social

Evandro Milet: ESG e a evolução do capitalismo

O grande economista Joseph Schumpeter foi preciso quando disse: “ A evolução capitalista significa perturbação.O capitalismo é essencialmente um processo de mudança econômica endógena. Na ausência de mudança a sociedade capitalista não pode existir… Por isso deve haver constante mudança vinda de dentro… Neste sentido, o capitalismo estabilizado é uma contradição em termos”.

E assim tem sido ao longo do tempo. A partir do início reconhecido do capitalismo no século XV, esse sistema conviveu com trabalho escravo, trabalho infantil, ausência de direitos trabalhistas, falta de segurança para investidores, falta de transparência na gestão, confusão entre recursos da empresa e dos proprietários, poluição do ambiente, ausência de preocupação com consumidores, qualidade deficiente de produtos, monopólios e cartéis, corrupção, e muitas outras mazelas, algumas que persistem até hoje. Mas as mudanças foram acontecendo ao longo do tempo, por demanda ou pressão de sindicatos, consumidores, cidadãos conscientes, políticos e concorrentes, empresários ou países.

Há algum tempo, o conceito de responsabilidade social se espalhou exigindo da empresa uma preocupação com seu entorno e contestando a postura definida por Milton Friedman, onde dizia que responsabilidade social da empresa era gerar lucro, porque gerava empregos e girava a economia. O conceito de responsabilidade social corporativa sucedeu a pura filantropia, já procurando associar as ações sociais ao negócio da empresa, porém ainda tentando misturar água com óleo e entendendo as ações como custo e obrigação.

Posteriormente, o conceito de valor compartilhado, lançado por Michael Porter, considerado por muitos como o maior consultor em gestão vivo, colocou definitivamente na mesma conta o negócio da empresa e sua atuação social, que deve estar vinculada ao negócio.

Todos esses conceitos convergem agora para os fatores ESG (ambientais, sociais, governança), com os quais consumidores cobram postura responsáveis dos seus fornecedores e o mercado financeiro reflete isso escolhendo investimentos a partir desses critérios.

A tendência acontece independentemente se você gosta ou não da Greta(eu gosto), se acha que é uma visão globalista comandada pela China com teses de Gramsci ou se o aquecimento solar é uma invenção.

Os fatores ESG incluem, entre outros, os listados a seguir:

Fatores ambientais: uso de recursos naturais, emissões de gases de efeito estufa (CO2, gás metano), eficiência energética, poluição, gestão de resíduos e efluentes.

Fatores sociais: políticas e relações de trabalho, inclusão e diversidade, engajamento dos funcionários, treinamento da força de trabalho, direitos humanos, relações com comunidades, privacidade e proteção de dados.

Fatores de governança corporativa: independência do conselho de administração, política de remuneração da alta administração, diversidade na composição do conselho de administração, estrutura dos comitês de auditoria e fiscal, compliance, ética e transparência.

O que vemos hoje é que investidores, consumidores e os novos entrantes da geração Z no mercado de trabalho estão prestando atenção nesses fatores para decidir onde investir, de quem comprar e onde trabalhar. É a evolução do capitalismo em direção a uma maior humanização. Milton Friedman foi ultrapassado nesse ponto. Schumpeter estava certo.


Agência Senado: Brasil, recordista em desigualdade

Cintia Sasse, Agência Senado

A pandemia escancarou, mais uma vez, o péssimo quadro da desigualdade social e econômica no Brasil. Durante a primeira onda do coronavírus, no ano passado, mais de 30% dos 211,8 milhões de residentes no país tiveram de ser socorridos na etapa inicial do auxílio de R$ 600 aprovado pelo Congresso, segundo dados do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) divulgados em julho de 2020.

O contingente dos que precisaram de ajuda espantou até mesmo algumas áreas de governo, mesmo tomando em consideração os desvios e irregularidades cadastrais. O Tribunal de Contas da União (TCU) estimou, em relatório divulgado ao final de fevereiro, que 7,3 milhões de brasileiros podem ter recebido o auxílio emergencial indevidamente. Mesmo quem não agiu de forma intencional terá que se acertar com o fisco agora em 2021.

Os cálculos quanto ao número total de beneficiários variam entre 67 e 68 milhões de brasileiros na primeira fase e cerca de 57 milhões na segunda rodada, a partir de setembro, quando o auxílio foi reduzido para R$ 300. Essa variação depende da fonte de informação consultada.

Além do espantoso número de beneficiários, o custo do chamado coronavoucher evidenciou o peso financeiro da desigualdade no país. Foram gastos praticamente R$ 293 bilhões no ano passado, cerca de 56% dos recursos federais desembolsados para enfrentar a primeira onda da pandemia, de acordo com o Siga Brasil, sistema do Senado que facilita a busca de dados do Tesouro Nacional. Ou R$ 321,8 bilhões, conforme os cálculos divulgados pelo Ministério da Economia sobre o gasto com o auxílio emergencial.

