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Bernardo Mello Franco: A mutação dos bolsonaristas

A CPI da Covid produziu uma mutação nos bolsonaristas. Diante dos senadores e das câmeras de TV, os defensores do capitão perdem subitamente a valentia. Passam a falar baixo, renegam suas bravatas e fingem esquecer o que já disseram.

Na semana passada, o fenômeno ocorreu com Fabio Wajngarten. Conhecido pela agressividade nas redes sociais, o publicitário afinou ao usar o microfone. Adotou um tom humilde, quase servil, para tentar escapar ileso do depoimento.

O ex-secretário de Comunicação se disse vítima de “boatos maldosos” sobre a intermediação da compra de vacinas. No entanto, perdeu a memória ao ser questionado sobre um termo usado pelo ex-ministro Eduardo Pazuello. “Não sei nem o que significa pixulé”, desconversou. “Melhor assim, não é?”, ironizou o senador Renan Calheiros.

Ontem a foi a vez de Ernesto Araújo sofrer um surto de amnésia. Pivô de múltiplas crises com a China, o ex-chanceler jurou que nunca criou atritos com Pequim. Renegou até o artigo em que se referiu ao coronavírus como “comunavírus”, endossando a teoria conspiratória de que os chineses teriam lucrado com a pandemia. “Vossa excelência renega o que escreveu. Aí, não dá!”, protestou o senador Omar Aziz.

Em outro momento, Ernesto disse que o ideólogo Olavo de Carvalho não era o guru da sua política externa delirante. “O senhor de fato é um homem muito ousado, muito corajoso”, debochou a senadora Kátia Abreu, antes de chamar o ex-ministro de “negacionista compulsivo”.

Apesar dos recuos e das gaguejadas, Wajngarten e Ernesto não conseguiram blindar o chefe. O publicitário admitiu que Jair Bolsonaro ignorou ofertas de vacinas da Pfizer. E o ex-chanceler confirmou que o presidente deu ordens para negociar a importação de cloroquina.

Ernesto deixou claro que sua gestão estava mais empenhada em travar lutas ideológicas do que em salvar vidas. Por discordar do governo da Venezuela, o ministro se negou a colaborar com o transporte de cilindros de oxigênio de Caracas para Manaus. Depois que a doação chegou, ele se recusou a dar um mísero telefonema para agradecer.

PF laçou a boiada de Ricardo Salles

A Polícia Federal laçou a boiada de Ricardo Salles. O ministro do Meio Ambiente foi o principal alvo da operação deflagrada nesta manhã. A polícia investiga sua participação num esquema de exportação ilegal de madeira.

A ação apura crimes de corrupção, advocacia administrativa, prevaricação e facilitação de contrabando. O ministro Alexandre de Moraes, do STF, determinou a quebra dos sigilos bancário e fiscal de Salles. Ele também afastou o presidente do Ibama, Eduardo Bim.

O governo de Jair Bolsonaro subverteu a razão de ser do Ministério do Meio Ambiente. Desde a posse do capitão, a pasta foi capturada por interesses econômicos ligados à exploração predatória dos recursos naturais.

Em vez de proteger as florestas, a gestão de Salles estimulou a ação de desmatadores, grileiros e garimpeiros. Na reunião ministerial de abril de 2020, ele escancarou sua estratégia: aproveitar a pandemia para ir “passando a boiada”. Era uma referência ao desmonte da legislação e dos órgãos ambientais no Brasil.

Em tempos normais, a operação da PF levaria à demissão imediata do ministro do Meio Ambiente. Como estamos no governo Bolsonaro, é preciso esperar para ver. A política antiambiental de Salles não é uma obra de um homem só. Estava sempre deixou claro que cumpre ordens do presidente.

Fonte:

O Globo

https://blogs.oglobo.globo.com/bernardo-mello-franco/post/mutacao-dos-bolsonaristas.html


O Globo: Operação da Polícia Federal foi ‘exagerada’ e ‘desnecessária’, diz Salles

Daniel Gullino, O Globo

BRASÍLIA — O ministro do Meio Ambiente, Ricardo Salles, afirmou que a operação da Polícia Federal (PF) da qual foi alvo foi “exagerada” e “desnecessária”. Salles disse que ele e todos os funcionários do ministério sempre estiveram a disposição para prestar esclarecimentos.

— Fazendo aqui uma manifestação de surpresa com essa operação que eu entendo exagerada, desnecessária. Até porque todos, não só o ministro, como todos os demais que foram citados e incluídos nessa investigação, estiveram sempre à disposição para esclarecer quaisquer questões — disse o ministro, na saída de um evento em Brasília.

Relatório do Coaf:  PF apontou participação de Salles em ‘esquema de facilitação ao contrabando de produtos florestais’

De acordo com Salles, o relator do inquérito no Supremo Tribunal Federal (STF), Alexandre de Moraes, foi induzido ao erro pela PF. A corporação descreveu a “existência de grave esquema de facilitação ao contrabando de produtos florestais” envolvendo Salles e servidores públicos do ministério e do Ibama.

— Entendemos que esse inquérito, o pouco que sabemos, não tive acesso ainda, ele foi instruído de uma forma que acabou induzindo o ministro relator a erro, induzindo justamente  dar impressão que houve ou teria havido possivelmente uma ação concatenada de agentes do Ibama e do Ministério do Meio Ambiente para favorecer ou para fazer o destravamento indevido do que quer que seja. Essas ações jamais, repito, jamais, aconteceram.

O ministro, que esteve no Palácio do Planalto na manhã desta quarta, disse que afirmou ao presidente Jair Bolsonaro que “não há substância nenhuma” nos fatos investigados:

— Expliquei ao presidente do que se trata. Expliquei que, na minha opinião, não há substância nenhuma das acusações. Embora eu não conheça os autos já sei qual é o assunto que se trata e me parece que esse é um assunto que vai ser esclarecido, ou que pode ser esclarecido com muita rapidez.

