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Roberto Freire: No ritmo do frevo

Como pernambucano, ao ouvir um frevo, em especial “Vassourinhas”, não consigo ficar parado. É assim desde a minha juventude, quando a música composta por Joana Batista Ramos e Mathias da Rocha já havia caído no gosto popular e era a mais tocada nos carnavais de Recife e Olinda. A canção surgiu ainda nos primeiros anos do século XX e era cantada inicialmente pelos foliões do Clube Carnavalesco Misto Vassourinhas. Ela atravessou gerações e se transformou em um dos grandes símbolos do carnaval e do frevo pernambucano, um dos mais ricos e emblemáticos patrimônios culturais e imateriais do Brasil.

Neste 9 de fevereiro, Dia do Frevo, é importante reafirmar a importância dessa forma de expressão musical, coreográfica e poética que nos encanta há mais de 100 anos. Em 2017, o frevo completa uma década de reconhecimento formal como Patrimônio Cultural. Há exatamente dez anos, foi inscrito pelo Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional (Iphan) no Livro de Registro das Formas de Expressão. Cinco anos depois, em 2012, foi declarado Patrimônio Cultural Imaterial da Humanidade pela Organização das Nações Unidas para a Educação, a Ciência e a Cultura (Unesco).

A origem do frevo remete ao final do século XIX, um momento de efervescência social, com uma série de manifestações das classes populares como forma ocupar as ruas e praças, sobretudo em Olinda e Recife. Sua consolidação se deu em meio à participação dos escravos recém-libertos, dos capoeiristas e da nova classe operária, além da rivalidade entre as diversas bandas militares e do surgimento de novos espaços urbanos. Ao fim e ao cabo, o frevo era a expressão de um protesto político e de uma crítica social em forma de música, dança e poesia. Foi, ao mesmo tempo, um símbolo de resistência em Pernambuco e uma manifestação inequívoca da diversidade cultural do Brasil.

Produto de um contexto histórico singular, essa rica manifestação artística da cultura pernambucana é uma das principais raízes da música brasileira. A partir do eclético repertório das bandas de música, que integrava vários estilos musicais, resultaram três modalidades que perduram até os dias de hoje: o frevo de rua, o frevo de bloco e o frevo-canção.

Como parte da programação pelo Dia do Frevo e pelos dez anos do reconhecimento como Patrimônio Cultural, o Ministério da Cultura (MinC) e o Iphan entregarão uma placa em homenagem ao Centro de Referência Paço do Frevo, espaço dedicado à difusão de ações, projetos e atividades de documentação, transmissão, salvaguarda e valorização dessa importante expressão musical e cultural do país. Inaugurado definitivamente em 2014, o Paço é uma iniciativa da Prefeitura do Recife, com realização da Fundação Roberto Marinho, e contou com o apoio do MinC e do Iphan por meio da lei de incentivo à cultura.

Neste dia de comemorações, é oportuno lembrar que Pernambuco é um dos estados brasileiros com a maior quantidade de manifestações culturais reconhecidas como patrimônio imaterial. Apenas para citar alguns exemplos, além do frevo, temos a Feira de Caruaru, a encenação do Cavalo-Marinho, o maracatu em seus mais variados estilos, a dança folclórica de Caboclinhos, o teatro de bonecos e fantoches popularmente conhecido como mamulengo, entre tantos outros.

Desde muito jovem, sempre brinquei o carnaval e pulei o frevo, como se dizia naquela época. Como ministro da Cultura e pernambucano, para mim é uma honra, um privilégio e um enorme prazer participar dessa série de celebrações em torno de um patrimônio cultural brasileiro que transcendeu a condição de mero ritmo musical ou carnavalesco. O frevo está enraizado em nossa cultura, em especial na memória coletiva do povo pernambucano, e representa uma mescla de gêneros musicais e artísticos que diz muito sobre a diversidade e a inventividade dos brasileiros. Reverenciar o frevo é, afinal, valorizar a cultura do Brasil. (Blog do Noblat/O Globo – 09/02/2017)

Roberto Freire é ministro da Cultura


Fonte: pps.org.br