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Política Democrática: Brasil tem 486 terras indígenas com demarcações homologadas, afirma Márcio Santilli
Sócio fundador do ISA diz que essas áreas representam 67% das 717 terras indígenas oficialmente reconhecidas
Cleomar Almeida
Em artigo publicado na quinta edição da revista Política Democrática online, o sócio fundador do ISA (Instituto Socioambiental) e ex-presidente da Funai (Fundação Nacional do Índio), Márcio Santilli, diz que o Brasil possui 486 terras indígenas, de um total de 717, com as demarcações já homologadas e registradas em cartórios. “Todas essas áreas somam pouco mais de 13% do território nacional, porém, mais de 98% dessa extensão estão na Amazônia Legal Brasileira”, afirma ele.
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Na publicação, produzida e editada pela FAP (Fundação Astrojildo Pereira), ele ressalta que existem terras indígenas invadidas ou que ainda não se encontram na posse dos índios, que, conforme ressalta, estão significativamente degradadas ou desmatadas. “Mas, de um modo geral, o grau de conservação das águas, florestas e outros ambientes naturais é bem maior do que a de terras situadas em seus entornos e equivale ao grau de unidades de conservação de uso restrito, como os parques nacionais”, continua ele.
Há 30 anos, de acordo com o artigo, eram poucos os representantes indígenas que tinham domínio do português ou algum conhecimento sobre as instituições políticas do país. “Nesse período, também houve avanço inédito na escolarização dos índios e em seu domínio do português. Temos hoje milhares de professores, agentes de saúde, agentes ambientais, profissionais liberais, artistas, empresários, pesquisadores e funcionários públicos indígenas, atuando nas suas terras, em cidades próximas ou fazendo a ligação entre elas’, analisa Santilli.
Nos idos da Constituinte, segundo o sócio fundador do ISA, havia apenas a UNI (União das Nações Indígenas) no país, que, conforme acrescenta, sequer dispunha de um registro em cartório. “Hoje, existem centenas, de todos os tipos: de representação política local ou geral, de corte profissional, de gênero, de expressão cultural ou até empresarial”, assinala.
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Ex-embaixador do Brasil em Washington (1999-2004) analisa, em artigo publicado na quinta edição da revista Política Democrática online, as medidas que o país precisa para reformar o Estado e destravar o mercado
Cleomar Almeida
O Brasil precisa cada vez mais de um choque liberal na economia para reformar o Estado, destravar o mercado, recuperar as finanças públicas e redirecionar os recursos públicos do dispêndio com pessoal e previdência. A avaliação é do ex-embaixador do Brasil em Washington (1999-2004), Rubens Barbosa, em artigo publicado na quinta edição da revista Política Democrática online, produzida e editada pela FAP (Fundação Astrojildo Pereira).
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De acordo com o autor do artigo, o Fórum Econômico Mundial em 2019 não teve nem o brilho, nem o otimismo dos anos anteriores, pela ausência dos líderes das principais potências e desaceleração da economia global e risco de guerra comercial. “Nesse contexto, o Brasil, uma das dez maiores economias do mundo, acenou com amplas oportunidades de investimento e de cooperação com a apresentação de um programa liberal de abertura da economia e de correção de práticas de corrupção, o que o auditório queria ouvir”, escreveu Barbosa.
Não pode ser ignorado, na avaliação do ex-embaixador, o atual contexto internacional muito negativo em relação ao Brasil em decorrência da muito bem-sucedida campanha de descrédito contra o país desenvolvida pelo PT junto à mídia, aos políticos e à academia nos EUA e na Europa, nos últimos três anos. “A percepção no exterior está dominada pela retórica do golpe, depois do impeachment de Dilma Rousseff, passando pela perseguição a Lula, presentado como um prisioneiro político, e culminando com a teoria de fraude na eleição de outubro passado pela não participação do ex-presidente”, ressaltou ele, para continuar: “A expectativa que se criou em Davos, pela presença do presidente Jair Bolsonaro na abertura do World Economic Forum, foi correspondida, em grande parte, pelos pronunciamentos presidencial e dos ministros Paulo Guedes e Sergio Moro”.
