racismo no Brasil

Aqualtune, Na Angotimé e Luís Gama | (crédito: Marc Ferrez, 1885/ Domínio Público - Twitter Geek Feminist)

Consciência Negra: conheça nomes que lutaram pelo fim da escravidão no Brasil

Aline Brito*, Correio Braziliense

Neste domingo (20/11) é comemorado o Dia da Consciência Negra. A data, que surgiu como uma forma de refletir sobre o valor e contribuição da comunidade negra para o Brasil, tem o papel de jogar luz sobre a resistência do povo negro e dar maior visibilidade à busca por igualdade, por direitos, e contra o racismo. Para entender o que envolve o movimento negro da atualidade, é necessário fazer um resgate histórico e falar sobre as raízes que envolvem essa luta.

O povo negro tem uma trajetória que começou muito antes da escravização, sendo alicerçada em território africano e formada por reis, rainhas, guerreiros e guerreiras de tribos que ali viviam. No Brasil, antes da chegada dos portugueses, estudos arqueológicos mostram que os primeiros habitantes eram indígenas. A chegada dos negros em solo brasileiro se confunde com a escravidão, uma vez que eles eram traficados da África para trabalharem, de forma forçada e desumana, para o império e os poderosos coloniais.

A escravidão no país começou por volta de 1530, quando os portugueses implantaram base no Brasil e, consequentemente, surgiram demandas de mão de obra. Os primeiros escravizados foram os indígenas, mas acabaram sendo substituídos pelos negros — estima-se que cerca de 4,8 milhões de africanos foram traficados para o Brasil durante todo o período que durou a escravidão.

Desde o início, essa exploração violenta da força de trabalho foi marcada pela resistência dos negros. “Essas pessoas são apagadas da história para que seja perpetuada a história branca e todos os privilégios que ela representa na sociedade. Conhecimento é poder, imagina se a população negra, que é maioria da população, mas não em espaços de poder e decisão, começa a conhecer a verdadeira história? Com certeza terão mais reivindicações, para ocupar, cada vez mais, espaços nos quais o povo negro não chega de forma proporcional. E não chega não por falta de vontade, inteligência ou talento, e sim por causa das barreiras impostas pelo racismo estrutural”, explica Luiza Mandela, mestra em Relações Étnico-Raciais.

“Não veio do céu, nem das mãos de Isabel”

Ao longo dos mais de 300 anos de exploração dos africanos no Brasil, os escravos se organizaram, de diversas formas, para resistir à escravidão e tentar fugir das senzalas. Uma personalidade muito conhecida por lutar pela libertação do povo contra o sistema escravista é Zumbi dos Palmares, um grande exemplo da batalha travada na época.

Zumbi foi líder do Quilombo dos Palmares, uma comunidade formada por escravos negros que fugiam de fazendas, prisões e senzalas. O quilombo surgiu por volta de 1580 e, em pouco tempo, se tornou o maior do período colonial, ocupando uma área equivalente ao tamanho de Portugal e com mais de 30 mil habitantes.

Apesar do Dia da Consciência Negra ser na data que marca a morte de Zumbi, uma forma de homenagem e também de garantir que a história de resistência do povo negro não seja esquecida, antes dele outros guerreiros como Ganga Zumba, primeiro líder do Quilombo dos Palmares, foram cruciais para o percurso que resultou na abolição da escravatura. Depois dele, também tiveram outros nomes tão importantes quanto, mas que não são lembrados em livros de história ou estudados dentro de salas de aula.

“A invisibilização da história negra causa impactos na construção da identidade e da subjetividade das pessoas negras. Essas pessoas crescem não se vendo de forma positiva, acreditando que não têm uma história, se achando inferiores, incapazes. Essa narrativa, que favorece a história eurocêntrica, afeta a saúde mental da população preta. Crescemos não gostando de nós mesmos por acreditarmos que não somos potentes, não temos história, nem identidade e, com isso, somos adoecidos e precisamos recorrer a tratamentos terapêuticos, psiquiátricos. E sabemos que nem todas as pessoas negras têm acesso a esses serviços”, esclarece Mandela.

De acordo com a especialista, é necessário que a população conheça a história do povo negro, para que seja descentralizada a visão eurocêntrica do Brasil, afinal, assim como mostrou o samba-enredo da escola de samba Estação Primeira de Mangueira, campeã do carnaval carioca de 2019, a liberdade dos escravos “não veio do céu, nem das mãos das mãos de Isabel”.

“Brasil, meu nego, deixa eu te contar a história que a história não conta, o avesso do mesmo lugar. Na luta é que a gente se encontra [...] Brasil, o teu nome é Dandara e a tua cara é de cariri [...] Salve os caboclos de julho, quem foi de aço nos anos de chumbo. Brasil, chegou a vez de ouvir as Marias, Mahins, Marielles, malês ”, diz a canção Histórias Para Ninar Gente Grande.

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Em 13 de maio de 1888, a princesa imperial Isabel do Brasil assinou a Lei Áurea e decretou o fim da escravidão no Brasil. No ensino básico regular, livros de história e até no imaginário de muitos brasileiros, ela foi a “salvadora” dos escravos, mas, a verdade, é que a abolição da escravatura não foi uma benfeitoria dos regentes do país na época, e sim resultado da pressão popular e do crescimento do movimento abolicionista.

Como cantou a Mangueira na maior festa popular do Brasil, no carnaval de 2019, a “liberdade é um dragão no mar de Aracati”. Nomes como Luís Gama, Luísa Mahin, José do Patrocínio, André Rebouças, Cosme Bento, Francisco José do Nascimento, José Luis Napoleão, Quintino de Lacerda, Aqualtune, Tereza de Benguela, entre muitos outros, foram negros, escravos ou filhos de escravos que, ao longo do tempo, tiveram expressiva participação no movimento que, verdadeiramente, contribuiu para a extinção da escravidão.

