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Revista online | Do esquecimento à depressão, sequelas da covid-19 fragilizam saúde mental

Cleomar Almeida / Revista Política Democrática online

A empresária Olívia Rosana Tavares, de 38 anos, tenta retomar sua rotina com pedidos em uma floricultura de Manaus (AM) desde que recebeu alta do hospital por causa de complicações da covid-19, em janeiro deste ano. “Mas não consigo. Por diversas vezes, já fiz confusão na anotação de pedidos e enviei flores erradas para os clientes”, lamenta.

Além de representar um alívio na luta pela vida, a saída de pacientes do hospital, muitas vezes, também é o início de uma nova guerra contra impactos severos da doença na vida de algumas pessoas que foram contaminadas e, possivelmente, tiveram o cérebro invadido pelo coronavírus.

A ideia de que o coronavírus é capaz de invadir o cérebro está apenas começando a se consolidar. Poucos pesquisadores no mundo foram capazes de analisar o tecido cerebral de pessoas que tiveram Covid. Mesmo no atendimento com a equipe de suporte, Olívia conta que enfrenta novo imbróglio.

 “É constrangedor porque nem sempre as pessoas compreendem, já que precisam do produto com urgência em casa, sem contar o prejuízo que estou tendo. Nesses casos, tenho de arcar com o retorno das peças e um novo reenvio delas”, afirmou. “Isso tem me deixado mais ansiosa, estressada e feito eu tomar mais remédio para controlar a depressão”, desabafa.

Consequências cognitivas e comportamentais da Covid-19 podem ocorrer de duas formas, segundo os pesquisadores da Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS), de Santa Catarina (UFSC), de Santa Maria (UFSM), do Ceará (UFC) e do Rio de Janeiro (UFRJ) que coordenaram o Guia de Saúde Mental Pós-Pandemia no Brasil. Foto: Flávio Dutra/JU/UFRS

Alertas

A agenda de saúde frente à pandemia engloba muitas áreas que devem ser cobertas. No entanto, a comunidade médica e a população sabem o risco de uma epidemia paralela, que dá indícios preocupantes: o aumento do sofrimento psicológico, dos sintomas psíquicos e dos transtornos mentais.

O Guia de Saúde Mental Pós-Pandemia no Brasil ressalta que a covid-19 tem sido cada vez mais reconhecida como uma doença sistêmica, que afeta muito além das vias respiratórias. O documento foi coordenado por médicos, psicólogo e educador físico de nove instituições, entre elas universidades públicas e particulares.

“Sabe-se que o vírus entra no organismo ligando-se a um receptor de entrada, o ACE2 (angiotensin-converting enzyme 2), que é encontrado no pulmão e, também, em outros órgãos, como o cérebro”, diz o documento, que faz um alerta para pacientes como a manauense Olívia.

O guia foi coordenado pelos profissionais da Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS), de Santa Catarina (UFSC), de Santa Maria (UFSM), do Ceará (UFC) e do Rio de Janeiro (UFRJ).

Também participaram do guia pesquisadores da Universidade de São Paulo (USP), Universidade Federal de São Paulo (Unifesp), da Pontifícia Universidade Católica do Rio Grande do Sul (PUCRS), do Instituto de Ensino e Pesquisa do Envelhecimento (Iepe) de Belo Horizonte e do Hospital Augusto de Oliveira Camargo (HAOC).

As consequências cognitivas e comportamentais podem ocorrer de duas formas, segundo os pesquisadores. Uma delas é por mecanismos biológicos, incluindo a invasão direta do vírus no órgão. Essa invasão ocorre a partir da cavidade nasal e rinofaringe ou ao passar pela região chamada de trato respiratório baixo, por meio do nervo vago.

Vírus transportado pelo sangue pode cruzar uma estrutura responsável por proteger o sistema nervoso central, conhecida como barreira hematoencefálica, e, então, chegar ao cérebro. Foto: Tatiana Makeeva/Sputnik

Neuroinvasão

Além disso, a chamada neuroinvasão pode ocorrer também pela corrente sanguínea. Nesse caso, de acordo com revistas científicas, o vírus transportado pelo sangue pode cruzar uma estrutura responsável por proteger o sistema nervoso central, conhecida como barreira hematoencefálica, e, então, chegar ao cérebro.

A outra ocorre por mecanismos de ativação imunológica e pode demorar mais tempo. Muitas vezes, conforme explica o guia de saúde mental, os efeitos comportamentais ocorrem apenas depois de alguns meses da infecção primária. Isso se deve a um mecanismo conhecido como priming, uma espécie de sensibilização do sistema imune.

Em linhas gerais, o priming é conhecido como um processo pelo qual uma condição antecedente ou exposição anterior potencializa a resposta do sistema imunológico a um estímulo subsequente, envolvendo uma cascata de mudanças funcionais e na morfologia celular.

Em janeiro, pesquisadores da USP publicaram um estudo segundo o qual o Sars-CoV-2 consegue entrar no cérebro humano. Imagens de altíssima resolução serviram de suporte para a análise, com ultrassom, ressonância magnética e tomografia, além de autópsia minimamente invasiva do tecido cerebral de seis pessoas que desenvolveram a forma grave da covid e foram internadas em unidade de terapia intensiva (UTI).

Cientistas, até então, acreditavam que o cérebro era afetado apenas por uma inflamação em resposta à presença do vírus no corpo. Os pesquisadores da USP, porém, verificaram que, com uma biópsia, é possível identificar o vírus nas células microgliais e endoteliais, que revestem a superfície interna dos vasos.

Imagens cerebrais de pacientes com coronavírus, de um estudo publicado em julho/2020. Alguns desenvolvem complicações neurológicas graves, incluindo danos nos nervos. Foto: Ross W. Paterson, Rachel L. Brown, et al. / Imprensa da Universidade de Oxford / via NYT

Resquícios do vírus

A análise do tecido cerebral mostrou resquícios da presença do vírus até em cérebros que, nas imagens, pareciam intactos. Por isso, reforçou-se ainda mais o alerta: mesmo que seja de forma assintomática ou leve, este é um vírus para não se ter.

Por causa das sequelas que dificultam a retomada das atividades, Olívia foi encaminhada para tratamento com equipe multiprofissional: neurologista, psiquiatra, cardiologista, psicólogo e educador físico. A ideia é unir forças para que ela consiga parar de anotar pedidos errados de sua floricultura.

“Fiquei bastante ansiosa no início, por perceber que estava anotando tudo errado ou esquecendo muito coisas básicas do dia a dia, mas agora me sinto mais aliviada e sei que vou vencer mais essa batalha aqui do lado de fora do hospital”, afirma ela. “A depressão e a ansiedade também pioraram, mas creio que vai melhorar agora com todo esse apoio profissional”,

acrescenta.