Barbosa também é consultor de negócios, presidente do Conselho Superior de Comércio Exterior da FIESP (Federação das Indústrias do Estado de São Paulo), presidente do Conselho Deliberativo da SOBEET (Sociedade Brasileira de Estudos de Empresas Transnacionais e da Globalização Econômica). Ele é membro do Gacinte (Grupo de Análise da Conjuntura Internacional) da USP) (Universidade de São Paulo), presidente emérito do CEBEU (Conselho Empresarial Brasil – Estados Unidos) e editor responsável da revista “Interesse Nacional”. É autor de “Interesse nacional e visão de futuro” (Sesi SP, 2012), “O Dissenso de Washington” (Agir, 2011) e “Mercosul e a integração regional” (Imprensa oficial – SP, 2009).
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Direitos negados serão foco do Sínodo para Pan-Amazônia, diz dom Roque Paloschi
Em entrevista à Política Democrática online, arcebispo de Porto Velho (RO) destaca atenção para realidade de índios, ribeirinhos, quilombolas e extrativistas
Cleomar Almeida
A Assembleia Especial do Sínodo para a Pan-Amazônia focará em uma “realidade” de “direitos negados” a índios, ribeirinhos, quilombolas e extrativistas, como antecipa o arcebispo de Porto Velho (RO) e presidente do CIMI (Conselho Indigenista Missionário), dom Roque Paloschi. Em entrevista à quinta edição da revista Política Democrática online, ele lembra que o evento vai durar 23 dias e será realizado em outubro, em Roma.
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Dom Paloschi, que também é membro do Conselho Pré-sinodal para a Assembleia Especial do Sínodo para a Pan-amazônia, diz que o Sínodo “é um convite ao diálogo, a escutar e buscar; a ter a ousadia de nos deixarmos conduzir pela ação do Espírito Santo e tentar dar respostas condizentes aos desafios de hoje na realidade pan-amazônica”.
Na prática, o Sínodo é o encontro global de bispos no Vaticano para discutir a realidade de índios, ribeirinhos e demais povos da Amazônia, políticas de desenvolvimento dos governos da região, mudanças climáticas e conflitos de terra. Com base em relatórios de inteligência, o Gabinete de Segurança Institucional (GSI), comandando pelo General Augusto Heleno, avalia que setores da Igreja pretendem aproveitar o Sínodo para criticar o governo Bolsonaro.
Para o GSI, a Igreja Católica é uma tradicional aliada do PT e está se articulando para influenciar debates antes protagonizados pelo partido no interior do País e nas periferias. No entanto, dom Roque Paloschi questiona: “A Igreja tem de ficar do lado de quem? Ao lado de quem promove a morte ou de quem busca a vida?”.
De acordo com o arcebispo, a reação à declaração de um general sobre a participação da igreja do Brasil no Sínodo é um assunto diplomático. “Quem vai responder a isso será a Nunciatura Apostólica ou a diplomacia do Vaticano. Aquilo que eu disse na entrevista a um jornal de São Paulo é o máximo que posso dizer. Primeiro: a igreja não tem nada a esconder. Segundo: nada a temer. Terceiro: temos que viver o evangelho. E quarto: de quem que a igreja tem que ficar do lado? De quem promove a vida ou de quem promove a morte? A posição da igreja é cristalina”.
Conforme lembrou Dom Paloschi, o Papa Francisco disse, em outubro de 2017, que é preciso buscar novos caminhos para a evangelização do povo de Deus na região Pan-Amazônica, avaliada pelo chefe da Igreja Católica como “uma realidade de sofrimento”. “Quem a acompanhou a visita do Papa ao Peru recordará que os povos indígenas disseram literalmente assim: ‘Francisco, nos defende, estão nos matando’”, ressaltou o arcebispo.