Segundo informações apresentadas pela PF nos autos, a investigação começou a partir de documentos produzidos pela embaixada americana no Brasil, especialmente pelo adido do órgão equivalente ao Ibama nos EUA, o Serviço de Pesca e Vida Selvagem, Bryan Landry. Os documentos informavam a apreensão, no Porto de Savannah, no estado da Geórgia, nos EUA, de três cargas de produtos florestais sem a respectiva documentação.

De acordo com Salles, o Ibama considerou na época que a norme que a regra que teria sido desrespeitada já deveria ter sido alterada:

— Essa questão dos Estados Unidos foi uma carga, aparentemente, até onde eu sei, foi uma carga que foi exportada e quando chegou nos Estados Unidos, eles pediram documentos que não constavam. A presidência do Ibama entendeu, analisando o caso concreto, que a regra estava sendo invocada, era uma regra que já deveria, naquela altura, ter sido alterada e dessa forma técnica, aparentemente, agiu.

Fonte:

O Globo

https://oglobo.globo.com/sociedade/meio-ambiente/operacao-da-policia-federal-foi-exagerada-desnecessaria-diz-salles-25024601

 


Metrópoles: Presidente do Ibama esvaziou órgão e perseguiu servidores, aponta PF

Tácio Lorran, Metrópoles

O presidente afastado do Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis (Ibama), Eduardo Fortunato Bim, é suspeito de ter esvaziado setores de fiscalização do órgão e promovido uma política de perseguição contra servidores.

Bim é alvo da Operação Akuanduba, deflagrada nesta quarta-feira (19/5) pela Polícia Federal (PF) para apurar participação de agentes públicos em um suposto esquema criminoso de exportações ilegais de madeira.

O ministro do Supremo Tribunal Federal (STF) Alexandre de Moraes autorizou o afastamento de nove agentes públicos do Ministério do Meio Ambiente e do Ibama – entre eles, o presidente do órgão, Eduardo Bim. O ministro de Estado Ricardo Salles é alvo de mandados de busca.

Moraes narra, ao autorizar a operação, que “a autoridade policial aduziu que os depoimentos colhidos demonstraram, em tese, uma gestão [de Bim] voltada ao esvaziamento do órgão sob seu comando (especialmente dos setores incumbidos da fiscalização) e uma franca política de perseguição contra os servidores que a ela se oponham, em verdadeiro descompasso com o seu cargo”.

Mais sobre o assunto

O presidente do instituto também participou de uma reunião com representantes da Confloresta e Aimex, além de um diretor da Tradelink Madeiras e do ministro do Meio Ambiente, Ricardo Salles, em fevereiro de 2020.

Essas empresas foram alvos de apreensões de produtos florestais exportados ilegalmente aos Estados Unidos. Logo após o encontro, houve “o atendimento integral da demanda formulada pelas duas entidades, […] legalizando, inclusive com efeito retroativos, milhares de cargas expedidas ilegalmente entre os anos de 2019 e 2020”.

Metrópoles apurou que parte dos servidores do Ibama se mostrou contrário à decisão tomada pelo órgão, para facilitar a exportação ilegal de madeiras.

A PF também narra que o ministro Ricardo Salles desfavoreceu esses servidores.

“Na sequência da aprovação desse documento e revogação da norma, servidores que atuaram em prol das exportadoras foram beneficiados pelo ministro com nomeações para cargos mais altos, ao passo que servidores que se mantiveram firmes em suas posições técnicas, foram exonerados por ele”.

Fonte:

Metrópoles

https://www.metropoles.com/distrito-federal/meio-ambiente/presidente-do-ibama-esvaziou-orgao-e-perseguiu-servidores-aponta-pf


O Estado de S. Paulo: Entenda como Salles e Ibama afrouxaram as regras para exportação de madeira

André Borges, O Estado de S. Paulo

O ministro do Meio Ambiente, Ricardo Salles, durante coletiva sobre operações de combate ao desmatamento Florestas Nacionais do Jacundá e Vila Samuel. Foto: Dida Sampaio / Estadão

Operação Akuanduba da Polícia Federal investiga, entre outras irregularidades, as ações do ministro do Meio Ambiente, Ricardo Salles, e do presidente do Ibama, Eduardo Fortunato Bim, que afrouxaram as regras de controle para exportação de madeira. Essa sempre foi uma demanda dos madeireiros e associações do setor, a qual foi atendida no ano passado.

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Entre o fim de 2019 e início de 2020, o Ibama recebeu uma série de demandas para facilitar a exportação e mexer nas regras de fiscalização. O pleito foi levado ao órgão por instituições como a Associação Brasileira de Empresas Concessionárias Florestais (Confloresta), Associação das Indústrias Exportadoras de Madeira do Pará (Aimex) e Centro das Indústrias do Pará (CIP), que representa os madeireiros do Estado. A mobilização das associações ocorreu após apreensões de produtos florestais exportados sem a devida documentação pelas empresas Ebata Produtos Florestais Ltda e Tradelink Madeiras Ltda, para os Estados Unidos.

O pedido foi atendido. No dia 25 de fevereiro de 2020, Bim editou um “despacho interpretativo” para atender aos pedidos dos madeireiros. Esse despacho é citado em diversos trechos da decisão do ministro do Supremo Tribunal Federal, Alexandre de Moraes, que embasa os pedidos de investigação e afastamento da cúpula do Meio Ambiente.

O ato do presidente do Ibama suspendeu os efeitos de uma instrução normativa de 2011 (15/2011) do próprio Ibama, que tratava do assunto. Essa instrução normativa previa uma autorização específica para que madeiras pudessem deixar o país. Com o despacho, porém, os produtos florestais passaram a ser acompanhados apenas do chamado Documento de Origem Florestal (DOF).

Em junho do ano passado, organizações ambientais como o Instituto Socioambiental (ISA) e Greenpeace, além da Associação Brasileira dos Membros do Ministério Público de Meio Ambiente, protocolaram uma ação civil pública na Justiça Federal, contra as mudanças.