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Ansiedade e depressão se alastram em meio à pandemia

No primeiro ano da pandemia da covid-19, a prevalência global de ansiedade e depressão aumentou em 25%, de acordo com um resumo científico divulgado, neste mês, pela Organização Mundial da Saúde (OMS). O estudo destaca quem foi mais afetado e mostra o efeito da pandemia na disponibilidade de serviços de saúde mental e como isso mudou durante a emergência de saúde pública.

Preocupações com possíveis aumentos dessas condições já levaram 90% dos países pesquisados a incluir saúde mental e apoio psicossocial em seus planos de resposta à covid-19, mas permanecem grandes lacunas e preocupações.

“As informações que temos agora sobre o impacto da covid-19 na saúde mental do mundo são apenas a ponta do iceberg”, disse o diretor-geral da OMS, Tedros Adhanom Ghebreyesus. “Este é um alerta para que todos os países prestem mais atenção à saúde mental e façam um trabalho melhor no apoio à saúde mental de suas populações”, afirmou ele.

Uma das principais explicações para esse aumento é o estresse sem precedentes causado pelo isolamento social decorrente da pandemia. Ligadas a essa situação estavam as restrições à capacidade das pessoas de trabalhar, a busca de apoio dos entes queridos e o envolvimento em suas comunidades.

Solidão, medo de se infectar, sofrimento e morte de entes queridos, luto e preocupações financeiras também foram citados como estressores que levam à ansiedade e à depressão. Entre os profissionais de saúde, a exaustão tem sido um forte gatilho até para o pensamento suicida.

Entre os profissionais de saúde, a exaustão tem sido um forte gatilho até para o pensamento suicida. Foto: Breno Esaki/Agência Saúde DF

Automutilação

Baseado em uma revisão abrangente das evidências existentes sobre o impacto da covid-19 na saúde mental e nos serviços de saúde mental, o resumo também inclui estimativas do último estudo Global Burden of Disease. Além disso, mostra que a pandemia afetou a saúde mental de jovens, que correm um risco desproporcional de comportamentos suicidas e automutilação.

Também indica que as mulheres foram mais severamente impactadas do que os homens e que pessoas com condições de saúde física pré-existentes, como asma, câncer e doenças cardíacas, eram mais propensas a desenvolver sintomas de transtornos mentais.

Os dados sugerem que pessoas com transtornos mentais pré-existentes não parecem ser desproporcionalmente vulneráveis à infecção por covid-19. No entanto, quando essas pessoas são infectadas, elas são mais propensas a sofrer hospitalização, doença grave e morte em comparação com pessoas sem transtornos mentais. Pessoas com transtornos mentais mais graves, como psicoses, e jovens com transtornos mentais estão particularmente em risco.

Saiba mais sobre o autor

Cleomar Almeida é graduado em jornalismo, produziu conteúdo para Folha de S. Paulo, El País, Estadão e Revista Ensino Superior, como colaborador, além de ter sido repórter e colunista do O Popular (Goiânia). Recebeu menção honrosa do 34° Prêmio Vladimir Herzog de Anistia e Direitos Humanos e venceu prêmios de jornalismo de instituições como TRT, OAB, Detran e UFG. Atualmente, é coordenador de publicações da FAP.

** Reportagem especial produzida para publicação na Revista Política Democrática Online de março/2022 (41ª edição), produzida e editada pela Fundação Astrojildo Pereira (FAP), sediada em Brasília e vinculada ao Cidadania.

*** As ideias e opiniões expressas nos artigos publicados na Revista Política Democrática Online são de exclusiva responsabilidade dos autores, não refletindo, necessariamente, as opiniões da Revista.

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Livro de Segatto tem compromisso com defesa da democracia, diz professor

João Vitor*, da equipe FAP

O professor Ricardo Marinho afirma que o livro Cultura política e democracia, do historiador José Antônio Segatto, tem compromisso com a defesa da cultura política democrática e republicana. “Desta forma, não é um livro a passeio. Apesar de sua linguagem acessível, exige do seu leitor a disposição de adentrar nesses terrenos movediços e de soluções nada fáceis”. A avaliação dele foi publicada em artigo na revista Política Democrática online de dezembro (38ª edição).

A revista é editada pela Fundação Astrojildo Pereira (FAP), sediada em Brasília. A instituição disponibiliza, gratuitamente, em seu portal, todo o conteúdo da publicação mensal na versão flip. Marinho, do Instituto Devecchi e da Unyleya Educacional, diz que Segatto é um historiador de formação crítica sólida.

Veja a revista Política Democrática online de dezembro!

Para Segatto, conforme analisa o autor do artigo, o belo, a estética e, consequentemente, a cultura política, de sentido republicano e democrático, deram lugar a uma cultura com significado antropológico puramente descritivo, empurrando-a para a “desrepublicanização” progressiva da cultura, da política e da sociedade.

De acordo com o artigo, Segatto observa que a revolução científico-tecnológica dos séculos XX e XXI mudou as formas e os ritmos dos dias tais como acontecia anteriormente na humanidade.

Segundo Marinho, a leitura de Cultura política e democracia leva à reflexão sobre o fato de a obra ser fruto do acompanhamento da crise da cultura política e da democracia manifesta em 2013 e, por isso, mobiliza sua experiência de mais de 25 anos na busca de saídas.

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A obra, de acordo com o professor, tem 26 artigos publicados no jornal O Estado de São Paulo, escritos nas palavras de Segatto “para tentar compreender e sugerir alternativas a problemas postos pela conjuntura”.

“Bem como de outros 16 ensaios que abraçam as universidades públicas, teoria política e democrática, relações entre Estado e sociedade, partidos e eleições, organizações sindicais e relações de trabalho, esquerda e direita, as relações entre literatura e história, o papel dos intelectuais, os militares, revolução e suas desventuras, globalização entre outras questões espinhosas”, explica Marinho.

A íntegra do artigo de Ricardo José de Azevedo Marinho pode ser conferida na versão flip da revista, disponível no portal da FAP, gratuitamente.

A nova edição da revista da FAP também tem reportagem especial sobre a variante Ômicron da covid-19entrevista especial com Hussein Kalout, além de artigos sobre política, economia e cultura.

Veja lista de autores da revista Política Democrática online de dezembro!

Compõem o conselho editorial da revista o diretor-geral da FAP, sociólogo e consultor do Senado, Caetano Araújo, o jornalista e escritor Francisco Almeida e o tradutor e ensaísta Luiz Sérgio Henriques. A Política Democrática online é dirigida pelo embaixador aposentado André Amado.

