Saneamento
Míriam Leitão: Bolsonaro e ministros usam sucesso do leilão da Cedae para melhorar semana desastrosa
Antes de melhorar a água e ampliar a oferta de saneamento no Rio, a privatização da Cedae foi usada pelo presidente Bolsonaro, o ministro Paulo Guedes, o ministro Eduardo Ramos, o senador Flávio Bolsonaro para tentar pular nas águas de uma notícia boa. Foi uma semana desastrosa para todos eles. A CPI começando, as derrotas no Senado, as declarações catastróficas de Guedes e do general Ramos, o fiasco de Flávio. A semana foi uma sucessão de fotos ruins para todos eles. Mas voaram todos para São Paulo, para sair na foto do leilão bem-sucedido.
O governador Claudio Castro tinha dito, num telefonema para o blog, que era um erro politizar um assunto que é técnico. “Não se pode resumir tudo a uma disputa entre Bolsonaro x Lula”. Mas sua afirmação de que não seria politizada não prevaleceu. O próprio governador aproveitou para, num dia emblemático do impeachment do ex-governador Wilson Witzel, tentar se alavancar. O presidente do BNDES, Gustavo Montezano, acentuou o ar politizado do evento. “Fluminenses avante”, disse e repetiu, chamou o governador de “herói” e outras grandiloquências. Depois dele, veio Paulo Guedes falando em “remover da miséria milhões de brasileiros”. O mesmo Guedes que se aborrece com o curso universitário do filho do porteiro.
Após Guedes, adivinha quem veio para martelar? O ministro Rogério Marinho, que se tornou o arqui-inimigo de Paulo Guedes. Para chamar também todos de “heróis”. E deixou claro que estava ali para fazer propaganda de Bolsonaro. Aproveitou para creditar ao presidente a transposição do Rio São Francisco. Bolsonaro, antes de também bater o martelo, aproveitou para mais uma vez tentar usar a figura divina em discurso político.
– Devo a Deus a minha segunda vida, devo a Deus o meu mandato.
Foi um show de demagogia. De fato, o leilão foi um sucesso, apesar de ter ficado um bloco sem comprador. A venda da Cedae teve até direito à emoção da disputa de viva voz pelo bloco 4, que teve 20 lances. No fim, o governo do Rio vai embolsar R$ 22 bilhões. O governador tinha falado que seria de 50% a 150% de ágio, e ficou em 114%. O consórcio Aegea arrematou dois blocos, e o consórcio, Iguá, outro. A dúvida é como ficarão os seis municípios do bloco 3, que permanecerão sob o serviço da estatal.
A venda da Cedae é um marco sim, mas é preciso martelar muito a realidade para dizer que tudo se deve aos que apareceram na foto. O projeto do marco regulatório do saneamento foi enviado pelo ex-presidente Michel Temer, foi salvo no Congresso pelo senador Tasso Jereissati, a modelagem da venda vem sendo feita há quatro anos pelos servidores do BNDES, como admitiu Montezano.
As privatizações às vezes parecem bem-sucedidas e depois dão errado, quando o comprador não faz o investimento, o governo usa mal o dinheiro arrecadado e o regulador não fiscaliza. O Rio sonha há muito tempo com um bom serviço de água e a universalização do saneamento. Que agora o governo do Rio fale sério e saia do palanque. Será preciso fortalecer a agência reguladora, será preciso fazer o investimento na Cedae que continuará sendo a produtora da água. Portanto, a nascente desse serviço. Se ela não melhorar a qualidade dos seus serviços, teremos apenas a geosmina.
Fonte:
O Globo
Marcus Pestana: Investimentos e expectativas
Afirmar que a maior prioridade pós-pandemia é a geração de empregos e a retomada do crescimento econômico é “chover no molhado”. Afinal, as novas projeções do FMI apontam para uma retração da economia brasileira de 9,1% em 2020.
Os motores que podem impulsionar são o investimento e o consumo, privado e público, e o comércio exterior. Mas quem comanda o crescimento são os investimentos. Nas ultimas décadas a taxa de investimento do país foi reconhecidamente baixa, chegando a 15,4% do PIB em 2019.
Dada a grave restrição fiscal que se impõe ao setor público as respostas não virão a partir de seus investimentos. A situação fiscal é dramática. E as receitas estão caindo em função da crise e as despesas continuam crescendo em sua rigidez inercial. A resposta obrigatoriamente virá dos investimentos privados e do crescimento das exportações.