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Política Democrática online destaca império das milícias sobre morte de Marielle Franco
Na quinta edição da revista, equipe de reportagem revela poder de grupos armados que determinam assassinatos de opositores e atuam no Rio de Janeiro sobre populações pobres
Cleomar Almeida
A FAP (Fundação Astrojildo Pereira) lançou a quinta edição da revista Política Democrática online, destacando a demora das investigações em apontar os suspeitos de envolvimento nos assassinatos da vereadora Marielle Franco (PSOL-RJ) e de seu motorista, Anderson Gomes. Os crimes foram praticados em março de 2018. A publicação, produzida e editada pela FAP, também leva aos leitores sete artigos de opinião e uma charge que critica a política brasileira. O destaque da entrevista é o arcebispo de Porto Velho (RO), dom Roque Paloschi, que também é presidente do CIMI (Conselho Indigenista Missionário) e membro do Conselho Pré-sinodal para a Assembleia Especial do Sínodo para a Pan-amazônia.
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Vinculada ao PPS (Partido Popular Socialista), a FAP produz a revista, mensalmente, desde outubro de 2018. Nesta edição, o editoral recebe o título “As expectativas da base e a fronteira móvel da legalidade”. “Ficou evidente, ao longo da campanha de 2018, a incompatibilidade pontual entre o programa e as propostas do candidato vitorioso e a ordem legal vigente. O propósito genérico de ruptura radical com um sistema considerado caduco desdobrou-se em diversas áreas, em propostas concretas que conflitam não só com leis vigentes, mas também direitos consagrados na Constituição”, diz um trecho.
Na reportagem de destaque, a equipe da revista Política Democrática online denuncia a morosidade das investigações policiais sobre os assassinatos de Marielle e Anderson, que tem sido pressionadas pelas forças política, econômica e social das milícias no Rio de Janeiro. A matéria conta o drama dos familiares das vítimas e destaca a cobrança por justiça, fortalecida, em todo mundo, com o apoio da Anistia Internacional Brasil. “No momento em que vi Marielle no caixão, inerte, fiquei anestesiada pela dor”, afirma a advogada Marinete da Silva, mãe da vítima.
Na entrevista à Política Democrática online, dom Roque Paloschi aborda a Assembleia Especial do Sínodo para a Pan-Amazônia, a qual, segundo ele, foca na “realidade” de ‘direitos negados’ a índios, ribeirinhos, quilombolas e extrativistas”. O sínodo é o encontro global de bispos no Vaticano para discutir a realidade de índios, ribeirinhos e demais povos da Amazônia, políticas de desenvolvimento dos governos da região, mudanças climáticas e conflitos de terra.
Outros assuntos analisados nesta edição são: a situação do Brasil em Davos, a pauta e a eleição das mesas do Congresso, o foro privilegiado, as pequenas empresas e a produtividade, assim como o contexto dos índios e de suas terras. Todo o conteudo da revista, de acordo com o diretor da revista, André Amado, é produzido por profissionais altamente gabaritados.
Integram o conselho editorial da Política Democrática online Alberto Aggio, Caetano Araújo, Francisco Almeida, Luiz Sérgio Henriques e Maria Alice Resende de Carvalho.
Saiba mais sobre os autores – Revista Política Democrática - Quarta Edição
» André Amado
Embaixador aposentado, escritor e diretor da Revista Política Democrática.
» Marcos Sorrilha Pinheiro
Autor de Lino Galindo e os Herdeiros do Trono do Sol. Professor de História - Unesp/Franca.
» Ivan Alves Filho
Historiador, autor de livros como Memorial dos Palmares, Brasil, 500 anos em Documentos e O Historiador e o Tapeceiro. Incluir presença negra
» JCaesar
JCaesar é o pseudônimo do jornalista, sociólogo e cartunista Júlio César Cardoso de Barros. Foi chargista e cronista carnavalesco do Notícias Populares, checador de informação, gerente de produção editorial, secretário de redação e editor sênior da VEJA.
» José Augusto Lindgren-Alves
Embaixador aposentado, primeiro diretor do Departamento de Direitos Humanos e Temas Sociais do Itamaraty (1995-1966) e antigo membro do Comitê para a Eliminação da Discriminação Racial - CERD ( Nações Unidas, Genebra, 2002-2017).