*Integrante do programa de estágios da FAP, sob supervisão do jornalista e editor de conteúdo Cleomar Almeida 

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Economista da UFRN destaca importância de planejamento urbano

João Vitor*, da equipe da FAP

O professor do Departamento de Políticas Públicas da Universidade Federal do Rio Grande do Norte (UFRN) Fábio Fonseca Figueiredo diz que o objetivo principal de um bom planejamento urbano é “tornar a cidade mais equilibrada, sustentável, humanizada e agradável para todos”. A análise dele foi publicada em artigo na revista Política Democrática online de novembro (37ª edição).

A revista é produzida e editada pela Fundação Astrojildo Pereira (FAP), sediada em Brasília e que disponibiliza todo o conteúdo para o público, por meio da versão flip, gratuitamente. No artigo, o professor constata que a melhor cidade é aquela que é pensada a partir de um urbanismo para as pessoas.

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Figueiredo, que também é pesquisador da Socioeconomia do Meio Ambiente e Política Ambiental (Semapa), avalia a "cidade como forma de aglomeração humana fantástica”. “A pobreza não é só resultado do modelo socioeconômico atual, mas também do modelo socioespacial das cidades”, acrescenta.

O pesquisador lembra que no Brasil, em 2010, o último Censo, do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), apontava que 85% da população viviam nas cidades e, destes, 26%, nas cidades litorâneas. “Essas estatísticas dão a noção da complexidade de pensar o planejamento urbano, desenvolvendo-o de forma equilibrada e trazendo esse planejamento para privilegiar as pessoas", analisa Figueiredo.


O autor do artigo avalia mais estatísticas que contribuem com a emissão de gases do efeito estufa e geram resíduos sólidos. “O que acarreta problemas de mobilidade urbana, contaminação nas suas diversas formas e a segregação socioespacial”, afirma o economista. 

Para resolver esses problemas, o professor explica que conferências como Objetivos de Desenvolvimento Sustentável (ODS) e Organização das Nações Unidas (ONU) visam tornar as cidades mais sustentáveis, humanizadas, inclusivas, seguras e resilientes. 

“Tanto os ODS como a agenda urbana possuem como objetivo tornar as cidades espaços de sinergia, menos segregadas e mais sustentáveis”, explica Figueiredo.

Ele alerta que as áreas verdes proporcionam qualidade de vida pelo fato de garantir áreas destinadas ao lazer, melhorar a estética do local, possibilitar espaços de sociabilidade e humanidade e melhorar a qualidade do ar.

Para isso, é importante, segundo o economista, não permitir que o meio ambiente urbano se torne cada vez mais um meio artificial.

“Cabe à sociedade atual mudar o modelo de uma cidade antropofágica, devoradora de agenciamentos humanos e espaços naturais para uma cidade pensada a partir de um urbanismo para as pessoas”, observa.

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A íntegra do artigo de Fábio Fonseca Figueiredo pode ser conferida na versão flip da revista, disponível no portal da FAP, gratuitamente. A nova edição da revista da FAP também tem reportagem especial sobre as novas composições familiares e entrevista especial com o economista Bernard Appy, além de artigos sobre economia, cultura e política.

Compõem o conselho editorial da revista o diretor-geral da FAP, sociólogo e consultor do Senado, Caetano Araújo, o jornalista e escritor Francisco Almeida e o tradutor e ensaísta Luiz Sérgio Henriques. A Política Democrática online é dirigida pelo embaixador aposentado André Amado.

*Estagiário integrante do programa de estágios da FAP, sob supervisão do jornalista Cleomar Almeida

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Avaliação é da doutora em História e Estética do Cinema Lilia Lustosa, em artigo na revista de novembro

João Vitor*, da equipe FAP

Doutora em História e Estética do Cinema pela Universidade de Lausanne, na França, Lilia Lustosa critica a possível falta de ideias originais no meio cinematográfico mundial que, segundo ela, causa um “surto de remakes no cinema”. Ela abordou o assunto em artigo que produziu para a revista Política Democrática online de novembro (37ª edição).

As refilmagens ou remakes, na avaliação de Lilia, são “uma forma de oferecer ao público uma versão melhorada de um hit do passado, usando tecnologia de última geração”. “Um tiro aparentemente certeiro para atingir grandes bilheterias. Afinal, cinema, além de arte, é também negócio”, continua.

A revista é editada pela Fundação Astrojildo Pereira (FAP), sediada em Brasília. A instituição disponibiliza, gratuitamente, em seu portal, todo o conteúdo da publicação mensal na versão flip. Lilia também é especialista em marketing.

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A autora do artigo analisa o recente lançamento do longa Duna, dirigido por Denis Villeneuve, remake do filme homônimo já convertido em cult, realizado por David Lynch em 1984, como uma possível escassez de ideias para novos roteiros.

Contudo, ela orienta que não haja generalização, pois, conforme ressalta, em alguns casos, pode haver, de fato, razão importante para a reprodução de um sucesso do passado. “Na passagem do cinema mudo para o cinema falado muitos estúdios refizeram alguns de seus títulos no intuito de modernizá-los, já que o público à época não queria mais saber de filme mudo”, afirma.

Na avaliação da autora, o cinema está cada vez mais negócio do que arte. “Mas uma coisa não se pode negar, o tal fim capitalista às vezes pode render uma versão artística de melhor qualidade, como é o caso do novo Duna”, analisa.

A especialista faz um pedido de desculpas aos fãs de Lynch, pois, para ela, a versão de Villeneuve está bem mais interessante e bonita do que a original. “Resta agora aguardar a segunda parte do novo Duna, com previsão para outubro de 2023, para ver se de fato o remake compensa”, pondera.

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A íntegra do artigo de Lilia Lustosa pode ser conferida na versão flip da revista, disponível no portal da FAP, gratuitamente.

A nova edição da revista da FAP também tem reportagem especial sobre as novas composições familiares e entrevista especial com o economista Bernard Appy, além de artigos sobre economia, cultura e política.

Compõem o conselho editorial da revista o diretor-geral da FAP, sociólogo e consultor do Senado, Caetano Araújo, o jornalista e escritor Francisco Almeida e o tradutor e ensaísta Luiz Sérgio Henriques. A Política Democrática online é dirigida pelo embaixador aposentado André Amado.

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José Luis Oreiro lembra que a taxa Selic alcançou patamar de 2% ao ano

João Vitor*, da equipe FAP

O professor de economia da Universidade de Brasília (UnB) José Luis Oreiro alerta para as consequências da alta taxa de juros para a inflação do Brasil. “A política de juros altos é ineficaz no que se refere a manter a inflação dentro das metas definidas pelo Conselho Monetário Nacional”, afirma, em artigo na revista Política Democrática online de novembro (37ª edição).

A revista é produzida e editada pela Fundação Astrojildo Pereira (FAP), sediada em Brasília e que disponibiliza todo o conteúdo para o público, por meio da versão flip, gratuitamente. No artigo, o professor, constata que a morte do rentismo no Brasil foi uma notícia bastante exagerada.