Mas não bastam, para atrair investimentos privados, bons fundamentos macroeconômicos. Já foi dito que no plano fiscal não estamos bem. Mas no segmento da política monetária temos a menor taxa básica de juros da história (2,25%) e inflação bem abaixo da meta. E do ponto de vista cambial temos reservas cambiais abundantes, saldo comercial positivo, apesar da queda do investimento direto estrangeiro e da relativa fuga de capitais do Brasil.
Mas há, além dos dados objetivos, fatores subjetivos que se refletem na formação das expectativas dos investidores. Precisamos gerar um ambiente de confiança. Garantir segurança jurídica, estabilidade legal e regulatória, diminuir o Custo Brasil, garantir infraestrutura adequada ao desenvolvimento, enraizar a cultura de respeito aos contratos, passar a ideia de que o Brasil tem rumo e estancar a instabilidade política.
O atual ambiente institucional confuso não nos ajudará a sair da profunda recessão que se avizinha. O investidor gosta de tranquilidade e de regras claras e confiáveis.
O jornal Valor Econômico mostrou que das dez maiores PPPs do país, cinco ou fracassaram ou têm futuro incerto. Mas há bons exemplos de parcerias que deram resultados nas áreas da infraestrutura, saúde, educação e sistema penitenciário. Várias concessões públicas estão problematizadas, mas há muitas que foram bem. O programa de privatizações foi estancado devido à crise, mas será retomado em algum momento futuro.
Entretanto, precisamos melhorar muito a imagem do Brasil e prosseguir nas reformas estruturais macro e microeconômicas. Temos que tratar melhor a questão ambiental e dos direitos humanos que pesam na opinião pública internacional. Gestores de fundos que administram 3,7 trilhões de dólares encaminharam documento às embaixadas brasileiras em oito países questionando a postura brasileira. Precisamos retomar as tradições da política externa brasileira e evitar polarizações danosas e alinhamentos automáticos.
E avançar em medidas como o Novo Marco do Saneamento aprovado, que poderá atrair 700 bilhões de reais em investimentos e tem metas arrojadas de assegurar água tratada a 99% da população e coleta de esgoto a 90% dos brasileiros até 2033.
Na mesma direção, aprovar as reformas tributária e administrativa, licitar o 5G nas telecomunicações e manter o compromisso permanente com a responsabilidade fiscal e a estabilidade da economia.
É isto que todos esperam como horizonte para um novo Brasil pós-COVID-19.
José Serra: O saneamento e o futuro
Ficar contra o Reisb é como ser contra a luz elétrica e, literalmente, contra a água encanada e o saneamento
Tenho insistido há muito tempo na ideia de que o sistema de saneamento é supertributado em nosso país, fator que corrói sua capacidade de investimentos e freia a expansão dos serviços de água e esgotos. O ponto marcante dessa distorção ocorreu no início do governo do presidente Lula, quando o PIS e a Cofins passaram a incidir sobre o valor adicionado das empresas. Antes, incidiam sobre o faturamento. No processo de mudança, a alíquota foi aumentada. Dadas as peculiaridades da função de produção do saneamento, a receita do PIS/Cofins extraída do setor aumentou quase três vezes em termos reais, equivalendo a cerca de 25% do investimento total da área!
Motivado para corrigir ou pelo menos atenuar essa distorção, apresentei em 2015 um projeto de lei criando o Regime Especial de Incentivos para o Desenvolvimento do Saneamento Básico (Reisb). Esse projeto foi aprovado no Senado e na Câmara, mas terminou desidratado por veto parcial do Executivo.
Em essência, o Reisb previa a possibilidade de que o PIS/Cofins devido pelas companhias de saneamento fosse destinado a novos investimentos das empresas. Seriam “novos” de verdade, pois se uma empresa tivesse investido 100 nos últimos cinco anos, só teria direito a crédito do PIS/Cofins devido sobre o adicional de investimentos que viesse a realizar nos anos subsequentes.
Para superar as limitações impostas pelo veto, apresentei neste ano o Projeto de Lei do Senado (PLS) 52, reidratando e aperfeiçoando a ideia. O relator do Reisb na Comissão de Assuntos Sociais, senador Waldemir Moka, deu um parecer favorável que contou com a aprovação – entusiasmada – de representantes de todas as correntes políticas.
No livro O Mapa Fantasma, Steven Johnson narra os eventos relacionados à epidemia de cólera de 1854 em Londres. Até então, a crença científica era de que o cólera fosse transmitido pelo “miasma” emanado dos rios poluídos. O médico John Snow, num trabalho epidemiológico brilhante, rastreou e mapeou todas as ocorrências individuais e conseguiu demonstrar que o cólera era provocado pela água contaminada.