Esse DOF de exportação, que existe desde 2006, serve, na prática, apenas para que a madeira seja levada até o porto, ou seja, é uma licença de transporte e armazenamento, enquanto a instrução até então vigente exigia uma autorização específica para exportação, um processo que incluía, por exemplo, inspeções por amostragem e outros controles para a exportação que o DOF não exige.

Naquela ocasião, uma análise técnica do próprio Ibama alertou que o Código Florestal distinguia a licença de transporte e armazenamento (DOF) da autorização de exportação. Essa avaliação, porém, foi descartada pelo presidente do Ibama. Bim acatou um argumento dos madeireiros, sob alegação de que a exigência daquela autorização específica teria “caducado”, porque teria sido revogada pela existência de outro recurso, o Sistema Nacional de Controle da Origem dos Produtos Florestais (Sinaflor), que começou a ser implantado em 2014.

Em seu despacho, o presidente do Ibama declarou que o Sinaflor teria alterado as regras de exportação, “sendo suficiente para exportar o DOF exportação ou a Guia Florestal expedida pelos Estados-membros”. Na prática, com a mudança, uma guia de transporte emitida pelos órgãos nos Estados passou a valer no lugar de uma autorização de exportação do Ibama.

“Equivocado entender que o DOF exportação não possibilita a fiscalização da carga, quando não apenas isso é possível, pelo dever geral de proteção ambiental, como expressamente previsto”, declarou Bim, em despacho de 25 de fevereiro do ano passado. “A fiscalização ambiental não é prejudicada.”

A decisão foi festejada. Em carta de 28 de fevereiro de 2020, o Centro das Indústrias do Pará afirmou que o presidente do Ibama “colocou em ordem as exportações de madeira”.

Como funciona o crime no Brasil

Antes de uma chapa de ipê ou mogno chegar ao porto de Santos ou qualquer outra porta de saída do território nacional, ela percorre uma cadeia no País que, invariavelmente, é marcada pela corrupção. O crime se baseia, basicamente, em uma indústria de papeis falsos. Por meio de agentes públicos que atuam de forma criminosa, documentos, como o DOF, são emitidos para “esquentar” a madeira roubada de terras indígenas e unidades de conservação, por exemplo.

O governo tem digitalizado há anos esse tipo de informação, por meio do Ibama, com o propósito de concentrar no órgão federal todos documentos de origem de madeira do País e, a partir disso, confrontar esses papeis com o inventário legal de madeira de corte. Esse cruzamento de dados, porém, ainda não está consolidado nacionalmente, além de conter brechas para manipulações de dados por seus gestores.

Na prática, portanto, um país que importa madeira do Brasil pode até achar que está adquirindo um produto 100% legal, quando, na realidade, sua origem pode ser fruto de um esquema fraudulento, que costuma inviabilizar o preço do mercado entre aqueles poucos madeireiros que desejam atuar de forma 100% legal.

Nos últimos anos, o Ibama tem procurado aperfeiçoar o sistema de registro, transporte e exportação de madeira, com a eliminação de papeis e a centralização de dados no Sistema Nacional de Controle da Origem dos Produtos Florestais (Sinaflor), que é administrado pelo órgão vinculado ao Ministério do Meio Ambiente. Ocorre que a inserção dos dados no sistema, como os tipos de madeira e quantidade que foram produzidas por determinadas empresa, possui fragilidades. Como se trata de dados repassados pelos Estados, sem um controle rígido de informações, há brechas para fraudes, com pedidos de autorizações e registros que não correspondem à realidade do que, efetivamente, foi retirado da floresta.

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Fonte:

O Estado de S. Paulo

https://politica.estadao.com.br/blogs/fausto-macedo/entenda-como-salles-e-ibama-afrouxaram-as-regras-para-exportacao-de-madeira/


O Globo: PGR diz que não foi consultada sobre operação da PF contra Ricardo Salles

Aguirre Talento e Jussara Soares, O Globo

BRASÍLIA – A operação da Polícia Federal contra o ministro do Meio Ambiente Ricardo Salles, deflagrada nesta quarta-feira, foi realizada sem uma consulta prévia ao procurador-geral da República Augusto Aras, como é a praxe nos procedimentos do tipo. Em seu despacho que autorizou a operação, o ministro do Supremo Tribunal Federal (STF) Alexandre de Moraes determinou que a Procuradoria-Geral da República (PGR) fosse informada do caso apenas após o cumprimento das diligências.

Após operação da PF:   Salles vai ao Planalto se reunir com Bolsonaro

Nos bastidores, fontes ligadas à investigação apontam que a PGR não foi informada previamente por receio de que Aras vazasse informações da operação para o Palácio do Planalto. Os investigadores também viam riscos de que o procurador-geral atuasse contra a realização da operação.

A decisão de não enviar previamente o caso para análise da PGR foi do ministro Alexandre de Moraes. “Após o cumprimento das diligências, dê-se, imediata ciência à Procuradoria-Geral da República”, escreveu Moraes, no despacho proferido no último dia 13 de maio.

Após tomar conhecimento da operação pela imprensa, a equipe de Aras divulgou uma nota com críticas ao procedimento adotado, sem citar nominalmente o ministro de Moraes. A PGR afirmou que “não foi instada a se manifestar sobre a medida, o que, em princípio, pode violar o sistema constitucional acusatório”.

Nos bastidores, o ministro Alexandre de Moraes minimizou as cobranças da PGR e vai responder nos autos caso Aras apresente alguma objeção.

Meio Ambiente: PF faz operação contra Ricardo Salles e presidente do Ibama é afastado do cargo

Geralmente, quando a PF solicita uma medida ao Supremo, o ministro pede um parecer da PGR a respeito do pedido policial. Só depois desse parecer do Ministério Público é que a operação costuma ser realizada. A mudança desse procedimento causou estranheza em integrantes da equipe de Aras.