O importante é que qualquer uma das duas cifras reflete o custo elevado do perfil de distribuição de renda no país. Os recursos socorreram não só os que ficaram desempregados ou perderam seus pequenos negócios no meio da maior crise sanitária deste século. Entre os elegíveis ao benefício estavam brasileiros situados na base da pirâmide social. Ou seja, os pobres que vivem com menos de US$ 5,50 por dia ou os muito pobres que conseguem apenas US$ 1,90, conforme classificação do Banco Mundial.

Desigualdade
 

— O Brasil está entre os dez países mais desiguais do mundo — afirma o sociólogo Luis Henrique Paiva, coordenador de estudos em seguridade social do Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea).
 

De fato. A publicação Síntese de Indicadores Sociais, divulgada pelo IBGE em 2020, trouxe estimativas do Banco Mundial com base no índice de Gini, instrumento criado pelo matemático italiano Conrado Gini para medir o grau de concentração de renda no grupo a ser avaliado. A variação numérica é de zero a um, sendo zero quando todos têm a mesma renda e um representando o extremo oposto.
 

Nesse ranking da desigualdade, o Brasil apresenta 0,539 pelo índice de Gini, com base em dados de 2018. Está enquadrado entre os dez países mais desiguais do mundo, sendo o único latino-americano na lista onde figuram os africanos. O Brasil é mais desigual que Botsuana, com 0,533 pelo índice de Gini, pequeno país vizinho à África do Sul com pouco mais que 2 milhões de habitantes.


Eurípedes Alcântara: O ‘reset’ é o novo digital

Reset é o novo digital. Palavra da língua inglesa, seu significado é restabelecer, recompor e, especialmente, reiniciar. Por reset, agora se pretende englobar num único substantivo o fenômeno de adoção rápida em massa pelas empresas dos princípios do ASG — Ambiente, Social e Governança. É um caminho sem volta. Em junho do ano passado, o World Economic Forum, WEF, de Davos, na Suíça, dedicou sua reunião anual a “The Great Reset”. Sem o mesmo poder de impacto e influência de edições anteriores, o WEF 2020 foi mais o reconhecimento de um fato do que seu impulsionamento pelas correntes do pensamento empresarial.

Em anos passados, discutia-se qual seria o grau de digitalização ideal para as empresas — ou, melhor, qual deveria ser o limite de poder dos departamentos de Tecnologia da Informação (TI). Aos poucos, foi ficando claro que a discussão estava enviesada, pois o ideal seria não ter departamentos de TI, mas toda a empresa deveria digitalizar-se na forma de atuar e pensar seu negócio. O reset queimou etapas, e observam-se por toda parte empresas se engajando nas políticas de ASG em todas as atividades da organização, numa velocidade ainda mais formidável do que aquela em que o digital se impôs.

Fabio Barbosa, executivo de grandes empresas, pioneiro do ASG no Brasil, define bem o momento: “A cada dia sai do mercado um consumidor, um investidor, um profissional que achava tudo isso uma bobagem, e entra um jovem que toma suas decisões de consumo, investimento e carreira com base nos princípios de ASG.”

Reset é o capitalismo como conhecemos, mas regido por uma série de regras novas, às quais é preciso obedecer para obter o lucro desejado. Sim, o lucro continua sendo o grande motor das empresas. O reset não é modismo. É um movimento de sobrevivência do capitalismo, parecido com o que, na Igreja Católica nos anos 1960, se chamou de aggiornamento no pontificado do Papa João XXIII. São atualizações a que instituições seculares precisam se submeter com alguma regularidade para manter seu poder de influência.

Com o reset, o capitalismo toma das mãos da esquerda uma de suas bandeiras mais poderosas das últimas décadas, o ambientalismo. De quebra, captura também as bandeiras da responsabilidade social e da governança, que dá força aos stakeholders em oposição ao tradicional monopólio do poder dos shareholders. Ou seja, a orientação das atividades empresariais passa a ser realizadas em harmonia com os interesses não apenas dos acionistas, mas com igual satisfação dos empregados, consumidores e de todas as demais pessoas de qualquer forma afetadas pelas empresas, suas fábricas e seus produtos.