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Oreiro diz que o Tesouro Nacional terá um gasto adicional de R$ 270 bilhões com o pagamento de juros sobre a dívida pública. Isso, segundo ele, caso a taxa Selic, básica de juros da economia, chegue a 11% ao ano.

No artigo, ele critica a “expectativa incorreta do fim do rentismo no Brasil durante a grande recessão de 2014-2016”, com a estagnação do crescimento no período 2017-2019 e a pandemia da covid-19.

“Pela primeira vez em 25 anos, a taxa Selic alcançou um patamar de 2% ao ano, o que obrigaria os ricos a aplicar sua riqueza em atividades produtivas”, afirma. Porém, ele lamenta que isso não tenha ocorrido em função do pior regime de chuvas nos últimos 90 anos no Brasil e da pandemia no mundo.

O autor do artigo afirma que a justificativa que os economistas convencionais davam para o elevado patamar da taxa Selic era a de que o regime de câmbio impedia o ajuste na conta de transações correntes do balanço de pagamentos.

De acordo com o professor, a situação exigia a entrada de capitais externos para financiar o balanço de pagamentos e a manutenção da Selic em patamares elevados para atrair a “poupança externa” necessária para “financiar” o crescimento da economia brasileira.

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A íntegra do artigo de Oreiro pode ser conferida na versão flip da revista, disponível no portal da FAP, gratuitamente. A nova edição da revista da FAP também tem reportagem especial sobre as novas composições familiares e entrevista especial com o economista Bernard Appy, além de artigos sobre economia, cultura e política.

Compõem o conselho editorial da revista o diretor-geral da FAP, sociólogo e consultor do Senado, Caetano Araújo, o jornalista e escritor Francisco Almeida e o tradutor e ensaísta Luiz Sérgio Henriques. A Política Democrática online é dirigida pelo embaixador aposentado André Amado.

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Ricardo Marinho analisa biografia de Lindolfo Hill na revista da Fundação Astrojildo Pereira

João Vitor*, da equipe FAP

Em artigo publicado na revista Política Democrática Online de novembro (37ª edição), o professor Ricardo Marinho, do Instituto Devecchi e da Unyleya Educacional, faz análise da biografia de Lindolfo Hill, escrita por seu sobrinho Alexandre Müller Hill Maestrini. “Apresenta um símbolo e exemplo daquilo que de melhor a utopia do comunismo legou ao século XXI”, afirma ele.

A revista é editada pela Fundação Astrojildo Pereira (FAP), sediada em Brasília. A instituição disponibiliza, gratuitamente, em seu portal, todo o conteúdo da publicação mensal na versão flip. Lindolfo Hill foi eleito vereador em Juiz de Fora (MG) para a legislatura 1947-1950, mas teve o mandato cassado após o Governo Eurico Gaspar Dutra encerrar as atividades do PCB.

Clique aqui e veja a revista Política Democrática online de novembro

A biografia Lindolfo Hill: um outro olhar para a esquerda, conforme observa Marinho, ressalta a história de um pedreiro que aderiu ao comunismo muito cedo e que permaneceu ligado ao movimento por toda sua vida. “Ele deve sua sobrevivência ao esforço de sua mãe e da solidariedade familiar”, diz.

Marinho afirma que a biografia é marcada por uma forte ética de convicção política e cultural, sempre submetida pelo protagonista a um código estoico e, ao mesmo tempo, por sua própria admissão tolerante.

O professor diz ser magnético e fascinante o exercício biográfico de entrelaçamento entre a narração de uma biografia de um brasileiro comunista no século XX e a história de uma grande política, abordando a reflexão organizada pela experiência pessoal e a que é gerada pelo operário da construção civil.

Marinho acentua que não se pode ignorar o fato de que o protagonista do livro é um dos maiores comunistas do século passado. “Não se pode escapar de ler sua biografia à luz do seu tempo e do nosso”, ressalta.

A biografia está dividida em prefácio, apresentação, impressões e posfácio de colaboradoras e colaboradores.

Veja lista de autores da revista Política Democrática online de novembro

A íntegra do artigo de Marinho pode ser conferida na versão flip da revista, disponível no portal da FAP, gratuitamente. A nova edição da revista da FAP também tem reportagem especial sobre as novas composições familiares, além de artigos sobre economia, cultura e política.

Compõem o conselho editorial da revista o diretor-geral da FAP, sociólogo e consultor do Senado, Caetano Araújo, o jornalista e escritor Francisco Almeida e o tradutor e ensaísta Luiz Sérgio Henriques. A Política Democrática online é dirigida pelo embaixador aposentado André Amado.

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RPD || Editorial: Balanço e perspectivas 

É difícil mensurar hoje os custos presentes e futuros da condescendência com um governo inaceitável, sob qualquer perspectiva

Resta menos de um ano para o segundo turno das eleições de 2022, e o calendário prossegue sua marcha. A perspectiva das eleições já domina o cenário político e a cada mês ocupará fatia maior das preocupações e projetos de todos os atores. 

No plano mais geral, a conjuntura no último ano do mandato presidencial parece marcada pela estabilização e relativo sucesso do pacto firmado entre o Presidente e a maioria da Câmara dos Deputados, dividida entre governistas convictos e ocasionais, radicais e Centrão. No fundo, uma barganha simples, mas eficaz: recuo no discurso e nas manifestações golpistas, contra a garantia da continuidade do mandato. Nem golpe, nem impeachment

É difícil mensurar hoje os custos presentes e futuros da condescendência com um governo inaceitável, sob qualquer perspectiva. Mas em algum momento, o ônus da reconstrução do país, em termos econômicos, institucionais, políticos e culturais, terá de ser enfrentado. 

Na perspectiva do governo, 2022 se apresenta como um ano difícil. Apesar do arrefecimento esperado da pandemia, as consequências dos trabalhos da Comissão Parlamentar de Inquérito se farão presentes. Simultaneamente, tudo aponta para o agravamento do quadro econômico, ou seja, estagnação com inflação, desemprego e pauperização da população. O vetor resultante é uma perspectiva eleitoral precária, alimentada apenas pela expectativa dos erros dos adversários. 

Para a base parlamentar do governo, a incerteza é ainda maior. Deputados federais enfrentarão uma eleição na qual os ventos da opinião pública já mudaram de direção. O viés para a direita, dominante em 2018, cedeu lugar, ao que tudo indica, à inflexão para o centro e para a esquerda. Além disso, deputados federais eleitos por um sistema eleitoral personalista perderam, com a mudança da regra, uma de suas muletas: a livre coligação entre partidos, mecanismo de distorção do sistema proporcional e de incentivo à irresponsabilidade dos mandatários. 

