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Revista online | Regulação das mídias digitais: o que fazer?

Marcos Cavalcanti*, professor da UFRJ e especialista em ciência das redes, especial para a revista Política Democrática online (52ª edição: fevereiro de 2023)

O melhor negócio do mundo é uma empresa de petróleo bem administrada. O segundo melhor é uma empresa de petróleo mal administrada. (John D. Rockefeller)

O mundo de Rockefeller não existe mais. Em 2022, das cinco maiores empresas do mundo, só uma é de petróleo (Saudi Aramco). As outras quatro são de tecnologia: Apple, Microsoft, Google (Alphabet) e Amazon.

Se no século passado as guerras e as disputas pelo poder eram fortemente influenciadas pelos interesses das empresas financeiras e de petróleo, hoje são as empresas de tecnologia que comandam a luta política. 

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Durante a crise financeira (subprimes) de 2008, muitos diziam que os grandes bancos e empresas envolvidas eram “muito grandes para poder falir” e que a falência destas empresas seria ainda mais traumática para o mercado. A mesma discussão ocorre agora com as grandes empresas de tecnologia. Muita gente acha que elas são “muito grandes para serem controladas”.

Veja, abaixo, galeria de fotos sobre mídias digitais:

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De fato, a receita combinada das cinco maiores empresas de tecnologia, Google (Alphabet), Apple, Microsoft, Amazon e Facebook, em 2022, que atingiu U$ 1,5 trilhões, é equivalente ao PIB brasileiro. E elas geram muito mais empregos que qualquer empresa petrolífera. Só o Google emprega o dobro de pessoas que a Petrobras, sendo que nenhuma delas faz um trabalho braçal.

O mundo do Rockfeller acabou. Contudo, as leis que nos regem ainda são do século passado. Nós, certamente, precisamos atualizá-la, mas não com um controle das redes sociais.

O presidente da República, Luiz Inácio Lula da Silva, em diversas ocasiões, manifestou-se favorável à “regulação das redes sociais”. É um equívoco.

Em primeiro lugar porque a expressão mostra um desconhecimento do tema. As “redes sociais” existem desde sempre. Os 12 profetas que saíram pelo mundo divulgando a palavra de Jesus, segundo os católicos, era uma rede social. As igrejas, os clubes de futebol e os partidos políticos são redes sociais. O que devemos discutir não é a regulação de “redes sociais”, mas das mídias digitais.

E isto não é uma questão semântica. Envolve conhecimento técnico e uma discussão sobre as liberdades individuais e a essência da Internet.

Como nos lembra Silvio Meira, “o resultado de regulamentações excessivas pode resultar em uma rede mais fechada, com menos espaço para inovação e para diversidade; deixando de lado um dos aspectos que a caracteriza: a pluralidade e seu aspecto global”. Pior, uma regulação excessiva pode levar à censura e ao surgimento de uma rede paralela, de segunda classe. Depois de experimentar a liberdade e pluralidade da rede, a sociedade não aceitaria ser controlada e ter sua liberdade limitada.

O que fazer?

Felizmente, não precisamos reinventar a roda. A comunidade europeia, depois de uma discussão de mais de três anos, acaba de aprovar uma Lei de Serviços Digitais da União Europeia – Digital Markets Act. O princípio é que nenhuma empresa pode ser “grande demais” no controle das informações geradas pelos cidadãos. Pelo contrário, são os cidadãos que devem controlar o poder destas empresas.

E este não é um problema “brasileiro”. O caminho para o respeito à liberdade e à cidadania é a criação de mecanismos globais que impeçam que dispositivos ou tentações autoritárias acabem por restringir o acesso à rede mundial. Podemos ter uma legislação mais ampla, simples e internacional que preveja que disputas que envolvam tecnologias de comunicação globais sejam julgadas em cortes internacionais.

Por fim, as questões de opinião, difamação e mesmo de notícias falsas (fake news) não são uma novidade trazida pelas mídias digitais. E, para combatê-las, já temos leis. Não precisamos criar nenhum órgão de controle. Não cabe a um governo ou a uma empresa cercear a livre expressão dos cidadãos. Aqueles que se sentirem injuriados ou lesados devem ir à Justiça para impedir a divulgação de inverdades. A regulação necessária das mídias digitais não pode ser um pretexto para aumentar o controle sobre a liberdade de expressão dos cidadãos.

Saiba mais sobre o autor

*Marcos Cavalcanti é professor titular da COPPE/UFRJ (Instituto Alberto Luiz Coimbra de Pós-Graduação e Pesquisa de Engenharia, da Universidade Federal do Rio de Janeiro) e especialista em ciência das redes, complexidade e big data estratégico.

** Artigo produzido para publicação na Revista Política Democrática Online de fevereiro de 2023 (52ª edição), editada pela Fundação Astrojildo Pereira (FAP), sediada em Brasília e vinculada ao Cidadania.

*** As ideias e opiniões expressas nos artigos publicados na Revista Política Democrática Online são de exclusiva responsabilidade dos autores, não refletindo, necessariamente, as opiniões da Revista.

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Workshop de escrita criativa da Biblioteca Salomão Malina | Arte: Washington Reis/FAP

Biblioteca Salomão Malina abre inscrições para o workshop escrita criativa

Estão abertas as inscrições para o workshop on-line de escrita criativa, que será realizado na terça feira (31/01), a partir das 19 horas. A oficina, de 25 vagas, terá como palestrante a escritora, poetisa e cronista Andressa Mikaelly dos Santos, com parceria da Biblioteca Salomão Malina, mantida pela Fundação Astrojildo Pereira (FAP), ambas em Brasília. 

O evento será transmitido no perfil da biblioteca no Facebook, assim como no canal da entidade no YouTube e no site da fundação. Andressa Mikaelly diz que escrever criativamente vai além de elaborar um texto que as pessoas julguem interessante. 

“É sair do óbvio. É mostrar o que você tem de diferente, pois não tem a ver com algo técnico, mas sim com o que parte de dentro de você”, explica. No final do evento, os participantes receberão um certificado. Para mais informações, entre em contato com a biblioteca pelo WhatsApp (61) 98401-5561.