“O resgate da história de Dragão do Mar, José Luís Napoleão, José do Patrocínio, Luísa Mahin, Maria Felipa entre outras personalidades é de fundamental importância para que seja trazida a narrativa da luta negra , da construção da identidade positiva das crianças negras, e respeito às diferenças e a cultura afro brasileira e africana. Romper com o epistemicídio também faz parte da luta contra o racismo” afirma a professora Luiza Mandela.

Conheça personalidades importantes na luta pela liberdade do povo negro

Aqualtune

Aqualtune
Aqualtune(foto: Marc Ferrez, 1885/ Domínio Público)

Aqualtune é uma das mais antigas líderes negras no Brasil e um dos maiores símbolos da batalha pela liberdade negra do regime escravocrata. Não se tem muitos registros que contam a história dela, nem se sabe exatamente onde nasceu e quem são seus pais, mas indícios históricos sugerem que ela teria nascido no século XVI (por volta de 1600), no Congo, na África Central, e teria uma linhagem real, sendo, possivelmente, filha de um rei do Congo.

A princesa Aqualtune foi uma guerreira africana que liderou cerca de 10 mil homens guerreiros que lutaram na Batalha de Ambuíla, contra o reino de Portugal, em 1665. O reino do Congo perdeu a guerra e, com isso, Aqualtune foi capturada e traficada para a então América Portuguesa, onde hoje fica o nordeste brasileiro.

Ao chegar no Brasil, a princesa congolesa foi escravizada e levada para uma fazenda localizada no atual estado de Alagoas, onde foi estuprada pelos donos da terra e colocada junto aos outros escravos. No local, Aqualtune ouviu falar sobre a resistência negra que estava em curso no país, liderada por quilombos, e se junto a outros negros que, mais tarde, conseguiriam fugir da fazenda onde eram explorados.

Detentora de grandes conhecimentos políticos, organizacionais e de estratégia de guerra, Aqualtune foi fundamental para a consolidação da República de Palmares. Ela se tornou líder quilombola à frente de uma das moradias do Quilombo dos Palmares, se tornando mãe de Ganga Zumba, primeiro líder desse quilombo e mãe de Sabia, que, mais tarde, daria à luz a Zumbi dos Palmares.

Portanto, Aqualtune foi avó de Zumbi e, de acordo com alguns historiadores, teria morrido em 1677, durante um incêndio provocado por invasores do Quilombo dos Palmares. Apesar de ser pouco lembrada pelos livros e escolas brasileiras — que costumam citar apenas Zumbi dos Palmares como o principal líder negro da época —, a princesa do Congo foi uma figura muito importante para a história da população negra durante o Período Colonial e passou a ser símbolo de liderança e resistência contra a opressão da comunidade negra e uma personagem importante de luta das mulheres negras.

Tereza de Benguela

Tereza de Benguela
Tereza de Benguela(foto: Domínio Público)

Assim como sugere seu nome, Tereza de Benguela teria nascido por volta de 1700, em Benguela, uma cidade em Angola, na África. Foi uma líder quilombola trazida como escrava para o Brasil e liderou o Quilombo do Piolho, localizado no atual estado do Mato Grosso.

Tereza, assim como outros inúmeros escravos do Brasil Colônia, fugiu da senzala onde era escravizada e, junto com o marido, José Piolho, se abrigou no quilombo que foi o maior de Mato Grosso. Historiadores acreditam que José tenha chefiado o Quilombo do Piolho até o início de 1750, quando foi assassinado.

Depois da morte do marido, até cerca de 1770, Tereza foi a rainha do quilombo e, sob seu comando, a comunidade negra da região resistiu à escravidão durante duas décadas. Do local, a chamada Rainha Tereza coordenou a comunidade que vivia do plantio e comandou a estrutura política e econômica do grupo. Ela também criou um sistema de defesa com armas, que contribuiu para a proteção do quilombo e resistência à escravidão.

Tereza morreu por volta de 1770. Em sua homenagem, foi criado o Dia Nacional de Tereza de Benguela, comemorado em 25 de julho. Essa mesma data é dedicada ao Dia da Mulher Afro-Latino-Americana e Caribenha. A mulher escravizada que virou rainha é um ícone da resistência negra no país e heroína do movimento de mulheres negras.

Nã Agontimé

Representação ilustrativa de como seria a aparência de Nã Agontimé
Representação ilustrativa de como seria a aparência de Nã Agontimé(foto: Reprodução/ Twitter Geek Feminist)

Nascida no reino do Daomé no século XVIII, onde hoje fica Benim, na África, Nã Agontimé foi uma rainha africana, esposa do rei Agonglo. Após a morte do marido, a estabilidade do reino ficou abalada e um de dos filhos dela, Adandozan, tomou o trono, mesmo que o próximo rei, de acordo com as vontade de Agonglo, deveria ser o filho de Agontimé, o Gakpe.

Tremendo reação negativa à traição que cometeu, Adandozan, conhecido por ser um homem cruel, vende a madrasta, Agontimé, como escrava. Depois disso, o paradeiro da rainha se perdeu, já que o novo rei ordenou aos compradores de escravos que ela fosse rebatizada, justamente para que ninguém a encontrasse.

Por falta de registros históricos, não se sabe ao certo onde Agontimé viveu no Brasil, nem por quanto tempo. O rastro da rainha ficou perdido durante anos, até que, em 1948, um pesquisador francês Pierre Fatumbi Verger descobre vestígios de que ela conseguiu uma carta de alforria e foi uma das fundadoras da Casa da Minas em São Luiz do Maranhão.