Finalmente, resta avaliar as possibilidades do conjunto das forças oposicionistas. A conjuntura, em abstrato, seria favorável a elas. No entanto, para dar concretude a essa vantagem é preciso discernimento e perseverança. Urge agora clareza para compreender as convergências e divergências no interior desse campo, bem como sabedoria para dar a prioridade devida aos vetores da unidade, mantendo no segundo plano as diferenças, legítimas, de projetos para o país. 

Em outras palavras, há que articular e consolidar, ao longo do ano, principalmente no período da campanha, os objetivos eleitorais específicos de cada partido e coligação com o objetivo maior e permanente de defesa do estado democrático de direito. 


RPD || Ricardo Marinho: Outros olhos para um comunista brasileiro - A biografia de Lindolfo Hill

Obra de Alexandre Müller Hill Maestrini apresenta um símbolo e exemplo daquilo que de melhor a utopia do comunismo legou ao século XXI

À memória de Raimundo Santos (1943-2020)

Ricardo José de Azevedo Marinho / RPD Online

É o próprio Lindolfo Hill (1917-1977) que, voltando de uma viagem em missão a Paris em novembro de 1945, nos fornece uma das chaves para a leitura de sua biografia do seu sobrinho-neto: “assinalar a ação internacional dos trabalhadores na nova fase de construção pacífica agora inaugurada para todos os povos no sentido do estabelecimento de forças superiores de existência democrática para a Humanidade.” Essa passagem resgatada por Alexandre Müller Hill Maestrini foi a razão de ser de Hill e é amplamente confirmada nas páginas da biografia. Não se pode ignorar o fato de que o protagonista do livro é um dos nossos maiores comunistas do século passado, e não se pode escapar de ler sua biografia à luz do seu tempo e do nosso. Magnético e fascinante é o exercício biográfico de entrelaçamento entre a narração de uma biografia de um brasileiro comunista no século XX e a história de uma grande política, entre a reflexão urdida pela experiência pessoal e aquela gerada pelo operário da construção civil, entre sua vida e seu tempo e a observação do biografo de ambos. 

A biografia está dividida em prefácio, apresentação, impressões e posfácio de colaboradoras e colaboradores. Da introdução até o último capítulo do livro, temos o sobrinho-neto, que contando com eles, perfazem vinte e oito capítulos. 

A história pessoal de Hill é, antes de tudo, a de um pedreiro que aderiu ao comunismo muito cedo e que permaneceu ligado a ele por toda sua vida. Órfão de pai com um mês de vida, de família com raízes germânica arruinada pela perda e pela crise, ele deve sua sobrevivência ao esforço de sua mãe e da solidariedade familiar. Os traços deixados por tais processos são indeléveis. Com notável coerência, Hill sempre reconheceu que o sonho comunista o acompanhou permanentemente. Diante disso, a biografia parece marcada por uma forte ética de convicção política e cultural, sempre submetida pelo protagonista a um código estoico e, ao mesmo tempo, por sua própria admissão, indulgente. 

Lindolfo Hill foi eleito vereador em Juiz de Fora (MG) para a legislatura 1947-1950, mas teve o mandato cassado após o Governo Eurico Gaspar Dutra encerrar as atividades do PCB. Foto: Arquivo pessoal

A bela biografia juiz-forana de Hill do seu sobrinho-neto, fruto de cinco anos de pesquisa, merece e certamente terá sequência, pois as lacunas que envolvem seu mandato de vereador (1947-1950) ainda estão por se fazer (idem com a do seu camarada de bancada o professor metodista Irineu Guimarães [1900-1984]), sobretudo pelo que acrescentará e atualizará a história política e cultural da cidade. Juiz de Fora, no início da década de 1930, era um local de engajamento de trabalhadores e, para Hill, o foi por meio de uma organização intitulada União Operária na “Manchester Mineira”, o que filia a cidade ao francês Alexis de Tocqueville (1805-1859), o alemão Friedrich Engels (1820-1895) e o inglês John Maynard Keynes (1883-1946). Tal engajamento no clima de violência política entre os anos de 1932 e 1937 traduz, para um jovem quase sem perspectiva, um espírito de radicalidade fundado em uma boa dose de indignação com o status quo

O sobrinho-neto se refere ao clima anticomunista vigente na década de 1950, em que todo comunista tinha que ser um "agente" de Moscou, sem trilhar o tom e reconhecer que seu tio-avô sofrerá, doravante, uma caçada até o final de sua vida. 

E o fio biográfico do sobrinho-neto deve ser compreendido com as transformações que levaram a dissolução gradual do ser comunista e a resistência do tio-avô em perceber tal processo, que, no entanto, teve uma realidade própria para ele marcante durante décadas. 

O Hill de Alexandre Müller Hill Maestrini sai pouco depois da summa biográfica de Richard J. Evans Eric Hobsbawm: uma vida na história (São Paulo: Planeta, 2021. 720 p.). A primeira apresentação pública de Lindolfo Hill: um outro olhar para a esquerda aconteceu quando o Brasil ultrapassava 590 mil mortes pelo coronavírus e ligou o nome de Hill à mobilização pela vida e sua biografia não pode ser pensada como algo indiferente aos conflitos hodiernos. Leiam o Evans e a belíssima contribuição de Alexandre Müller Hill Maestrini de que além de um digno presente póstumo a sua mãe Marilda Hill Maestrini (1943-2021), apresenta um símbolo e exemplo daquilo que de melhor a utopia do comunismo lega ao século XXI. 


Saiba mais sobre o autor
Ricardo Marinho é professor do Instituto Devecchi e da Unyleya Educacional


RPD || Lilia Lustosa: Remakes, reboots, spin-offs… Faltam ideias?

Estúdios apostam nos remakes, criando uma versão melhorada de um hit do passado com tecnologia de última geração, para atingir grandes bilheterias

Lilia Lustosa / RPD Online

O recente lançamento do blockbuster Duna, dirigido por Denis Villeneuve, remake do filme homônimo já convertido em cult, realizado por David Lynch em 1984, leva-nos a pensar se estão faltando ideias originais no meio cinematográfico mundial. Some-se a esse título todas as sequelas, prequelas, rebootsspin-offs e todos os outros tipos de continuação de histórias já contadas e que agora ganham novas cores, sons e tecnologias. Desde Pinóquio e Cinderela, passando por A Lenda de Candyman e Amor, Sublime Amor (a ser lançado em dezembro), a lista é longa! 

A primeira impressão é a de que escasseiam ideias para novos roteiros. No entanto, se olharmos para trás, veremos que não estamos vivendo nada de novo, já que Hollywood sempre foi afeita a um remake e/ou a uma franquia.Sem falar, é claro, nos tantos filmes estrangeiros que, ao fazerem sucesso em seus países de origem, ganham imediatamente uma versão norte-americana para que os espectadores dali não tenham o trabalho de ler legendas.  Só neste ano há dois bons exemplos: O Culpado, uma “cópia cuspida e escarrada” do original dinamarquês Culpa (2018); e No Ritmo do Coração, versão americana do francês A Família Bélier (2014).  Duas produções plenamente satisfatórias em suas versões originais, mas que não agradariam ao público estadounidense, segundo sugerem alguns produtores, que enxergam na refação dessas obras um sucesso praticamente garantido.  