Considerado um aliado por Bolsonaro, Aras analisa desde o final de abril um pedido de investigação contra Salles, protocolado no STF pelo ex-superintendente da PF do Amazonas, mas pediu explicações ao ministro antes de decidir se solicitaria a abertura de inquérito. A lentidão do PGR neste caso provocou desconforto entre investigadores da Polícia Federal

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Fonte:

O Globo

https://oglobo.globo.com/sociedade/pgr-diz-que-nao-foi-consultada-sobre-operacao-da-pf-contra-ricardo-salles-25024405

 


Bernardo Mello Franco: Vinte anos depois, Bruno Covas repete drama do avô

Duas décadas depois, Bruno Covas repete o drama do avô. Mario Covas descobriu um câncer no auge da carreira política. Havia acabado de se reeleger governador de São Paulo. Ele rompeu uma tradição da política brasileira e manteve os cidadãos informados sobre a evolução da doença. Morreu em 2001, aos 70 anos.

O prefeito Bruno também escolheu enfrentar a tragédia pessoal com transparência. Além de explicar cada etapa do tratamento, usou as redes sociais para divulgar boletins médicos e mensagens de otimismo. Na quinta-feira, ele publicou a última foto no hospital. Morreu neste domingo, aos 41 anos.

O câncer de Bruno Covas interrompe uma carreira política promissora. Em 2016, ele se elegeu vice-prefeito na chapa de João Doria. Quando Doria renunciou para concorrer ao governo paulista, tornou-se o prefeito mais jovem da história da cidade.

Covas não herdou o carisma do avô, mas honrou sua trajetória de combate ao autoritarismo. Em 2018, foi um dos poucos líderes tucanos a negar apoio a Jair Bolsonaro no segundo turno da eleição presidencial. Depois ofereceu ajuda para encenar peças de teatro boicotadas pelo governo federal.

Num ambiente político marcado pela radicalização, o prefeito se destacava pela moderação e pelo equilíbrio. Ele também representava uma face mais progressista do PSDB, partido que caminhou para a direita desde o fim do governo FH.

Em 2020, Covas se reelegeu ao vencer uma disputa civilizada com Guilherme Boulos. Chegou a se desculpar publicamente quando um aliado fez ataques pessoais ao candidato do PSOL. Um dos pontos fracos de sua campanha foi a escolha do vice Ricardo Nunes, num arranjo para garantir o apoio do MDB. Agora o ex-vereador assume o comando da maior cidade do país.

Fonte:

O Globo

https://blogs.oglobo.globo.com/bernardo-mello-franco/post/vinte-anos-depois-bruno-covas-repete-drama-do-avo.html


Míriam Leitão: A perda prematura do prefeito nascido em berço da boa política

Neste tempo das dores sem fim, o jovem político Bruno Covas perde a luta para o câncer. Das cenas do começo da pandemia, que ficarão na memória, uma delas é a do prefeito de São Paulo morando na prefeitura para trabalhar e, ao mesmo tempo, respeitar o confinamento. A imagem da cama colocada abaixo do quadro do Pátio do Colégio, lugar onde a cidade começou, era forte demais. Simbolizava a união entre a capital e seu prefeito.

Neste tempo em que o país precisa tanto de políticos dedicados à causa pública, o que São Paulo e o Brasil viram foi uma dessas pessoas em combate pela saúde da cidade enquanto travava a sua própria luta. Bruno Covas nasceu em berço da boa política e governou a mesma cidade que seu avô, Mário, governou. E com igual senso de dever. Foi abatido pela mesma doença.

Durante a campanha eleitoral, neste tempo dos conflitos extremados e polarizados, São Paulo viu alguns debates entre Bruno Covas e o candidato Guilherme Boulos, em que as divergências eram colocadas com elegância e respeito. Parecia lembrar ao Brasil o que o Brasil pode ser. É inevitável pensar, neste momento, no futuro que ainda aguardaria o jovem político que administrava a maior cidade do país.

 

Fonte:

O Globo

https://blogs.oglobo.globo.com/miriam-leitao/post/perda-prematura-do-prefeito-nascido-em-berco-da-boa-politica.html


Luiz Carlos Azedo: Apagão logístico na Saúde

Queiroga assume o ministério deslumbrado com o cargo e alinhado com Bolsonaro, mas completamente perdido diante da gravidade da crise sanitária

O novo ministro da Saúde, Marcelo Queiroga, assume o cargo em meio a um apagão logístico: faltam vacinas, mesmo com o escalonamento da programação, leitos, respiradores, oxigênio, material para intubação, sedativos e pessoal treinado em várias regiões do país. Em São Paulo, o estado com mais recursos, maior rede hospitalar e principal produtor de imunizantes do país, a situação é dramática, com uma morte a cada dois minutos. Queiroga fez, ontem, um discurso ambíguo, no qual defendeu a “política de saúde do presidente Jair Bolsonaro” e, ao mesmo tempo, destacou a importância das “evidências científicas” na condução da pasta, o que é uma contradição. Bolsonaro é contra as medidas de governadores e prefeitos para conter a propagação do vírus e evitar o colapso do Sistema Único de Saúde (SUS). Está deslumbrado com o cargo, mas completamente perdido diante da gravidade da situação.

Com a saída de Pazuello, não haverá uma transição, mas continuidade da política que estava sendo implementada por ele. Nenhuma mudança na equipe do ministério, formada por militares, foi anunciada. O novo ministro assumiu a pasta no dia em que o Brasil registrou 2.841 mortes por covid-19 nas últimas 24 horas, recorde absoluto desde o início da pandemia, e 84.362 novos casos, segundo o Conselho Nacional de Secretários de Saúde. Com isso, o número de vítimas fatais da doença chegou a 282.128, e o total de casos, a 11,603 milhões. Falta uma coordenação nacional de combate à pandemia, agravada pelo fato de que o presidente Bolsonaro estimula a desobediência civil e o desrespeito às medidas de isolamento social.