No Brasil, Agontimé foi rebatizada como Maria Jesuína e foi pioneira na disseminação da religião de matriz africana em território brasileiro. A rainha criou o culto de tradição Ewe-Fon no país, cultuado na Casa da Minas, que, em africano, carrega o nome de Querebentã de Zomadonu e significa “Casa grande de Zomadonu”, em referência ao vodun protetor de Maria Jesuína.

Assim, o Maranhão é o único lugar das Américas onde se encontraram cultos às divindades ancestrais da realeza do Daomé, lugar onde nasceu Agontimé. Além disso, a Casa da Minas é o primeiro templo de tambor do Maranhão e serviu de modelo para a instalação de outras no Norte e Nordeste do Brasil, bem como para a implementação de outros centros de religião africana em todo território brasileiro.

Cosme Bento

Representação ilustrativa de Cosme Bento
Representação ilustrativa de Cosme Bento(foto: Reprodução/Google)

Negro Cosme, como ficou conhecido o líder quilombola Cosme Bento, liderou uma das maiores revoltas de escravos do Maranhão, a Balaiada. Nascido escravo entre 1800 e 1802, em Sobral, no Ceará, onde conseguiu alforria.

Em 1830, pouco depois de chegar ao Maranhão, foi preso por assassinato e, em 1833, conseguiu fugir da cadeira. A partir de então, passou a promover uma vasta rebelião de negros em vários pontos de trabalho escravo da região. Para não ser pego, Negro Comes se encondia em diversos quilombos e ajudava escravos a se libertarem da opressão de seus esploradores.

Negro Cosme também foi responsável por criar o maior quilombo da história do Maranhão, a fazenda Tocanguira, localizada no município de Itapecuru-Mirim, interior do estado. No local, oferecia auxílio a todos que apoiavam a luta contra o escravismo e ficou conhecido como defensor da liberdade.

O objetivo dele era criar uma outra visão de liberdade e igualdade entre os homens, buscando a insurreição contra à escravatura, em favor da liberdade. Ele foi mais que um líder entre os balaios, sendo considerado o chefe da revolta negra maranhense.

Luísa Mahin

Ilustração de Luísa Mahin
Ilustração de Luísa Mahin(foto: Reprodução/Wikipédia)

Uma das principais responsáveis por todas as revoltas de escravos na Bahia. Luísa Mahin nasceu, provavelmente, em 1812, em Costa da Mina, na África, e foi traficada como escrava para o Brasil.

Ela comprou alforria e se tornou quituteira em Salvador, onde teve um filho, o abolicionista Luis Gama. Luísa esteve envolvida na articulação de todas as revoltas e levantes de escravos que sacudiram a então Província da Bahia nas primeiras décadas do século XIX.

Luisa ajudava com a distribuição de mensagens codificadas, em árabe, por meio dos meninos que fingiam comprar seus quitutes. Essas mensagens continham informações relevantes para a resistência dos escravos e os movimentos que contribuiam para a libertação deles. Desse modo, esteve envolvida na Revolta dos Malês e na Sabinada.

A ex-escrava transformou sua casa no quartel general das revoltas de escravos e, caso o levante dos malês tivesse sido vitorioso, Luísa teria sido reconhecida como Rainha da Bahia.

Luís Gama

Luís Gama
Luís Gama(foto: Reprodução/Domínio Público)

Filho de Luísa Mahin, Luís Gama foi um dos principais nomes do movimento abolicionista no Brasil. Nasceu em 1830, em Salvador, e mesmo sendo filho de pai branco e mãe negra liberta, foi feito escravo aos 10 anos de idade.

Permaneceu analfabeto até os 17 anos, quando passou a estudar e, mais tarde, conquistou na justiça a própria liberdade. Depois disso, passou a advogar em defesa dos escravos e, aos 29 anos, já era considerado o maior abolicionista do Brasil e o único a ter sido feito escravo.

Toda a vida de Luís Gama foi pautada pela abolição da escravatura e fim da monarquia no Brasil. Ele escreveu também artigos para jornais da época, sempre sobre assuntos sociorraciais do Brasil Imperial.

Além de ajudar escravos libertos a conseguirem empregos e defender judicialmente escravos acusados de crimes, a principal atuação de Gama em prol da abolição da escravatura foi nos tribunais. Em 1880, em uma carta autobiográfica enviada ao amigo Lúcio de Mendonça, o abolicionista revela que já havia libertado do cativeiro mais de 500 escravos.

Gama também é conhecido pela maior ação coletiva de libertação de escravizados conhecida nas Américas, quando conseguiu a liberdade de 217 escravos. É dele a célebre frase “o escravo que mata o senhor, seja em que circunstância for, mata sempre em legítima defesa”, proclamada durante um júri.

André Rebouças

André Rebouças
André Rebouças(foto: Reprodução/Domínio Público)

André Rebouças foi um engenheiro, inventor e abolicionista brasileiro. Ele é considerado um dos mais importantes articuladores do movimento abolicionista e trabalhou pelo desenvolvimento de territórios africanos.

Nascido 50 anos antes da abolição da escravatura, em 1838, ele era filho de mãe escrava e um alfaiate português. Diferente de muitos negros de sua época, Rebouças teve a oportunidade de estudar desde muito jovem e ingressou na Escola Militar do Rio de Janeiro, onde se tornou 2º tenente.

Ao lado de nomes importantes na história do Brasil, como Machado de Assis, o engenheiro foi um dos representantes da pequena classe média negra em ascensão no Segundo Reinado. Ele ajudou a criar a Sociedade Brasileira Contra a Escravidão, e participou também da Confederação Abolicionista.

André trabalhou também ao lado de Luís Gama no movimento em busca da liberdade da comunidade negra. Com os movimentos abolicionistas crescendo, pela atuação de nomes como Rebouças e Gama, e a pressão social contra o Império cada vez mais forte, em 1888 a escravidão é extinta no Brasil, sendo o último país das Américas a acabar com a exploração do povo negro.