Mas não generalizemos!  Em alguns casos, pode haver de fato uma razão importante para a reprodução de um sucesso do passado. Na passagem do cinema mudo para o cinema falado, por exemplo, muitos estúdios refizeram alguns de seus títulos no intuito de modernizá-los, agregando-lhes som, já que o público de então não queria mais saber de filme mudo. Ou ainda, em casos bem específicos, como o do brasileiro Orfeu do Carnaval, realizado primeiramente em 1959 pelo francês Marcel Camus, baseado na peça Orfeu da Conceição de Vinícius de Moraes, e depois refeito por Cacá Diegues no fim dos anos 1990. À época do lançamento do filme de Camus, os futuros cinemanovistas, jovens que se organizavam em torno de um cinema brasileiro independente e descolonizado, reprovaram a versão estereotipada da pobreza pintada pelo francês em seu filme, onde a favela aparecia como um aglomerado de casinhas coloridas, com suas vistas deslumbrantes e com uma gente sempre sorridente e dançante ocupando as cenas. Diegues nunca esqueceu esse “descalabro” e lançou seu Orfeu em 1999, com o intuito de fazer valer a obra original do poeta e diplomata brasileiro. Escolheu o cantor Toni Garrido como protagonista e fez uma versão musicada em plena Retomada do nosso cinema.

Apesar da riqueza musical (com assinatura de Caetano Veloso), o Orfeu de Diegues traz um ambiente menos festivo e mais marcado pela realidade do morro, com o tráfico de drogas e o crime organizado ganhando destaque, além de uma complexificação dos personagens, que deixam de lado o maniqueísmo da versão francesa. Não que o Orfeu de Camus fosse de todo ruim. O sucesso foi tal que o filme acabou levando a Palma de Ouro em Cannes e, no ano seguinte, o Oscar de Melhor Filme Estrangeiro. Dois prêmios que foram, no entanto, parar lá na França, país natal do diretor, deixando os brasileiros, donos do palco, do elenco e da história, de mãos vazias! 

No passo acelerado com que as tecnologias se desenvolvem atualmente, casos como o de Orfeu são, no entanto, minoria. A explicação mais provável para o novo surto de remakes é a de oferecer ao público uma versão melhorada de um hit do passado, usando tecnologia de última geração. Um tiro aparentemente certeiro para atingir grandes bilheterias. Afinal, cinema, além de arte, é também negócio. Cada vez mais negócio do que arte, sendo o “vil metal” o que mais conta em Hollywood. Ou estaria faltando mesmo criatividade para roteiristas, diretores e produtores? Ideias novas capazes de render fortunas para os cofres dos megaempresários, que, por medo do fracasso, acabam optando por mais do mesmo. 

Mas uma coisa não se pode negar, o tal fim capitalista às vezes pode render uma versão artística de melhor qualidade, como é o caso do novo Duna… Pois, que me desculpem os fãs de Lynch, mas a versão de Villeneuve, que desta feita vem dividida em partes, está bem mais interessante e bonita do que a original, que, além de muito lenta, é dona de uma estética demasiado trash para um filme de pretensões tão gradiosas. 

Resta agora aguardar a segunda parte do novo Duna, com previsão para outubro de 2023, para ver se de fato o remake compensa! 


Saiba mais sobre a autora
Lilia Lustosa, é formada em Publicidade, especialista em Marketing, mestre e doutora em História e Estética do Cinema pela Universidade de Lausanne, França.


RPD || José Luis Oreiro: O retorno do rentismo no Brasil

Tesouro Nacional terá um gasto adicional de R$ 270 bilhões com o pagamento de juros sobre a dívida pública caso a Selic chegue a 11% ao ano

José Luis Oreiro 

A eliminação da alta inflação no Brasil a partir da implementação do Plano Real durante o governo Itamar Franco teve como efeito colateral a persistência de patamares extremamente elevados para a taxa real de juros de curto-prazo, a taxa Selic. Durante o primeiro mandato do Presidente Fernando Henrique Cardoso, creditava-se essa persistência à adoção de um regime de bandas cambiais deslizantes, no qual o Banco Central do Brasil definia um “teto” e um “piso” para a taxa nominal de câmbio, definindo ex-ante o ritmo de depreciação de ambos de maneira a produzir uma desvalorização controlada da taxa de câmbio, ao mesmo tempo que se permitia que, no intervalo da banda cambial, a taxa de câmbio pudesse flutuar “livremente” com base nas condições de oferta e demanda de moeda estrangeira.  

Durante a vigência desse regime cambial, a taxa Selic real média oscilou em torno de 20% a.a, permitindo que aplicações financeiras livres de risco tivessem taxa de retorno muito superior ao que poderia ser obtido com qualquer tipo de empreendimento do lado real da economia. Nesse contexto, a justificativa que os economistas convencionais davam para o elevado patamar da taxa Selic era a de que o regime de câmbio administrado impedia o ajuste na conta de transações correntes do balanço de pagamentos – fortemente deficitária durante o primeiro mandato de FHC –, o que exigia a entrada de capitais externos para financiar o balanço de pagamentos e, dessa forma, a manutenção da Selic em patamares elevados para atrair a “poupança externa” necessária para “financiar” o crescimento da economia brasileira.  

Se esse diagnóstico fosse correto, o abandono do regime de câmbio administrado em janeiro de 1999, no início do segundo mandato de FHC, deveria ter reduzido a taxa Selic para patamares mais civilizados. Não foi isso o que ocorreu. Embora a Selic real tenha se reduzido para um valor próximo a 10% a.a no ano 2000, ela permanecerá num patamar de quase 9% a.a até o início da crise financeira internacional de 2008. Se considerarmos o período 2003-2016, a taxa Selic real média foi de 6,25% a.a, um valor 2,57 p.b superior à estimativa da taxa de juros de equilíbrio da economia brasileira, ou seja, da soma entre a taxa de juros internacional e do prêmio de risco país. Apesar do elevado patamar da taxa Selic, a análise da variação acumulada do IPCA em 12 meses no período compreendido entre janeiro de 2003 e setembro de 2017 mostra que a inflação acumulada em 12 meses permaneceu a maior parte do tempo acima do centro do regime de metas de inflação, tendo estourado o teto desse regime em diversos momentos.  

A experiência brasileira parece mostrar de maneira bastante clara que a política de juros altos é ineficaz no que se refere a manter a inflação dentro das metas definidas pelo Conselho Monetário Nacional.  