Rio Branco, Rio de Janeiro, João Pessoa, Macapá e Aracaju interromperam a aplicação da primeira dose da vacina contra a covid-19 porque o estoque acabou. Maceió suspendeu a imunização programada para ontem. Em Belford Roxo (RJ), milhares de pessoas se aglomeraram nos postos de vacinação sem conseguir receber a dose, todos idosos. Até agora, o Brasil vacinou cerca de 10 milhões de pessoas, o que equivale a 4,7% da população. É muito pouco, porque a chamada P1, originária de Manaus, já se espalhou por todo o país. Esse vírus mutante é responsável pelo novo perfil da pandemia, com taxa de contaminação mais alta e letalidade maior. Também está hospitalizando pacientes mais jovens, por longo tempo.

Falta de insumos
Em São Paulo, foram 679 novas mortes provocadas pela covid-19 em 24 horas, a maior taxa desde o início da pandemia. O estado totaliza 64.902 óbitos causados pelo coronavírus. Nessa escalada, será inevitável um lockdown em muitas cidades, pois 90% dos leitos de unidade de terapia intensiva (UTI) para covid-19 estão ocupados. O índice considera hospitais públicos e particulares. Na Grande São Paulo, a taxa média é ainda maior, 90,6%. Em todo o estado, 69 cidades já alcançaram 100% de ocupação de leitos de UTI. São 24.992 pessoas internadas, sendo 10.756 em UTIs e 14.236, em enfermaria.

No Rio Grande do Sul, foram 502 óbitos nas últimas 24 horas. É o maior registro diário em toda a pandemia. A taxa de ocupação dos leitos de UTIs estava em 109,6%. Dos 3.461 pacientes hospitalizados em leitos críticos, 2.534 são de pessoas confirmadas com covid (73,2%). Na rede privada, a situação é ainda mais grave: 135% das vagas de UTI adulto estão ocupadas. No Sistema Público de Saúde (SUS), a taxa é de 99%. Faltam equipamentos; os profissionais de saúde estão esgotados e adoecendo.

Em Mato Grosso, faltam respiradores. Em Várzea Grande, região metropolitana de Cuiabá, médicos que trabalham na Unidade de Pronto Atendimento (UPA) do Bairro Ipase desmontaram estetoscópios para usar a mangueira do aparelho como mangueira de oxigênio, já que o insumo está em falta. No Ceará, todos os hospitais da rede privada de Fortaleza estão em colapso, com 100% dos leitos de enfermaria e UTI ocupados. No Paraná, 28 hospitais de Curitiba e região estão em colapso, mesmo com o lockdown. Em Santa Catarina, faltam bloqueadores neuromusculares e anestésicos para a realização de intubação de pacientes em tratamento contra a doença. Acabaram os estoques de medicamentos, como Rocuronio, Propofol e Atracúrio.

https://blogs.correiobraziliense.com.br/azedo/nas-entrelinhas-apagao-logistico-na-saude/

João Doria: 'Polarização favorece os extremistas que destroem o País'

Cotado para 2022, governador de São Paulo diz em entrevista que forças de centro não serão engolidas se tiverem 'juízo'

Pedro Venceslau, O Estado de S. Paulo

Apontado como um dos presidenciáveis do PSDB - o outro é o governador do Rio Grande do Sul, Eduardo Leite -, o governador de São Paulo, João Doria, disse em entrevista ao Estadão que, caso o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva confirme a disposição de disputar o Palácio do Planalto em 2022, o cenário eleitoral vai mudar, mas as forças de centro não serão engolidas se "tiverem juízo".

Doria não descarta até a possibilidade de o PSDB apoiar um outro nome na disputa presidencial do ano que vem: "Nada deve ser excluído. Uma aliança pelo Brasil não pode estabelecer prerrogativas de nomes".

Como a decisão do ministro Edson Fachin que devolveu os direitos políticos ao ex-presidente Lula impacta o campo político do centro?

Primeiro é preciso saber se o presidente Lula será candidato. A medida do Supremo traz um impacto muito grande no mundo da política, mas é preciso saber se o presidente Lula tem disposição. Se ele confirmar que será candidato em 2022, então o cenário político para a sucessão presidencial muda. 

Muda como? 

Estabelece desde já a polarização extremista entre Bolsonaro e Lula, que é o que mais deseja o atual presidente.

A polarização também interessa ao Lula? 

Ao Lula resta saber. Ao Bolsonaro eu tenho certeza. Tem que perguntar para ele. 

Com Lula no tabuleiro eleitoral, as forças de centro precisam acelerar a escolha de um nome? 

A polarização favorece os extremistas que destroem o País. Já destruíram uma vez e estão completando o serviço com Bolsonaro. Portanto vejo como um impacto positivo para o centro democrático estar unido na defesa de um programa de governo que salve o Brasil dos extremistas. 

Por que o impacto é positivo? 

É preciso ver se os russos vão jogar a partida. Está todo mundo supondo. Caso o presidente Lula tome a decisão de ser candidato, se configura uma conflagração para a eleição de 2022 de alto risco para o Brasil. O extremismo não traz uma solução conciliadora diante da pandemia e da gravidade dos efeitos na economia. 

Teme que o centro seja engolido por essa polarização? 

Se tiver juízo, não. 

E o que significa ter juízo?

Capacidade de dialogar, formular um programa econômico e social para o Brasil e escolher um candidato que seja competitivo para disputar a eleição e, ao vencer, governar a Nação. Não basta a análise de popularidade, que é parte do processo. É preciso conciliar popularidade com capacidade. De nada vai adiantar ter um popular na Presidência da República que seja incapaz. 

O antipetismo e o antibolsonarismo são duas forças que ainda dominam a política brasileira?

Não vou dizer que dominam, mas são latentes. 

Qual é o momento de escolher o nome que vai encabeçar essa frente de centro?

No limite até outubro deste ano, caso contrário não haveria tempo de trabalhar esse nome nacionalmente. 