O economista Eugene Fama, da Universidade de Chicago, ganhador do Prêmio Nobel em 2013, vinha sendo um dos estudiosos mais descrentes da viabilidade de um “grande reinício” das economias ocidentais, principalmente em função do aumento dos custos de operação. Num artigo publicado no final de outubro de 2020 (“Contract Costs, Stakeholder Capitalism, and ESG”), Fama reconhece a inevitabilidade de um reset geral das empresas, mesmo com impactos negativos em seus resultados financeiros. Fama atribui o poder de transformação às forças de mercado. “Minha conclusão é que as soluções de mercado devem continuar moldando as empresas (para que se encaixem) nesse novo modelo.”

Michael Lind, da Universidade do Texas, concorda com os efeitos positivos do A e do G, mas é cético quanto aos avanços do S na sigla ASG. Em seu livro “The New Class War: Saving Democracy from the Managerial Elite” (“A nova guerra de classes: salvando a democracia da elite gerencial”), ainda sem edição em português, Lind enxerga uma batalha política global entre “oligarcas populistas” e “salvadores da democracia”. O respeito ao meio ambiente e a governança arejada são de pouca consequência para o desfecho desse combate, acredita Lind. A meu ver, Lind está sendo pessimista. O reset terá seu sucesso avaliado justamente por conter a fúria dos insatisfeitos à esquerda e à direita.


PPS lança o Manual do Candidato e da Candidata com orientações para a disputa eleitoral de 2018

O PPS acaba de lançar o Manual do Candidato e da Candidata. A publicação tem como objetivo preparar os candidatos e candidatas do partido para as eleições deste ano.

O livreto aborda questões gerais da política com foco na realidade social e política brasileira e traz os valores e princípios que norteiam as ações formadoras de quem disputará o próximo pleito. Ele também contém as propostas formuladas na Conferência Nacional “A Nova Agenda do Brasil”, promovida pela FAP, além de trechos da proposta do PPS para um Programa de Governo.

Faça o download do Manual do Candidato e da Candidata do PPS

O Manual apresenta ao candidato as informações necessárias para compreender e utilizar os mais diversos e modernos recursos que o auxiliarão na busca de votos. Além disso, traz ainda leis e resoluções do Tribunal Superior Eleitoral (TSE), assim como a Resolução Eleitoral e as normas do PPS para as convenções que serão realizadas entre os dias 20 de julho e 05 de agosto.

Trata-se de um material mais que necessário para que dirigentes partidários e quem vai assumir candidatura nas unidades da Federação tenham ao seu dispor todos os passos a serem dados em busca do sucesso pessoal ou partidário.


Luiz Carlos Azedo: Nada pelo social

 

“Tudo pelo social”, o slogan do governo Sarney, foi escolhido com base nas regras de ouro do marketing, mas deu tudo errado, com o fracasso do Plano Cruzado. Foi inspirado na Constituição de 1988, a carta cidadã de Ulysses Guimarães, que ampliou os direitos sociais dos brasileiros, contra a qual José Sarney se bateu, depois de embarcar no populismo voluntarista de sua política econômica de crescimento acelerado e fracassar. Acabou o mandato com governo na lona, em meio à hiperinflação, juntamente com seus aliados. Todos eles assistiram perplexos uma disputa de segundo turno entre os ex-presidentes Collor de Mello e Luiz Inácio Lula da Silva, vencida pelo primeiro, que foi apeado do poder porque era um “outsider” na política. A crise econômica parecia imbatível.

Ministro da Fazenda de Itamar Franco, Fernando Henrique Cardozo fez o ajuste fiscal e um plano de estabilização da economia que deram tão certo que acabou presidente da República. Foi eleito graças ao fim da hiperinflação. Seu governo fez a reforma patrimonial do Estado (privatizações) e adotou uma política social liberal, que consistiu na focalização dos gastos sociais nos mais pobres. As políticas sociais universalistas enfrentaram grande restrição de recursos, mesmo assim, foram inovadoras em alguns aspectos, entre os quais a universalização do ensino básico, sob comando do ex-ministro da Educação Paulo Renato, já falecido, e alguns êxitos importantes na saúde pública, como o controle da epidemia de Aids e a produção de medicamentos genéricos, com a quebra de patentes internacionais, mérito do senador José Serra (PSDB-SP).

Lula deitou e rolou quando assumiu o poder, porque a cama estava arrumada. A crise cambial que enfrentou foi fruto de expectativas negativas, mas acabou facilmente superada quando anunciou na Carta aos Brasileiros que manteria o “mais do mesmo” da política monetária do ex-ministro da Fazenda Pedro Malan: superavit fiscal, câmbio flutuante e meta de inflação. Na crise financeira internacional de 2008, porém, caiu no canto da sereia da chamada “nova matriz econômica” de Dilma Rousseff. Como o Brasil ainda surfava as altas taxas de crescimento da China e a expansão da economia mundial, Lula conseguiu manter taxas elevadas de crescimento na sua sucessão, chegando a 7% em 2010, quando Dilma foi eleita pela primeira vez.

