protestos
Mais de 300 já morreram em protestos no Irã, diz agência da ONU
g1*
Mais de 300 pessoas já morreram durante os protestos que tomaram conta do Irã e que pedem o fim do regime islâmico nos dois últimos meses, segundo levantamento da agência das Organizações das Nações Unidas (ONU) para os Direitos Humanos apresentado nesta terça-feira (22).
O país vive a maior onda de protestos de sua história, que eclodiram em reação ao caso da jovem curda Mahsa Amini, de 22 anos, que apareceu morta após ser presa no fim de setembro pela chamada polícia dos bons costumes do país por "uso inadequado" do véu islâmico, obrigatório no Irã.
As reivindicações, contra a repressão às mulheres, rapidamente se tornaram o maior movimento contra a República Islâmica desde a sua proclamação, em 1979.
O governo tem respondido com repressão às manifestações, e há diversos relatos apontam que tiros vindos de policiais durante os atos são os responsáveis pela maior parte da morte.
A agência da ONU não sustenta diretamente essa informação, mas descreve um "endurecimento da resposta das autoridades aos protestos que resultaram em mais de 300 mortes nos últimos dois meses".
"Instamos suas autoridades a atender às demandas das pessoas por igualdade, dignidade e direitos, em vez de usar força desnecessária ou desproporcional para reprimir os protestos", disse o porta-voz do chefe de direitos humanos da ONU, Volker Turk.
Os números apresentados pela ONU são similares aos da Organização Não Governamental (ONU) Iranian Human Rights Watch, , a principal organização de monitoramento das manifestações. A ONG fala em 380 mortes desde o início dos protestos. Ainda segundo esse balanço, 45 eram crianças.
Texto publicado originalmente no portal g1.
Ocidente tem dever moral de apoiar protestos no Irã
Made for Minds*
Não é possível contar sobre as décadas de lutas da sociedade civil iraniana sem destacar a excepcional contribuição que as mulheres deram – e seguem dando. Há mais de 40 anos, elas são o maior grupo reprimido, discriminado e humilhado do Irã. Ao mesmo tempo, foram as primeiras a se defender corajosamente contra a liderança da Revolução Islâmica, enquanto intelectuais e políticos do sexo masculino se calavam.
Quase quatro décadas transcorreram dessa maneira, até que, em 2017-2018, manifestações públicas isoladas pela primeira vez colocaram em questão a legitimidade do regime islâmico. O que se presencia agora, contudo, é inédito, nessa forma: é a confrontação unida da população civil contra os mulás no poder. A morte de Jina Mahsa Amini bate de volta no sistema como um bumerangue, o protesto une todos os grupos até então empurrados para as margens e retorna à origem do descontentamento: a libertação das mulheres no Irã.
E agora é hora de o Ocidente falar em linguagem clara. Invólucros verbais vazios, exigências diplomáticas ou advertências frouxas não bastam, nem de longe. Nunca bastaram, mas agora estamos numa encruzilhada: a comunidade internacional precisa se colocar do lado da população iraniana com toda força, ameaçando com consequências rigorosas. Se necessário, com a suspensão das negociações sobre o programa nuclear de Teerã.
Ocidente trata Irã com luvas de pelica
Os governantes iranianos nunca empregaram uma linguagem civilizada de conciliação e moderação, e não levam a sério quem a emprega. Eles não têm medo de sanções simbólicas, aguentaram até mesmo um embargo de petróleo. Continuando-se a confrontá-los apenas com simbolismo, eles não hesitarão nem um momento em seguir matando para se manter no poder.
Eles sabem que, depois de um certo tempo, a real política de muitos países voltará a entrar em contato para negociar. Eles interpretam como um presente os longos anos de contemporização do Ocidente contra a expansão no Oriente Médio. O Irã não recua diante de operações de terror estatal em todo o mundo, em especial em países europeus. Os detentores de poder do Irã veem como seu "privilégio especial" poder ameaçar a existência de Israel e a falta de reação resultante.
O fato é que, em comparação com a Líbia de Muammar Kaddafi, o Iraque de Saddam Hussein e a Síria de Bashar al Assad, o Ocidente tem tratado com luvas de pelica o Irã de Ali Khamenei. Isso deixou a República Islâmica tão atrevida, que ela se permite continuar despreocupada com o massacre de seus próprios cidadãos.
O único ponto vulnerável do regime iraniano
No entanto, a República Islâmica teme que seu dossiê retorne a consideração perante o Conselho de Segurança da ONU. Recentemente, a Agência Internacional de Energia Atômica (AIEA) constatou que o Teerã não está disposto a prestar contas sobre seu programa nuclear e os vestígios de urânio enriquecido em três locais do país. Paralelamente, já há meses o regime brinca de gato-e-rato em suas negociações com o Ocidente, a fim de ganhar tempo para construir a bomba atômica.
O Ocidente teria razões mais do que suficientes para detonar as negociações com o Irã e iniciar o processo para retomada das sanções das Nações Unidas, o assim chamado "snapback". Essa seria a única mensagem que Teerã é capaz de entender e temer. Só assim não seria sufocda no berço a revolta civil do povo iraniano, com as mulheres no front avançado. Só sob esse tipo de pressão, o supremo líder religioso Ali Khamenei ordenaria o fim do assassinato dos manifestantes.
