foi ele, e não nenhum ministro ou líder governista, que garantiu os votos necessários à aprovação da PEC dos Predatórios (não, não é um erro de digitação, trata-se de um projeto de predar mesmo o Orçamento, em que os beneficiários do Auxílio Brasil são só figurantes).
Lira faz o que faz, liberando até voto transcontinental, de graça? Certamente, não. Vem aí, tão certo quanto que o sol nascerá amanhã, um lauto aumento nas famigeradas emendas e no fundão eleitoral.
E então, ministra Rosa? É voz corrente no STF que ela se cercou de informações a respeito do caráter conspurcatório da democracia que tais emendas adquirem e de como isso representa um expediente desigual de força, até eleitoral, por parte do presidente de turno.
Mais: se não for o Judiciário a disciplinar essa imoralidade, quem mais? Algum presidente eleito na vigência de um instrumento tão caro ao Legislativo terá coragem de revogá-lo? Dificilmente.
O mal tem de ser estancado já, e pela raiz. Há diferentes apostas em Brasília quanto ao que Rosa proporá em seu voto e como votarão os demais nove ministros. Ela pode desde julgar as emendas do relator inconstitucionais e determinar sua extinção até estipular limites de valores e freios a seu caráter praticamente secreto.
Mas é urgente que ela libere essas ações para o plenário, sob pena de o consórcio Bolsolira continuar usando votações que envolvem pedaladas monumentais com recursos públicos como ferramenta para tentar viabilizar politicamente um presidente cuja popularidade precisa ser levantada à custa de tratores, escavadeiras e, se possível, até guindastes. No caso da turma que chancelou a PEC dos Predatórios, quanto mais superfaturados, melhor.
Fonte: O Globo
https://blogs.oglobo.globo.com/vera-magalhaes/post/rosa-weber-pode-frear-poder-de-lira.html
Elio Gaspari: O aviso do xerife de 2022
Moraes sabe como funcionam as milícias e quem as financia e como rola o dinheiro
Elio Gaspari / O Globo
Um ano antes do pleito de 2022, o Tribunal Superior Eleitoral escreveu uma boa página de sua história. Livrou a chapa de Jair Bolsonaro da cassação e avisou aos interessados que se repetirem o golpe das notícias falsas e das milícias eletrônicas, pagarão pelos seus delitos. Nas palavras do ministro Alexandre de Moraes, que presidirá a Corte em 2020: “Irão para a cadeia”.
A decisão unânime do TSE acompanhou o voto de 51 páginas do corregedor Luiz Felipe Salomão. No ambiente envenenado da política nacional, Salomão apresentou uma peça redonda e cirúrgica na demonstração das malfeitorias cometidas e equilibrada na conclusão de que faltaram provas e as impressões digitais necessárias para justificar a cassação de uma chapa três anos depois de sua posse. O magistrado mostrou a letalidade do vírus e abriu o caminho para a advertência de Moraes.
Passados três anos do festival de patranhas de 20018, Alexandre de Moraes chegará à presidência do TSE em agosto, com a estrela de xerife no peito. Salomão fez sua carreira na magistratura; Moraes, no Ministério Público, com uma passagem pela Secretaria de Segurança de São Paulo. Além disso, na condução do inquérito das notícias falsas conhece as obras e pompas das milícias eletrônicas e mostrou-se rápido no gatilho ao mandar delinquentes para a cadeia. Zé Trovão, o caminhoneiro foragido, decidiu entregar-se à Polícia Federal. Na estrela de xerife de Moraes brilha o destempero com que Jair Bolsonaro investiu contra ele, chamando-o de “canalha”.
Moraes sabe como funcionam as milícias e quem as financia e como rola o dinheiro. Salomão, por seu turno, já firmou a jurisprudência que congela os recursos que as alimentam. As conexões internacionais dessas milícias, um fato que há três anos estavam no campo da ficção cibernética, hoje estão mapeadas. Se há um ano elas tinham o beneplácito do governo americano, hoje têm o FBI no seu encalço.
Com Moraes na presidência do TSE é possível prever que entre o início dos disparos propagadores de mentiras e a chegada dos responsáveis à carceragem passarão apenas dias ou, no máximo, poucas semanas. Basta ler o voto de Salomão e acompanhar as decisões de Moraes para se perceber que os reis das patranhas de 2018 são hoje sócios de colônias de nudismo.
Esteves errou a conta
O banqueiro André Esteves lida com números. Noves fora outras impropriedades cometidas em sua fala aos clientes do BTG, ele disse que “no dia 31 de março de 1964 não teve nenhum tiro, ninguém foi preso, as crianças foram para escola, o mercado funcionou.”