Tudo parecia caminhar na direção da transformação do Brasil numa potência emergente, com uma classe média numerosa, mas o naufrágio era iminente. As manifestações de 2013 foram o recado dos jovens de que as coisas não estavam indo bem, apesar do oba-oba em torno da Copa do Mundo. Além disso, os sintomas de que a corrupção era sistêmica e fora organizada de cima pra baixo já eram aparentes. Mesmo assim, Dilma foi reeleita em 2014, quando a economia já mandava sinais de que o seu motor estava pifando.

Desemprego
Dilma ganhou o segundo mandato, mas não levou. O impeachment de Dilma Rousseff foi mais um ponto fora da curva, como o de Collor de Mello. Dilma não soube aproveitar as oportunidades, potencializou todas as ameaças, anulou os pontos fortes de seu governo e não conseguiu compensar nenhum de seus próprios pontos fracos. O que parecia impossível aconteceu: perdeu o mandato de presidente da República com o povo na rua pedindo sua cabeça, enquanto o PT, acuado, procurava preservar suas forças com a narrativa do golpe e a candidatura de Lula a presidente em 2018.

Chegamos ao governo de Michel Temer, que não somente articulou a queda de Dilma, como herdou seu sistema de alianças, expurgado do PT e seus satélites de esquerda. A antiga oposição se incorporou ao governo, dando-lhe legitimidade e base de apoio no Congresso para enfrentar as adversidades. No caso, foram duas denúncias do ex-procurador-geral da República Rodrigo Janot, ambas rejeitadas pela Câmara, da qual Temer foi presidente três vezes. Soube neutralizar os pontos fracos e conter as ameaças para preservar o mandato.

Temer reverteu a recessão e retomou o crescimento; jogou a inflação abaixo de 3,5% ao ano, com uma taxa de juros que deve chegar a 7%. Teria tudo para ter o mesmo sucesso de Itamar Franco e emplacar um sucessor, mas está longe disso. Além do desgaste provocado pelo envolvimento do governo na Operação Lava-Jato, o governo parece não dar a menor bola para a questão social, haja vista a portaria sobre trabalho escravo, num país com 13 milhões de desempregados declarados. Não tem política de emprego, a face mais perversa da crise social, que cresce vegetativamente, a ponto de os indicadores de 2017 serem superiores aos de 2016, porque o ingresso de jovens no mercado de trabalho é superior à geração de novos postos de trabalho, que este ano atingiu 1 milhão de postos. O mais grave, porém, a crise de segurança, na qual a violência urbana, principalmente no Rio de Janeiro, escandaliza o país e o mundo.

 


Valdo Cruz: Teto dos gastos públicos acaba com a era da fantasia

BRASÍLIA – Logo depois de ser aprovado em primeiro turno na Câmara dos Deputados, o teto dos gastos públicos foi alvo de nova onda de críticas, principalmente de defensores da saúde e educação, acuando mais uma vez o governo Temer.

A sensação é que, de repente, estava sendo revelado o lado perverso do mecanismo que limita o crescimento das despesas públicas à inflação do ano anterior. Seria mais uma invenção técnica e fria de economistas que não pensam no social.

Tal discurso é fácil de pegar. Afinal, ninguém pode ser a favor de corte de verbas em saúde e educação, num país com elevado deficit nessas áreas. Basta circular por hospitais e escolas públicas para checar a situação de emergência deles.

Os críticos do teto passaram a divulgar números, para todos os gastos, de perdas milionárias que as duas áreas sofrerão nos próximos anos. O governo sustenta que saúde e educação terão suas verbas preservadas e podem até subir mais.

Não vou entrar na guerra dos números. Foco outra questão. O país precisa, sim, aumentar a verba da área social. Congelá-la não é o melhor caminho. Mas, para isto, precisamos fazer escolhas. Cortar em outras áreas ou aumentar impostos.

A segunda opção não é defendida por quase ninguém. A primeira, por todos, mas desde que o corte não atinja o seu bolso. Aí começa a guerra das corporações, uma minoria barulhenta que prevalece sobre os interesses da maioria.

O teto dos gastos públicos, aprovado, forçará este debate no país. É bom lembrar que o Congresso não está impedido de, no Orçamento, elevar as verbas de saúde e educação. Mas terá de tirar de outras áreas para respeitar o teto geral de gastos.

A medida acaba com a era da fantasia, em que se elevava artificialmente as receitas para bancar toda sorte de despesas a fim de beneficiar certos grupos. A conta não fechava e era jogada nas costas de todos os brasileiros. Vamos cair na real. (Folha de S. Paulo)


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