» João G. Piquet Carneiro
Advogado, vice-presidente do Conselho de Desburocratização do Senado. Presidente do Instituto Helio Beltrão.
» Pedro Fernando Nery
Consultor Legislativo do Senado e autor do livro Reforma da Previdência – Por que o Brasil não pode esperar (Elsevier, 2019).
» Prof°. Babalawô Ivanir dos Santos
Pós- doutorando em História Comparada pela Universidade Federal do Rio de Janeiro (PPGHC/UFRJ). Doutor em História Comparada pela Universidade Federal do Rio de Janeiro (PPGHC/UFRJ). Pedagogo pela Notre Dame. Membro da Associação Brasileira de Pesquisadores Negros (ABPN), onde coordena a área de pesquisa Experiências Tradicionais Religiosas Espirituais e Religiosidades Africanas e Dispóricas, Racismo e Intolerância Religiosa. É pesquisador do Laboratório de História das Experiências Religiosas (LHER-UFRJ) e no Laboratório de Estudos de História Atlântica das sociedades coloniais pós coloniais (LEHA-UFRJ). Coordenador da Coordenadoria de Religiões Tradicionais Africanas, Afro-brasileiras, Racismo e Intolerância Religiosa (ERARIR/LHER/UFRJ). Conselheiro Estratégico do Centro de Articulações de População Marginalizada (CEAP). Interlocutor da Comissão de Combate à Intolerância Religiosa (CCIR). Conselheiro Consultivo do Cais do Valongo. Vice-presidente da América Latina no Conselho Internacional African traditional religious organizations, the Ancient Religion Societies of African Descendants International Council (ARSADIC), Nigéria. Humanos e Cidadania; Relações Internacionais; Religiões tradicionais da África Ocidental e Afro-brasileira.
» Sérgio C. Buarque
Economista, com mestrado em sociologia, professor aposentado da FCAP/UPE, consultor em planejamento estratégico com base em cenários e desenvolvimento regional e local, sócio da Multivisão-Planejamento Estratégico e Prospecção de Cenários e da Factta-Consultoria, Estratégia e Competitividade. Buarque também é fundador e membro do Conselho Editorial da Revista Será? – http://revistasera.ne10.uol.com.br.
Alberto Aggio: Depois das eleições, oposição democrática
Jair Bolsonaro (PSL) venceu o segundo turno das eleições presidenciais com mais de 10 milhões de votos de diferença contra Fernando Haddad (PT). Não foi uma vitória esmagadora, mas foi incontestável e, sobretudo, legítima. Em janeiro de 2019, com a alternância democrática de poder, prevista na Constituição, Bolsonaro assumirá o posto maior da República.
Na democracia, a quem vence cabe a tarefa de governar; a quem perde, fazer oposição. A vitória eleitoral de Bolsonaro não significa a imposição de uma única força política ao país, numa visão simplista de alguns de seus apoiadores, segundo a qual o vencedor “leva tudo”. Os pilares da democracia brasileira, assentados na Constituição de 1988, continuam a dar os parâmetros para a nossa convivência política e social.
Não há dúvida que essa vitória representa uma mudança política significativa na história recente do país. Fala-se do esgotamento ou do final de um período da política brasileira e do advento de uma nova fase. Superando as forças políticas que lideraram a democratização, o presidente eleito traz novamente a direita ao poder depois de décadas em que ela havia sido alijada, com o fim da ditadura militar. O resultado eleitoral em seu conjunto representou a condenação das oligarquias políticas que controlaram o poder nos últimos anos e o rechaço ao conluio entre a “coisa pública” e os interesses dos grandes grupos econômicos.
