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Segurança Pública de Lula mira arsenal pesado de CACs e pode cassar licenças de clubes de tiro
Alex Mirkhan*
O governo de transição planeja conter o fluxo de armas de fogo e munições de civis para grupos criminosos e milícias privadas. Coordenador da equipe de justiça e segurança pública, o senador eleito Flávio Dino (PSB-MA) tem falado em revogar decretos de Bolsonaro para iniciar um plano de desarmamento da população.
Nesta quarta-feira, dia 23, o político maranhense voltou a atacar os decretos e portarias editados pelo governo de Jair Bolsonaro, que que fizeram o número de armas nas mãos dos civis quase triplicar, segundo levantamento do Instituto Sou da Paz.
“Existe uma decisão do presidente Lula de mudar a legislação que foi mutilada nesse período bolsonarista no sentido de voltarmos ao controle responsável sobre armas. O que temos em debate é como vai ser a regulamentação dos CACs [caçadores, atiradores e colecionadores] em relação aos arsenais que foram adquiridos nesse período em que reinou o vale-tudo. Daqui pra frente não há dúvidas de que as portarias, as normativas que foram editadas inclusive contrariando a lei serão revistas”, adiantou Dino em entrevista concedida à imprensa no Centro Cultural Banco do Brasil (CCBB) em Brasília.
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Apesar de ainda reunir propostas e estratégias, o governo Lula não deve promover mudanças drásticas de imediato para a maior parte das pessoas que já possuem armas. O foco será cortar excessos nas liberações dadas aos CACs, aumentar a fiscalização sobre clubes de tiro e recolher armas de grosso calibre.
Sob Bolsonaro, cada CAC pôde adquirir até 15 fuzis e 6 mil munições por ano, ampliando os arsenais de civis tanto em quantidade quanto em calibre. Ao mesmo tempo, os clubes de tiro se proliferam pelo Brasil e mostraram sua influência política e financeira, sendo um dos principais financiadores de protestos pró-armas realizados nos últimos quatro anos.
“A gente estima que tenha entrado ali, no mínimo, 1,2 milhão de armas só na mão de civis, dezenas de milhares de fuzis, muitos dos quais que já se sabe hoje estão sendo comprados por laranjas e desviados para o crime organizado, para milícias”, aponta Bruno Langeani, gerente de projetos do Sou da Paz.
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Ele também refuta ilações feitas por grupos armamentistas que têm difundido desinformação sobre a abrangência dos planos do governo Lula para o tema. Inclusive, um dos desafios previstos pelo próximo governo passa por campanhas de comunicação e conscientização, tentando evitar o pânico e a resistência às proposições.
“Ninguém está defendendo a proibição da compra de arma, o fim do tiro esportivo, não tem nada a ver com isso. Agora, esses excessos absurdos que foram criados, permitindo um único CPF ter 60 armas, comprar 180 mil munições, são coisas incompatíveis com o estado de direito e com a garantia de promoção de segurança pública prevista na Constituição Federal”, afirma.
Mudanças exigirão nova postura das forças de segurança
Com o apoio da Polícia Federal e do Ministério Público Federal, pretende-se verificar a frequência de integrantes de clubes de tiro, a comprovação de participação de atiradores esportivos em competições e outras medidas de controle sobre os arsenais já existentes.
Há a expectativa de que as ações sejam respaldadas por outras políticas de segurança pública, mais afirmativas do que pautadas pela repressão e o encarceramento em massa. É o que agrega Bella Gonçalves (PSOL-MG), eleita deputada estadual por Minas Gerais e membro da equipe de Cidades do governo de transição.
“Nós temos muitas armas nas mãos dos civis, talvez até mais do que nas mãos das forças policiais e isso é gravíssimo. Eu entendo que a gente vai ter que construir algumas medidas que foquem num modelo de segurança pública cidadã e consiga pensar em formas de estimular os civis a devolverem as armas, uma campanha de conscientização e a essa cultura de violência”, afirma a socióloga.
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Porém, as metas traçadas pelo governo de transição esbarram nas atribuições dadas ao Exército e à sua própria competência para cumpri-las. Além de controlar as autorizações dadas aos CACs, o braço terrestre das Forças Armadas também é responsável pelo cadastramento de armas e artefatos.
De acordo com Langeani, membros do Exército foram lenientes com as alterações de normativas feitas pelo governo federal e devem ser responsabilizados pelo crescimento de ocorrências envolvendo arsenais provenientes de CACs. Ele menciona como exemplos o aumento de ocorrências de fuzis dessa procedência sendo usados em roubos a banco e apreensões de armas de grosso calibre junto a integrantes de grupos criminosos com extensa ficha criminal pregressa.
“A nossa avaliação é que o Exército teve uma atuação vergonhosa nesse campo. A gente faz o acompanhamento de controle de armas e munições há décadas e sempre teve críticas sobre a qualidade da fiscalização das Forças Armadas, com casos de conflitos de interesse claro por militares que foram trabalhar na indústria de armas. Mas o pior de tudo foi ver o Exército dizendo ‘amém’ a todas as vontades que o governo eleito quis fazer”, enfatiza.
Atribuições do Exército podem ser revistas no futuro
O ex-governador do Maranhão Flávio Dino é o nome mais cotado até o momento para assumir o Ministério da Justiça e Segurança Pública e já se reuniu, no dia 17 de novembro, com o atual ministro Anderson Torres. Além do tema das armas, sua equipe se debruça sobre outros cinco temas principais: Amazônia, homicídios, fronteiras, drogas e o papel das polícias, em especial da PRF (Polícia Rodoviária Federal). Um relatório deve ser divulgado até 12 de dezembro.
Dino também se reuniu nesta quarta-feira (23) com secretários de segurança pública estaduais, que foram convidados a participar da elaboração de planos de ação a partir de janeiro. Uma das preocupações já declaradas é com regiões que apresentaram uma explosão no número de clubes de tiro e armas regularizadas, que seriam incompatíveis com o número de caçadores, atiradores e colecionadores cadastrados.
“Um dos lugares onde mais cresceu o registro de armas e clubes de tiros foi a região Norte, que é a região que também teve a maior alta de homicídios nos últimos anos, na contramão do que tivemos no resto do Brasil. E quando a gente analisa o número de clubes de tiros por unidades da federação, vemos que há cidades muito pequenas com dois clubes de tiro, algo que de fato perguntar qual a intenção mesmo desse crescimento”, alerta o porta-voz do Sou da Paz.
Como meta de longo prazo, há também um anseio antigo de organizações da sociedade civil em reverter uma lógica que permaneceu imtacta após a redemocratização do Brasil após a ditadura militar (1964-85).
“O que o tiro esportivo tem a ver com a missão constitucional do Exército brasileiro, que é prioritariamente de defesa nacional? O que a caça, que na verdade nem é permitida no Brasil, tem a ver com a missão do Exército? É uma série de perguntas que o Brasil vai precisar enfrentar e a gente espera que, cada vez mais, para que isso seja unificado, centralizado e debaixo de um controle civil”, finaliza Langeani.
*Texto publicado originalmente no site Brasil de Fato
RPD impressa analisa papel dos municípios na segurança pública
Revista impressa editada pela Fundação Astrojildo Pereira (FAP) terá lançamento virtual no dia 11 de agosto, às 14h30
Cleomar Almeida, da equipe da FAP
As guardas municipais não esgotam, por si só, o compromisso e a responsabilidade dos municípios para a garantia da segurança pública. As atividades que as cidades podem desempenhar nessa área ainda demandam contornos mais definidos, de acordo com a revista impressa editada pela Fundação Astrojildo Pereira (FAP) e que será lançada, no dia 11 de agosto, em evento on-line, com transmissão a partir das 14h30, no portal e redes sociais (Facebook e Youtube) da entidade.