O PSDB pode apoiar o candidato de outro partido?

Nada deve ser excluído. Uma aliança pelo Brasil não pode estabelecer prerrogativas de nomes. 

Como o sr avalia que será o impacto político das medidas restritivas causadas pela pandemia nas eleições de 2022?

Não há dúvida que a pandemia vai impactar na decisão eleitoral. É a pior tragédia da história do Brasil nos últimos 100 anos. Em breve vamos alcançar o número de 300 mil mortos. Não há tragédia mais triste do que 300 mil vidas perdidas. 

O PSDB marcou para outubro as prévias para definir o candidato do partido ao Palácio do Planalto...

Sou amplamente favorável às prévias. Elas fortalecem, somam e constroem candidaturas fortes para a disputa eleitoral. Aliás, sou filho das prévias. As duas únicas prévias feitas até hoje no Brasil foram feitas pelo PSDB e em São Paulo, em 2016 e 2018. Disputei e venci as duas. 

Em 2014 e 2018 o PSDB reuniu um arco de partidos para disputar o Palácio do Planalto. Acredita que em 2022 esses partidos estarão reunidos em torno de uma candidatura de centro ou apoiarão Bolsonaro?

É possível, embora o ideal seja a conciliação. O fracionamento só atenderá o  interesse dos extremos. 

O antipetismo ainda tem a mesma força que teve em 2018 ou o PT com Lula pode aglutinar as forças de oposição ao Bolsonaro?

O governo Bolsonaro em dois anos provou a sua incompetência e fez da sua gestão um mar de fracassos e uma usina de mortes. Já provou, portanto, a sua incapacidade. 

Como avaliou a decisão do Fachin?

O Brasil é muito maior que Lula e Bolsonaro.


Splash: Alê Youssef diz que cultura segue sob ataque e projeta calendário de 2022

Guilherme Lucio da Rocha, Splash

O secretário municipal de Cultura de São Paulo, Alê Youssef, acredita que o setor "entrou em 2021 levando porrada e sofrendo ataques". Ele vê muita ideologização em relação à cultura por parte do governo federal, sob a gestão do presidente Jair Bolsonaro  (sem partido).

Acumulando duas passagens na pasta da maior cidade do país desde 2019, Youssef recebeu Splash com exclusividade em seu gabinete para conversar sobre suas ações e as dificuldades neste período de pandemia, em que o setor cultural foi o primeiro a sentir os impactos das medidas restritivas e deve ser o último a conseguir voltar à normalidade em 100%.

"Eu vejo 2021 como um período com os desafios que vêm desse processo pandêmico permanente, desse início de esperança [por conta da vacinação], mas de incerteza. A cultura foi a primeira a entrar e será a última a sair."

O secretário da gestão Bruno Covas (PSDB) já foi filiado ao PT e ao PV e mantém boas relações com diversas frentes políticas. Ele se diz preocupado com o "imbróglio ideológico" promovido pelo governo federal. A melhor maneira de explicar isso é citando o post do deputado preso Daniel Silveira e do Mário Frias [secretário de Cultura do governo Bolsonaro] falando sobre a estratégia para defenestrar a cultura e misturando-a com a esquerda. O vídeo em questão, postado por Silveira (PSL-RJ) em seu Instagram e já excluído, falava sobre um controle de verbas da pasta federal para "financiar projetos nefastos" desse "câncer chamado esquerda".

Contraponto
A maior cidade do país acabou se tornando uma espécie de contraponto às medidas do governo federal em relação à cultura. Um dos principais exemplos disso foi o festival "Verão Sem Censura", realizado no início de 2020 (época pré-pandemia). O evento reuniu peças teatrais, intervenções e shows musicais de artistas que sofreram com censura ou tiveram seus trabalhos rejeitados pela União. O secretário afirma que a atuação do governo federal é de "ataque", e que São Paulo deve ser uma voz de resistência.

Quando você tem pilhas de projetos da Ancine e da Lei Rouanet parados, é quase que uma censura prévia. Você desliga o motor que faz a engrenagem girar. Além disso, tem a exclusão das pessoas e personalidades da Fundação Palmares. Como alguém, por pura arbitrariedade, exclui pessoas tão emblemáticas, históricas, de uma hora para outra? A cultura é fundamental no processo antirracista.

Um dos pontos de possível diálogo entre governo federal e secretaria de Cultura de São Paulo é a Cinemateca. O local, que fica em São Paulo, mas é de responsabilidade do governo federal, não recebeu repasse de verbas em 2019 nem em 2020, colocando em risco parte de seu acervo histórico.

"Estamos tentando [um diálogo]. Precisamos achar uma solução. Para nós, além de ser uma responsabilidade em relação ao acervo nacional, tem a ver com um espaço emblemático da cidade."

Carnaval na pandemia
A trajetória de Alê Youssef está muito ligada ao bloco Acadêmicos do Baixo Augusta, do qual o secretário é um dos fundadores. Por conta da pandemia, não houve comemoração oficial neste ano, e o prejuízo vai além da questão afetiva: em 2020, o  Carnaval movimentou quase R$ 3 bilhões na cidade. A gente estava numa crescente e, em 2021, teria um número ainda maior do que em 2020. Óbvio também que existiram as festas clandestinas, mas acho que demos uma demonstração de maturidade. Os grandes protagonistas do Carnaval [blocos de rua e escolas de samba] respeitaram o momento.

Sobre o Carnaval de 2020, o Ministério Público de São Paulo ofereceu denúncia  contra Youssef, a SPTuris e seu presidente, Osvaldo Arvate Junior, além de outros funcionários da administração pública e a Ambev. Segundo o MP-SP, o contrato firmado entre prefeitura e a empresa para o patrocínio da festa de rua foi "extremamente vago".

"Recebi a denúncia perplexo, mas fiquei também tranquilo quando li os argumentos. Estamos preparando a defesa. Tenho muita consciência dos ritos que tomamos, acho que faz parte do exercício da atividade pública esse tipo de questionamentos. E temos o dever de responder no tempo certo."