O dia 31 de março, quando o general Olímpio Mourão Filho se rebelou em Juiz de Fora, foi relativamente normal, com umas poucas prisões. Como disse o marechal Cordeiro de Farias, “o Exército dormiu janguista”. Cordeiro, um revoltoso desde 1924, foi um patriarca das conspirações do século passado e sabia o que aconteceu naquelas horas. No dia seguinte, acrescentou o marechal, o Exército “acordou revolucionário”. Foram presas centenas de pessoas, entre as quais o governador Miguel Arraes, de Pernambuco, mandado para Fernando de Noronha. Estádios e navios foram usados como cadeias.
Mais: no dia 1º de abril morreram sete pessoas.
Para os padrões, foi um golpe incruento mas, como lembrou a Central Intelligence Agency ao presidente Lyndon Johnson na manhã de 7 de abril: “Cresce o medo, não só no Congresso, mas mesmo entre aliados da revolta, que a revolução tenha gerado um monstro.”
Não deu outra.
Ministros e meteoros
Em março de 2020, diante do estrago provocado pela pandemia, o ministro Paulo Guedes disse que “nós fomos atingidos por um meteoro”. Passou-se um ano e ele viu novamente um meteoro na conta de R$ 90 bilhões dos precatórios devidos pela União.
A pandemia podia ser comparada a um meteoro, por natural e imprevisível. Já o espeto dos precatórios nada tem de natural e estava lá há anos. Mesmo assim, persistiu na teoria dos meteoros.
O último grande meteoro que atingiu o Brasil foi o Bendegó, achado no século XVIII. Tem cinco toneladas e não fez grandes estragos.
De lá para cá, o Brasil teve mais de cem ministros da Fazenda.
Alguns deles fizeram estragos maiores que os objetos caídos do céu.
Chamem o André
Durante seu piti ao responder às perguntas de André Marinho numa entrevista, Jair Bolsonaro repetiu seis vezes que “se o Marinho entrar mais uma vez na tela eu vou embora”. Como ele voltou, o capitão levantou-se e abandonou a cena.
Não se pode saber o melhor caminho para que Bolsonaro se vá, mas ele mostrou que se chamarem o André Marinho ele vai.
O verdadeiro fantasma
Gustavo Bebianno pode ter virado um fantasma assombrando Jair Bolsonaro, mas a verdadeira assombração que ronda o capitão está viva e atenta. É o general da reserva Carlos Alberto dos Santos Cruz, defenestrado da Secretaria de Governo nos primeiros meses do governo.
Santos Cruz fala pouco. Tornou-se um atento ouvinte de quase todos os generais da ativa que, tendo cometido a imprudência de se juntar ao capitão, viram-se tratados como cabos.
Impunidade patriótica
Outro dia o ministro Tarcísio de Freitas, da Infraestrutura, tratou da famosa greve dos caminhoneiros de 2018 e disse o seguinte:
“A paralisação foi financiada por empresas de transporte, com o apoio do agronegócio”.
Até as pedras sabiam disso, mas o presidente Michel Temer e seu ministro da Defesa, Raul Jungmann, rosnaram e nenhum empresário pagou pelo que fez.
Quando o movimento já durava uma semana, com resultados catastróficos para a economia do país, o deputado Jair Bolsonaro, candidato a presidente disse o seguinte:
“Qualquer multa, confisco ou prisão imposta aos caminhoneiros por Temer ou Jungmann será revogada por um futuro presidente honesto e patriota.”
O atalho do Centrão
Quando o Centrão se mostra disposto a patrocinar uma emenda constitucional que dá cadeiras vitalícias (com imunidade) aos ex-presidentes, está pavimentando o caminho do seu desembarque.
O capitão iria para o Senado e o Centrão apoiaria o novo governo, seja qual for, como aconteceu em relação a todos os seus antecessores.
Pontes não é burro
O ministro Marcos Pontes, da Tecnologia, levou na esportiva o fato de seu colega Paulo Guedes tê-lo chamado de “burro”.
Ex-aluno do Instituto Tecnológico da Aeronáutica e coronel da reserva da FAB, é provável que burro ele não seja.
Em abril do ano passado o doutor anunciou a descoberta de dois remédios com 94% de eficácia contra o coronavírus:
— No máximo na metade de maio, um momento crítico, nós teremos aqui uma solução de um tratamento.
Pontes não é burro, acha que os outros são.