Assista!
Com uma coletânea de sete análises inéditas, a revista impressa Política Democrática (56ª edição) “O papel dos municípios na segurança pública”, apresenta reflexões sobre os melhores caminhos para a atuação e participação dos municípios nessa área, considerada vital para a sociedade.
“O papel dos municípios na segurança pública não se resume à existência das guardas municipais”, afirma o diretor do Instituto de Ciências Sociais da Universidade de Brasília (UnB) Artur Trindade Costa, organizador da obra, em texto de apresentação. Ele também será coordenador do evento on-line.
Costa, que também é coordenador do Núcleo de Estudos sobre Segurança Pública e conselheiro do Fórum Brasileiro de Segurança Pública, ressalta que alguns municípios desenvolvem políticas sociais de prevenção de violências.
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Gestão Cidadã é tema de podcast da Fundação Astrojildo Pereira
“Em alguns lugares, estas políticas foram relativamente bem sucedidas, como Canoas (RS), Diadema (SP) e Lauro de Freitas (BA)”, cita o especialista. De acordo com ele, independentemente da forma como os municípios têm atuado na segurança pública, sua participação se dá num contexto de inexistência de um marco regulatório que defina claramente as atribuições e prerrogativas dos entes federados.
No texto “As guardas na gestão da segurança pública municipal”, um dos publicados no livro, a doutora em Antropologia Ana Paula Miranda lembra que esse tema surgiu, nos anos 1990, como coadjuvante.
“A partir de 2009, com a primeira Conferência Nacional da Segurança Pública (Conseg), o município se tornou protagonista, com a municipalidade sendo reconhecida como uma instância fundamental de cogestão da segurança pública”, disse ela.
Segundo Ana Paula, a publicação do Estatuto Geral das Guardas Municipais não possibilitou um melhor desenho para as instituições, na medida em que se limitou apenas a descrever quais são os “serviços” da segurança pública que um município pode realizar.
O texto “Os municípios e o financiamento da segurança pública no Brasil”, também publicado na revista impressa, aponta que é fundamental refletir que os entes municipais têm enorme expressão no tratamento da segurança pública.
Essa última análise conjunta é da doutora em economia Ursula Dias Peres, que também é professora da Universidade de São Paulo (USP); da doutora em administração pública e diretora-executiva do Fórum Brasileiro de Segurança Pública Samira Bueno e do mestre em gestão de políticas públicas Gabriel Marques Tonelli.
“Seja porque há o reconhecimento de que muitas soluções de políticas públicas implicam ações locais, com foco no território, seja porque diversos municípios passaram a incluir a segurança pública entre suas políticas prioritárias nos últimos anos com a criação de secretarias de segurança urbana, guardas municipais, conselhos comunitários de segurança, dentre outros”, afirmam os autores, no texto.
SERVIÇO
Evento on-line de lançamento da 56ª edição da Política Democrática impressa
Título: O papel dos municípios na segurança pública
Data: 11/8/2021
Transmissão: a partir das 14h30, no portal e redes sociais (Facebook e Youtube) da Fundação Astrojildo Pereira
Realização: Fundação Astrojildo Pereira
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Em entrevista à Política Democrática Online, ex-secretário Nacional de Segurança Pública afirma que ditadura reordenou instituições
Cleomar Almeida, assessor de comunicação da FAP
Ex-secretário Nacional de Segurança Pública, Luiz Eduardo Soares diz que polícias militares são refratárias à democracia, em entrevista exclusiva à revista Política Democrática Online de novembro, produzida e editada pela FAP (Fundação Astrojildo Pereira), sediada em Brasília. “Nós precisaríamos de uma grande coalizão e entender a necessidade de enfrentar a questão da governança das polícias e do que eu chamei um enclave institucional, alterando posturas do Ministério Público, da Justiça”, disse.
Clique aqui e acesse a revista Política Democrática Online de novembro!
Todos os conteúdos da revista são disponibilizados, gratuitamente, no site da FAP. Soares é um dos 579 alvos de um dossiê elaborado pelo Ministério da Justiça do governo do presidente Jair Bolsonaro (sem partido), a partir do monitoramento secreto de um grupo descrito como “militantes antifascistas”. O entrevistado também é escritor, dramaturgo, antropólogo, cientista político e pós-doutor em Filosofia Política.
Soares tem proposto debates sobre segurança pública, polícias e justiça criminal no Brasil há mais de 30 anos. Na opinião dele, a transição para a democracia no Brasil não foi completa porque as polícias militares mantiveram-se no tempo da ditadura e são agentes na desigualdade e no racismo estrutural que ainda assola o país, diariamente.
De acordo com a entrevista concedida à revista Política Democrática Online, há um legado à democracia de estruturas organizacionais forjadas na ditadura. “A ditadura não inventou a violência policial, as práticas conhecidas e nem as instituições como as conhecemos, mas as reordenou, reorganizou e qualificou”, disse. ‘Qualificar aqui tem sentido negativo e problemático. Essas instituições reformadas, reorganizadas e retemperadas pela ditadura, instituições muito problemáticas que têm passado obscurantista, autoritário, que dialogam com o pior da nossa tradição escravagista, foram legadas pela ditadura acriticamente, por assim dizer”, lamentou.
Soares tem vinte livros publicados, como “Elite da Tropa” (com André Batista e Rodrigo Pimentel), editado em 2006 pela Objetiva, “Elite da Tropa II” (com os mesmos coautores e Claudio Ferraz), publicado pela Nova Fronteira, em 2010, “Espírito Santo” (com Rodney Miranda e Carlos Eduardo Ribeiro Lemos), editado pela Objetiva, em 2008, além de “Rio de Janeiro; histórias de vida e morte”, publicado em 2015 pela Cia. das Letras, e os romances “Experimento de Avelar”, premiado pela Associação de Críticos Brasileiros em 1996, e “Meu Casaco de General”, este, finalista do Prêmio Jabuti em 2000. Foi professor da Unicamp e do IUPERJ, além de visiting scholar em Harvard, University of Virginia, University of Pittsburgh e Columbia University.
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Míriam Leitão: Todas as forças
A crise da segurança pública é tão ampla, tão profunda e perigosa que as autoridades precisam abandonar as partições com que veem suas responsabilidades. Os estados pedem a presença das Forças Armadas, que acham que não é sua função. A União diz que está apenas auxiliando, porque é atribuição constitucional dos estados. Há uma emergência e as disputas de jurisdição aumentam o risco de todos.
Existem brigas e rixas entre polícias e desentendimento entre instâncias administrativas sobre de quem é a responsabilidade em cada evento. As Forças Armadas dizem que não foram preparadas para a atuação dentro das cidades, mas sim para defender a integridade nacional e temem que a presença prolongada no combate aos narcotraficantes contamine a tropa. Os estados, muitas vezes, convocam as Forças Armadas porque querem reduzir os custos, aliviar suas responsabilidades e, na visão federal, estão banalizando esse ato. A Força Nacional virou uma forma de melhorar salários dos policiais e os estados se queixam de que custa caro.
