Sombra
Luiz Carlos Azedo: À sombra da Lava-Jato
É impressionante a presença da Operação Lava-Jato como vetor do processo político, a oito meses das eleições. Toda movimentação em curso, seja no Executivo seja no Legislativo, e até mesmo no Judiciário, tem como pano de fundo as investigações sobre os elos escusos entre políticos e empreiteiras para desvio de recursos públicos e financiamento ilegal de campanha. Nem mesmo o Supremo Tribunal Federal (STF) escapa do redemoinho, por causa da iminente prisão do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva. Ontem mesmo, a Corte foi palco de uma batalha de Itararé, aquela que foi muito anunciada e não ocorreu, nas proximidades da divisa entre São Paulo e Paraná, durante a revolução de 1930.
No começo da próxima semana, o Tribunal Regional Federal da 4ª Região (TRF-4) deverá julgar o embargo de declaração da defesa de Lula contra a condenação de 12 anos e 1 mês de prisão, com execução imediata da pena. A confirmação da sentença pelos desembargadores federais de Porto Alegre resultará na decretação da prisão do ex-presidente da República por determinação do juiz federal Sérgio Moro, em razão de jurisprudência do Supremo que determina a execução da pena após condenação em segunda instância. É assunto de repercussão internacional.
Fora da disputa eleitoral de 2018, por causa da Lei da Ficha Limpa, que somente pode ser revogada por emenda constitucional, Lula concentra os esforços no sentido de evitar a própria prisão. Seus advogados pleiteiam no Supremo que o ex-presidente não seja encarcerado antes de o processo transitar em julgado em todas as instâncias da Justiça. Para isso, precisa modificar a jurisprudência, forçando um novo julgamento que coloque em xeque o entendimento de que a pena comece a ser cumprida após decisão em segunda instância.
A presidente do Supremo, ministra Cármen Lúcia, em entrevistas quase diárias, tem afirmado que não colocará em votação no plenário da Corte a revisão da jurisprudência. Mesmo assim, não é levada a sério por alguns de seus pares, que começaram a acolher pleitos de advogados que podem servir de paralelo para revisão do entendimento também em relação a Lula. Nas conversas de bastidor, a aparência frágil da presidente do Supremo alimenta especulações de que acabaria por ceder às pressões.
Políticos enrolados na Lava-Jato, de todos os matizes, intensificaram as articulações junto a ministros do Supremo de suas relações para pôr a mudança em votação. Todos querem Lula fora da disputa eleitoral, mas não desejam que o petista seja preso, pois todos correrão o mesmo risco quando forem julgados. É o chamado efeito Orloff, aquele da propaganda de vodca: “Eu sou você amanhã!” Urdiu-se a manobra perfeita: acabar também com o foro privilegiado para crimes cometidos antes do mandato. Assim, ao mesmo tempo em que Lula não seria preso, com a mudança de jurisprudência, os que aguardam julgamento no Supremo ganhariam logo fôlego para prescrição de pena, voltando a ser julgados a partir da primeira instância.
Fora de pauta
Não se falava outra coisa em Brasília na manhã de ontem, com a expectativa de que o ministro Celso de Mello, decano da Corte, convencesse Cármen Lúcia a pôr o assunto em pauta, depois de uma reunião reservada com seus pares. A reunião foi anunciada aos quatro ventos, mas não aconteceu. Supostamente, a ministra é tão mineira quanto os políticos de sua terra. Consultada pelo decano da Corte sobre uma reunião informal para tratar do assunto, aquiesceu, mas não chamou ninguém pra conversar. Noticiado nos jornais, o encontro não aconteceu porque ninguém foi convidado.
Sabe-se, porém, que toda sorte de manobra já foi pensada para pôr a matéria em pauta no Supremo contra a vontade de Cármen, que não recua. Ministros contrários à mudança da jurisprudência também ameaçam fazer retaliações. À sombra da Lava-Jato, o Supremo vive dias de muito estresse, às vésperas da prisão do ex-presidente Lula. Quem já foi rei não perde a majestade, diz um velho ditado popular. Na contramão das expectativas, porém, o ministro Edson Fachin, relator da Lava-Jato no STF, ontem rejeitou embargo de declaração contra decisão de 2016 na qual a Corte decidiu pelo cumprimento da pena de prisão após uma condenação em segunda instância. Fachin considerou que uma mudança nesse sentido só será possível em um novo julgamento da ação, de “mérito”, a ser marcado por Cármen Lúcia. Também rejeitou o pedido para que levasse o recurso a julgamento no plenário, diretamente, sem passar pela presidente do Supremo.