Quintino de Lacerda

Quintino de Lacerda
Quintino de Lacerda(foto: Reprodução/Prefeitura de Santos)

Ex-escravo, Quintino de Lacerda se tornou um herói abolicionista. Ele foi líder do Quilombo do Jabaquara, em São Paulo, além de ter se tornado o primeiro vereador negro do Brasil e receber a patente de Major honorário do Exército Nacional.

Lacerda foi o primeiro líder político negra de Santos, no litoral paulistano, considerado o mais atuante fomentador da abolição na região e participou ativamente de grandes eventos nacionais, como a Revolta Armada e o processo de desestruturação do sistema escravista no Brasil.

O político nasceu escravo, em 1855, em Sergipe, e se afeiçoou à família para a qual foi vendido e da qual herdou o sobrenome. Depois de oito anos de serviço, ele conquistou a carta de alforria e se juntou ao movimento contra a escravidão, se tornando, nas duas últimas décadas do século XIX no Brasil, uma figura central nos movimentos sociais e debates políticos.

Além de lutar pela extinção do sistema escravista, após a promulgação da Lei Áurea, Quintino, enquanto capitão do Exército, organizou um batalhão com o objetivo de derrubar o trono brasileiro. Sendo assim, o abolicionista foi também uma figura importante para a proclamação da República.

Francisco José do Nascimento

“Liberdade é um dragão no mar de Aracati”, assim é retratado Francisco José do Nascimento no samba-enredo da Mangueira, em 2019. Conhecido como Dragão do Mar, o líder jangadeiro nasceu em 1839, em Aracati, município do Ceará.

Antiescravista, o Dragão do Mar teve participação ativa no Movimento Abolicionista no Ceará, que foi o primeiro estado brasileiro a abolir a escravidão e, por isso, ficou conhecido como Terra da Luz.

Desde 2017 reconhecido, oficialmente, como Herói da Pátria, o líder se juntou à luta contra a escravidão em 1881 quando se recusou a transpostar escravos para os navios negreiros que saíam do litoral cearense com o objetivo de vender essas pessoas no Rio de Janeiro. Esse movimento foi chamado de Greve dos Jangadeiros e resultou na abolição da escravatura no Ceará, sendo também decisivo para que a liberdade do povo negro fosse implantada no Brasil por meio da Lei Áurea.

Em 1884, Dragão do Mar foi homenageado na capa da Revista Illustrada, importante periódico abolicionista da época. “À testa dos jangadeiros cearenses, Nascimento impede o tráfico dos escravos da província do Ceará vendidos para o sul”, noticiou a revista.

Francisco José do Nascimento é, até os dias atuais, símbolo da resistência popular cearense contra a escravidão. Ele também foi homenageado pelo governo do Ceará, com seu nome dado ao Centro Dragão do Mar de Arte e Cultura, pelo que ele e os outros jangadeiros realizaram em nome da liberdade da comunidade negra.

José do Patrocínio

José do Patrocínio
José do Patrocínio(foto: Reprodução/Domínio Público)

Outra figura importante nos momentos decisivos do movimento abolicionista, que conquistou o fim da escravidão. José do Patrocínio foi um farmacêutico, jornalista, escritor, orador e ativista político brasileiro.

Em 1879, iniciou a campanha pela abolição da escravatura no Brasil e entrou para a Associação Central Emancipadora. Em em 1880, juntamente com Joaquim Nabuco, fundou a Sociedade Brasileira Contra a Escravidão. Além disso, ele teve uma forte atuação como jornalista com artigos contra a escravidão em periódicos da época, Patrocínio também preparou e auxiliou a fuga de escravos e coordenou campanhas de angariação de fundos para adquirir alforrias, com a promoção de espetáculos ao vivo, comícios em teatros, manifestações em praça pública.

Patrocínio também participou da Maçonaria, atuando no processo de emancipação do trabalho escravo, defendendo o fim da escravidão a partir de discussões no Parlamento, de debates entre a elite branca e da defesa de uma abolição da escravatura, por intermédio da Sociedade Brasileira contra a Escravidão.

Os guerreiros e guerreiras da atualidade

134 anos depois da Lei Áurea e da árdua história dos negros em busca da própria emancipação, o Brasil ainda vive um desafio. Muito por conta da invisibilização histórica da comunidade negra no processo de abolição da escravatura, o povo negro ainda é muito associado à escravidão e vítima de um racismo estrutural.

“São muitos anos com essa associação da negritude à escravidão, mas outras histórias já estão sendo contadas. Para avançarmos precisamos estudar, para conhecermos mais a verdadeira história do povo negro, que não começou na escravidão”, destaca Luiza Mandela, mestra em Relações Étnico-Raciais.

Assim como antes de 1888 ou durante os anos seguinte à abolição, os negros lutaram e seguem lutando por direitos, igualdade e para que a história de resistência dos cerca de 500 anos desde a chegada dos primeiros negros africanos no Brasil não seja apagada. “Essas personalidades que resistiram e lutaram contra a escravidão pavimentaram o chão para que pudéssemos estar aqui vivos e resistindo, apesar de, infelizmente, o negro ainda ser o que mais morre diariamente no Brasil, sendo um a cada 23 minutos”, lamentou Mandela.

O movimento negro segue contando com nomes importantes e que são essenciais para toda e qualquer conquista dessa comunidade. Afinal, desde que o Brasil é Brasil, os direitos da população negra foram adquiridos a partir da luta travada com as próprias mãos.