O mesmo se aplica ao atual presidente, Ebrahim Raisi: ele certamente não ousaria mandar mais uma vez executar milhares de presos em pouquíssimo tempo, como fez em meados de 1988.
O regime dos mulás em Teerã deve se sentir encurralado pelo mundo. Senão, o que ficará na memória das iranianas e iranianos será só o silêncio internacional e a cumplicidade tácita do Ocidente. Isso seria irresponsável. Não: seria imperdoável.
Behnam Bavandpour é jornalista da DW. O texto reflete a opinião pessoal do autor, não necessariamente da DW.
Texto publicado originalmente no Made for Minds.
O que alcançaram os movimentos anti-Bolsonaro?
Lideranças consideram que movimentos antigoverno que floresceram em 2020 contribuíram para desgaste de Bolsonaro
Malu Delgado / DW Brasil
George Floyd acabara de ser assassinado nos Estados Unidos, e a primeira onda da pandemia atingia seu pico no Brasil, entre devaneios antidemocráticos do presidente Jair Bolsonaro e a falta de compromisso federal com o combate à covid-19. Ao final do primeiro semestre de 2020 floresceram no país os primeiros movimentos sociais mais organizados contra Bolsonaro.
Mais de um ano depois, alguns deles se desintegraram e não sobreviveram às dificuldades de manter uma coesão durante a pandemia. Ainda assim, lideranças que ajudaram a formar frentes de resistência a Bolsonaro consideram que importantes vozes da sociedade ecoaram mais claramente e se fortaleceram, conseguindo ao menos deter absurdos extremos do atual governo e contribuindo para o desgaste e aumento da rejeição ao presidente.
"Não tenha dúvida de que o índice de rejeição que Bolsonaro tem hoje diz respeito fundamentalmente à ação dos movimentos. Se não fosse toda essa mobilização geral, prevaleceriam só as fake news de Bolsonaro, para quem todas as desgraças brasileiras são responsabilidade de outros", disse à DW Brasil Douglas Belchior, liderança da UNEafro Brasil e membro da Coalizão Negra Por Direitos, criada ao final de 2019. Para Belchior, os movimentos sociais resistiram, cada um a seu modo, e agiram dentro de seus limites.
Ações, unificadas, segundo ele, ajudaram a combater a tese antivacina que prosperava no governo Bolsonaro, intensificando a pressão internacional. Foram também essas vozes da sociedade civil, em especial a da Coalizão Negra, que forçaram a manutenção do auxílio emergencial em 2021, evitando que a miséria e a fome se alastrassem ainda mais pelo país.
"Esses movimentos sociais atuaram e pressionaram a opinião pública e as mídias. Não haveria o desgaste nacional e internacional de Bolsonaro sem isso", sentencia Belchior.
"Com racismo, não haverá democracia"
Estamos Juntos, Somos 70% e Basta! são exemplos de movimentos que surgiram com uma bandeira comum, a luta em favor da democracia numa reação contra atos do atual governo que esses segmentos consideraram atentados contra contra direitos, civilidade e tolerância. No entanto, para Belchior, a morte de George Floyd acendeu também o alerta no país contra o racismo.
O manifesto da Coalizão Negra Por Direitos, escrito em 2020 em paralelo a esses outros movimentos que se expandiam, adotou a seguinte frase como lema: "Enquanto houver racismo, não haverá democracia".
"Uma das primeiras ações do governo Bolsonaro foi tentar derrubar a lei de cotas raciais. O movimento negro fez uma atuação em conjunto", lembra Belchior.
"Para o maior segmento da sociedade brasileira [a população negra], o risco à democracia não é novo. Onde é que tem democracia com a polícia estourando as quebradas e as favelas como sempre fez? Onde é que tem democracia com 800 mil pessoas presas, 40% delas sem julgamento?", questiona Belchior.
Ele considera que a Coalizão Negra talvez seja o único movimento social hoje no Brasil com atividade orgânica – ou seja, organizado na ponta, pela população diretamente atingida –, algo que talvez só se assemelhe ao Movimento dos Sem Terra (MST) da década de 90.
"A gente surge [após a eleição de Bolsonaro] para fazer uma dinâmica política que os brancos sempre fizeram em nosso nome. Onde o movimento negro era a ausência? Nos espaços de poder, no parlamento e em fóruns internacionais. Eram sempre os brancos falando em nosso nome. Mas a história dá uma pirueta e nos obriga a usar essa força de rede também na ponta."
Fim da espiral do silêncio da maioria
Ex-banqueiro e empresário, Eduardo Moreira é um dos nomes mais conhecidos do movimento Somos 70%. Ele enfatiza, no entanto, que nunca alimentou o próprio ego, evitando se colocar como dono do movimento ou utilizá-lo como instrumento de poder. "Sou apenas um dos 70%", pontua.
O empresário considera que o movimento foi extremamente bem-sucedido e ainda tem ecos. O objetivo do Somos 70% era extremamente simples, e muitas vezes não foi compreendido, diz.
"Vivemos no Brasil a espiral do silêncio durante um tempo. As pessoas ouviam 30% [da população que apoia Bolsonaro] falando e se intimidavam. Não só por serem a única voz que aparecia, mas por ser também uma voz muito ameaçadora, que difamava. A ideia dos Somos 70% foi só lembrar as pessoas de que podem falar, e lembrar que elas eram a maioria. Tentavam me botar numa saia justa e perguntavam: mas o [Sergio] Moro faz parte dos 70%? Se ele não é favorável a Bolsonaro, faz. Isso é simplesmente uma estatística. Não é abaixo-assinado. Ninguém pode escolher ser contra Bolsonaro e não estar nos 70%", afirma.