Há, claro, diferentes competências, mas as forças do Estado brasileiro precisam estar unidas, porque o crime criou coalizões. Ninguém sabe hoje a separação entre tráfico de drogas e tráfico de armas. O narcotráfico é o grande cliente das armas ilegais que entram através de fronteiras que estão sob a supervisão das três forças. As facções de criminosos atravessaram divisas estaduais e se tornaram grupos interestaduais, portanto o que antes era enfrentado apenas dentro das unidades federadas passou a ser crime federal, no combate ao qual tem que estar a Polícia Federal também. As drogas e as armas entram pela terra, pelo mar, ou pelo ar, atravessam estradas e rios, cruzam fronteiras estaduais, chegam nas grandes cidades e alimentam o poder de grupos que tiram a soberania do Estado Nacional sobre partes do nosso território urbano. Quem deve nos proteger nessa disseminação do crime? Todas as forças. O cidadão quando paga seus impostos não escolhe a quem destinar o fruto do seu trabalho, se a essa repartição ou àquela.
A crise da segurança pública não é mais algo localizado, virou uma epidemia. Não é um problema segmentado, mas um risco generalizado. A violência está em níveis intoleráveis e números eloquentes mostram isso. O assassinato de jovens atingiu dimensão de país em guerra e não há nada mais ameaçador para uma nação do que a morte da juventude. A educação é atingida por diversas formas, a começar da impossibilidade de as escolas funcionarem em muitos dias, em muitas áreas das grandes cidades. O que os governos gastam para acudir os atingidos pela tragédia da segurança é muito mais do que gastariam se investissem na prevenção, com visão estratégica e a consciência de que esse é um problema de todos os que nos governam.
A Constituição, que dá essa atribuição aos estados, não pode ser biombo para que forças federais se escusem ou que se apresentem como auxiliares voluntários no combate ao crime. A presença do governo federal não pode ser entendida pelos estados como uma terceirização da responsabilidade. É de todas as forças que o Brasil precisa porque o inimigo é grande e ameaça não uma cidade, mas a Nação. As realidades locais são parte de um mesmo mosaico trágico.
Pela sua geografia urbana, o Rio dá ao morador a noção exata de como somos todos alvos da mesma guerra. De várias partes da cidade, é possível ouvir os tiros ecoando nas áreas pobres, onde grupos de criminosos disputam o controle territorial. Os moradores das favelas são avisados com antecedência sobre o momento em que haverá o choque entre os grupos de bandidos. No Rio, não há como não ver e ouvir, não é possível segregar a tragédia como se ela pertencesse a um grupo social. No Rio, desmascara-se a hipocrisia da sociedade desigual que fecha em redomas blindadas os mais ricos e expõe os pobres. A cidade tem que ser vista, não como um caso destoante, mas como o alerta do risco extremo que todos corremos. Há questões e momentos em que é preciso ter noção lúcida da dimensão da ameaça e, desta forma, construir a união entre as forças do Estado. Este é o caso da segurança pública.
Arnaldo Jordy: É guerra mesmo
O Brasil não está em guerra no sentido formal, mas é como se estivesse, tal o escândalo dos números do 11º Anuário Brasileiro do Fórum de Segurança Pública, que foram apresentados ao público nesta segunda-feira, 30. Causa estarrecimento saber que a cada nove minutos uma pessoa é morta violentamente no país. Em 2016, foram exatos 61.619 assassinatos, na sua grande maioria por armas de fogo. O número é equivalente às mortes causadas pela explosão de uma bomba atômica na cidade japonesa de Nagasaki, na Segunda Guerra Mundial. Em cinco anos, 279 mil pessoas foram vítimas de mortes violentas intencionais no país, enquanto a guerra na Síria, no mesmo período, matou 256 mil pessoas.
No ano passado, no Brasil, sete pessoas foram assassinadas a cada hora, o que coloca o Brasil entre os cinco com maiores índices de violência do mundo. O aumento em comparação com 2015 foi de 3,8%. A taxa de homicídios para cada 100 mil habitantes ficou em 29,9 no país no ano passado.
Apesar desses números estarrecedores, os governos federal, estaduais e municipais gastaram 2,6% a menos com políticas de segurança pública em 2016: R$ 81 milhões. A maior redução foi observada nos gastos do governo federal, com um corte de 10,3%. Infelizmente, parece que o assunto não vem sendo tratado com a devida seriedade.
Os jovens negros e pobres são os maiores alvos das forças policiais, 81% das 21.897 pessoas que perderam a vida em confrontos com a polícia entre 2009 e 2016 tinham entre 12 e 29 anos, 76,2% eram negros e 99,3% homens. Só no ano passado, 4.224 pessoas morreram em decorrência de ações das polícias, um aumento de 25,8% em comparação com 2015. Mas os policiais também estão em risco: 437 policiais civis e militares foram vítimas de homicídio em 2016, com crescimento de 17,5% em comparação com 2015.
No caso das mulheres, os números são igualmente alarmantes. Uma mulher é assassinada a cada duas horas no Brasil. Um total de 4.657 mulheres foram vítimas de feminicídio, quando o assassinato decorre da condição de mulher da vítima. Em 2016, cresceu 3,5% a incidência de estupros, com 49.497 ocorrências no ano passado.
As escolas deixaram de ser lugares de aprendizado em segurança, pois, segundo o Anuário de Segurança Púbica, 40% delas não têm qualquer esquema de policiamento e 70% dos professores já presenciaram agressões físicas ou verbais entre os alunos.
Para nosso desespero, Belém continua entre as capitais mais violentas do Brasil, com a segunda maior taxa de homicídios por 100 mil habitantes, 64,9, atrás de Aracaju e à frente de Porto Alegre. O Estado do Pará inteiro teve 4.209 pessoas assassinadas em 2016, um crescimento de 10,3% em comparação com 2015. A taxa de mortes por 100 mil habitantes no Estado no ano passado foi de 50,9%, ante 46,1% em 2015. O número é a soma dos homicídios dolosos, latrocínios, lesões corporais seguidas de morte e policiais civis e militares mortos em confronto ou fora de serviço. Nesse triste ranking, somos o sexto Estado mais violento, atrás de Alagoas, Amazonas, Ceará, Espírito Santo e Minas Gerais, e à frente da Paraíba, Paraná, Pernambuco, Piauí, Rio de Janeiro, Rio Grande do Norte e Santa Catarina.
Esses números estarrecedores colocam em xeque o próprio modelo de segurança pública brasileiro, que precisa ser repensado para o cenário atual da nossa sociedade e democracia. Considero que apenas a repressão já não funciona para conter a criminalidade, já que muitas vezes contribui para acirrar a violência, provocando o aumento do número de mortes. Em vez disso, será preciso pensar a questão de modo estrutural, promovendo mudanças na sociedade capazes de torná-la mais igualitária e menos injusta, além de modernizar e equipar as forças de segurança, para que possam desenvolver seu trabalho de modo mais efetivo e seguro para todos. Além disso, é preciso incentivar o desarmamento da sociedade. Ao contrário do que muitos pensam, quanto mais armas nas ruas, mais inseguros todos nós estaremos. Uma estratégia precisa ser planejada envolvendo o Poder Judiciário, Ministério Público, Polícia Federal, polícias estaduais, com critérios bem definidos, para enfrentar com inteligência o crime organizado, que tem com o pano de fundo o tráfico de drogas, origem de crimes e violência.
* Arnaldo Jordy é deputado federal pelo PPS-PA e líder do partido na Câmara
Zander Navarro: Por que somos assim?
Publicado no O Estado de S. Paulo em 01/03/2017
Não há nenhum grupo a quem entregar o bastão e que nos conduza a um futuro mais radiante
Vamo-nos fixar no Brasil, ignorando por ora a insanidade coletiva que caracteriza o estado do mundo. Afinal, seria demasiado desafiador entender por que o Parlamento russo sancionou a violência doméstica ou os deputados da Romênia tentaram liberar a corrupção até certo nível monetário. Por que será que países com História ilustre, como a Turquia, a Hungria ou a renascida Polônia e sua vibrante economia optaram por regimes autoritários tão primitivos? E os ingleses, sempre acesos, como se deixaram levar pela emoção e aprovaram o mergulho na escuridão fora da União Europeia? Sobre todos esses fatos, e muitos outros, surge um espertíssimo empresário, mas ignorante do mundo da política e, inacreditavelmente, os eleitores do país mais poderoso do mundo o elegem para a Presidência. São tempos sombrios e ameaçadores.