Periferia modernista
Tentando manter a cultura viva em 2021, com políticas de resgate e apoio aos profissionais da área, a esperança é que 2022, pós vacinação, seja histórico. O ano marca o centenário da Semana de Arte Moderna, que marcou a era modernista no Brasil e foi um marco para a cidade de São Paulo.

Youssef revela que o prefeito Bruno Covas deve anunciar detalhes das celebrações mais para a frente, mas já adianta que o grande destaque será a valorização da cultura periférica. "Nós encaramos o centenário de 2022 como um grande reencontro da cidade consigo mesma. E ele se dá a partir da percepção de que o novo modernismo é concentrado na cultura da periferia. Ela é a protagonista."

O discurso encontra reflexo em seu gabinete. Desde janeiro, a secretária-adjunta da pasta é a produtora cultural Ingrid Soares, articuladora que tem ligações com as periferias da cidade. "Precisamos ter um olhar estratégico de valorização da cultura periférica. É o olhar para a formação cultural, o quanto a cultura tem que estar próxima das nossas crianças".

Se o assunto é cultura periférica de São Paulo, é preciso falar de funk e dos bailes de rua, que arrastam multidões pelos extremos da cidade. As medidas relacionadas a esses eventos costumam estar mais ligadas à pasta de Segurança Pública. No entanto, Youssef destaca o programa Funk da Hora, que visa levar infraestrutura para a realização desses eventos de forma organizada, com o aval do Estado.

Em 2015, a gestão de Fernando Haddad tentou instituir um programa similar, o Funk SP. No entanto, a medida adotada pelo petista durou cerca de um ano e recebia criticas sobre o "engessamento" das festas. Youssef argumenta que o Funk da Hora é diferente do projeto da gestão anterior e busca manter diálogo com produtores e artistas locais.

"Nossa ideia era estruturar festas públicas nas comunidades, para fazer com que a juventude e os artistas locais pudessem estar presentes nos palcos. Realizamos alguns eventos antes da pandemia, entramos em 2020 com essa agenda, era algo que levaríamos durante todo ano. Tratamos o funk como uma das principais expressões culturais da cidade."


Luiz Carlos Azedo: O trem andou

A independência do BC agrada ao mercado, porque garante mais previsibilidade na economia, mas não desenrola a política econômica

A independência do Banco Central (BC) foi aprovada, ontem, na Câmara, por 339 votos a 114, depois de 30 anos de discussão. O presidente da Casa, Arthur Lira (PP-AL), fez da votação uma demonstração de força e uma sinalização para o mercado de que vai retornar à agenda das reformas. A aprovação também é um contraponto à gestão do antecessor, deputado Rodrigo Maia(DEM-RJ), que está sendo responsabilizado por Lira e pelo Planalto pelo atraso na votação das medidas econômicas necessárias para enfrentar a crise. Não é bem assim, a matéria já estava pronta para ser aprovada e contava com ampla maioria. Provavelmente, seria a primeira medida a ser votada caso o deputado Baleia Rossi (MDB-SP) fosse o eleito.

Na verdade, o que está atrasando a votação das medidas econômicas é a falta de entendimento político entre a turma do Centrão, os militares do Planalto e a equipe econômica em relação à maioria dos assuntos, sem que Bolsonaro tome uma decisão. Por exemplo, a criação do auxílio emergencial, desejo da ampla maioria dos parlamentares, não vai adiante porque toda a Esplanada dos Ministérios se recusa a cortar na própria carne, e a equipe econômica também não quer criar um imposto.

A independência do BC agrada ao mercado, porque garante mais previsibilidade na economia, mas não desenrola a política econômica. Diretores do banco terão mandato de quatro anos, com direito a uma reeleição. Os mandatos não coincidirão com o do presidente da República, que indicará o presidente e demais diretores do BC. Caberá ao Congresso aprovar a indicação e, se for necessário, destituir os diretores do banco.

Em tese, a independência do BC acaba com interferências do Executivo na política monetária. Num regime de metas de inflação, isso garante que a política de juros seja administrada com foco exclusivo na estabilidade da moeda. Alguns analistas acreditam que os juros do mercado futuro, que servem para a rolagem da dívida pública, tenderão a cair com a decisão. A medida é muito criticada pela esquerda e economistas desenvolvimentistas, mas há muitos países governados por partidos de esquerda que têm bancos centrais independentes.

Outro passo importante foi a instalação da Comissão Mista de Orçamento, que estava sendo adiada por causa de uma disputa pelo seu comando entre o ex-presidente da Câmara Rodrigo Maia (DEM-RJ) e o Centrão. A presidente da CMO é a deputada Flávia Arruda (PL-DF), indicada por Arthur Lira. Com 31 deputados e 11 senadores, a comissão instalada, ontem, vai examinar o Orçamento de 2021; em abril, outra composição será feita, para discutir o Orçamento de 2022. O presidente do Congresso, Rodrigo Pacheco (DEM-MG), ao instalar a comissão, descartou a criação de um novo imposto para financiar a prorrogação do abono emergencial.

Doria versus Aécio
A lavagem de roupa suja em público no PSDB continuou ontem. O governador João Doria praticamente deu um ultimato à cúpula do partido para afastar o deputado Aécio Neves (MG), em nota duríssima; Aécio rebateu. Do jeito que vão as coisas, será impossível a permanência de ambos na legenda. O problema é que Doria tem mais poder político, por causa do governo de São Paulo, mas quem tem maioria na cúpula da legenda é o político mineiro.