A direita que se expressa por Bolsonaro não é a mesma dos idos de 1964 e nem poderia ser. Permanece nela, é verdade, um certo ranço e uma retórica anticomunista obtusa e anacrônica face ao fato de que o fim de “comunismo histórico” carrega quase 30 anos nas costas, não havendo nenhuma sinalização do seu reaparecimento ao redor do mundo. Nessa eleição, a direita emergiu travestida de um “populismo iliberal”, seguindo a vaga planetária, além de expressar inclinações reacionárias e autoritárias. O novo presidente é um personagem, a um só tempo, pragmático e midiático – sem ser carismático –, que se utiliza mais de uma retórica instrumental de caráter pentecostal do que propriamente fascista. Tudo isso não é pouco para nos alertar quanto aos riscos que corre a democracia. Contudo, a vitória de Bolsonaro não deve ser vista como um retorno ou uma condenação antecipada do país aos “anos de chumbo”.
Na montagem do governo, com uma reforma administrativa em curso que reduz o número de Ministérios, o presidente eleito parece visar mais a composição de um quadro de referência de mudanças – no qual estão indicativos neoliberais, mas também da democracia política –, do que a emulação de um líder que prepara a instalação de um regime fascista ou de uma ditadura, mesmo que seja de forma gradual. Será certamente um governo de direita porque essencialmente apela à ordem de maneira ameaçadora e quase brutal, pensa mudanças econômicas a partir da régua neoliberal, com poucas ou nenhuma concessão de caráter social, além de ser regressivo, restritivo e anacrônico no plano cultural e ambiental, sem falarmos no plano comunicacional, até agora o mais tenebroso no seu comportamento.
Uma das tarefas essenciais da oposição democrática – que precisa ainda ser construída e articulada – é a de agir para evitar que o estilo (de um violentismo performático) e as inclinações autoritárias do presidente eleito e do seu entorno se transformem em regime político. Os atores políticos que se perfilam no campo oposicionista terão uma árdua tarefa pela frente, em particular a esquerda que terá que se reconstruir uma vez que a linguagem da antipolítica que predominou nessas eleições a atingiu profundamente em suas lideranças, ideias e valores.
Derrotado nas eleições, o PT parece não ver razões para alterar seu posicionamento, fixando-se numa posição de antagonismo irredutível. A considerar o discurso de Fernando Haddad na noite em que se deram a conhecer os resultados, o PT se mantém no interior da célebre divisão “nós versus eles” instituída pelo partido desde os governos Lula. Para o partido, a oposição a Bolsonaro deverá assumir a representação política de uma “outra nação”, aquela que lhe rendeu 46 milhões de votos, na qual a palavra-chave é a da “resistência” a uma espécie de “governo de ocupação”, na infeliz expressão do Wanderley Guilherme dos Santos. Aqui abro um parêntesis: de fato, “resistência” é uma noção cuja origem é a ocupação nazista na França e Itália, que se conformou num referente histórico para a esquerda; na luta contra a ditadura no Brasil, aqueles que haviam aderido à luta armada, ao retornarem à luta política, formularam a “narrativa” da resistência com o intuito de legitimarem essa mudança sem contudo realizarem nenhuma autocrítica; hoje, como se vê, o PT prepara uma nova artimanha, evitando rever seu passado recente com rigor e a devida autocrítica.
A perspectiva de “resistência” que o PT apresenta à oposição vive da expectativa de que o governo Bolsonaro fracasse rotundamente e, quanto mais rápido melhor. Lembra vivamente um retorno às origens e, com isso, uma vocação para o isolamento. O PT não compreende que o tempo não passou em vão, que a sociedade amadureceu e que as forças políticas já não se deixam enredar por artimanhas. Considerando os resultados eleitorais, a situação da esquerda é claramente defensiva e de recomposição. O antagonismo irredutível do PT é condenação ao isolamento.
Claro está que o PT é um ator problemático para oferecer uma estratégia de oposição democrática ao governo Bolsonaro. Além da sua leitura obtusa da nova conjuntura política, o PT ainda se vê acorrentado à miragem da libertação de Lula e das fábulas (o golpe de 2016) que contaminam sua visão a respeito do que se passou no país desde 2013. O PT não reconhece que o partido, e em particular o lulismo, são vistos hoje pela sociedade como duas expressões consagradas da corrupção que o eleitorado condenou nessas eleições. É largamente reconhecido que o principal fator que deu a vitória ao representante do PSL foi o antipetismo, sem mencionarmos os milhões de desempregados que emergiram e cresceram assustadoramente desde o governo Dilma Rousseff.