Sujeitos às nossas particularidades, não escapamos dessa marcha delirante. Basta abrir os olhos e ver à nossa volta, das episódicas evidências do cotidiano aos fatos mais impactantes. Somos um país que delicia os antropólogos, os especialistas dedicados às “coisas da cultura” que tentam explicar por que sempre escolhemos o irracional, o inconsequente e o mágico. Mas sua civilidade os impede de usar os termos corretos para designar as oceânicas patetices que conduzem a Nação. Mesmo a cordialidade permanente que nos caracterizaria (assim dizem) não camufla a gigantesca sensação de derrota e fracasso que está hoje fincada no fundo de nossos corações – a generalizada impressão sobre um país que, de fato, não tem futuro.
Como recordar é viver, diariamente observamos exemplos espantosos. Do presidente da República, que seria um especialista em Direito Constitucional, mas não se envergonha de exercer a censura em razão de uma infantilidade que teria incomodado sua esposa. E o outro que era então presidente do Supremo, mas nem ficou corado em “fatiar” a Constituição para proteger a ex-presidente, rasgando ao vivo e em cores a nossa Lei Maior?
E esta recente carnificina num presídio de Natal, quando atemorizados soldadinhos da Força Nacional entraram com contêineres para separar as facções em luta? Assustados, ficamos pensando: não conseguem sequer interromper a selvageria e dar fim à rebelião? São eventos nada educativos, sugerindo que o Estado brasileiro é ficcional e se vão esfumaçando os fundamentos da vida em sociedade.
Pior ainda: qualquer fato ou ação proposta sempre se defronta com duas expressões imobilizadoras tornadas obrigatórias no jargão da política. A primeira exige que “seja ouvida a sociedade”, vaga demanda que sugere democracia, como se esta fosse real no Brasil. E se for iniciativa com alguma implicação social, diversas vozes logo ecoarão:
“Chamem os movimentos sociais!”. É outra ficção, mas, na dúvida, opta-se por nada fazer. E seguimos entre a inércia e a boçalidade que talvez seja, esta sim, a nossa marca cultural mais distintiva.
Por que somos assim? Por que aceitamos tanta falsidade, tanto cinismo e manipulação com tal serenidade? Por que situações que são acintosamente ilógicas são passivamente recebidas pela população? Por que nos deixamos dominar tão rapidamente pelo autoengano, pelo fingimento e pelo pensamento mágico? Somos, de fato, estruturalmente incapazes de alguma reflexão crítica e, entre nós, a frase de Montaigne sobre o “maravilhoso trabalho da consciência: ela nos faz trair, acusar e combater a nós mesmos (...) nos denuncia contra nós mesmos”, não se aplicaria?
Por que somos assim? Ativado um debate nacional para obter respostas, listaríamos os fatores que são os mais conhecidos. Da baixa escolaridade às recentes raízes agrárias, pois a intensificação da urbanização se desenrolou no último meio século. Da modernidade industrial à extensão dos direitos e ao adensamento democrático, mudanças igualmente recentes. Outros enfatizarão o peso do catolicismo vigente, que exalta a pobreza e a vida comunitária, o que desenvolveria posturas que, na prática, acabam sendo anticapitalistas e inibem o empreendedorismo. Ou, então, heranças patrimonialistas de nossa História e até mesmo o legado de estruturas cartoriais que nos formaram ao longo dos séculos.
Todos esses determinantes, sem dúvida, têm algum peso que precisaríamos avaliar. Mas discutimos escassamente dois outros aspectos que parecem ser igualmente cruciais para explicar esse estado de prostração que atualmente é típico em nossa sociedade. Primeiramente, e ao contrário do que tem sido afirmado, nossas instituições (as formais e as informais) funcionam muito mal, são diáfanas de tão fracas, sem nenhuma robustez e eficácia, existem mais no papel e na retórica, com rala efetividade prática no cotidiano dos cidadãos. Não imagino que seja necessário ilustrar, todos conhecemos sobremaneira a inoperância de nossas instituições. Como adensá-las?
Por fim, o outro grande tema que está exigindo urgente discussão diz respeito à inacreditável indigência que caracteriza as nossas elites, seja no tocante ao seu minúsculo estofo cultural ou, então, em relação à sua incapacidade decisória. Todas elas, da política à empresarial, da educacional à estatal, da Justiça à científica.
Não há grupo algum a quem possamos entregar o bastão e pedir que nos conduza para um futuro mais radiante. Sobre esse tema novamente Montaigne nos inspira: “Para quem não tem na cabeça uma forma do todo, é impossível arrumar os elementos (...) nossos projetos descaminham-se porque não têm direção nem objetivo. Nenhum vento serve para quem não tem porto de chegada”.
Todas as grandes sociedades se consolidaram em função de projetos societários impulsionados sob o comando de elites que conseguiram desenvolver “uma forma do todo”. Ainda veremos essa estratégia transformadora concretizar-se no Brasil algum dia?
*Sociólogo e pesquisador em ciências sociais
Raul Jungmann: As Forças Armadas nas ruas
O emprego de militares não deve ser banalizado, e muito menos se destina a corrigir crises sistêmicas e problemas estruturais de segurança pública
Publicado no Jornal O Globo em 18/02/2017
A crise na segurança pública do Rio de Janeiro e do Espírito Santo traz à tona o papel das Forças Armadas em resposta à crescente demanda da sociedade por segurança.
A Constituição (artigo 142) consagra como funções das Forças Armadas, além da defesa da pátria e da garantia dos poderes, a manutenção da lei e da ordem (GLO). O emprego das Forças Armadas na GLO está regulamentado pelo Decreto nº 3.897, de 24/8/2001, com vistas à preservação da ordem pública e da incolumidade das pessoas e do patrimônio, sempre que os instrumentos à disposição das autoridades locais tenham-se esgotado, ou seus meios estejam indisponíveis, inexistentes ou insuficientes. O emprego das Forças Armadas deverá ser episódico, em área definida e ter a menor duração possível.
Desde outubro de 2008, foram autorizadas 42 GLOs, sendo sete delas em nove meses de minha gestão. As Forças Armadas garantiram a segurança em eleições municipais e nacionais, em visitas de autoridades estrangeiras e nos grandes eventos, como a Copa do Mundo e os Jogos Olímpicos e Paralímpicos, sempre com avaliação positiva pela população.
Os militares estiveram presentes no processo de pacificação de comunidades do Rio de Janeiro. No Complexo da Maré, as Forças Armadas restabeleceram condições de cidadania para cerca de 140 mil pessoas.
Em Natal, com a operação Potiguar (2016 e 2017), os militares atuaram frente à onda de violência que assolou a cidade. No Recife, a operação Pernambuco devolveu a normalidade aos cidadãos. Com a operação Varredura, as Forças Armadas atuaram nas dependências de estabelecimentos prisionais a fim de detectar materiais ilícitos ou proibidos.
Em que pese a eficácia das ações de GLO e o alívio trazido às populações angustiadas com a violência, é necessário deixar clara a natureza da participação das Forças Armadas na segurança pública. O emprego de militares não deve ser banalizado, e muito menos se destina a corrigir crises sistêmicas e problemas estruturais de segurança pública. É necessário que todas as entidades assumam seu papel, no âmbito de suas respectivas competências e responsabilidades constitucionais. Não podem os militares assumir, de forma continuada, funções que os distanciam de suas finalidades em substituição a instituições que detêm responsabilidade primária na matéria.