Para Moreira, as atuais pesquisas de intenção de votos confirmam o desgaste de Bolsonaro e são resultado da expressão da maioria. Influente nas redes sociais, o empresário postou recentemente fotos ao lado do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva e de Ciro Gomes, que é pré-candidato à Presidência pelo PDT.
"O Somos 70% tinha esse poder de não estar vinculado a nenhum partido político e não ter um compromisso de uma aliança. Normalmente, quando uma pessoa acaba se envolvendo em um movimento específico, se ela conversa com o Lula não pode falar com o Ciro, porque escolheu um lado. Eu sempre defendi a arena do debate. Luto pelo direito de debater. Luto pelo direito de discutir."
A voz minoritária e agressiva que calou a maioria sucumbiu, e agora a percepção geral no país é outra, diz Eduardo Moreira. O movimento, diz ele, "tomou vida própria" e o conceito de Somos 70% foi incorporado pela sociedade. Algumas estatísticas revelam isso, aponta, como o fato de 70% dos brasileiros rejeitarem a flexibilização do porte de armas; 67% acreditarem que a corrupção vai aumentar, e os mesmos 67% rejeitarem a aproximação de Bolsonaro ao Centrão. Além disso, 75% dos brasileiros acham que a democracia é o regime mais indicado, e 78% afirmam que o regime militar foi uma ditadura – todos esses dados de pesquisas recentes feitas pelo Instituto Datafolha.
O ex-banqueiro acredita que o cenário econômico caótico desmascarou a incompetência do ministro da Economia, Paulo Guedes. No entanto, Moreira não crê que haverá impeachment de Bolsonaro, por falta de interesse de grupos políticos à esquerda e à direita. A despeito da acomodação da classe política, ele vê o "antibolsonarismo consolidado".
Resposta da classe artística, Estamos Juntos perdeu fôlego
"No mesmo dia eu recebi um telefonema do Douglas Belchior, da UNEafro, e outro do Luciano Huck. Se os dois enxergaram naquele movimento um ponto de encontro, era sinal de que muita gente cabia ali", relata o escritor e roteirista Antonio Prata, um dos que ajudaram a organizar o movimento Estamos Juntos.
A principal ação do movimento em 2020 foi publicar um enorme
manifesto nas páginas dos principais veículos de imprensa do país, fortalecendo princípios democráticos. O Juntos reuniu assinaturas de intelectuais e políticos de diferentes espectros ideológicos em favor da democracia.
Antonio Prata considera que naquele momento, maio do ano passado, reunir assinaturas de economistas à direita e à esquerda num mesmo manifesto foi um feito relevante. Segundo ele, no auge da pandemia era impossível colocar as pessoas nas ruas, mas havia um forte sentimento, sobretudo entre setores culturais, de que era necessário formular uma ação rápida e contundente contra o atual governo, que flertava com a ideia de golpe institucional.
O movimento Estamos Juntos ganhou adesão significativa da classe artística e se espalhou como rastro de pólvora. Foram criados milhares de grupos de WhatsApp por todo o país. No entanto, hoje, os criadores do Juntos já nem fazem mais parte desses grupos, e a discussão se perdeu. Ainda assim, o escritor considera que o movimento teve um significado relevante na conjuntura de 2020.
Prata pondera que há dificuldades quase intransponíveis quando se reúnem pessoas com pensamentos muito divergentes num único movimento, como foi o caso do Juntos. Além disso, a pandemia dificultou uma organização mais efetiva, acrescenta.
"Mas pra mim deu muito mais a ideia de que é possível fazer coisas do que é impossível", sintetiza. "Não tentaria reavivar aquilo. É muita gente diferente, cabeças diferentes. Não é a turma de ninguém. Não tem um grupo com pensamento e origem parecidas. Há outros caminhos [de resistência ao governo], mas foi ótimo, abriu muitas portas, contatos", acrescenta o escritor.
"Movimentos sofrem síndrome da paixão", diz filho de Herzog
Filho do jornalista Vladimir Herzog, morto na ditadura militar, o engenheiro Ivo Herzog também aderiu à onda de protestos contra Bolsonaro, mas tem uma visão bastante crítica, e amarga um pessimismo diante da apatia da sociedade brasileira.
"Eu realmente me engajei no Estamos Juntos, em meados de maio. Acho que esses movimentos sofrem da síndrome de paixão. É muito fácil se apaixonar, só que paixão tem data de validade. Não perdura. O que perdura é o amor. A paixão a gente mergulha, para de fazer tudo o que está fazendo, mas passa. Isso explica muitoesses movimentos, de maneira geral", diz.
Segundo ele, esses movimentos ganharam fôlego a partir de uma sequência de eventos negativos para o governo no ano passado, como a saída de Sergio Moro do governo, as trocas sucessivas no Ministério da Saúde, a falta de respostas na pandemia e a "flagrante intenção de Bolsonaro de atentar contra a democracia".