Para ser crível e não se lançar à luta de olhos vendados, os democratas devem começar por saber o que fazer diante de suas circunstâncias, com realismo e uma perspectiva generosa de futuro. (Esse artigo, finalizado em 04/11/2018, foi publicado originalmente em Política Democrática Online 2, novembro de 2018, p.18-19)
Lançamento: Revista Política Democrática nº 42, da Fundação Astrojildo Pereira
Crise geral e corrupção, até quando?
Depois de 12 anos de governos do Partido dos Trabalhadores, e de seis meses do segundo mandato da presidente Dilma Rousseff, período sob a responsabilidade direta do lulopetismo, o Brasil atravessa uma profunda crise econômica, que se agrava a cada dia, a cada semana, a cada mês. A fenômenos já estruturais, como a desindustrialização, somam-se agora a paralisia da economia e o aumento crescente do custo de vida com o retorno da inflação. Sem falar nos níveis preocupantes de desemprego, um drama que atinge em cheio vidas e projetos de vida, marcando negativamente, de modo desastroso, quem já participa do mercado de trabalho e quem se prepara para nele entrar – uma catástrofe intergeracional.
Vinculada a essa degradante situação, o país está enredado numa crise ético-política, fruto da malversação dos recursos públicos e da incapacidade administrativa, acrescida da perda de legitimidade e de autoridade política do atual governo. Pelo que se conhece dos resultados do trabalho do Ministério Público e da Polícia Federal, assim como do juiz Sergio Moro, a corrupção se estende por toda a estrutura do Estado, capturado como está por um projeto de poder populista. Tal projeto pretende se manter a qualquer preço, tendo como pilares, entre outros, a partidarização da máquina estatal, a adoção de métodos esquivos na relação com o Legislativo e a dependência dos setores mais pobres da população ao assistencialismo governamental.
A ampla e profunda crise que sacode as estruturas nacionais parece caminhar para a ingovernabilidade, o que coloca as forças políticas diante de três possíveis cenários: (a) a rejeição das contas do governo pelo Congresso Nacional com base no parecer do Tribunal de Contas da União (TCU), em decorrência das “pedaladas fiscais”; estas últimas configuram evidente descumprimento da Lei de Responsabilidade Fiscal e abrem a possibilidade de o Congresso Nacional iniciar o processo de impeachment; (b) a cassação do mandato da presidente Dilma pelo Tribunal Superior Eleitoral (TSE), que investiga a utilização de recursos desviados da Petrobras na campanha eleitoral de 2014; (c) a renúncia ao mandato por parte da presidente da República.
A realidade é tão delicada e complexa que a presidente Dilma e seu partido não hesitaram nem hesitam em degradar a relação, que deveria ser harmoniosa e ter como base a autonomia recíproca, entre os Poderes da República. Um exemplo particularmente gritante esteve no pedido da presidente de que o ministro da Justiça organizasse um obscuro encontro com o presidente do Supremo Tribunal Federal, às escondidas e em terra estrangeira, configurando um perigoso indício de estelionato, agora jurídico, para que ela não perca seu mandato.
Diante desse quadro, é mais que necessária a unidade das forças democráticas no Parlamento e na sociedade, para que a resolução da crise se paute nos marcos institucionais previstos pela Constituição, com base em decisões do TCU e/ou do TSE. Porém, antes de tudo, é necessário haver mais ação dos partidos políticos e das organizações sociais, devidamente articulados com as redes sociais e as mobilizações de rua, para que possamos mostrar nosso desejo de dar novos rumos ao Brasil.
Nossa tarefa fundamental será demonstrar a capacidade de as forças políticas democráticas envolvidas nesse processo superarem esta crise, apontando um novo caminho para o país, realizando as reformas de base (tributária, do Estado, previdenciária etc.), retomando o crescimento econômico e voltando a trilhar os caminhos da ética e da justiça social. Parte considerável dos artigos desta edição aborda, sob diferentes ângulos, esta delicada realidade.
Por: Os editores
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