A nova teoria de Snow encontrou resistências na comunidade científica, mas, com a ocorrência do Great Stink do Rio Tâmisa, que atormentou os londrinos em 1858, as autoridades decidiram pela construção de um sistema que levasse todos os dejetos até o estuário do rio.
Essa obra monumental e pioneira, que incluiu várias estações elevatórias – um feito tecnológico para a época –, livrou a população de um esgoto a céu aberto e remodelou as margens do Tâmisa, no que hoje se chamaria de revitalização urbana.
Assim, com uma tecnologia que atualmente seria considerada rudimentar, foi construída a rede de esgotos de Londres, em apenas seis anos. Aqui, mais de um século e meio depois, estamos ainda considerando a hipótese – otimista – de universalizarmos o tratamento de esgotos em 2033!
Nossa cobertura de esgotos (83%) é inferior à da Argentina (96%); do Chile (99%); do Paraguai (89%) e do Uruguai (96%). De 2005 a 2015, aquela cobertura aumentou no Brasil somente 5 pontos porcentuais, de 77,7% para os atuais 83%. O Paraguai nos ultrapassou no período: saiu de 76% para 89%, uma melhora de 13 pontos.
Além disso, nossa cobertura ainda é muito deficiente quanto ao tipo de coleta. Segundo a Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios (Pnad) de 2015, temos rede coletora para apenas 54% da população.
Em algumas regiões, a situação é pior do que a média. No Pará, por exemplo, o porcentual das famílias que recebem até 1 salário mínimo sem rede de esgotos ou com atendimento precário é de 79%, ou seja, apenas 1 em cada 5 domicílios está ligado à rede coletora.
Segundo o Ministério da Saúde, tivemos 340 mil internações por infecção gastrointestinal em 2013. A falta de cobertura provoca 330 mortes a mais por ano, decorrentes de infecções evitáveis. A insuficiência de saneamento afeta o desempenho escolar em até 30% nas áreas não atendidas.
Na verdade, os dados demonstram que a expansão da rede de esgotos é uma política essencialmente redistributiva, em termos regionais e de renda.
Aliás, um efeito comprovado e muito relevante para os mais pobres é a valorização imobiliária nos bairros e regiões beneficiados pela implantação do saneamento básico. A melhor infraestrutura cria condições para novas atividades econômicas e novos empreendimentos. Ao fim desse ciclo virtuoso, a renda média nas regiões atendidas aumenta. Estima-se que só o efeito de valorização imobiliária provocada pela universalização do saneamento equivaleria a um ganho global de R$ 178 bilhões.
E há, ainda, vantagens e benefícios insuspeitados. Por exemplo, nas áreas carentes de fornecimento de água, a necessidade de manter estoques mal acondicionados do produto provou-se um fator de proliferação do Aedes aegypti e, portanto, um vetor de propagação da dengue, da zika e da chikungunya. A simples melhora da qualidade do abastecimento teria um efeito decisivo no extermínio do Aedes.
Qualquer avaliação séria de custos e benefícios recomenda a adoção de um forte programa de investimentos, como o do Reisb. Hoje em dia, ficar contra esse programa é como ser contra a luz elétrica e, literalmente, contra a água encanada.
Há tanto desperdício na máquina pública, tantos exageros salariais, tantos subsídios inexplicáveis – estamos falando de isenções fiscais na casa dos R$ 200 bilhões –, muitos sem qualquer impacto positivo na economia, que parece descabido afirmar que um incentivo meritório e indispensável ao investimento em saneamento constitui uma grave ameaça fiscal.
De fato, essa resistência, basicamente, tem um conteúdo mais simbólico. Já que não se consegue entregar efetivamente resultados fiscais que revertam o crescimento da dívida, apela-se para essas demonstrações rituais de austeridade.
* José Serra é senador (PSDB-SP)
Vitória é a primeira capital entre as cidades mais eficientes do País, mostra ranking do Datafolha
A Folha de S. Paulo publicou neste domingo (28) o Ranking de Eficiência dos Municípios. O levantamento mostra quais prefeituras foram mais eficientes na utilização dos recursos públicos. Vitória, cidade administrada pelo prefeito do PPS, Luciano Rezende, é a capital mais bem avaliada na pesquisa.
O ranking leva em conta indicadores de saúde, educação e saneamento para a calcular a eficiência da gestão e apresenta dados de 95% dos municípios brasileiros.
Numa escala de 0 a 1, apenas 24% das cidades ultrapassam 0,50 e, pela metodologia utilizada, podem ser consideradas eficientes. Pesquisa da Datafolha indica que só 26% dos brasileiros aprovam a gestão de suas prefeituras.
Fonte: pps.org.br