A Constituição ressalta que a segurança pública é dever do Estado, direito e responsabilidade de todos (Artigo 144). As Forças Armadas, com seu patriotismo e sua ética resumida na expressão “missão dada, missão cumprida”, desempenharão com eficácia seu papel, mas a solução da profunda crise de segurança vai muito além de seu emprego. Ela passa pela refundação do contrato social brasileiro, com o fortalecimento do pacto federativo, a responsabilidade fiscal e a renegociação das dívidas dos estados, o investimento em educação, saúde, infraestrutura social e segurança pública, o apoio do Congresso e do Judiciário e, vale insistir, a ética na política.
As Forças Armadas darão sua contribuição, mas as outras instâncias do Estado também devem fazer sua parte.
* Raul Jungmann é ministro da Defesa
Segurança pública está sob controle, afirma Jungmann
Entrevista ao Jornal Valor, em 16/02/2017.
O ministro da Defesa, Raul Jungmann, não teme o efeito dominó das crises na área de segurança de Espírito Santo e Rio de Janeiro. O Comando do Exército auscultou os comandos regionais e soube que estão estáveis os cenários no Pará e na Bahia, regiões onde o trabalho das forças que atuam nas operações de garantia da lei e da ordem previam turbulências próximas. Jungmann forma com o general Sérgio Etchengoyen, ministrochefe do Gabinete de Segurança Institucional da Presidência da República, e com o ministro da Justiça, quando vier a ser nomeado, o Conselho de Inteligência e Operações do governo Michel Temer. Ele está no centro da polêmica sobre o uso das Forças Armadas para garantia da ordem nos Estados, para negociar greve de policiais militares, para a varredura em presídios, para o combate ao crime organizado, tudo que tem criado risco e instabilidade no momento. A segurança, que realçou sua ação política mais recentemente, não é novidade na carreira de Jungmann.
Militou durante todo o mandato parlamentar na Comissão de Segurança Pública e Combate ao Crime Organizado, por dez anos; participou de todas as CPIs do sistema prisional; visitou a maior parte das penitenciárias; participou da CPI do tráfico de armas e da questão do narcotráfico e, ultimamente, antes de assumir o Ministério da Defesa, era relator da proposta de emenda constitucional da unificação das polícias. Está recebendo apoio de todos os lados para seu protagonismo recente no Executivo. Entre a negociação com policiais amotinados no Espírito Santo e coordenação, com o Comando do Leste, do processo de Garantia da Lei e da Ordem (GLO) no Rio, Jungmann falou ao Valor. Apesar das visíveis tensões, o ministro afirma que a situação da segurança pública no país está sob controle. A seguir, os principais trechos da entrevista:
Valor: Mudou o seu papel no governo?
Raul Jungmann: O que mudou foi a realidade. A agudização e a superposição de crises. Não mudei de função. São duas crises: uma é a prisional, que nos levou a realizar operações de garantia da lei e da ordem duas vezes em Natal, uma em São Luís, motivadas pela crise prisional. Temos duas outras GLOs motivadas pela crise nas polícias. É o caso de Recife, que foi em dezembro, e agora essa do Espírito Santo.
Valor: A crise de Pernambuco não foi tão percebida como a do Espírito Santo.
Jungmann: Em Pernambuco foram 3.500 homens. É que fica distante, mas foi grave. O problema de Vitória é que fica no Sudeste, próxima ao Rio, e tem elementos de conexão, de contágio. Mas não teve mesmo a dimensão do Espírito Santo, que é inédita.
Valor: E agora o Rio de Janeiro.
Jungmann: Se fizer as contas, são seis, estou aqui há nove meses, e já são seis GLOs
Valor: Por que o caso do Espírito Santo é inédito?
Jungmann: Primeiro, porque é uma manifestação capitaneada por mulheres.
Valor: É verdade, isso? Não estão servindo como anteparo para os amotinados?
Jungmann: Existe uma estrutura de comando por trás, inclusive policiais que são políticos, e que de certa forma manipulam os cordéis. Mas é indiscutível que elas assumiram um protagonismo. Só que tem um problema, não por serem mulheres, mas elas não têm expertise de negociação. Não são sindicalistas, não sabem os riscos, não têm noção da complexidade. A mão do Estado, a punição a quem comanda motim é muito pesada.
Valor: O governo federal foi lento para decidir entrar na crise do Espírito Santo?
Jungmann: Eu tenho conversado sem parar com as autoridades do Espírito Santo, estive lá duas vezes. O governador me ligou às 11 horas do domingo. Eu disse que só poderia fazer alguma coisa se o presidente determinasse. Assim, ele deveria ligar ao presidente Temer. Às 7h15 da manhã o presidente me liga: 'Olha, recebi o pedido e autorizo GLO'. Às 10 horas chega isso por escrito e às 17 horas eu já começava o policiamento lá. Ainda com um contingente pequeno. É preciso deslocar gente, a tropa para a rua não é a tropa regular, é uma que tem experiência, que passou, por exemplo, por Haiti, paraquedistas, fuzileiros, tem que ter capacidade de lidar com conflito urbano. Na verdade, deslocamos para lá 2.900 homens, em dois dias, com toda a logística.
Valor: Em que a participação das mulheres dificultou a solução do problema?
Jungmann: Quem negociou com elas teve imensa dificuldade, porque uma concordava, outra discordava. Não há hierarquia, não há presidente, não há um sindicato, isso se transformava numa balbúrdia, no primeiro acordo. Elas assinaram e depois voltaram atrás. No segundo acordo a negociação foi conduzida com as associações. Mas como elas não fizeram o início, não foram elas que iniciaram a mobilização, quando se foi levar o acordo fechado em cima dos batalhões, foi recusado. Os batalhões se dividiram, gente que queria continuar, gente que queria sair.
Valor: Elas sabiam dos riscos e podiam avaliar até onde ir?
Jungmann: Não, e não sabiam a hora de parar. De fato, ficou muito claro que teve uma ultrapassagem da liderança formal. Uma outra liderança política atuava com elas, mas elas passaram a ter um protagonismo real.
Valor: Não estavam comandadas pelos amotinados?
Jungmann: No início do processo, elas foram apoiadas pelo comandante geral, que em 23 dias foi demitido. Coronel, major, oficiais superiores as apoiaram. A partir de um certo momento, desfezse a hierarquia formal. Quando chegamos lá, não tinha um policial. Quando a gente chega para fazer GLO, precisa de informação, tem que ter um interlocutor, estavam todos vivendo o processo.
Valor: O que foi feito a seguir?
Jungmann: Procuramos assegurar a normalidade. Essa é a tarefa, a lei e a ordem. Hoje temos mais gente lá fazendo segurança do que a PM em dias normais. A PM coloca 1.800, nós fizemos com 3.130.
Valor: Quais foram os riscos principais no Espírito Santo?
Jungmann: Muitos. Os policiais que queriam sair foram impedidos não só pelas mulheres como pelos outros policiais amotinados. Estavam todos armados. Um deputado que é policial contou que o clima era tão pesado que não ficou no batalhão. Um clima desses, com arma na mão, procurando os traidores... Gente que queria sair, gente que impedia de sair. Tive informação que, num único dia, cem policiais foram a um atendimento de urgência com crise nervosa e distúrbios psiquícos. Isso podia resultar numa chacina. Essa era a agudeza.
Valor: Essas operações projetam os militares?