Podemos destacar na história mais recente personalidades como Ruth de Souza, atriz e a primeira grande referência para artistas negros na televisão; Antonieta de Barros, jornalista, uma das primeiras mulheres eleitas no Brasil e a primeira negra brasileira a assumir um mandato popular; Conceição Evaristo, escritora e uma das mais influentes literatas do movimento pós-modernista no Brasil; Katiuscia Ribeiro, filósofa e um dos principais nomes da atualidade responsáveis por disseminar o conhecimento acerca da ancestralidade; e Abdias do Nascimento, ator e um dos maiores expoentes da cultura negra e dos direitos humanos no Brasil, tendo recebido o Nobel da Paz em 2010.

“Eu destaco nomes importantes que me inspiram a continuar no caminho da luta contra o racismo, como Christina Ramos (minha mãe e militante do Movimento Negro), Nilma Lino Gomes, Conceição Evaristo, Joana Oscar, Ricardo Jaheem, Bárbara Carine, Roberto Borges, Jurema Werneck, entre tantos outros nomes fundamentais, que precisamos conhecer”, destaca a mestra em Relações Étnico-Raciais.

Por mais que, ao longo dos anos, o povo negro tenha conseguido alguns avanços, como as Cotas Raciais, as leis Afonso Arinos e Caó, que proíbem a discriminação racial e tipificam o crime de racismo, ou a Lei 11645/08, que torna obrigatório o ensino da história e cultura afrobrasileira e africana em todas as escolas públicas e particulares do ensino fundamental até o ensino médio, ainda há muito o que progredir.

Para isso, Luíza Mandela ressalta que é importante garantir que essas leis sejam aplicadas, principalmente a que determina o ensino da cultura afro nas escolas, “para que a história de resistência, potência e beleza da população negra e indígena seja contada nas escolas, universidades, imprensa e em todos os espaços”. “Mas, para isso, precisamos ter letramento racial e estudar para sairmos da visão eurocêntrica e reducionista que nos foi ensinada”, conclui.

*Texto publicado originalmente no Correio Braziliense


Militantes do Movimento Negro fazem ato na Praça dos Três Poderes em defesa dos negros e contra a violência racial no Brasil. (Foto: Pedro Ladeira/Folhapress, PODER)

Evangélicos negros dizem em manifesto que Bolsonaro usa fé para racismo

Folha de São Paulo*

Organizações negras evangélicas publicam nesta sexta-feira (28) o Manifesto Negro Protestante Brasileiro, com demandas do movimento. São 14 entidades, de 13 estados diferentes

Aos governantes, as entidades denunciam o extermínio e encarceramento da juventude negra, "intencionalmente promovida por parte do braço armado do Estado brasileiro".

Defendem a garantia da saúde da população negra e destacam que os problemas da pauta socioeconômica do Brasil, tais como queda do poder aquisitivo, crescimento do número de pessoas em situação de rua e o aumento da fome, são minimizados pelo governo do presidente Jair Bolsonaro (PL).

Denunciam ainda o racismo ambiental, cometido contra os povos originários, população ribeirinha, quilombolas, sendo a população negra a maioria desses contingentes.

As organizações afirmam ainda que a fé cristã foi usada pelo atual governo para justificar racismo, machismo e LGBTfobia e sustentam que a bancada evangélica no Congresso cometeu perjúrio e espalhou mentiras em nome de Deus. Criticam também a herança escravocrata existente ainda nas igrejas e o silêncio dos púlpitos em relação ao racismo.

Pedem também o reconhecimento da importância do movimento negro e que acolham, sem reservas, todas as manifestações culturais provenientes dele.

Por fim, o manifesto recomenda aos eleitores que escolham seus governantes tendo como base o voto laico.

Assinam o documento a Aliança de Negras e Negros Evangélicos do Brasil, Coletivo Reverendo Martin Luther King Jr., Coletivo Independente de Pessoas Negras da Igreja Metodista, Coletivo Negro Evangélico Cuxi, Coletivo Núbias, Coletivo O Que Tem no Brasil, Coletivo Zaurildas, Fórum de Negritude da Aliança de Batistas do Brasil, Grupo de Estudos Antirracista África Bíblica, GT "Teologia e Negritude" da FTL, Movimento Negro Evangélico do Brasil, Pastoral de Negritude Igreja, Batista do Pinheiro, Pastoral da Negritude Rosa Parks e Rede Mulheres Negras Evangélicas.

"Considerando que a população negra é o maior número de adeptos do protestantismo brasileiro, é importante que organizações negras evangélicas manifestem-se sobre esse momento histórico que vivemos, de ameaça à democracia e do bem-estar e qualidade de vida dessa população", afirma Vanessa Barboza, secretária executiva da Rede de Mulheres Negras Evangélicas.

Segundo ela, o manifesto sinaliza uma "voz profética" de denúncia do perigo que correm e dos danos já causados pelo governo Bolsonaro nos últimos anos.

Texto publicado originalmente na Folha de São Paulo.


Motociata por igualdade racial | Foto: Prostock-studio/Shutterstock

Revista online | Representatividade negra na política

Kennedy Vasconcelos Júnior*, especial para a revista Política Democrática online (46ª edição: agosto/2022)

Como pode um deputado ou deputada não-negros (brancos) entenderem as demandas dessa população se nunca sofrem discriminação ou racismo na pele? Para iniciar qualquer conversa sobre o tema “representatividade”, é essencial definirmos o conceito do termo de modo que possamos partir do mesmo ponto.

De acordo com o Dicionário da Língua Portuguesa e o Dicionário de Política, do filósofo e historiador Norberto Bobbio, a representatividade é a expressão dos interesses de um grupo (partido, classe, movimento, nação, etc.) na figura de um representante, de forma que aquele que fala em nome do coletivo o faz comprometido com as demandas e necessidades dos representados. 