Para ele, o movimento Estamos Juntos cresceu muito rapidamente, o que desestrutura qualquer iniciativa. Além disso, pontua, por envolver muitas "celebridades", houve uma guerra de egos nos bastidores do movimento que prejudicou as articulações. "É isso. Perdeu o foco, se perdeu nas discussões, se queimaram pontes. Foi uma paixão avassaladora. Normalmente paixão dura dois anos. Aquela durou dois meses."
Herzog afirma que os pressupostos do movimento eram interessantes e que ele sempre insistiu na necessidade de manter uma ação suprapartidária. Defender nomes e partidos, sustenta, gera distanciamento, e não aproximação. "Nossa luta é contra esse obscurantismo, todo esse processo em que começamos a andar para trás, desde o governo Temer, na verdade", completa.
Empobrecimento democrático
Para Herzog, é pouco provável que a sociedade civil consiga se articular de forma efetiva em 2022 contra Bolsonaro.
"Estou muito descrente. O que vai acontecer é que vamos entrar em 2022 gastando 10% do nosso tempo brigando com Bolsonaro e 90% brigando entre a gente, para ver quem vai ser o cara [candidato à Presidência]. E não vai se discutir conteúdo."
Ainda assim, Ivo Herzog acha que Bolsonaro não se reelegerá, mas o Brasil perderá a chance de debater coletivamente uma proposta de país.
"Não existe uma casa no Brasil para se debater as ideias. Os partidos políticos não são mais isso. Estão atrás de pessoas que tragam votos. Não interessa se o cara usa suástica ou a estrela de Davi. É uma loucura, e o eleitor com um mínimo de consciência se afasta deste processo", lamenta.
Para ele, o fato de o ex-presidente Lula ser "a mesma solução política há 30 anos" é sinal do empobrecimento democrático do Brasil.
"Claro que o Lula de 1989 não é o Lula de hoje, mas é uma loucura você pensar que é o mesmo cara. É desanimador. E olha as alternativas postas... Não dá para pensar no PSDB que faz Bolsodoria. O braço direito do [Geraldo] Alckmin em São Paulo era o [ex-ministro do Meio Ambiente] Ricardo Salles", critica.
Há décadas, conclui Herzog, "o Brasil normaliza o absurdo". "Não vejo ninguém fazendo uma reflexão bem estruturada para esse país."
Fonte: DW Brasil
https://www.dw.com/pt-br/o-que-alcan%C3%A7aram-os-movimentos-anti-bolsonaro/a-59837165
Ministério Público articula reação à PEC que retira autonomia do órgão
Representantes do MP buscam deputados e marcam protestos pelo país para alertar contra enfraquecimento de investigações
Bernardo Mello, João Sorima Neto e Mariana Muniz / O Globo
RIO, SÃO PAULO e BRASÍLIA — Em protesto contra a Proposta de Emenda à Constituição (PEC) 05/2021, vista como forma de enfraquecer a autonomia do Ministério Público, promotores e procuradores de 18 estados realizam a partir desta quarta-feira uma série de atos de repúdio em todo o país. Associações e procuradores-gerais ouvidos pelo GLOBO avaliam como pontos mais graves da proposta a elaboração, por parte do Congresso, de um código de ética para o MP; alterações na composição do Conselho Nacional do Ministério Público (CNMP) para aumentar a influência do Legislativo, através inclusive da indicação de um corregedor nacional; e a possibilidade de o órgão passar a anular atos de investigação.
A PEC chegou a entrar na pauta de votações na Câmara dos Deputados na semana passada, mas foi retirada por falta de apoio. Representantes do Ministério Público têm buscado chamar atenção para os riscos à independência de investigações, e esperam reverter alguns dos trechos da proposta ainda na Câmara ou, em caso de aprovação pelos deputados, no Senado. Também há chance de judicialização no Supremo Tribunal Federal (STF) para reverter o eventual desequilíbrio no CNMP pela maior interferência do Congresso.
Uma das bases para eventual judicialização é o argumento da paridade entre o CNMP e o Conselho Nacional de Justiça (CNJ), ambos criados em 2004 pela mesma legislação. Em 2005, ao reconhecer a constitucionalidade do CNJ, o plenário do STF estabeleceu que se trata de um órgão de controle interno com autonomia institucional e que, portanto, deve ter maioria qualificada de membros da magistratura e sem o poder de interferir em decisões judiciais.
Atualmente, o CNMP tem 14 integrantes, sendo oito indicados pelos diferentes braços do Ministério Público, incluindo o procurador-geral da República (PGR), e outras seis vagas distribuídas pelo Judiciário, Congresso e Ordem dos Advogados do Brasil (OAB). Na versão final do relator da PEC, deputado Paulo Magalhães (PSD-BA), uma reorganização das vagas deixaria o MP com sete cadeiras no conselho, contra oito escolhidos por outros órgãos — sendo quatro por atribuição do Legislativo.
— Não faz sentido acrescentar duas vagas sob escolha do Congresso no CNMP, sendo uma delas a partir de lista elaborada pelo STF, e retirar uma vaga do MP da União. Se o intuito é aumentar a composição de 14 para 15 cadeiras, seguindo a paridade com o CNJ, então defendemos que esta cadeira seja destinada aos MP estaduais, respeitando assim a maioria qualificada, com nove vagas, para membros da carreira — afirma o presidente da Associação Nacional dos Procuradores da República (ANPR), Ubiratan Cazetta.PUBLICIDADE
Outro ponto passível de judicialização é a criação de um novo código de ética para o CNMP através de lei complementar aprovada pelo Congresso, estipulando advertência como sanção mínima. O código atual permite sanções mais brandas.