Jungmann: Isso evidentemente dá uma projeção ao Ministério da Defesa. Em contrapartida, há um reclamo da sociedade. Extraordinariamente, nós cuidaremos das cidades quando se apresentar uma situação em que o governo perca as condições de manter a lei e a ordem. Mas isso é extraordinário. Agora, ordinariamente, temos um papel nas fronteiras que a Constituição nos dá. E a opinião pública sabe que é nas fronteiras onde se inicia, ou pelo menos é a passagem, de boa parte dos delitos, dos crimes de contrabando, das drogas e das armas, que vão explodir nos grandes centros urbanos.
Valor: O trabalho nas fronteiras está também em ritmo crescente?
Jungmann: Vamos nos voltar ainda mais para as fronteiras. Comecei a fazer acordo com a Colômbia, um acordo extraordinário, com toda a cúpula, inclusive para que a gente possa acompanhar o processo de paz. E ter informações sobre todo o desarmamento que está ocorrendo lá dentro. Um dos temores é que uma parte das armas migre para cá, particularmente para o Rio de Janeiro. E evidentemente, não só isso. Colocar mais dinheiro no sistema integrado de monitoramento de fronteiras, levar observador do parlamento e da imprensa para conhecer a realidade da fronteira. Quando se diz que o Brasil tem a terceira maior fronteira do mundo, o que é isso? O Brasil tem 17 mil quilômetros de fronteira terrestre.
Valor: Qual o peso da nacionalização do crime nas crises?
Jungmann: As grande quadrilhas do Sudeste, nomeadamente do Rio e São Paulo, estão hoje em todo o país. Os dados do Gaeco, o grupo especial de combate ao crime organizado de São Paulo, a que eu tive acesso, mostram que, em 2014, o PCC tinha 3.200 membros presos. Em dois anos chegaram a 13.600. O Comando Vermelho tem o controle de 424 comunidades no Rio. O Amigo dos Amigos tem 77, o Terceiro Comando Capital tem 86, e as milícias têm 146. São praticamente 700 comunidades sob controle do crime organizado, sem direitos e garantias constitucionais, vivendo em regime de exceção. A criminalidade deu um salto e se nacionalizou. E ao mesmo tempo está se internacionalizando. Começa disputar mercado de produção, de contrabando de armas no Paraguai e Bolívia.
Valor: Onde entra o Ministério da Defesa nisso?
Jungmann: Transborda para a Defesa porque ao alcançar este nível, o crime organizado começa a desafiar o Estado. Um exemplo: Durante as eleições, em novembro, o governador do Maranhão, Flávio Dino, deu um aperto naquela penitenciária de Pedrinhas. Ele resolveu cumprir à risca a lei de execução penal. O que eles fizeram? Mandaram mensagem: não vai ter eleição. E começaram a queimar escolas. Tirando do cidadão o direito de exercer o que é constitucionalmente assegurado. Não estou atravessando fronteiras e assumindo papéis que não são nossos. Passou a ser inevitável diante da gravidade. Diante da crise fiscal dos Estados, diante da crise prisional, superposta à crise de segurança, rebeliões, greves, motins, é natural que fôssemos atraídos para dentro desse processo.
Valor: Até que ponto o presidente Michel Temer está participando diretamente das soluções?
Jungmann: O presidente tem manifestado grande atenção e preocupação com isso, ele não tem vacilado em nenhum momento em conceder os pedidos dos governadores. Pezão fez um pedido de 9 páginas. Fomos a Natal duas vezes, a São Luiz uma vez, Pernambuco uma vez, Espirito Santo uma vez, sem falar na Olimpíada, quando colocamos 24 mil homens no Rio. Estou aqui há nove meses com seis garantias da lei e da ordem.
Valor: Pode explicar melhor sua argumentação de que a atual crise de segurança tem a ver com a crise fiscal dos Estados?
Jungmann: Esses fatos, essa conjuntura do sistema prisional, a crise das polícias, estão totalmente relacionadas à falência fiscal dos Estados. O constituinte de 1988 não se deu conta, nem poderia, da nacionalização do crime. Particularmente no artigo 142, ele coloca a questão da segurança e da ordem pública nos Estados. São os governos estaduais que têm que cuidar disso. O governo federal cuida de forma complementar. O federal cuida de pequena parte, que é a questão da Polícia Federal, que cuida de drogas, crimes interestaduais, internacionais, e um papel de fronteira. Além disso, tem a Polícia Rodoviária Federal. Mas 90% da garantia da ordem está com os Estados. Se tudo isso ficou com o Estado e eles passam por uma crise fiscal grave, tudo se reflete pesadamente na segurança, porque a segurança é cara, tem muita gente, tem combustível, equipamento, carro etc., a segurança é algo de muito peso nas contas.
Valor: Se o governo estadual não dá conta de carregar o peso, o que pode fazer?
Jungmann: Se os Estados vivem uma crise fiscal que contagia a segurança, o governo federal não dispõe, constitucionalmente, de mecanismos compatíveis com esse desafio. Por isso o uso extraordinário das Forças Armadas, instrumento que resta ao governo.
Valor: As Forças Armadas reclamam?
Jungmann: São muito disciplinadas. Muito profissionais. Evidentemente foram preparadas para outra missão, para aquilo que é defesa da soberania, dos interesses nacionais. É nisso que é a formação delas. As Forças Armadas no Brasil, elas têm uma característica que não se encontra em outros países do mundo: a pluralidade de atividade e ações que elas fazem. Tais como: combate à zika, distribuição de água para 4 milhões de nordestinos, transporte de órgãos para transplante, varredura em presídios, garantia da lei e da ordem.
Valor: Em outros países como o problema se resolve?
Jungmann: Outros têm a guarda nacional. Agora, o presidente Temer determinou ampliação da guarda nacional. São 200 homens, um batalhão que fica em Brasília. Quando há uma missão, você monta o efetivo. Preciso 12.000, pega os 200, tira de outros Estados e faz o efetivo. Agora vai passar a ter uma Força Nacional, por determinação do presidente, de 7 mil membros permanentes. Elas são dos Estados, há problema da heterogeneidade e os Estados, premidos pela crise de segurança, têm dificuldade de liberar.
Valor: Há, então uma nova realidade.
Jungmann: E somos arrastados por ela. Se o governador diz que está com insuficiência e indisponibilidade para manter a ordem, se o presidente negar, imagina a responsabilidade do presidente: assalto, saque, arrastão, homicídio... praticamente é impositivo.
Valor: Quer dizer que não são as Forças Armadas que vão resolver o problema da segurança no Brasil.
Jungmann: O problema da segurança no Brasil se resolve na segurança e não na Defesa. Por uma razão simples: militares são empregados em situação extraordinária, por tempo limitado e local limitado. Quem de verdade cuida da segurança pública, entende é preparado, tem formação para isso são os policiais.
Valor: A população está pedindo a presença das tropas?
Jungmann: É um aluvião o que recebo de pedidos, das bancadas, das pessoas, dos municípios. A presença dá uma segurança às pessoas. Mas Isso, na prática, se usar exclusivamente, é dar férias a bandido. O bandido vai se retrair, tirar férias, e depois voltar.
Valor: Depois dessas experiências, como o sr. está vendo a questão da segurança no Brasil?
Jungmann: Ela tem uma alta complexidade, a segurança é um sistema judiciário policial. Inclui a polícia, sistema judiciário, sistema penitenciário, o Ministério Público e a Justiça. E esse sistema não é centralizado, cada um com sua autonomia. Vejo muitas pessoas dizendo que o problema é de outro. Tem que funcionar integrado. Não há uma autoridade que coordene. O Ministério da Justiça e Segurança é o que de mais próximo pode ter para gestão da segurança. Você tirou a Cidadania para um ministério separado e deixou a Justiça com foco com segurança. Pela primeira vez a segurança foi ao nível ministerial. É uma maneira que vai tendo de avançar e responder à crise.