A escritora espera que, ao final, os alunos se sintam confiantes para expressar e mostrar ao mundo, de forma livre, seus escritos. “Escrever é transcender o limite do pensamento''. Ela conta que começou a escrever para se imaginar em lugares aos quais tinha vontade de ir.

O Brasil perdeu, nos últimos quatro anos, mais de 4,6 milhões de leitores, segundo dados da pesquisa Retratos da Leitura no Brasil, que é realizada pelo Instituto Pró-Livro (IPL). O objetivo do levantamento é promover pesquisas e ações de fomento à leitura. 

Para a cronista Andressa Mikaelly, as redes sociais contribuem para que as pessoas leiam menos. “Os reels, tik tok e outras redes nos dão a oportunidade de ver as coisas resumidas, o que tira a beleza de se buscar conhecer e aprofundar”, afirma.

Ela acrescenta que, normalmente, boa parte das pessoas querem tudo para ontem. Perderam, segundo Andressa Mikaelly, a beleza de se aprofundar na leitura. As ações de ler e escrever andam juntas, segundo ela. 

Sobre a palestrante

Andressa Mikaelly tem 31 anos e está finalizando sua licenciatura em Letras na Universidade Paulista (UNIP). Publicou, em janeiro de 2022, seu primeiro livro disponível na Amazon: Textos que eu escrevi sobre você.

O livro é um compilado de frases e poesias baseados na presença, mas, principalmente, na ausência, e no que se pode fazer com a dor que invade alguém depois de uma despedida.

Ela acredita que todo escritor é um bom observador. Em Brasília, cidade onde mora, a escritora gosta de ir aos cafés para sentar e ler um bom livro. “Adoro observar a vida fora da minha 'bolha', isso rende boas histórias”, diz.

Seus livros preferidos são A desumanização, de Valter Hugo Mãe; A hora da estrela, de Clarice Lispector; e Sorria, você está sendo iluminado, de Felipe Guga. 

Conheça mais sobre a escritora aqui: https://keepo.io/andressamikaelly/

Serviço

Workshop de escrita criativa

Link de inscrição: https://forms.gle/mJsnRUmPt9VAwEYGA

Dia: 31/01/2023

Horário da transmissão: 19h

Onde: Perfil da Biblioteca Salomão Malina no Facebook e no portal da FAP e redes sociais (Facebook e Youtube) da entidade

Realização: Biblioteca Salomão Malina e Fundação Astrojildo Pereira (FAP)

Texto editado pela coordenação de publicações da Fap.


Protesto de domingo em Xangai atraiu centenas de pessoas e muitas foram presas | REUTERS

Protestos na China: jornalista da BBC é detido durante cobertura

BBC News Brasil*

A polícia chinesa espancou um jornalista da BBC em Xangai e o prendeu brevemente enquanto ele cobria protestos que varrem o país contra o lockdown imposto pelo governo por causa da covid-19

Ed Lawrence foi detido no principal protesto da cidade no domingo (27/11) por várias horas antes de ser libertado.

"É muito preocupante que um de nossos jornalistas tenha sido atacado desta forma enquanto cumpria suas funções", disse a BBC.

O governo da China disse que Lawrence não apresentou suas credenciais de imprensa.

Ele estava filmando a multidão no maior protesto do país em Xangai, na Wulumuqi Middle Road, no domingo. Imagens amplamente compartilhadas nas redes sociais mostraram vários policiais agarrando Lawrence e prendendo-o no chão.

Lawrance foi espancado e chutado por policiais e depois levado algemado.

A BBC descreveu a prisão de seu jornalista como "extremamente preocupante".

A polícia chinesa espancou um jornalista da BBC em Xangai e o prendeu brevemente enquanto ele cobria protestos que varrem o país contra o lockdown imposto pelo governo por causa da covid-19.

Ed Lawrence foi detido no principal protesto da cidade no domingo (27/11) por várias horas antes de ser libertado.

"É muito preocupante que um de nossos jornalistas tenha sido atacado desta forma enquanto cumpria suas funções", disse a BBC.

O governo da China disse que Lawrence não apresentou suas credenciais de imprensa.

Ele estava filmando a multidão no maior protesto do país em Xangai, na Wulumuqi Middle Road, no domingo. Imagens amplamente compartilhadas nas redes sociais mostraram vários policiais agarrando Lawrence e prendendo-o no chão.

Lawrance foi espancado e chutado por policiais e depois levado algemado.

A BBC descreveu a prisão de seu jornalista como "extremamente preocupante".

*Texto publicado originalmente no site BBC News Brasil


Fernando Abrucio: Alimentar o ódio é minar a nação

Democracia Política e Novo Reformismo*

A construção de nações foi uma das tarefas mais complexas da história da humanidade. O primeiro passo é estabelecer os limites territoriais dos países, algo ainda inacabado em parte do mundo, tendo muitas vezes a guerra como solução. Mas o aspecto mais complicado está na produção da identidade nacional. Constituir um povo que conviva com suas diferenças não é nada trivial. Mesmo sendo escandalosamente desigual, o Brasil conseguiu edificar uma sociedade razoavelmente tolerante, com espaços de convívio e respeito mútuo. Só que o ódio entre brasileiros tem sido alimentado cotidianamente. Isso pode afetar o destino de curto e longo prazo da nação.

O ódio social nunca foi uma bússola para construir civilizações. Nos casos mais extremos, produziu-se a barbárie. Assim foi na Alemanha nazista, com a perseguição de vários grupos sociais, especialmente os judeus, com 6 milhões de mortos. O Brasil atual está longe disso, mas o crescimento do neonazismo nas redes sociais e manifestações declaradamente nazistas em universidades e até em escolas particulares de educação básica revelam que há sementes totalitárias sendo plantadas em nossa nação.