Fonte: O Globo
https://oglobo.globo.com/politica/o-aviso-do-xerife-de-2022-25258620
Bolsonaro aciona STF contra pedido da CPI para bani-lo das redes
Bolsonaro associou falsamente vacinas contra covid ao risco de desenvolver aids em live, excluída por redes sociais
DW Brasil
Após presidente ligar vacinas a aids, comissão no Senado aprovou requerimentos pela suspensão de suas contas nas redes sociais e a quebra de seu sigilo telemático. Em ação no Supremo, AGU pede anulação das decisões.
O presidente Jair Bolsonaro acionou o Supremo Tribunal Federal (STF) contra a decisão da CPI da Pandemia a favor da suspensão de suas contas nas redes sociais e da quebra de seu sigilo telemático.
A ação foi apresentada nesta quarta-feira (27/10), mirando requerimentos aprovados pela comissão no Senado em sua última sessão, na terça-feira, após Bolsonaro ter associado vacinas contra covid-19 ao risco de desenvolver aids. A falsa relação foi feita durante uma live transmitida em redes sociais na semana passada, posteriormente excluída por Facebook, Instagram e YouTube.
Um dos requerimentos determina que a CPI apresente ao ministro do STF Alexandre de Moraes, relator do inquérito das fake news, uma medida cautelar pedindo que o presidente seja proibido de se manifestar em redes sociais – como ocorreu com o ex-presidente americano Donald Trump, por iniciativa das próprias plataformas.
A decisão pede que o banimento de Bolsonaro ocorra "até ulterior determinação". A CPI ainda requer que o presidente seja obrigado a se retratar sobre a associação entre vacinas e aids, sob pena de R$ 50 mil por dia em caso de descumprimento.
A comissão também aprovou a quebra do sigilo telemático de Bolsonaro sobre seu uso de redes sociais do Google, Facebook e Twitter, de abril de 2020 até o momento, e solicitou que os dados sejam enviados ao Supremo e à Procuradoria-Geral da República (PGR). Isso inclui dados como os IPs, cópias do conteúdo armazenado e informações sobre quem administra as publicações.
A ação de Bolsonaro
No mandado de segurança enviado ao STF, a Advocacia-Geral da União (AGU), responsável pela defesa judicial do governo, pede que os requerimentos sejam anulados, justificando que as decisões extrapolam as competências da comissão de senadores.
"Note-se que não há poderes de investigação criminal ou para fins de indiciamento, seja da Câmara dos Deputados ou do Senado Federal, em face do presidente da República, no âmbito de CPIs ou de qualquer outra Comissão Parlamentar, seja a que título for", diz a AGU.
A ação também afirma que a CPI inverteu "de forma integral" a garantia dos direitos de Bolsonaro, já que a comissão não poderia "instar órgão jurídico a promover a investigação e responsabilização do presidente da República, o qual, conforme delineado, não pode sequer ser convocado como testemunha no âmbito da CPI".
Ainda nesta quarta-feira, o ministro Alexandre de Moraes foi escolhido como relator da ação de Bolsonaro no STF, uma vez que ele já relata outros casos ligados ao mesmo tema.
Mentira sobre aids
Em sua live da quinta-feira passada, Bolsonaro leu um texto afirmando que vacinados com as duas doses contra a covid-19 estariam desenvolvendo a "síndrome da imunodeficiência adquirida" – o nome oficial da aids – "mais rápido do que o previsto" e que tal conclusão era supostamente apoiada em "relatórios oficiais do governo do Reino Unido".
No entanto, não há estudos do governo do Reino Unido que mencionam tal risco. Entidades médicas e cientistas imediatamente desmentiram o presidente em redes sociais.
A notícia falsa citada por Bolsonaro foi publicada originalmente pelos sites Stylo Urbano e Coletividade Evolutiva, este último um site antivacinas que veiculou fake news ao longo da pandemia. Os dois sites se basearam numa página em inglês conhecida por espalhar teorias conspiratórias.
O site Aos Fatos apontou que os textos divulgados por Stylo Urbano e Coletividade Evolutiva inseriram de maneira fraudulenta uma tabela que não existia em documentos oficiais das autoridades sanitárias do Reino Unido.
Antes da última sessão da CPI na terça-feira, o relator Renan Calheiros comentou a live de Bolsonaro e chamou o presidente de "serial killer que tem compulsão de morte e continua a repetir tudo que já fez anteriormente".
Fonte: DW Brasil
https://www.dw.com/pt-br/bolsonaro-aciona-stf-contra-pedido-da-cpi-para-bani-lo-das-redes/a-59648794