Valor: O Congresso não tem sensibilidade para esse problema?
Jungmann: Quem ganha voto pedindo recurso para sistema prisional? Uma população vulnerável e barbarizada, ela regride ao olho por olho, dente por dente. Tem uma população que se sente exposta e indefesa. A reação dessas pessoas é ou a busca da autotutela vou me armar já que não há defesa, ou a noção de que bandido bom é bandido morto.
Valor: O sr. tem feito reuniões sucessivas com o comandante do Exército, com o chefe do Estado Maior, e tem analisado a situação dos Estados. Há temor de contágio?
Jungmann: Estávamos definindo o Rio. O Rio não está na mesma situação do Espírito Santo, mas o Estado é infinitas vezes maior, e o que o governador pediu é muito amplo. Vamos policiar parte da cidade para liberar a PM para fazer a Alerj. As forças policiais são essenciais a uma democracia. Sem elas vivese estado de anomalia. Presidentes têm uma pauta de prioridades, educação, saúde, e isso é ditado pela população. E como a questão da segurança é sobretudo algo dos Estados, um Presidente da República chamar a si essa atribuição, sem ter fonte de recursos compatível, demanda muita firmeza. Temer não tem vacilado. Pegou R$ 1,7 bilhão basicamente para o programa nacional de segurança. Com o pouco tempo que tem e a crise que vive tem dado respostas.
Valor: Voltando à contaminação, além do Rio tem mais gente pedindo ajuda agora?
Jungmann: O comandante do Exército acabou de fazer uma teleconferência com os comandantes de área em todo o país. O relato é uma boa notícia: a situação está estável.
Valor: Havia alguma preocupação específica?
Jungmann: Estávamos preocupados que evoluísse no Pará. Muitas vezes, quando chega perto do carnaval tem uma certa instabilidade na polícia da Bahia. Os governadores se anteciparam em alguns Estados, o de Pernambuco está votando agora na Assembleia Legislativa o aumento do pessoal. A informação que o comandante me deu é que neste momento está sob controle.
Valor: A situação no Rio está fora de controle como Vitória?
Jungmann: No Rio está havendo controle, vamos para lá preventivamente. São tempos difíceis, aí você tem uma instituição coesa, disciplinada, bem formada, compromissada, que não faz greve, não tem hora extra, não tem sindicalização, não tem um segundo emprego, e é estruturada com base na disciplina e hierarquia. A tendência é que se recorra às Forças Armadas, não só nessa, mas em outras circunstâncias.
Carlos Alberto Torres: Não nos deixemos enganar!
Algumas análises, diante do morticínio que ocorre nas prisões, da gravidade destes fatos e da comoção que que têm causado, argumentam que essa questão é mais importante do que o combate ao crime de colarinho branco. Na verdade, são duas faces de uma mesma moeda e estão relacionadas!
Alguns chegam mesmo a defender que o combate ao crime de colarinho branco já está bem equacionado. Isto, em primeiro lugar, não corresponde aos fatos; em segundo lugar, pode ser uma esperta tentativa de tirar o foco do que é essencial.
Óbvio que as organizações criminosas precisam ser enfrentadas com toda a competência e energia do aparelho judiciário, nos marcos do Estado Democrático de Direito, mas não podemos nos deixar enganar, nem desconhecer:
(1) que, historicamente, os criminosos de colarinho branco não são condenados, não habitam as prisões e normalmente ficam impunes;
(2) que os traficantes são condenados e presos, e são os que estão se matando nas prisões;
(3) que as iniciativas dos que na justiça querem aperfeiçoar a punição dos criminosos de colarinho branco enfrentam a resistência de uma ampla e poderosa "santa aliança", suprapartidária e supra-ideológica dos que temem a Lava-Jato;
(4) que mesmo dentro do próprio sistema judiciário existem resistências contra o fim da impunidade dos crimes de colarinho branco;
(5) que existem pressões poderosas envolvendo os maiores próceres da república para que haja um acordo "por cima" para interromper as consequências judiciais do que foi apurado até aqui pela Lava-Jato;
Não haverá nem poderá haver combate eficaz às organizações criminosas do "andar de baixo" da sociedade brasileira se ela mesma não conseguir acabar com a própria impunidade dos crimes de colarinho branco, pois estes são a fonte principal da desesperança, da descrença nas instituições, da desorganização financeira do Estado e da ineficácia de sua ação. Sobretudo, ele é a fonte da desmoralização da política, da polícia e do próprio sistema judiciário.
Estamos todos consternados com a barbárie concentrada, a vivo e cores, do que temos visto nestes dias; mas a sua raiz reside em que, embora diferentes os dois tipos de crimes, é exatamente o que não decapita nem mata diretamente o mais perigoso, pois é o que mais mata, embora indiretamente, o maior número de pessoas. Há muito tempo essas ameaças já residem fora das prisões, e estão nos tirando o emprego, o atendimento público de saúde, a educação de qualidade para nossas crianças, e nos aprisionando em nossas próprias casas!
Se a situação do sistema prisional precisa ser enfrentada com ações emergenciais, até para que cesse a matança, ele não se resolverá enquanto a sociedade, todos nós, ficarmos tratando os criminosos de colarinho branco como "bandidos bons", e os criminosos pobres, pretos e prostitutas (os PPP's), os que são recrutados para serem soldados do tráfico, como "bandidos maus", que podem ser empilhados e armazenados nesses presídios, sem dignidade, para sobreviverem, se tiverem sorte!
Vitória registra queda de 30% nos homicídios em 2016
A cidade de Vitória (ES) registrou a maior redução de homicídios na região da Grande Vitória, com uma queda de 30% em 2016, de acordo com dados da Secretaria da Segurança Pública do Espírito Santo. Cariacica foi a segunda cidade a ter a maior queda, com 24%. As duas cidades são governadas pelo PPS.
No cenário nacional, a redução também teria colocado Vitória como antepenúltima no ranking das capitais mais violentas do País, segundo o secretário estadual de Segurança Pública, André Garcia. Nos últimos anos, a cidade já teria ocupado a segunda posição no ranking de homicídios.
Considerando toda a Grande Vitória, a redução foi de 18%, com Vitória liderando. Cariacica foi a segunda cidade a ter a maior queda, com 24%, seguida de Viana (19%), Serra (17%), Vila Velha (11%) e Guarapari (5%). Os dados apresentados pela Sesp também mostram que houve redução expressiva no índice estadual, com a maior redução de assassinatos nos últimos 28 anos em 2016.
O prefeito de Vitória, Luciano Rezende, do PPS, destacou que o resultado é fruto da parceria e integração da Guarda Municipal com as forças de segurança do estado, como a Polícia Militar.
“Só temos que comemorar e agradecer à nossa Guarda Municipal, que vai continuar trabalhando em parceria com a Polícia Militar. Novas câmeras de videomonitoramento serão instaladas na cidade. No início da gestão, em janeiro de 2013, a cidade tinha apenas 34 câmeras. Atualmente, esse número passa de 200 câmeras. Vitória era considerada a capital mais violenta do Brasil e, hoje, é considerada uma das mais seguras. Então, eu tenho uma satisfação enorme de poder contribuir com essa ação, presidindo pessoalmente o Gabinete de Gestão Integrada Municipal [GGI-M], e ocupando a cidade com as famílias”, disse o prefeito.
Para o secretário municipal de Segurança Urbana, Fronzio Calheira, os números reforçam o desafio de conseguir manter os índices positivos.