Mas o ódio pode ter uma forma mais branda e duradoura, com divisões sociais marcadas pelo rechaço completo entre as forças políticas, transformando a atividade da política em um jogo de mágoas perpétuas. A Argentina tem trilhado essa história desde a Segunda Guerra Mundial, com períodos autoritários muito violentos e com momentos democráticos em que o diálogo tem pouco espaço entre os diferentes. O fato é que o desenvolvimento econômico e social argentino foi barrado por um grau de polarização que dificulta qualquer decisão que resulte da negociação e do respeito mútuo. Esse é o efeito Orloff que o Brasil mais deveria temer.

Nos últimos 15 anos, um novo ciclo internacional de ódio político foi constituído. Ele é a combinação do avanço de redes sociais propositadamente polarizadoras com o discurso da nova extrema direita, caracterizada pela defesa de valores tradicionais, pelo nacionalismo excludente (nem todos os integrantes da nação são legítimos) e pela crítica às instituições impulsionadas a partir do Iluminismo ocidental. Por meio desses dois elementos, construiu-se um movimento baseado na busca da destruição dos inimigos, como a mídia tradicional, os liberais globalistas, a esquerda em seus vários matizes, a ciência e os intelectuais, além de grupos sociais politicamente minoritários (mulheres, negros, LGBTQIA+ etc.), para citar os principais alvos, realizando uma hiperpolitização de todos os espaços da vida humana.

A hiperpolitização significa que nenhum espaço da vida humana pode estar alheio às ideias políticas que norteiam o grupo que se pretende dominante, ou melhor, que pretende eliminar todos os que não concordam com ele. É uma noção similar ao conceito de ideologia usado por Hannah Arendt para descrever os totalitarismos do século XX. Os filmes de Goebbels muitas vezes falavam da vida cotidiana, da higiene que a raça ariana deveria cultivar para se tornar superior. Hoje, a hiperpolitização não define apenas o que se deve fazer na seara política, mas como se comportar na esfera privada.

A política é a atividade mais nobre entre os seres humanos, como já pensavam os clássicos como Aristóteles e Maquiavel, porém, quando tudo vira política, há grandes chances de se criar uma sociedade incapaz de conversar na padaria, de tomar o mesmo ônibus, de se sentar numa mesma sala de aula, de entender que o direito de um termina quando afeta a liberdade do outro - evitar que uma pessoa doente atravesse uma estrada é matar o sentido de uma nação. Será que a Copa do Mundo nos trará a ideia de brasileiros, iguais na sua diferença, de volta?

É muito assustador quando uma sociedade começa a funcionar segundo uma divisão baseada no ódio ao outro, a quem pensa diferentemente ou tem uma origem social distinta. O clima social geral e em todas as organizações fica extremamente pesado. Haverá mais conflitos desnecessários, em algumas situações se chegará à violência, com a possibilidade da morte de um irmão ou irmã não de sangue, mas de identidade nacional. As escolas se tornarão menos suscetíveis ao aprendizado como resultado do diálogo e do compartilhamento de experiências diferentes. As empresas também sofrerão com esse processo de disseminação do ódio, provavelmente reduzindo sua produtividade, porque o sucesso organizacional depende bastante da combinação de talentos e visões de mundo diferentes.

Para exemplificar a que ponto se chegou o ódio alimentado pelo bolsonarismo, basta lembrar que o Brasil precisa do Nordeste para a construção de seu imaginário cultural e de seu sucesso econômico - experimente segregar os estados, e barreiras econômicas nascerão a seguir, perdendo-se mercado consumidor e capital humano. Os meninos da escola privada que trataram seus colegas de forma preconceituosa terão enormes dificuldades de conseguir empregos no futuro, pois as empresas estão demandando diversidade, e quem for contra isso terá menos espaço na economia do século XXI. Voltando à Copa do Mundo, tema que vai ser dominante nas próximas semanas, seria impossível ganhar qualquer um dos cinco títulos que temos se o atual modelo de ódio definisse as convocações.

Aqui vale diferenciar o conceito de pátria do sentido da palavra nação. Ficou na moda em certos círculos sociais se definir como patriota. Gostar da bandeira e do hino nacional unifica as pessoas de um país. Só que a palavra pátria tem a ver mais com o lado oficial do Estado nacional, e relaciona-se menos com o que profundamente liga as pessoas em uma determinada sociedade. A pátria pode ser evocada por ditadores, por gente que mata seus semelhantes em nome de objetivos políticos - muitos dos autoproclamados patriotas que estão nas ruas querem destruir seus inimigos, mesmo que sejam seus vizinhos que um dia os levaram ao hospital ou cuidaram de seus filhos quando estavam fora de casa.

A nacionalidade, ao contrário, vai além da estrutura institucional do poder. Ela está lá também, entretanto, sua principal característica é ser um sentimento profundo e de longo prazo de pertencimento a uma coletividade. A nação unifica sem que se produza a homogeneidade social. Em vez disso, deve garantir a unidade na diversidade, alimentando consensos e gerindo dissensos. O pertencimento a uma nação é a possibilidade de discordar e conviver, como quem torce para times diferentes, discute quem é a melhor equipe, xinga o juiz do jogo, mas ao final aceita as regras e acredita que o futebol só tem graça porque há adversários. O que seria do Corinthians sem o Palmeiras, e vice-versa?

O ódio político está minando os vínculos básicos da nação brasileira. Em termos coletivos e intertemporais, ninguém ganha com isso, a não ser grupos organizados para conquistar o poder por meio da violência política e social. O problema é que esse tipo de extremismo convenceu uma parcela relevante da sociedade brasileira que, inebriada pela hiperpolitização que parece dar respostas a todas as angústias da vida social, mobiliza-se cegamente para a destruição das bases mais amplas da coletividade, colocando em risco o seu presente e, sobretudo, o futuro de seus filhos e netos.

No curto prazo, é preciso construir espaços públicos de diálogo entre os diferentes, mostrando como é possível conviver com a divergência, negociar posições e até mudar de opinião. Claro que aqueles que cometeram crimes contra a democracia, segundo define a lei, podem ser punidos. Todavia, a maioria que está descontente com o resultado eleitoral e acredita nas teorias conspiratórias que são alimentadas pela hiperpolitização pode ser trazida de volta ao debate democrático com suas diferenças em relação ao presidente eleito.