Representantes de associações argumentam que os códigos de ética do CNJ e da própria Câmara são formulados internamente e que, neste caso, haveria possibilidade de contestar no STF tanto o texto da PEC quanto a futura lei complementar.
Apelo a Aras
Segundo Cazetta, há a expectativa de reverter ainda na Câmara ou no Senado a previsão de que o corregedor do CNMP seja um dos membros indicados pelo Congresso, o que fere a autonomia do órgão.
Além disso, outro ponto que pode ser derrubado é o que permite aos procuradores-gerais indicarem dois terços dos membros dos respectivos conselhos superiores, responsáveis pela fiscalização de suas atividades. A ideia é criticada por abrir brecha a uma eventual concentração de poder nos chefes dos MPs. No modelo atual, os conselheiros são eleitos de forma igualitária entre procuradores e promotores.
— A PEC como um todo é horrível para nós. Mas em uma ordem de gravidade, eu diria que entre os pontos mais problemáticos estão a figura do corregedor escolhido pela Câmara, pois seria um corregedor com vínculo político, a reversão de decisões de membros do Ministério Público, e em terceiro a questão do Código de Ética — afirmou Manoel Murrieta, presidente da Associação Nacional de Membros do Ministério Público (Conamp).
A Conamp está à frente da coordenação dos atos previstos para 18 estados entre esta quarta e sexta-feira. Estão programadas manifestações em cidades como Rio, São Paulo, Recife, Manaus e Curitiba. Murrieta disse esperar que o atual PGR, Augusto Aras, “também nos apoie nessa causa”.
Aras, que tem enfrentado sucessivos atritos dentro do Conselho Superior do MPF, divulgou nota na semana passada afirmando que atuou para adiar a votação da PEC, para que as discussões sobre diferentes pontos “possam ser aprofundadas". A nota afirma ainda que Aras tem mantido “interação permanente” com procuradores e promotores “com o propósito de fortalecer o debate em defesa da autonomia do CNMP”. Na avaliação do presidente da Conamp, as declarações apontam que Aras recebeu com “espanto” o avanço da PEC.
O procurador-geral de Justiça do Rio, Luciano Mattos, disse em entrevista ao GLOBO esperar que a PEC seja rejeitada pelo Congresso e afirmou que o texto traz “riscos”, como ao prever que o CNMP possa rever atos de investigação. Mattos participará do ato de repúdio na capital fluminense, na manhã desta quarta, na sede da Associação de Promotores do MP do Rio (Amperj).
— O CNMP tem por finalidade justamente não interferir na atividade-fim (do MP). Permitir essa invasão representa um grande retrocesso, atingindo a autonomia do Ministério Público — afirmou.
Em manifestação pelo canal Palavra do PGJ, o procurador-geral de Justiça de São Paulo, Mario Sarrubbo, disse ter argumentado a parlamentares paulistas que a proposta na Câmara coloca em xeque a independência funcional do MP. A Procuradoria-Geral de Justiça e a Associação Paulista do Ministério Público promovem ato de repúdio na tarde desta quarta-feira.
— O Ministério Público enfraquecido significa menos condições de defender a ordem jurídica, o regime democrático e os direitos sociais — disse Sarrubbo.
Oposição a Bolsonaro mostra força, e "frente ampla" engatinha
Atos levaram milhares às ruas em todo o país. Partidos variados participaram da organização, mas em São Paulo esquerda se destacou
DW Brasil
Os protestos de rua realizados neste sábado (02/10) em diversas cidades do país e do exterior contra Jair Bolsonaro, a exatamente um ano das eleições de 2022, mostraram que a oposição ao governo segue capaz de levar pessoas para a rua, mas que uma "frente ampla" substantiva contra o presidente ainda está distante.
A pauta dos atos deu ênfase à crise econômica e social do país, com menções aos preços da gasolina e do gás de cozinha, à fome e ao desemprego. Na Avenida Paulista, uma estrutura inflável em frente ao Museu de Artes de São Paulo (MASP) representava um grande botijão de gás, com o preço de R$ 125.
Também eram presentes faixas e palavras de ordem pelo impeachment do presidente, apesar de faltarem as condições objetivas para isso no momento. Bolsonaro segue com apoio do presidente da Câmara, Arthur Lira (PP-AL), a quem cabe deflagrar o processo de impeachment, e de parte significativa do Congresso e do Centrão.
Organização diversa, público nem tanto
Os atos deste sábado tiveram um arco de organizadores mais amplo do que as manifestações antibolsonaristas que vinham sendo convocados pela centro-esquerda e esquerda desde maio, puxados inicialmente pelas frentes Brasil Popular e Povo Sem Medo e pelo PSOL e que depois ganharam o apoio do PT e outras legendas.
Neste sábado, participou ativamente da organização, por exemplo, o Solidariedade, que apoiou o impeachment de Dilma Rousseff e chegou a indicar pessoas para cargos de segundo escalão no governo Bolsonaro, mas agora sinaliza apoiar a candidatura do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva em 2022. A legenda é presidida pelo deputado federal Paulinho da Força (SP), que também é presidente licenciado da Força Sindical. Além do PT, do PSOL e do Solidariedade, estavam na organização dos atos deste sábado PC do B, PSB, Cidadania, PV, Rede e PDT.