“Vai ser desafiador para todas as instituições manter a tendência de queda. Para isso, além de manter as estratégias atuais, será preciso criar novos mecanismos de controle da criminalidade. No caso de Vitória, as medidas que estão em planejamento preveem a implantação do cerco eletrônico, dispositivo que identifica carros roubados, renovação da frota da Guarda de Vitória e qualificação continuada de todo o efetivo da Guarda”, disse o secretário.
Menos feminicídios
Além da queda no número total de homicídios, Vitória também registrou grande diminuição no número de mortes de mulheres, com uma redução de 70%. De acordo com o secretário Fronzio Calheira, políticas públicas municipais de apoio às mulheres com medidas protetivas e o projeto Botão do Pânico, que garante proteção às vitimas de violência doméstica, contribuíram para esse resultado.
Ações da Prefeitura
Entre as diversas ações que impactam na segurança urbana, a Prefeitura atua de forma mais intensa naquelas capazes de ocupar os lugares públicos e fomentar o convívio das famílias, o esporte e o lazer. A troca da iluminação em diversas avenidas, praças, parques e na orla é uma das ações.
Hotéis, bares e festas passaram a ter fiscalização sistemática, que posteriormente foram ampliadas para todo tipo de festa e evento, formal ou informal. Assim, até mesmo a aglomeração de pessoas passou a ser fiscalizada, evitando a proliferação de ambulantes e carros de som. A Guarda de Vitória também passou a trabalhar nos últimos anos 24 horas por dia, o que ampliou o patrulhamento da cidade e a parceria com a Polícia Militar.
Videomonitoramento
As novas câmeras de videomonitoramento da Secretaria Municipal de Segurança Urbana de Vitória já estão operando em bairros que antes não contavam com esse serviço de vigilância. As regiões mais atendidas são as de São Pedro e Santo Antônio.
Ao todo, são 13 novas câmeras, instaladas nos bairros Grande Vitória, Santa Martha, São Pedro, Santo Antônio, Ilha das Caieiras, Inhanguetá, Nova Palestina e Tabuazeiro, além do Morro do Moscoso. As câmeras são operadas durante 24 horas por dia por guardas civis municipais.
Elas ajudam a fazer flagrantes de crimes e já foram responsáveis pela prisão de suspeitos de roubo, furto e arrombamentos e pela recuperação de diversos carros roubados.
Redução da criminalidade
As imagens registradas podem servir ainda de prova para processos criminais e ajudam a Polícia Civil a desvendar casos pendentes. De acordo com o secretário municipal de Segurança Urbana, Fronzio Calheira, as câmeras também foram um dos instrumentos que ajudaram na redução dos índices de criminalidade na capital.
“Com as novas câmeras, o município continua a contribuir com a redução dos homicídios em Vitória. A população precisa saber que o custo não é só com equipamento, tem toda uma gama de profissionais que se revezam em turnos para que a vigilância funcione 24 horas por dia e que selecionam devidamente as imagens para que elas possam servir como prova, fazendo com que os crimes não fiquem impunes”, explicou o secretário.
Os locais e os bairros que receberam as novas câmeras de videomonitoramento foram escolhidos de acordo com os dados do “Mapa do Crime”, do Governo do Estado, após debate em conjunto com outros órgãos de segurança, como a Polícia Civil (PC) e a Polícia Militar (PM). A definição dos pontos também levou em consideração as análises das associações de moradores. Agora, todas as macrorregiões de Vitória já estão sendo atendidas pelas câmeras.
Utilidade pública
Um dos serviços prestados pelos operadores da central de videomonitoramento é identificar pontos viciados de lixo e acionar os setores responsáveis pela limpeza da Prefeitura para a retirada. Semáforos apagados e postes sem luz também são verificados, além de troncos de arvores caídas e pedidos de podas.
Os operadores também verificam acidentes de trânsito e retenções, acionando imediatamente os agentes de trânsito para desobstrução do local, liberando rapidamente o fluxo de veículos.(Assessoria da Prefeitura de Vitória)
Fonte: www.pps.org.br
Luiz Eduardo Soares: Tranquila e infalível como Bruce Lee
Os primeiros nove meses do governo Dilma, na segurança pública, foram decepcionantes.
A decepção decorre do contraste entre as expectativas suscitadas pelos excelentes nomes escalados para enfrentar o desafio e a postura da presidente, que prefiro descrever a qualificar, por respeito ao cargo e à sua biografia.
O começo foi alvissareiro, com a nomeação do ministro da Justiça, José Eduardo Cardozo, que encheu de esperança até os céticos.
O primeiro ato do novo ministro justificou o otimismo. Foram convidados Regina Mikki e Pedro Abramovay para as secretarias de segurança e de políticas para as drogas.
Escolhas irretocáveis, cujos significados prenunciavam avanços. Some-se a isso uma vitória do ministro ao obter o deslocamento da secretaria responsável pela política sobre drogas para o Ministério da Justiça. Ainda que o ideal fosse inseri-la no Ministério da Saúde, tratava-se de um passo positivo da maior importância.
Na sequência, mais um alento: em entrevista a O Globo, Pedro mostrava quão perversa vinha sendo a escalada do encarceramento no Brasil, cujas taxas de crescimento já eram campeãs mundiais: desde 2006, o tipo penal que concentrava o foco das ações repressivas correspondia à prática da comercialização de drogas ilícitas sem armas, sem violência, sem envolvimento com organizações criminosas.
De meados dos anos 90 até hoje, passamos de 140 mil a mais de 500 mil presos. Em termos absolutos, só perdemos para a China e para os Estados Unidos. Era preciso mudar a abordagem do problema.
Por aí ficou Pedro, mas já era suficiente para disseminar o entusiasmo em tantos de nós.
Enquanto a taxa média nacional de esclarecimento de homicídios dolosos é de 8% (92% dos homicidas permanecem impunes, nem sequer são identificados nas investigações policiais), o país entope penitenciárias de jovens pobres, com baixa escolaridade, não violentos, que negociavam drogas no varejo.
Ao condená-los à privação de liberdade em convívio com grupos profissionais e organizados, que futuro estamos preparando para eles e para a sociedade?
Não há uso mais inteligente para os R$ 1.500 mensais gastos com cada jovem preso que não cometeu violência? É preciso impor limites, mas também ampará-los na construção de alternativas.
Veio a primeira frustração: a presidente ordenou ao ministro que desconvidasse Pedro Abramovay. A ordem presidencial caiu como um raio, fulminando a confiança que se consolidava e expandia.
Enquanto isso, o Brasil continua sendo o segundo país do mundo em números absolutos de homicídios dolosos — em torno de 50 mil por ano —, atrás apenas da Rússia.
Para reverter essa realidade dramática, uma equipe qualificada do ministério trabalhou todo o primeiro semestre na elaboração de um plano de articulação nacional para a redução dos homicídios dolosos, valorizando a prevenção mas com ênfase no aprimoramento das investigações.
Um plano consistente e promissor, que não transferia responsabilidades à União, mas a levava a compartilhar responsabilidades práticas. Em meados de julho, chegou a data tão esperada: o encontro com a presidente. O ministro passou-lhe o documento, enquanto o técnico preparava-se para expô-lo.
Rápida e eficaz, tranquila e infalível como Bruce Lee, a presidente antecipou-se: homicídios? Isso é com os Estados. Pôs de lado o documento e ordenou que se passasse ao próximo ponto da pauta.
Luiz Eduardo Soares é antropólogo e autor, entre outros, de Justiça (Nova Fronteira, 2011). Foi secretário nacional de Segurança Pública (2003).
Fonte: http://www.acessa.com/gramsci/?page=visualizar&id=1422