Para isso, é preciso que as principais instituições sociais, como a mídia e a universidade, e o novo governo se guiem pela maior abertura possível para conversar e incorporar demandas de diferentes setores sociais. No caso da terceira gestão presidencial de Lula, ele terá que se vigiar constantemente para evitar o hegemonismo que por muitas vezes acomete o PT. A frente ampla é a única forma de salvar a nação da doença do ódio que cresce no país, e ela será feita de grandes decisões e de pequenos atos, como o relativo à discussão da presidência do BID, quando o petismo se esqueceu das lições recentes e atuou como no passado hegemonista.

A solução estrutural para evitar o crescimento do ódio político e social está na educação. É preciso fazer da diversidade a peça central do ensino, da creche à universidade. Há quase 30 anos formo alunos com ideias diferentes, e sempre estimulei o convívio e o aprendizado entre os divergentes. Já falhei na minha jornada pedagógica, como num episódio recente em que fui desrespeitoso com quem pensava diferentemente de mim. Talvez todos estejamos envoltos em muito ódio, quando precisamos de paciência e de empatia. Por essa razão, dedico este artigo a Danielle Klintowitz, falecida precocemente há algumas semanas. Ela foi minha orientanda e seu doutorado mostrava que uma política pública bem-sucedida depende de negociação e acordos entre os diferentes. E o que vale para ações governamentais, vale para a convivência de todas as pessoas da nossa nação.

*Fernando Abrucio, doutor em ciência política pela USP e professor da Fundação Getulio Vargas.

Texto publicado originalmente no Democracia Política e Novo Reformismo.


O presidente Jair Bolsonaro (PL) participa de cerimônia do Dia do Exército ao lado do general Villas Bôas | Foto: Gabriela Bilo /Folhapress

Villas Bôas adota tom golpista e diz que atos antidemocráticos são contra atentados à democracia

Folha UOL*

O general da reserva Eduardo Villas Bôas defendeu nesta terça-feira (15) as manifestações antidemocráticas promovidas por apoiadores do presidente Jair Bolsonaro (PL) que rejeitam a vitória eleitoral de Luiz Inácio Lula da Silva (PT).

Em publicação feita no Twitter, o militar disse que os atos são contra "atentados à democracia" e que também tratam das "dúvidas sobre o processo eleitoral", repetindo um tom golpista adotado por parte dos apoiadores de Bolsonaro.

Em 2018, quando era comandante do Exército, Villas Bôas usou as redes sociais para ameaçar o STF (Supremo Tribunal Federal) na véspera da votação de pedido para evitar a prisão de Lula. Esse episódio se tornou um marco da intromissão de militares em assuntos civis desde a redemocratização de 1985.

Apoiadores de Bolsonaro realizam manifestações em diversas cidades pedindo que as Forças Armadas impeçam a posse de Lula. Em Brasília, o ato com pedido de golpe ocorre em frente ao quartel-general do Exército. Os ministros do STF e do TSE (Tribunal Superior Eleitoral) também são alvos frequentes dos manifestantes.

Villas Bôas disse na publicação desta terça-feira (15) que esses apoiadores de Bolsonaro estão aglomerados nas portas de quartéis "pedindo socorro às Forças Armadas".

"Com incrível persistência, mas com ânimo absolutamente pacífico, pessoas de todas as idades, identificadas com o verde e o amarelo que orgulhosamente ostentam, protestam contra os atentados à democracia, à independência dos Poderes, ameaças à liberdade e as dúvidas sobre o processo eleitoral", afirmou o militar no Twitter.

O general também elogiou a fiscalização feita pelos militares no processo eleitoral. Apesar de não ter encontrado nenhum indício de fraude nas eleições, o Ministério da Defesa afirmou que não descarta a possibilidade de fraudes no pleito.

Villas Bôas disse que os comandantes da Marinha, Exército e Aeronáutica ainda demonstraram "apego aos princípios e valores militares, bem como ao texto constitucional" ao assinarem uma nota conjunta que apresenta recados indiretos ao Judiciário em meio aos protestos antidemocráticos.

"Não pode deixar de ser destacada a liderança, o equilíbrio, a serenidade e a autoridade dos atuais comandantes e do Ministro, condições com as quais asseguram a disciplina e a coesão de seus subordinados", afirmou ainda Villas Bôas nessa terça.

O general foi comandante do Exército de 2015 ao começo de 2019. Bolsonaro chegou a afirmar, em 2019, que ele foi "um dos responsáveis" pela sua chegada ao Palácio do Planalto.

Villas Bôas também ocupou cargo no governo Bolsonaro até junho de 2022, quando deixou o posto de assessor especial do ministro do Gabinete de Segurança Institucional da Presidência da República.

Na publicação desta terça, o general também disse que a imprensa tenta esconder as manifestações bolsonaristas.

"Talvez nossos jornalistas acreditem que ignorando a movimentação de milhões de pessoas elas desaparecerão", escreveu Villas Bôas. No protesto feito em Brasília nesta terça, uma equipe da rádio Jovem Pan precisou ser escoltada por soldados depois de ser hostilizada e ameaçada por bolsonaristas.

Os atos antidemocráticos em Brasília chegaram nesta terça ao 15º dia. Caravanas gratuitas de pelo menos oito cidades foram anunciadas pelas redes sociais.

As manifestações na capital federal têm contado com caminhoneiros convocados por empresários do agronegócio para permanecerem em Brasília.

Nesta sexta-feira (11), o ministro do STF Alexandre de Moraes determinou que a Polícia Federal, a Polícia Rodoviária Federal e as Polícias Militares dos estados adotem medidas imediatas para a desobstrução de vias públicas bloqueadas por manifestantes bolsonaristas em protestos antidemocráticos.

Manifestantes fazem atos antidemocráticos em frente a quartéis pelo país após derrota de Bolsonaro

Texto publicado originalmente no Folha UOL.