As manifestações também tiveram o apoio do grupo Direitos Já!, criado em 2019 e que reúne dezenove partidos à esquerda e à direita, incluindo o PSDB, o PSL e o Novo. O movimento Acredito!, uma das iniciativas de "renovação da política", participou do ato. No carro de som, discursos ressaltaram a importância de ter "pessoas de todas as cores" contra o governo.
"Temos muitas divergências, mas temos uma unidade. Não queremos mais Bolsonaro governando este país", afirmou a presidente do PT, Gleisi Hoffmann, de cima do caminhão de som. "O grito de hoje não é um ponto final, mas o início de uma caminhada que une os diferentes contra um desgoverno que quer restringir liberdades", disse a senadora Simone Tebet (MDB-MS), em mensagem gravada reproduzida em São Paulo.
O vice-presidente da Câmara, deputado Marcelo Ramos (PL-AM), enviou mensagem reproduzida no ato em São Paulo. "Esse Brasil exige união de todos os democratas. O lado certo é o lado da resistência, da denúncia dos desmandos do atual governo", afirmou. O ex-senador Aloysio Nunes (PSDB-SP) também enviou um vídeo com sua fala.
A participação de siglas à direita, porém, foi fragmentada e restrita a algumas pessoas. Lideranças importantes desse campo, como o governador paulista João Doria, do PSDB, não compareceram – ele estava fazendo campanha das prévias do PSDB em Minas Gerais. O Livres, movimento liberal suprapartidário, tampouco foi aos atos.
Márcio Moretto, professor da Escola de Artes, Ciências e Humanidades da USP e coordenador do Monitor do Debate Político no Meio Digital, foi ao ato da Paulista fazer uma pesquisa de campo e relatou à DW Brasil que havia nove caminhões de som na avenida, dos quais oito tinham uma clara orientação à esquerda.
No carro de som central, em frente ao MASP, ele notou um "esforço grande" dos organizadores para compor uma frente ampla de oradores, "mas os manifestantes não estavam tão abertos a essa amplitude toda". Ciro Gomes, do PDT, foi bastante vaiado durante a sua fala, assim como Paulinho da Força.
Em termos de comparecimento, as manifestações deste sábado foram significativamente mais amplas do que as de 12 de setembro, quando os grupos de direita Movimento Brasil Livre (MBL) e Vem Pra Rua, que haviam convocado atos para aquela data, tentaram atrair setores da esquerda mas não encheram as ruas . Naquela oportunidade, não houve envolvimento direto de partidos na organização, e esquerdistas evitaram engrossar atos que tinham originalmente o mote "Nem Bolsonaro, nem Lula" – que foi retirado pelo MBL na véspera.
Mas, na Avenida Paulista, a impressão de Moretto é que o ato não superou o número de apoiadores de Bolsonaro que foram ao local ouvir o presidente no feriado de 7 de setembro. Na ocasião, os bolsonaristas adotaram como estratégia concentrar os protestos em São Paulo e em Brasília, em vez de se dispersar em cidades variadas, e a Polícia Militar estimou um público de 125 mil pessoas na capital paulista.
Segundo o portal G1, neste sábado foram registrados atos em 84 cidades do país, incluindo as 27 capitais. A Polícia Militar de São Paulo calculou um público de 8 mil pessoas na Avenida Paulista, enquanto os organizadores estimaram o público em 100 mil pessoas.
"Abaixo da expectativa"
O cientista político Bruno Bolognesi, professor da Universidade Federal do Paraná (UFPR), avalia que os atos deste sábado ficaram abaixo da expectativa que havia sido criada pelas legendas em torno de uma suposta capacidade de mobilização da "frente ampla", e não foram capazes de oferecer uma "resposta satisfatória" diante dos atos bolsonaristas de 7 de setembro. "Não foi o suficiente para botar pressão e dizer 'somos maiores, temos mais gente'", diz.
Ele é cético quanto à tentativa de criação de uma "frente ampla" contra Bolsonaro comandada por partidos, que no Brasil, diz, em geral não refletem de forma orgânica as suas bases nem têm capacidade de mobilização de militantes.
"É uma ilusão achar que uma frente com 15 partidos vá mobilizar, pois não estamos em um país onde os partidos fazem sentido para seus militantes. O que mobiliza no Brasil são líderes carismáticos", diz. Bolognesi nota que a eventual ida de Lula ao ato poderia alavancar a participação de mais pessoas, mas o petista não tem ido às manifestações "por questões estratégicas de sua campanha".
Ele considera a tentativa de "frente ampla" "capenga", pois "o que aparece nas ruas não é frente ampla, é a esquerda, pois a direita e a centro-direita não conseguem mobilizar".
Bolognesi acrescenta que outro motivo para os atos deste sábado não terem sido mais cheios é que a pauta do impeachment de Bolsonaro perdeu força, pois "institucionalmente não há nenhuma vontade de fazer isso acontecer", o que teria um efeito desmobilizador.
"Diante das circunstâncias, um sucesso"
A cientista política Márcia Ribeiro Dias, professora da Universidade Federal do Estado do Rio de Janeiro (UniRio), tem uma avaliação diversa e diz que, diante de desafios atuais para levar a oposição a Bolsonaro às ruas, os atos deste sábado tiveram resultados muito positivos.