Veja todos os artigos desta edição da revista Política Democrática online

Portanto, falar de representatividade revela o sentido político e ideológico por trás do termo. Mesmo que seja possível imaginar o sofrimento do outro, só podem alcançar a compreensão plena do que seja a opressão racial aqueles que sofrem diretamente a violência desse contexto. Qualquer coisa diferente disso é achismo.

A maneira mais reveladora de se enxergar a falta de representatividade negra é nos números: Além de o Brasil ser o maior país em concentração de negros fora do continente africano, temos 125 deputados autodeclarados negros – soma de pardos e pretos, segundo critério do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) – de um total de 513 parlamentares na Câmara dos Deputados, o que representa 24,36% da assembleia da Casa. 

Mesmo que pessoas negras constituam a maioria da população brasileira (cerca de 56%, de acordo com dados do censo do IBGE de 2018), a representatividade desse grupo está muito aquém da necessária, e isso não é um acidente. O racismo estrutural é fruto do caráter exploratório e excludente da colonização, bem como da desigualdade social que afeta majoritariamente negros e pardos no Brasil.

Veja, abaixo, galeria de imagens:

Mulher negra segurando papelão escrito igualdade | Foto: giuseppelombardo/Shutterstock
Mulheres negras enfileiradas e sorrindo | Foto: Nelson Antoine/Shutterstock
Motociata por igualdade racial | Foto: Prostock-studio/Shutterstock
Enquanto o presidente radicaliza sua retorica dentro do país sua política externa esta cada vez mais dócil | Foto: Vincenzo Lullo/Shutterstock
Mulher negra gritando no mega fone com a mão erguida | Foto: Prostock-studio/Shutterstock
Contra a desigualdade social | Foto: SB Arts Media/Shutterstock
Pela igualdade social | Foto: fizkes/Shutterstock
Protesto contra o racismo | Foto: AlessandroBiascioli/Shutterstock
Racism protest | Foto: Shutterstock/Drazen Zigic
Foto: Drazen Zigic/Shutterstock
Racismo é crime | Foto: Shutterstock/Angela_Macario
Mulher negra segurando papelão escrito igualdade
Mulheres negras enfileiradas e sorrindo
Motociata por igualdade racial
Enquanto o presidente radicaliza sua retorica dentro do país sua política externa esta cada vez mais dócil
Mulher negra gritando no mega fone com a mão erguida
Contra a desigualdade social
Pela igualdade social
Protesto contra o racismo
Racism protest
Protesto com mega fone
Racismo é crime
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Mulher negra segurando papelão escrito igualdade
Mulheres negras enfileiradas e sorrindo
Motociata por igualdade racial
Enquanto o presidente radicaliza sua retorica dentro do país sua política externa esta cada vez mais dócil
Mulher negra gritando no mega fone com a mão erguida
Contra a desigualdade social
Pela igualdade social
Protesto contra o racismo
Racism protest
Protesto com mega fone
Racismo é crime
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Jovens negros continuam sendo as principais vítimas da violência no Brasil, o que é facilmente constatado pelos dados do Anuário Brasileiro de Segurança Pública de 2020. De acordo com a pesquisa, pessoas negras foram 76,2% das vítimas de mortes violentas intencionais. No mesmo ano, representaram 78,9% das vítimas de intervenções policiais. Além disso, 62,7% dos policiais assassinados eram negros.

Nada disso decorre de crimes diretamente caracterizados por ódio racial. No entanto, fazem parte de uma lógica histórica mais profunda, entranhada não só nas percepções individuais e no funcionamento das políticas públicas e das instituições.

Tudo isso, atrelado à falta de perspectivas e oportunidades, justifica a urgência da necessidade de falarmos sobre representatividade negra e diversidade, além da garantia de direitos fundamentais para que a vida de nossas crianças se desenvolva de forma segura, saudável e promissora, por meio de políticas compatíveis com as necessidades de um mundo real, partindo do entendimento de que nossa sociedade é múltipla e diversa. Aceitar e se aliar a essa pauta é uma oportunidade de reforçar o nosso desenvolvimento individual como seres humanos e como sociedade. 

A “violência simbólica" é o subproduto das relações de poder, trazendo à margem tudo que foge do padrão eurocêntrico preestabelecido desde as colonizações. O sociólogo francês Pierre Bourdieu define violência simbólica como um conceito social elaborado, o qual aborda uma forma de violência sem coação física, causando danos morais e psicológicos, muitas vezes sutis, e que estão arraigados na estrutura social. 

A única forma de combater o racismo estrutural nas instituições é por meio do despertar da consciência da comunidade negra, que precisa se reconhecer como tal e, assim, se empoderar da armadura ancestral de lutas, sacrifícios e vitórias. Os brancos precisam reconhecer seus privilégios e entender que é preciso microevoluções para grandes revoluções. Tudo isso é crucial para este momento de ameaça democrática. É preciso confiar nas instituições e no processo eleitoral e respeitar a luta de muitos que se foram para respirarmos liberdade e escolha.

Doze das 24 legendas com representação na Câmara dos Deputados não têm qualquer instância para debater igualdade racial ou sua organização política, o que fere profundamente a representatividade racial no Brasil, pois dificulta ainda mais que negros e negras disputem eleições no país.  

A Comissão de Igualdade Racial do Tribunal Superior Eleitoral (TSE) lançou neste mês de agosto de 2022 um relatório de financiamento de campanha eleitorais para impulsionar campanhas de pessoas negras  por meio do Fundo Especial de Financiamento de Campanha (FEFC) e o Fundo Partidário, atribuindo a responsabilidade de empregar os recursos aos candidatos negros, aos órgãos geridos pela base nacional de cada partido, que também será responsável por fixar os critérios internos para o recebimento pelos candidatos, assim como sua prestação de contas ao TSE. 