Meta é controladora do Facebook e Instagram — Foto: Reuters

Facebook e Instagram começam a remover publicações com pedidos de intervenção militar no Brasil, diz Meta

Anaísa Catucci*, g1

Meta, controladora do Facebook e do Instagram, diz que começou a remover publicações de usuários com pedidos de intervenção militar no Brasil.

A empresa afirma que faz o monitoramento das postagens referentes ao cenário político e que a medida faz parte das práticas de remoção que já existiam anteriormente. No entanto, não informou quantos conteúdos foram retirados do ar nas plataformas.

Desde que foi anunciado o resultado das eleições presidenciais, grupos bolsonaristas têm bloqueado rodovias por todo o Brasil para contestar a derrota de Jair Bolsonaro (PL) nas urnas e pedir intervenção federal. Apoiadores também recorrem às redes sociais para fazer posts em protesto contra a vitória de Luiz Inácio Lula da Silva (PT).

"Temos acompanhado com atenção os acontecimentos no Brasil e as conversas sobre esses eventos nas nossas plataformas, e começamos a remover pedidos para uma intervenção militar no Brasil no Facebook e Instagram”, disse um porta-voz da Meta ao g1.

Na quinta-feira (3), o presidente do Tribunal Superior Eleitoral (TSE), Alexandre de Moraes, afirmou que o resultado da urna é incontestável e que criminosos que atacam o sistema eleitoral serão responsabilizados.

“As eleições acabaram, o segundo turno acabou democraticamente no último domingo. O TSE proclamou o vencedor, o vencedor será diplomado até dia 19 de dezembro e tomará posse em 1º de janeiro de 2023. Isso é democracia, isso é alternância de poder, isso é estado republicano”, afirmou o presidente do TSE.

O ministro da Justiça, Anderson Torres, disse por meio de uma rede social que houve 37 prisões e foram aplicadas 4.216 multas a motoristas que bloquearam rodovias federais.

Texto publicado originalmente no portal g1.


O corregedor do CNJ (Conselho Nacional de Justiça), Luis Felipe Salomão/Folhapress

CNJ suspende perfis de juízes favoráveis a Bolsonaro e Lula nas redes sociais

José Marques*, Folha de São Paulo

corregedor do CNJ (Conselho Nacional de Justiça), ministro Luis Felipe Salomão, determinou a suspensão de perfis de dois magistrados nas redes sociais que manifestaram posicionamento político-partidário a favor do presidente Jair Bolsonaro (PL) e do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT), adversários na disputa ao segundo turno presidencial.

Um dos juízes, que apoiou Bolsonaro, é reincidente e já responde a um procedimento disciplinar que pode resultar em perda do cargo. Sob determinação do ministro, uma juíza que se manifestou a favor de Lula também responderá a um procedimento, como antecipou a coluna Painel.

As determinações de remoção de conteúdo, da última quarta-feira (26), são inéditas no âmbito da Corregedoria do CNJ.

Salomão ainda oficiou ao ministro Alexandre de Moraes para que os magistrados entrem em inquérito relatado por ele no STF (Supremo Tribunal Federal).

Um dos magistrados que teve os perfis no Facebook e no Twitter suspensos é o desembargador do Tribunal de Justiça do Rio de Janeiro Marcelo Buhatem, presidente de uma entidade de classe da categoria, chamada Andes (Associação Nacional de Desembargadores).

Segundo a decisão, ele compartilhava em sua lista de transmissão no WhatsApp materiais contendo fake news contra Lula, associando o ex-presidente à facção Comando Vermelho.

Também publicava em suas redes sociais, segundo Salomão, conteúdo que "em tese, violam normas proibitivas aplicáveis à magistratura nacional".

Buhatem, por meio da associação, distribuiu uma nota em que se solidarizava com a ministra do Supremo Cármen Lúcia após ela sofrer ataques do ex-deputado Roberto Jefferson (PTB), aliado do presidente Jair Bolsonaro.

No entanto, a nota acrescentava que "recentemente idênticos impropérios foram duramente lançados por uma jornalista contra uma criança, menina de 11 anos de idade, com a nítida intenção de atingir o senhor presidente da República, mas que parece não ter sofrido críticas de setores da sociedade civil, tampouco qualquer reprimenda por parte dos legitimados"

Em sua decisão, Salomão afirmou que "o conteúdo da nota está a sugerir, em princípio, que o sindicado aproveitou o lamentável episódio envolvendo a Min Carmen Lúcia –noticiado amplamente na imprensa– para enxertar, no meio do texto, manifestação de apoio ao Presidente da República, atualmente candidato à reeleição".

O segundo caso é o da juíza Rosália Sarmento, do Tribunal de Justiça do Amazonas. Na decisão, Salomão afirma que ela veiculou em suas redes sociais publicações com conteúdo político-partidário.

Um dos posts da magistrada foi dizia "vote 13 e ajude a impedir que os réus decidam se devem ser presos ou não".

O ministro afirma que ela publicou "mais de 70 mensagens com conteúdo político-partidário, chegando, em várias delas, a declarar sua intenção de voto e a conclamar seus seguidores a votar no mesmo candidato de sua preferência. Em outras tantas, profere juízos depreciativos contra o candidato adversário".

Nas duas decisões, Salomão diz que, "a manifestação de pensamento e a liberdade de expressão são direitos fundamentais constitucionais dos magistrados, dentro e fora das redes sociais", mas "não são, no entanto, direitos absolutos".

"Tais direitos devem se compatibilizar com os direitos e garantias constitucionais fundamentais dos cidadãos em um Estado de Direito, em especial com o direito de ser julgado perante um magistrado imparcial, independente e que respeite a dignidade do cargo e da Justiça."

As redes sociais já cumpriram a decisão do ministro e suspenderam os perfis das redes sociais.

Texto publicado originalmente na Folha de São Paulo.


Foto: reprodução

Fake news: entenda como funciona a fábrica de desinformação política no Brasil

Marina Pinhoni,* g1

Você sabe como as notícias falsas de política são criadas e qual caminho elas percorrem até viralizar nas redes sociais?