Entre esses desafios, ela menciona que o campo de oposição ao presidente está dividido entre um polo em torno de Lula e um polo de centro-direita que não aceita o ex-presidente como um possível líder de uma "frente ampla".
Além disso, Dias afirma que a prática de realizar protestos em finais de semana, segundo ela introduzida pela direita durante os atos pelo impeachment de Dilma, acabou sendo adotada pela esquerda, mas desfavorece esse campo. "A tradição da esquerda era fazer manifestação de dia de semana, para o trabalhador ir depois do expediente, para atrapalhar e chamar a atenção. É outra coisa mobilizar durante o final de semana", diz.
A professora da UniRio acrescenta que há pessoas que fazem oposição a Bolsonaro que ainda preferem não ir às ruas por causa da pandemia, e que mesmo assim as manifestações foram muito maiores do que as do dia 12 de setembro, convocadas por MBL e Vem Pra Rua. Ela também considera os protestos deste sábado mais significativos que os atos bolsonaristas de 7 de setembro, considerando a amplitude nacional. "Acho que foi um sucesso", diz.
O momento do governo Bolsonaro
O presidente enfrenta a sua pior aprovação popular desde o início do governo. Pesquisa realizada pelo PoderData em 27 a 29 de setembro mostra que 58% dos brasileiros consideram seu governo ruim ou péssimo, maior taxa desde que ele tomou posse. É a terceira pior marca para um presidente neste momento do mandato, e só perde para Michel Temer e José Sarney.
A alta na sua desaprovação ocorre em um momento de crise econômica no país, que vê a inflação anual se aproximar de 10%, com alta no preço de alimentos e da energia, como gasolina, gás e eletricidade – este último, em função da crise hídrica – e mais de cinco meses de uma CPI no Senado expondo má gestão e suspeitas de irregularidades na condução da pandemia de covid-19, que se aproxima da marca de 600 mil mortos.
A taxa de desemprego atingiu seu recorde da série histórica no trimestre encerrado em abril, em 14,7%, e recuou para 13,7% no trimestre encerrado em junho, mas ainda atinge 14,1 milhões de pessoas. Em abril, havia cerca de 27,7 milhões de brasileiros vivendo abaixo da linha da pobreza, o equivalente a 13% da população, segundo pesquisa da Fundação Getúlio Vargas divulgada em setembro – em 2017, essa taxa era de 11,2%.
O auxílio emergencial, transferência de renda mensal criada em abril de 2020 para amparar as famílias mais pobres afetadas pela pandemia, está programado para terminar neste mês de outubro. Bolsonaro chegou a anunciar que o substituiria por um novo programa Bolsa Família, com maior valor e para mais beneficiados, mas dificuldades orçamentárias e políticas do Planalto reduziram as chances de isso ocorrer. O governo estuda prorrogar o auxílio emergencial por mais alguns meses.
Por outro lado, além do prestígio junto ao presidente da Câmara, que protege Bolsonaro de um impeachment, a parcela da população que avalia sua gestão como boa ou ótima está estável há vários meses em cerca de um quarto da população. Quando Dilma foi afastada do cargo de presidente, 13% consideravam seu governo ótimo ou bom, e Fernando Collor deixou o Palácio do Planalto com essa taxa em 9%.
Fonte: DW Brasil
https://www.dw.com/pt-br/oposi%C3%A7%C3%A3o-a-bolsonaro-mostra-for%C3%A7a-e-frente-ampla-engatinha/a-59387543
Com Lula como favorito para derrotar Bolsonaro, o PT de fato quer o impeachment?
Partidos e movimentos predominantemente de esquerda convocaram novos protestos pelo impeachment neste sábado (02/10)
Mariana Schreiber / BBC News Brasil
Desconfianças de ambos os lados têm dificultado unificar as mobilizações em uma frente ampla contra o presidente, o que, na leitura de alguns analistas políticos, acaba reduzindo a capacidade desses atos de pressionar o Congresso Nacional — a decisão de iniciar um processo depende do presidente da Câmara, Arthur Lira (PP-AL), que hoje lidera uma ampla base de deputados da centro-direita avessa ao impeachment de Bolsonaro, já que tem sido beneficiada por cargos e verbas federais para seus redutos eleitorais.
Assim como o PT e movimentos historicamente ligados ao partido, a exemplo da Central Única de Trabalhadores (CUT), não aderiram aos atos de setembro, os grupos de direita que lideraram aquela mobilização, como Movimento Brasil Livre (MBL) e Livres, decidiram não ir às ruas nesse sábado.
Um dos motivos é a desconfiança de parte destes grupos sobre o real compromisso do PT com a luta pelo impeachment. Como as pesquisas de intenção de voto indicam hoje Lula como favorito para vencer a eleição de 2022 em uma disputa direta contra Bolsonaro, críticos do partido dizem de que a preferência dos petistas pode ser por manter o presidente na corrida eleitoral para evitar que outro candidato potencialmente mais agregador se cacife para chegar ao segundo turno contra Lula. Petistas refutam essas acusações.
Outra justificativa dos grupos de direita para não participar dos protestos é um suposto risco de agressão a seus apoiadores por parte de manifestantes da esquerda — a mesma preocupação foi levantada pela esquerda em relação aos grupos de direita nos atos de setembro.