Os efeitos combinados da grande recessão de 2014-2016, com a estagnação do crescimento no período 2017-2019 e a pandemia do covid-19 fizeram com que, pela primeira vez num período de 25 anos, a taxa Selic alcançasse um patamar de 2% a.a em termos nominais no segundo semestre de 2020. Finalmente, parecia que o país por fim havia obtido a “eutanásia do rentista”, obrigando os ricos a aplicar sua riqueza em atividades produtivas.  

Contudo, essa expectativa se demonstrou incorreta. Em função de uma série de choques de oferta ocorridos no Brasil (pior regime de chuvas nos últimos 90 anos) e no resto do mundo (interrupção das cadeias mundiais de fornecimento de insumos devido ao covid-19), a inflação no Brasil e no resto do mundo começa a se acelerar a partir do início de 2021. Enquanto os Bancos Centrais dos países desenvolvidos (FED, BCE, BOE e BOJ) interpretaram a aceleração inflacionária como um fenômeno temporário num ambiente ainda marcado por elevadas taxas de desemprego, mantendo inalteradas suas taxas de juros; o BCB inicia um ciclo de elevação da Selic, levando-a ao patamar de 7,75% a.a em outubro de 2021.  

Alguns analistas argumentam que, se a Selic chegar a 11% a.a ao final do atual ciclo de “normalização da política monetária”, o Tesouro Nacional terá um gasto adicional de R$ 270 bilhões com o pagamento de juros sobre a dívida pública. Trata-se do maior programa de transferência de renda da história do Brasil, um programa no qual se transfere dinheiro de todos os contribuintes para uma pequena elite de rentistas que se situa no 1% mais rico da pirâmide de distribuição de riqueza do país. Ao que parece a morte do rentismo no Brasil foi uma notícia bastante exagerada.   


Saiba mais sobre o autor
José Luis Oreiro é professor do Departamento de Economia da Universidade de Brasília, Pesquisador Nível IB do CNPq e Lider do Grupo de Pesquisa "Macroeconomia Estruturalista do Desenvolvimento", cadastrado no CNPq. É autor do livro "Macroeconomia do Desenvolvimento: uma perspectiva Keynesiana", LTC: Rio de Janeiro (2016). E-mail: joreiro@unb.br.  


RPD || Henrique Brandão: Uma história de amor e resiliência

Maid já entrou para a lista de séries mais queridinhas da Netflix, superando O Gambito da Rainha

Henrique Brandão / RPD Online

A minissérie ‘Maid” (Empregada Doméstica), em exibição na Netflix, é um dos grandes sucessos de todos os tempos do canal de streaming. Lançada em primeiro de outubro, a produção se tornou a mais vista da plataforma, com cerca de 67 milhões de espectadores, superando, inclusive, a incensada “O Gambito da Rainha, vista por 62 milhões de pessoas e tida, até então, como a campeã de audiência entre as minisséries. 

O fenômeno mundial do canal é a série coreana “Round Six”, lançada quase ao mesmo tempo e vista, até agora, por 111 milhões de espectadores ao redor do mundo. Certamente, esse número será maior quando você estiver lendo esse artigo. Dado o estrondoso sucesso, a série, galinha dos ovos de ouro da Netflix, ganhará uma continuação. 

E aqui vale explicar a diferença entre os dois formatos: as séries, como é o caso de “Round Six”, podem ganhar continuações infindáveis, a depender, sobretudo, do sucesso comercial da produção. A última temporada de uma série deixa sempre em aberto a possibilidade de novos desdobramentos da trama (um “gancho”, como se diz no jargão técnico), que ganhará outra temporada e episódios inéditos, sucessivamente. Já a minissérie, termina no último episódio da primeira e única temporada. São relatos “fechados”. Muitas vezes narram histórias reais ou são adaptações de livros.  

É o caso de ‘Maid”, adaptado de “Maid: Hard Work, Low Pay, and a Mother's Will to Survive” (2019), livro de memórias escrito por Stephanie Land, best-seller da lista do “New York Times”. 

A minissérie narra a trajetória de Alex, jovem mãe que dá duro fazendo faxina a fim de ganhar alguns caraminguás para poder criar a filha sozinha, em meio a um ambiente hostil de violência psicológica e pouca ajuda familiar. 

São muitos os perrengues. O marido, o pai e a sogra de Alex têm ou tiveram problema com o álcool. A mãe, bipolar, vive em um mundo próprio de ilusões e que a impossibilita de atender aos apelos de ajuda da filha. Para onde se vira, Alex é obrigada a superar obstáculos que parecem fáceis de lidar, mas que se mostram muito mais complexos do que aparentam à primeira vista: o que parecia porto seguro se revela instável. A estrada da vida se converte numa espiral que a leva sempre de volta ao ponto de partida.  

Lido assim, pode até parecer enredo barato, de dramalhão mexicano, ou então de séries maniqueístas, que mostram a mocinha perseverante em luta contra o mundo cruel que a cerca. Não é o caso. Em “Maid”, o que se vê na tela são seres humanos retratados em suas nuances, com todas as suas contradições, angústias, erros e acertos.  

No marasmo das paisagens da pequena cidade em que se desenrola a trama, o passado contamina o presente e turva o horizonte. Em determinado momento, a mãe de Alex revela a falta de perspectiva dos habitantes do lugar: ela nasceu ali, sua mãe também e a avó idem. Por que partir? – questiona, diante da insistência da filha em mudar de cidade. 

Certo dia, o marido de Alex, bêbado, esmurrou a parede, quebrou objetos e esbravejou injúrias.  Na calada da noite, com a filha Maddy no colo, Alex aproveita para escapar. A violência que sofre não é física, mas deixa marcas profundas na alma. O que a leva a se livrar daquele ambiente opressor, onde só o medo prevalecia. 

Fugir foi só o começo. Desde então, mãe e filha empreendem uma cruzada que passa por dormir no chão da estação das barcas ao acolhimento provisório em um abrigo para vítimas de violência doméstica. De faxina em faxina, sujeita a humilhações e a salários miseráveis, tendo que lidar com a indiferença da burocracia, Alex apenas sobrevive. É mais uma “invisível” que o Estado ignora. O que a mantém resoluta na sua luta é o amor por Maddy. 

Com uma história real dessas, é grande a possibilidade de escorregar para o exagero, carregar nas tintas. O roteiro, no entanto, muito bem estruturado, evita o melodrama. Não há choros de esguichos, tampouco gargalhadas retumbantes. 

A brilhante interpretação de Margaret Qualley como Alex, acrescenta meios-tons à direção sóbria da minissérie. A intimidade da relação que estabelece com Rylea Nevaeh Whittet, a criança de dois anos que interpreta sua filha, é impressionante. Andy MacDowell faz o papel da mãe de Alex. Na vida real, Qualley é filha de MacDowell.  