Um estudo realizado pelo NetLab da Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ) mostra que a campanha de desinformação no país está cada vez mais complexa e sofisticada, e conta com uma estrutura permanente de produção de conteúdo que é anterior ao período eleitoral.

"O que a gente está vendo em 2022 é bem diferente do que a gente viu em 2018, em termos de complexidade e de estratégia. É lógico que a desinformação sempre foi comum em qualquer eleição, mas com as plataformas, com as redes sociais, isso tem outra escala. Uma capacidade de segmentação", diz a coordenadora do estudo, Marie Santini.

Os pesquisadores apontam que, antes de ser disseminada para um número maior de pessoas, as fakes são testadas em grupos fechados e de nicho. A repetição da narrativa também é capaz de atingir as pessoas além das "bolhas" das redes sociais.

"A desinformação hoje funciona através de uma campanha permanente, onde você vai reduzindo a resistência das pessoas a determinadas narrativas e aumentando a resistência à checagem. A pessoa começa a ser bombardeada por diferentes fontes. Uma narrativa repetida muitas vezes tem o efeito de começar a gerar dúvida em outro público que não seria o segmento principal de uma estratégia de desinformação.”

Veja como funciona a fábrica de fake news:

Caminho das Fake News — Foto: Wagner Magalhães/g1
  1. Produção da narrativa: Os primeiros conteúdos geralmente são divulgados nos chamados sites de conteúdo duvidoso, chamados "junk news", e em vídeos do YouTube de canais com poucos seguidores.
  2. Teste de receptividade: A próxima etapa consiste em testar a aderência do discurso em grupos fechados de WhatsApp e Telegram.
  3. Bolhas e segmentos: O passo seguinte é distribuir o conteúdo em nichos por meio de grupos do Facebook e anúncios segmentados. Uma fake pode ser enviada para um grupo só de religiosos, por exemplo, e outra diferente para um grupo só com mulheres.
  4. Desinformação audiovisual: Na sequência, a informação falsa é transformada em uma peça audiovisual um pouco mais elaborada. Pode ser um vídeo curto ou mais longo, que será divulgado no InstagramTikTok e canais médios e grandes do YouTube.
  5. Campanha "Firehose": Depois que o conteúdo foi testado em diferentes contextos, começa a campanha massiva de distribuição multiplataforma. Ela é caracterizada pelo grande volume, rapidez, continuidade e repetição.

Texto publicado originalmente no portal do g1.


Sergio Moro corrupção operação Lava-jato | Foto: Marcelo Chello/Shutterstock

Nas entrelinhas: A disputa pela direção intelectual e moral da sociedade

Luiz Carlos Azedo | Nas entrelinhas | Correio Braziliense

Um dos organizadores da edição brasileira dos Cadernos do Cárcere, de Antônio Gramsci, sob a liderança de Carlos Nelson Coutinho e a participação de Luiz Sérgio Henriques (obra que acaba de ser reeditada pela Editora Civilização Brasileira), o cientista político e professor livre docente da Universidade Estadual Paulista (UNESP) Marco Aurélio Nogueira, a propósito da coluna publicada ontem, intitulada Guerra de posições, fez observações muito pertinentes sobre a disputa pela direção intelectual e moral da sociedade.

Transcrevo a seguir seus comentários sobre a disputa entre o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) e o presidente Jair Bolsonaro (PL) nesse terreno: “Você usa o conceito de direção intelectual e moral, que é utilíssimo na formulação da hegemonia. Mas acho que não está certo falar que ‘o segundo turno das eleições opõe, de um lado, o domínio político do governo Bolsonaro e, de outro, a direção intelectual e moral da sociedade protagonizada pela oposição liderada por Lula’. Você acrescenta que ‘Quem conseguir juntar domínio, pela via eleitoral, e direção, exercendo o poder, governará o país pelos próximos quatro anos’. E mais: ‘O chefe do Executivo já tem o domínio, mas perdeu a direção moral, que tenta recuperar'”.

Depois desse resumo, Nogueira comenta: “Duas coisas me vieram à mente. (1) Bolsonaro não perdeu a direção intelectual e moral: 50% dos eleitores estão com ele e o seguem justamente como ‘dirigente’. (2) Lula está disputando essa direção, mas ainda não a tem. Numa eleição, vence quem dirige, não quem domina. E o poder é uma situação típica de domínio, não necessariamente de direção. Quem exercer o poder pode dirigir também, mas desde que busque fazer isso, não automaticamente. Por isso, Gramsci fala que antes de se chegar ao poder, seria conveniente que se tratasse de conquistar a direção”.

São observações que ilustram a complexidade do cenário eleitoral, no qual Bolsonaro, neste segundo turno, estabeleceu como eixo de campanha exatamente a disputa pela “direção moral” da sociedade, com uma estratégia na qual empunha as bandeiras da ética, da família unicelular patriarcal, da fé em Deus e da liberdade individual. Com isso, conseguiu reduzir a vantagem de Lula no primeiro turno, que mantinha uma liderança folgada até às vésperas da votação.

Senso comum

Bolsonaro estruturou sua campanha em torno dessas bandeiras e organizou uma base política orgânica nas redes sociais, que tem revelado grande poder de mobilização e protagoniza a radicalização política e ideológica na sociedade desde as eleições de 2018. O uso de fake news para aumentar a rejeição de Lula e reduzir a sua própria vem sendo recorrente na campanha do presidente, mas isso não elimina, e até reforça, o fato de que ancora seus ataques ao petista no senso comum da população, que é majoritariamente conservador.

Conversando sobre isso, Nogueira chamou-me a atenção para o fato de que a campanha de Lula está focada, principalmente, na comparação dos resultados econômicos de seus dois mandatos com os de Bolsonaro, que pleiteia a reeleição. Ou seja: o petista privilegia o terreno das questões econômicas. Até agora, vem tendo sucesso ao escolher esse terreno de batalha, porém, é inegável que as ações do governo para melhorar o ambiente econômico estão influenciando os eleitores, como comprovam as pesquisas, que mostram redução da rejeição de Bolsonaro e da desaprovação de seu governo. Isso limita o peso da economia na decisão de voto.