É impressionante como a disputa pela presidência da Câmara desagregou a legenda. Mostrou para Doria que uma parte considerável da bancada pode ter derivado para a base do presidente Jair Bolsonaro, comprometendo seu projeto eleitoral. A forma como o governador paulista pretende resolver o problema não está clara. Há três hipóteses: (1) forçar os pares a lhe entregar o comando da legenda; (2) sair do partido para ser candidato por outra legenda; (3) desistir da candidatura, tendo Aécio como pivô da tragédia.

https://blogs.correiobraziliense.com.br/azedo/nas-entrelinhas-o-trem-andou/

Luiz Carlos Azedo: Doria põe fogo no ninho

“O eixo de gravidade da maioria dos tucanos no Congresso não é o Palácio dos Bandeirantes, é o Palácio do Planalto”

O governador de São Paulo, João Doria, pode ter dado um grande passo em falso para a consolidação de sua candidatura. Nem tanto por exigir do PSDB um claro posicionamento de oposição ao presidente Jair Bolsonaro, uma vez que já se coloca nesse campo, mas porque fez duas exigências para as quais, no momento, ainda não reúne forças suficientes para obtê-las dentro de seu próprio partido: a renúncia do deputado Bruno Araújo (PE), que preside a legenda, e a expulsão do deputado Aécio Neves MG), uma eminência parda nas bancadas da Câmara e até do Senado, onde ainda tem muitos aliados.

Doria fez as exigências num jantar com lideranças tucanas na segunda-feira. Bruno Araújo foi surpreendido pela proposta e não gostou nem um pouco da ideia de passar o comando da legenda para o governador paulista, de quem, inclusive, era aliado. A reação do presidente do PSDB foi defender a realização de prévias, pois o governador do Rio Grande do Sul, Eduardo Leite, tem revelado a aliados que não deseja se reeleger ao cargo e gostaria de disputar a Presidência da República. O líder da bancada na Câmara, Rodrigo Castro (MG), muito menos. É muito ligado a Aécio, que reagiu confrontando Doria diretamente: “O partido não tem dono”.

O ninho foi incendiado por Doria, mas a divisão interna já estava patente na disputa pelos comandos da Câmara e do Senado. No primeiro caso, por muito pouco a bancada não se retirou do bloco encabeçado pelo líder do MDB, Baleia Rosssi (SP), que foi derrotado por Arthur Lira (PP-AL). Foi preciso que Doria e até o ex-presidente Fernando Henrique Cardoso interviessem nas articulações, porque a maioria da bancada estava com o candidato do Centrão. No segundo, cinco dos oito senadores tucanos apoiaram Rodrigo Pacheco (DEM-MG) contra Simone Tebet (MDB-MS). Ou seja, o eixo de gravidade da maioria dos tucanos no Congresso não é o Palácio dos Bandeirantes, é o Palácio do Planalto.

Repete-se no PSDB uma situação muito parecida com a do DEM, que se alinhou com o presidente Jair Bolsonaro na eleição das Mesas do Senado e da Câmara, com a diferença de que os tucanos já têm uma candidatura própria. Desde a eleição de Fernando Henrique Cardoso, os candidatos paulistas à Presidência do PSDB enfrentam dificuldades internas fora do estado, principalmente em Minas Gerais e no Rio de Janeiro. No caso de Doria, essa dificuldade é ainda maior porque o governador paulista não tem nenhuma experiência parlamentar, ou seja, não conhece o Congresso. Além disso, há contenciosos entre os estados nos quais São Paulo fica num certo isolamento, principalmente em matérias financeiras e tributárias.

Doria disputava uma aliança com o DEM com o presidente Jair Bolsonaro e o apresentador Luciano Huck, que também tentava atrair a legenda para sua candidatura, inclusive com a possibilidade de a ela se filiar. Os recentes episódios na Câmara fizeram com que ambos despertassem desse sonho. Doria, agora, tenta atrair para o PSDB o vice-governador Rodrigo Garcia, que deve assumir o governo e se candidatar à reeleição. Isso resolveria o problema do descolamento do DEM em São Paulo, facilitando, também, a acomodação dos tucanos paulistas. O governador paulista também tenta atrair o deputado Rodrigo Maia (RJ), que anunciou sua saída do DEM com duras críticas ao ex-prefeito de Salvador (BA) ACM Neto, presidente da legenda. O prefeito do Rio de Janeiro, Eduardo Paes (DEM), é outro assediado por Doria.

Rodrigo Maia e Eduardo Paes são atores importantes no quadro político nacional, mas precisam de um partido para ter protagonismo. O primeiro tem pressa em se reposicionar, para não sair do jogo; o segundo, não tem a mesma urgência, pois não pretende se candidatar em 2022. Além do PSDB, as principais opções para Maia são o PSL, com a saída dos parlamentares ligados a Bolsonaro, e o MDB, que precisa se reestruturar no Rio de Janeiro. Corre por fora o Cidadania, caso se confirme a filiação de Luciano Huck.

Comitê de imprensa
Oscar Niemeyer, Carlos Castelo Branco, Ari Cunha, Tarcísio Holanda e Jorge Bastos Moreno, para não estender a lista, certamente estariam engrosssando o coro de protestos contra o despejo do comitê de imprensa da Câmara do local que historicamente lhe foi destinado, ao lado do plenário, para facilitar o acesso recíproco de jornalistas e deputados a ambos os espaços. O “ato administrativo” do novo presidente da Câmara, Arthur Lira (PP-AL), obviamente, é uma retaliação política à cobertura da imprensa durante a sua campanha eleitoral, na qual se consolidou uma imagem negativa.

A exposição que todo presidente da Casa tinha ao atravessar o Salão Verde da Câmara era sempre um rito democrático: ao transitar do gabinete para o plenário, mesmo cercado de seguranças, era abordado por jornalistas, parlamentares, lobistas e cidadãos. Provavelmente, o espaço do comitê de imprensa será reconfigurado, com novos banheiros, amplo gabinete, salas reservadas e novas cortinas, para impedir os olhares indiscretos de quem chega pela chapelaria e avista o espaço inteiramente livre no qual os jornalistas trabalham em suas bancadas. Muitas vezes, eram os últimos a deixar a Câmara, depois de sessões que entravam pela madrugada.

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