Esses recursos deverão ser solicitados à base nacional do partido através de uma carta de autodeclaração racial. É importante fiscalizar o destino do dinheiro e se atentar a autodeclarantes que não possuem características negras.

A mensagem final que deixo é sobre o aquilombamento, um conceito muito bem abordado por Abdias do Nascimento, político brasileiro, poeta, artista e ativista do direito negro. A perspectiva do aquilombamento vem trazendo uma nova modalidade para a luta negra no Brasil, um lugar seguro de compartilhamento e fortalecimento. É um espaço de conexão e acolhimento com amor. 

Uma das maiores características dos quilombos é a união do povo. É preciso um espírito evoluído para olhar integralmente para as questões humanas e saber que a construção de um mundo melhor faz parte de nós. Não basta não ser racista, é preciso ser antirracista.

Sobre o autor

*Kennedy Vasconcelos Júnior é coordenador do Igualdade23 de Minas Gerais. Primeiro Secretário na empresa Conselho Municipal de Cultura de Juiz de Fora - Concult-JF.

** Artigo produzido para publicação na Revista Política Democrática Online de agosto de 2022 (46ª edição), editada pela Fundação Astrojildo Pereira (FAP), sediada em Brasília e vinculada ao Cidadania.

*** As ideias e opiniões expressas nos artigos publicados na Revista Política Democrática Online são de exclusiva responsabilidade dos autores. Por isso, não refletem, necessariamente, as opiniões da publicação.

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Em defesa da democracia estampado na bandeira do Brasil | Foto: ThalesAntonio/Shutterstock

Movimentos populares voltam às ruas nesta quinta em defesa da democracia

Nicolau Soares*, Brasil de Fato

Nesta quinta-feira (11), as ruas de ao menos 19 capitais serão palco de manifestações pela democracia, em defesa de eleições livres e contra a violência política. Inicialmente convocados pelos movimentos populares, sociais e sindicais organizados na campanha "Fora, Bolsonaro" para o dia 6, os atos foram adiados para acontecerem na mesma data da leitura da "Carta às brasileiras e aos brasileiros em defesa do Estado democrático de Direito", que já recebeu mais de 800 mil assinaturas até aqui.

"A campanha vem realizando, desde que Bolsonaro assumiu, atos em defesa da democracia, para pressionar pela questão da vacinação, denunciando a fome, o desemprego. E agora, voltamos às ruas contra a escalada do autoritarismo, da ameaça de não respeitar as eleições, ou seja, não respeitar a soberania popular do voto, anunciando ao mundo naquela reunião com os embaixadores que a urna eletrônica não é segura", afirma Raimundo Bonfim, coordenador da Central de Movimentos Populares (CMP) e um dos organizadores da campanha, que inclui as Frentes Brasil Popular e Povo Sem Medo, além de dezenas de entidades.

A organização da campanha já tem 22 atos confirmados em 19 estados, número que deve crescer até a quinta-feira. Em São Paulo, a manifestação pública acontece a partir das 17h, no vão livre do Masp, na Avenida Paulista. No Rio de Janeiro, o ato acontece na Candelária, região central da cidade, a partir das 16h.

Também está previsto ato em Brasília, em frete ao Congresso Nacional, a partir das 15h. Em Salvador, será realizada uma passeata saindo da praça do Campo Grande às 9h.

Ações simultâneas

A data marca o lançamento oficial do manifesto elaborada por ex-alunos e professores da Faculdade de Direito da USP, que acontecerá às 11h30, no Salão Nobre da Faculdade de Direito do Largo de São Francisco, em São Paulo.

Clique aqui para ler na íntegra e assinar o documento.

Mais cedo, às 9h30, será feita a leitura do manifesto Em Defesa da Democracia e da Justiça, de iniciativa da Fiesp e subscrito por 107 entidades de diversos setores, como a Febraban e organizações ligadas ao agronegócio. O documento já foi publicado em alguns dos maiores jornais do Brasil na semana passada.

A diversidade de setores mostra um amplo arco de forças na defesa da democracia, o que é comemorado por Raimundo. "Isso é importante, nós saudamos essa iniciativa puxada pela Faculdade de Direito da USP e por setores empresariais, mas nós achamos que o elemento rua é fundamental nessa luta em defesa da democracia para o povo brasileiro", afirma, ressaltando as diferenças entre os grupos.

"Nós defendemos a democracia, mas defendemos a democracia com direitos. Com políticas públicas. Não existe democracia com racismo, com desemprego, com fome, com miséria. Estaremos nas ruas fazendo a defesa da democracia, da soberania popular do voto, mas também levando a nossa pauta de denúncia, do desemprego, das más condições de vida do povo brasileiro", conclui.

Veja abaixo a lista de atos confirmados até aqui:

AL: 

Maceió: Praça Centenário, 8h 

AM:  

Manaus: Praça da Saudade, 15h 

BA: 

Salvador: Praça do Campo Grande, 9h 

CE: 

Fortaleza: Praça da Bandeira, 9h 

DF: 

Brasília: Congresso Nacional, 15h 

ES: 

Vitória: Praça Costa Pereira, 10h 

GO:  

Goiânia: Praça Universitária, 17h 

MA: 

São Luís: Praça Deodoro, 16h 

MG: 

Belo Horizonte, Praça Afonso Arinos, 17h 

MS:

Campo Grande: Câmara Municipal, 10h. 

PB:

João Pessoa: Lyceu Paraibano, 14h 

PE: 

Recife: Rua da Aurora, 15h 

PI:

Teresina: Praça Rio Branco, 8h30 

PR: 

Curitiba: Praça Santos Andrade, 18h30 

 RJ: 

Rio de Janeiro: Candelária, 16h 

RN:

Natal: Midway, 14h30 

SC:  

Florianópolis: Praça da Alfândega, 17h 

SE:  

Aracaju: Praça Getúlio Vargas. Bairro São José, 15h. 