É bom lembrar que o governo é a forma mais concentrada de poder e Bolsonaro não tem o menor pudor em utilizar a máquina federal para alavancar sua candidatura. O fato de estar no poder, ou seja, numa situação de domínio, é uma vantagem estratégica na campanha eleitoral dos que concorrem à reeleição, porque controla estruturas capazes de mudar a correlação de forças eleitorais. Mas, no caso de Bolsonaro, isso ocorre de forma sem precedentes, devido à aprovação do “estado de emergência” pelo Congresso, que possibilita a realização de gastos e outras ações governamentais em plena campanha eleitoral.

Nesse cenário, o que pode fazer a diferença é a tal capacidade de liderança intelectual e moral da sociedade. Lula chegou a exercê-la, em razão da alta rejeição de Bolsonaro, até o resultado das urnas em 2 de outubro. Já no primeiro turno, revelou dificuldades nos debates para lidar com as agendas negativas do mensalão e do petrolão. Juridicamente, a Operação Lava-Jato morreu de morte matada, mas a questão ética está vivíssima em termos eleitorais, como comprova a eleição do ex-juiz Sergio Moro ao Senado, pelo Paraná. Esse é o maior obstáculo a ser enfrentado por Lula no segundo turno contra Bolsonaro.

https://blogs.correiobraziliense.com.br/azedo/nas-entrelinhas-a-disputa-pela-direcao-intelectual-e-moral-da-sociedade/

A ministra Cármen Lúcia, do TSE, durante sessão plenária | Secom/TSE

TSE manda remover vídeos que relacionam PT a kit erótico nas escolas

UOL*

O TSE (Tribunal Superior Eleitoral) determinou a remoção de um vídeo que relacionava falsas distribuições de "kits eróticos" pelo governo do Ceará, estado governado pelo PT. A decisão é da ministra Cármen Lúcia e determina que o Twitter e o TikTok removam o conteúdo em até 24 horas.

As redes sociais vão precisar também informar os dados dos perfis que compartilharam o vídeo primeiro e que foram citados no processo movido pelo Partido dos Trabalhadores.

No vídeo, há a mensagem de que o partido estaria impondo uma cartilha sexual nas creches e escolas. O material foi gravado em 2019 e já vinha sendo usado como desinformação desde então, mas agora foi relacionado de forma direta com a campanha do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva.

No entendimento de Cármen Lúcia, o conteúdo "não tem respaldo da realidade" e é sabidamente falso. Consta que haveria, além da distribuição de material, também uma orientação sobre a pedofilia e masturbação infantil, o que nunca aconteceu não apenas no Ceará, mas em nenhum estado da federação.

No Código Penal, nos artigos 217 e 218, respectivamente, colocam que é crime o estupro de vulnerável, bem como a mediação de menor de 14 anos para satisfazer a lascívia de outrem. Já no ECA (Estatuto da Criança e do Adolescente), em seu artigo 240, impõe a ilegalidade da utilização de criança ou adolescente em cena de sexo explícito ou pornográfica, além do comércio de material pedófilo difusão de pedofilia e aliciamento de crianças.

A ministra então afirmou que a argumentação da coligação merecia acolhimento, porque "o link destacado veicula conteúdo falso e teve como objetivo atingir a imagem do Partido dos Trabalhadores e o candidato Luiz Inácio Lula da Silva ao tentar associá-los à distribuição de cartilha de conteúdo erótico, a incentivar a pedofilia e a prática de masturbação infantil", conclui a ministra.

Texto publicado originalmente no UOL.


(crédito: Reprodução/Twitter)

Ataques aos nordestinos se multiplicam nas redes sociais após 1º turno

Correio Braziliense*

A central da ONG de proteção aos Direitos Humanos Safernet Brasil recebeu cerca de 14 denúncias de xenofobia por hora na última segunda-feira. Ao todo, foram 348 registros no dia após o primeiro turno das eleições. O número quase supera o total de reclamações registrado nos primeiros seis meses do ano passado (358). No domingo, dia do pleito, foram registradas 10 denúncias.

Uma onda de ataques a nordestinos nas redes sociais se estabeleceu conforme a apuração dos votos mostrou o favoritismo de Luiz Inácio Lula da Silva (PT) nos nove estados que compõem a região. As mensagens partiam principalmente de perfis anônimos, mas que se identificam como apoiadores de Jair Bolsonaro (PL), e reduziam o Nordeste a uma imagem de pobreza e subdesenvolvimento.

Ontem, viralizou um vídeo no qual a advogada Flávia Moraes, então vice-presidente da Comissão da Mulher da OAB de Uberlândia (MG) — depois da repercussão, ela deixou o cargo —, ataca os nordestinos e diz que vivem de migalhas.

"Nós que geramos empregos, nós que pagamos impostos, vocês sabem o que a gente faz? Nós gastamos o nosso dinheiro lá no Nordeste. Não vamos fazer isso mais. Vamos gastar dinheiro com quem realmente merece. A gente não vai mais alimentar quem vive de migalhas. Vamos gastar nosso dinheiro no Sudeste, no Sul ou fora do país", disse, ao lado de duas amigas. O presidente da OAB/MG, Sérgio Leonardo, disse que vai haver processo disciplinar, cujas penas vão da advertência até a expulsão.

Comparando o primeiro semestre deste ano com o de 2021, a organização já havia observado aumento de 520,6% nas denúncias de xenofobia: pulou de 358 para 2.222 este ano.

Texto publicado originalmente no Correio Braziliense.


Em debate político a jornalista Vera Magalhães sofre agressão verbal de deputado

Nas entrelinhas: A violência contra Vera Magalhães espreita todos nós

Luiz Carlos Azedo | Nas entrelinhas | Correio Braziliense

Nossa colega Vera Magalhães, vítima de um ataque direto do presidente Jair Bolsonaro (PL) no debate dos presidenciáveis na Band e, agora, mais recentemente, de uma agressão verbal do deputado paulista Douglas Garcia (Republicanos) — que está sendo investigado pelo Ministério Público por suspeita de crime de stalking e dano emocional àquela profissional —, tornou-se uma espécie de símbolo do relacionamento oficial do atual governo com a imprensa.