Para quem quiser conhecer uma outra faceta de Margaret Qualeey, aqui vai a dica: ela é também bailarina. Sua performanceno comercial do perfume "Kenzo World", de 2016, dirigido por Spike Jonze, (https://www.youtube.com/watch?v=itqQS_gpNHM) é de tirar o fôlego. Ninguém diria que se trata da mesma pessoa. A moça é danada. Puro talento. 


Saiba mais sobre o autor
Henrique Brandão é jornalista e escritor


RPD || Gianluca Fiocco: Da pandemia se sai pela esquerda?

Alemanha teve eleições com resultado histórico, que favorece a causa europeísta

Gianluca Fiocco / RPD Online

A recente votação na Alemanha marcou, de alguma forma, o fim de uma era. Angela Merkel, cuja chancelaria caracterizou fortemente o cenário alemão e europeu por 16 anos, não se candidatou. Seu afastamento representou sério problema sobretudo para seu partido, o CDU, que ficou órfão de sua presença carismática e estabilizadora. Mas todo o sistema partidário, desprovido de líderes minimamente comparáveis ​​a sua estatura, sofreu com o fechamento desse ciclo. 

Podemos considerar históricos os resultados que saíram das urnas: pela primeira vez desde o pós-guerra, as duas colunas tradicionais da política alemã – a socialdemocrata e a democrata-cristã – ficaram ambas abaixo de 30%. A ligeira prevalência do SPD (25,7% dos votos) conduziu as negociações para a formação de uma coligação que está sendo chamada de "semáforo" – vermelha, amarela e verde, respectivamente, dos socialdemocratas, liberais (11,5) e do partido ecológico do Grünen (14,8). As negociações foram anunciadas, porém não são fáceis, e seu fracasso também recolocaria a CDU no jogo. 

Em todo caso, o debate antes e depois das eleições favoreceu a causa europeísta. A capacidade de Merkel de colocar a UE em novos caminhos, realçando seu perfil, foi especialmente enfatizada. Com exceção dos partidos mais extremistas (a eleição foi particularmente ruim para a esquerda do Linke, mas também para a direita ultranacionalista do AFD, que seguiu o mesmo ritmo), todos os candidatos se perfilaram para assegurar as responsabilidades alemãs na Europa e a centralidade da dimensão europeia nas grandes escolhas da Alemanha. Também a anunciada intenção de reunir no programa do futuro governo as questões sociais, as necessidades de estabilidade financeira e os objetivos da transição ecológica (com a meta de abandonar o carvão até 2030) representa um dos desafios políticos que hoje está diante de toda a Europa, como "potência civil" capaz de representar um modelo de desenvolvimento equitativo e sustentável. 

Uma das primeiras atitudes de Merkel após as eleições foi visitar Roma, onde encontrou Mario Draghi e o Papa Francisco. Foi uma iniciativa significativa já que a própria conexão Merkel-Draghi se revelou fundamental para o lançamento das políticas de auxílio do Banco Central Europeu que têm salvaguardado o euro e a solidez da UE. 

A Itália também vivenciou eleições, embora apenas em nível local. Cidades importantes como Roma e Turim estiveram envolvidas. Ao contrário da Alemanha, onde o sistema partidário mostrou sua vitalidade e o nível de participação dos cidadãos foi alto, o voto italiano mostrou um difuso descontentamento com a dimensão administrativa e rachaduras gritantes na relação entre os cidadãos e as forças políticas. Um observador autorizado como Sabino Cassese chegou à amarga conclusão de que "todos perderam. Perderam as forças políticas que tiveram de encontrar seu candidato fora delas, porque dentro delas não foram capazes de selecionar e formar uma classe dirigente. Perderam as classes políticas locais porque os eleitores nas eleições municipais diminuíram na última década mais do que o dobro em relação às últimas eleições gerais. Perderam os vencedores dos segundos-turnos porque só conseguiram o apoio de um quarto ou um quinto do eleitorado". 

Se nos anos noventa a eleição direta de prefeitos encarnou na Itália a ideia de renovação das instituições, mais próximas das necessidades das pessoas, agora parece evidenciar as dificuldades dos partidos em manter raízes efetivas na sociedade. Este é um sinal de alerta a ser levado em conta frente às futuras eleições para a renovação do Parlamento. Os dados estatísticos dos últimos anos indicam que existe um interesse pelas questões políticas em comparação com os dados de muitos parceiros europeus, mas a confiança nos mecanismos e no valor da participação na vida política tem caído. 

Os resultados da Itália premiaram claramente a centro-esquerda, ao passo que a direita (tanto a Lega, no governo, quanto Fratelli d’Italia, na oposição) sofreu duro golpe. Nestes casos, é difícil, talvez impossível, estabelecer em que medida os fatores locais ou nacionais favoreceram o êxito. Talvez não seja tão forçado dizer que fatores europeus também pesaram: a associação da direita com os chamados soberanistas (embora bastante moderados na versão italiana) não rendeu, e até se mostrou negativa, nesse momento em que o apoio da UE aparece como uma esperança de sair da crise sanitária, econômica e social desencadeada pela pandemia. Os fundos europeus extraordinários da Next Generation EU permitiram o lançamento do ambicioso “Plano Nacional de Recuperação e Retomada”, que é gerido por uma figura intimamente ligada ao plano pró-europeu, como Mario Draghi. O Partido Democrático (PD) foi visto como o defensor mais consistente desse plano, e seus candidatos se beneficiaram dele. 

A aposta europeísta expressa precisamente a forte conexão entre os votos da Alemanha e da Itália. Em ambos os países, as questões europeias têm influenciado as escolhas dos eleitores de uma forma que parece demonstrar confiança generalizada no papel que a UE vem desempenhando na segurança e no bem-estar dos seus cidadãos. Como observou o historiador Sandro Guerrieri, “a União Europeia funciona quando se encontram soluções que representam um valor agregado às políticas e linhas de conduta dos governos individuais”. O atual esforço de recuperação é um desses momentos e pode ser decisivo para uma retomada do europeísmo de cunho social e progressista. “Da pandemia se sai pela esquerda”, declarou o secretário do PD, Enrico Letta, comentando o novo equilíbrio político alemão. Se o novo chanceler for realmente uma expressão da aliança vermelho-amarelo-verde, essa perspectiva certamente ganhará impulso. 

*Tradução de Alberto Aggio


Saiba mais sobre o autor
Gianluca Fiocco é professor e pesquisador de História Contemporânea vinculado a Universidade Roma2, “Tor Vergata”. É também membro do Conselho de Direção Científica da Fundação Gramsci de Roma. Dentre as suas publicações está Togliatti, il realismo della política, Roma: Carocci, 2018.