SP: 

Santos: Praça dos Andradas, 10h 

São Paulo: MASP, 17h 

Ribeirão Preto: Esplanada do Teatro Pedro II, 17h

*Texto publicado originalmente em Brasil de Fato. Título editado.


Hypeness: Militância na prática - Mulheres negras que combatem o racismo no Brasil

As palavras de Sueli Carneiro sobre o começo de sua trajetória como ativista mostram que a indignação foi o que a moveu. Pelo percurso, encontrou pessoas que a ensinaram a usar tamanho inconformismo como ferramenta de transformação

Redação Hypeness

Me mostraram caminhos em que eu podia potencializar aquela indignação com ação política, com combate ao racismo, com o desenvolvimento de projetos e de outras possibilidades de inserção da população negra”, contou, em entrevista ao canal “Trip Transformadores”, no YouTube.

Foi por influência da intelectual Lélia Gonzalez (1935-1994) que Aparecida Sueli Carneiro Jacoel, seu nome completo, decidiu construir uma linha de pesquisa e militância voltada para essa dimensão da questão racial.

Em 1988, Sueli Carneiro fundou o Géledes — Instituto da Mulher Negra, a primeira organização negra e feminista independente de São Paulo, por meio do qual encoraja e fortalece mulheres negras contra o racismo e o sexismo.  

É uma organização que surge de uma evidência para as mulheres negras de 30 anos atrás de que as lutas coletivas, que são travadas por mulheres e negros na sociedade brasileira, tendem a privilegiar ou mulheres brancas ou homens negros. As mulheres negras terminam por permanecer numa situação de confinamento social pela articulação perversa que gênero e raça produzem nessa sociedade”, reflete.

Doutora em Filosofia pela Universidade de São Paulo (USP), Sueli é um dos mais relevantes nomes do feminismo e do ativismo negro no país. 

Ao lado dela, esteve Luiza Helena de Bairros (1953-2016), ex-ministra-chefe da Secretaria de Políticas de Promoção da Igualdade Racial do Brasil no durante o primeiro mandato da presidente Dilma Rousseff.

Nascida em Porto Alegre, em 1953, Luiza chegou na Bahia nos anos 1970, envolvida com o movimento estudantil, e construiu alicerces firmes para inspirar na luta pela igualdade por aqui. 

A homenagem só é válida se cada uma e se cada um efetivamente incorporar aquilo que é o legado de quem está sendo homenageado”, costumava dizer em vida. A frase não poderia ser mais verdadeira quando observada sua influência na construção de debates tão importantes com relação a gênero e raça.

Quando chegou de vez na Bahia, se apaixonou pelo “vigor da militância negra naquele período”, ela relatou, certa vez, em entrevista a historiadora Silvana Bispo dos Santos. 

Foi uma fase de afirmação da existência do racismo, era isto fundamentalmente que caracterizava a nossa intervenção, que era muito facilitada, em algum sentido, pela existência no mesmo período das manifestações de blocos afros e afoxés que eram muito fortes”, contou.

Em 1981, Luiza foi uma das fundadoras do Grupo de Mulheres do Movimento Negro Unificado da Bahia (MNU-BA). A criação do coletivo foi fundamental para acentuar o debate em torno do sexismo presente não só na sociedade em geral, mas também no MNU. 

Quando passou a integrar o governo Dilma, Luiza criou o Sistema Nacional de Promoção da Igualdade Racial (Sinapir). O programa tinha como objetivo promover a implementação de políticas públicas de combate ao racismo ao mesmo tempo em que fortalecia as estruturas para oferecer oportunidades à população negra. 

CarlaAkotirene também cita Lélia Gonzalez como inspiração. Graduada em Serviço Social pela Universidade Católica de Salvador e pesquisadora em Estudos de Gênero, Mulheres e Feminismo na Universidade Federal da Bahia, ela é autora de “O Que É Interseccionalidade?”, parte do projeto “Feminismos Plurais”, coordenado por Djamila Ribeiro.

Antes de se tornar pesquisadora em racismo e sexismo institucionais nas penitenciárias da Bahia, Carla foi cordeira do bloco de carnaval e vendia joias como ofício. Em entrevista ao programa “Perfil & Opinião”, da TVE, ela conta que nunca pensou em entrar para a Academia.

Até que um episódio específico a fez mergulhar nos estudos. Ela estava em um ensaio do bloco Ilê Ayê acompanhada de um ativista do movimento negro quando duas outras pensadoras negras questionaram o colega de Carla sobre ela. 

Como você anda com uma mulher dessa? Porque esta aqui é professora, essa daqui é advogada, a outra é médica e ela é o quê? Ela é só gostosa, né? Porque ela não sabe nem falar direito”, contou Carla sobre aquele dia. “Eu tomei aquele baque e não tive condição intelectual de responder a altura”, lembra.

Segundo Carla, ela percebeu que “estava diferenciada” ainda que as outras mulheres também fossem mulheres negras. Até que uma delas, a doutora Andreia Beatriz a chamou no canto e a aconselhou. “Ela disse: ‘Carla, não deixe ninguém fazer isso com você. Lhe tratar dessa forma. Por que você não vai estudar?’”

A pesquisadora conta que, na seleção para entrar na universidade, deu respostas das quais se envergonha. “Respondi que era contra as cotas, que eu era morena escura, que eu não acreditava em racismo…”, disse sobre a situação vivida em 2003. “Eu hoje fico até constrangida“, admitiu. 

Se a gente não for submetida, submetido, a uma formação política a gente faz aliança com a colonização, com a colonialidade e não com as ferramentas que foram pensadas para as nossas resistências.