Na verdade, as grosserias e agressões a jornalistas por parte de Bolsonaro e seus aliados ocorrem desde o começo do governo, tendo como cenário privilegiado o famoso cercadinho do Palácio da Alvorada, local utilizado pelo presidente para suas conversas com apoiadores e entrevistas quebra-queixo com os jornalistas credenciados na Presidência. E se reproduzem nas redes sociais.

No livro A Política como Vocação — na verdade uma palestra famosíssima, em 1918, na Universidade de Munique —, o sociólogo alemão Max Weber discorre longamente sobre as atividades dos jornalistas. Publicada um ano depois, a obra é um clássico da ciência política e referência para os estudantes de jornalismo, pois mostra que a profissão é inseparável da política.

Ao falar sobre os jornalistas, Weber dizia que somos uma espécie de “casta de párias” e, por isso, “as mais estranhas representações sobre os jornalistas e seu trabalho são, por isso, correntes”. Com razão, afirmava que a vida do jornalista é muitas vezes “marcada pela pura sorte”, sob condições que “colocam à prova constantemente a segurança interior, de um modo que muito dificilmente pode ser encontrado em outras situações”.

É o que está acontecendo com Vera Magalhães, cujo texto contundente e sempre bem contextualizado se destaca entre os analistas políticos, além do fato de que faz parte de uma geração que transitou do jornalismo impresso para a comunicação multimídia com pleno êxito. Ela se tornou uma “persona” nas redes sociais, mas sua imagem não está descolada da personalidade, do talento e da vida pessoal, pois a sua coragem e firmeza como profissional e mulher independente fazem parte do éthos da profissão que escolheu. Como se sabe, antropologicamente falando, éthos é o conjunto dos costumes e hábitos fundamentais, no âmbito do comportamento e da cultura de uma coletividade — ou seja, nossos valores, ideais e crenças.

Weber resumiu a ópera: “A experiência com frequência amarga na vida profissional talvez não seja nem mesmo o mais terrível. Precisamente no caso dos jornalistas exitosos, exigências internas particularmente difíceis lhe são apresentadas. Não é de maneira alguma uma iniquidade lidar nos salões dos poderosos da terra aparentemente no mesmo pé de igualdade (…). Espantoso não é o fato de que há muitos jornalistas humanamente disparatados ou desvalorizados, mas o fato de, apesar de tudo, precisamente essa classe encerra em si um número tão grande de homens valiosos e completamente autênticos, algo que os outsiders não suporiam facilmente”.

Àquela época, as mulheres ainda não eram a maioria na categoria, como agora, muitas das quais comandando as redações, como a diretora de Redação aqui do Correio, Ana Dubeux. Mesmo assim, essas observações são atualíssimas e servem para elas, principalmente as que estão em começo de carreira, que sofrem duplo preconceito, por serem jornalistas e mulheres.

Trabalho cercado de jovens jornalistas. Encanta-me a forma como encaram a profissão, com sede de verdade e coragem para enfrentar os desafios de uma atividade que passa por mudanças inimagináveis quando comecei minha carreira profissional, lá se vão mais de 50 anos.

Era digital

O tema da violência faz parte da vida dos jornais e do jornalismo. Não raro, os jornalistas são as vítimas, como aconteceu tantas vezes no Vietnã, no Afeganistão e, agora, na Ucrânia. Nos grotões do nosso país, ainda hoje, segundo a Associação Brasileira de Imprensa (ABI), são constantes as intimidações e os assassinatos de profissionais de imprensa.

Mas vivemos num mundo muito diferente daquele que Weber conheceu. Com a revolução digital, os meios de comunicação e os jornalistas perderam o monopólio da notícia. Ela chega pelo celular em tempo real, com imagens flagradas pelo cidadão comum — o “furo”, a notícia exclusiva no jargão das redações, nem sempre é nosso. Porém, mesmo assim, sua veracidade exige comprovação e ninguém apura as informações com mais precisão e processa as notícias com mais qualidade do que os jornalistas profissionais. A missão permanece a mesma; o contexto, os meios e as plataformas é que mudaram.

Somos diariamente desafiados a desnudar a verdade, confrontados por fake news, poderosos instrumentos de luta política, como foram os velhos panfletos apócrifos e publicações ficcionais, quase sempre contra o Estado democrático e/ou tratando os adversários como inimigos, muitas vezes jurados de morte.

Nessa guerra entre a verdade e as mentiras, os jornalistas são a infantaria da democracia, com a missão de desarmar seus inimigos. Não é uma empreitada fácil, porque o ambiente beligerante, que justifica essa analogia com a guerra, infelizmente hoje é uma triste realidade em nosso país — muito mais grave do que já era, porque há uma política oficial de promover a formação de milícias políticas, armadas até os dentes.

A propósito, a expressão monopólio da violência (gewaltmonopol des staates) foi cunhada por Weber, como atributo do Estado ocidental moderno — ou seja, o uso legítimo da força física dentro de um determinado território em defesa da sociedade. Esse poder de coerção é exercido pelo Estado por meio de seus agentes legítimos. Entretanto, para isso, é preciso um poder que os obrigue a respeitarem o contrato.

O Estado sozinho, absoluto, porém, não resolve o problema. É preciso garantir liberdade e direitos aos cidadãos. É aí que John Stuart Mill, no século XIX entra em cena em Sobre a Liberdade (1859): o Estado deve preservar a autonomia individual e, ao mesmo tempo, evitar a tirania da maioria.

Tudo é permitido ao indivíduo, desde que as suas ações não causem danos a terceiros.

https://blogs.correiobraziliense.com.br/azedo/nas-entrelinhas-a-violencia-contra-vera-magalhaes-espreita-todos-nos/