"Eu não coloco o impeachment à frente da segurança de quem nos segue. E tb não acho que atos orquestrados pelo PT sejam favoráveis ao impeachment", escreveu no Twitter o líder do MBL Renan dos Santos, ao justificar a ausência do grupo nos atos desse sábado.
Pesquisa Ipespe divulgada na quinta-feira (30/09) indica que, se a eleição fosse hoje, Lula e Bolsonaro disputariam o segundo turno, sendo que o petista venceria com 50% dos votos contra 31% do atual presidente. A pesquisa ouviu mil pessoas por telefone e tem margem de erro de 3,2 pontos percentuais.
O resultado vai na mesma linha da última pesquisa do Instituto Datafolha, divulgada duas semanas antes, que entrevistou 3.667 presencialmente e tem margem de erro de 2 pontos percentuais. Esse levantamento indica que, mantidas as condições atuais, o petista derrotaria Bolsonaro no segundo turno com 56% contra 31% dos votos.
Por outro lado, essas pesquisas também indicam que Lula venceria com larga vantagem outros possíveis candidatos, como João Dória (PSDB) e Ciro Gomes (PDT).
Lideranças do PT ouvidas pela BBC News Brasil refutam as acusações de que o partido não esteja empenhado pelo impeachment, embora nos bastidores há quem reconheça que a disputa contra Bolsonaro seria hoje o cenário mais confortável para Lula voltar ao Palácio do Planalto.
Parlamentares ou lideranças petistas já assinaram ao menos dez pedidos de impeachment ou aditamentos (acréscimos a pedidos anteriores), o primeiro deles apresentado em maio de 2020 pelo ex-prefeito de São Paulo e candidato presidencial derrotado em 2018 Fernando Haddad.
Ao lado do deputado Rui Falcão (PT-SP), Haddad também apresentou um mandado de segurança em julho deste ano ao Supremo Tribunal Federal (STF) solicitando que a Corte obrigue Arthur Lira a apreciar os mais de cem pedidos de impeachment que aguardam sua análise. A ação ainda será julgada.
"O PT nunca tergiversou com esse assunto. Nós sempre achamos que para o Brasil é melhor o Bolsonaro sair. E nós não escolhemos adversário (para a eleição presidencial de 2022), não nos preocupamos com isso. Nosso foco é com o programa e o projeto de país que nós temos a oferecer para o Brasil", disse a presidente do partido, deputada federal Gleisi Hoffmann (PT-PR), em maio de 2020.
Ela ressalta que o PT, ao lado de PCdoB e PSOL, já participou da convocação de outros quatro atos pelo impeachment, desde março. Esses protestos têm sido liderados pela Frente Povo Sem Medo, a Frente Brasil Popular e a Coalizão Negra por Direitos — as três reúnem centenas de sindicatos, movimentos sociais e coletivos negros e de periferia, como Movimento dos Trabalhadores Sem Teto, Central Única dos Trabalhadores (CUT) e a UNEAfro.
Gradualmente, outros partidos aderiram, como PDT, PSB, Rede e Cidadania. Todos eles estão apoiando os protestos deste sábado também, assim como Solidariedade e PV. São aguardadas ainda lideranças de PSL, MDB, PSDB, DEM e Novo, embora essas siglas não estejam institucionalmente convocando para a mobilização.
Considerando os pré-candidatos presidenciais, Ciro Gomes (PDT) confirmou que participará das manifestações no Rio de Janeiro, pela manhã, e em São Paulo, na parte da tarde.
Já Lula não deve comparecer para evitar dar uma conotação eleitoral aos atos, disse Hoffmann. Segundo ela, há também preocupação com a saúde do ex-presidente e dos manifestantes devido à pandemia de covid-19, já que sua presença poderia causar focos aglomerações.
'Bolsonaro combalido até a eleição'
Apesar da movimentação do PT pelo impeachment, dentro do partido existe uma leitura de que enfrentar Bolsonaro nas urnas tende a ser o cenário mais confortável para Lula, contou à BBC News Brasil o assessor parlamentar de um senador petista.
A compreensão interna, diz, é que o presidente terá dificuldades de se recuperar até a eleição porque as perspectivas para a economia têm piorado muito.
"Com a atual política econômica, os preços dos combustíveis não vão parar de subir, os empregos não vão voltar. A ideia é que ele chegue combalido na eleição", afirma.
Segundo esse assessor parlamentar, o partido reconhece que Bolsonaro segue tendo uma base fiel relevante, capaz de colocá-lo no segundo turno, mas "não tem apoio suficiente para vencer". Ele ressalta ainda que ninguém no PT espera que seja uma eleição fácil.
"Todo mundo sabe que Lula vai ser confrontado com muita coisa de corrupção, de cadeia (período em que ficou preso condenado em processos da Lava Jato posteriormente anulados), de governo Dilma, vão dizer que ela destruiu o Brasil. Aquele velho discurso do antipetismo vai voltar forte", afirma.
"Mas projetam que um cenário de Bolsonaro acabado, e sem se viabilizar uma terceira via, seja menos difícil para Lula articular uma grande aliança e chegar lá", acrescenta.
Por outro lado, parlamentares petistas ouvidos pela BBC News Brasil acreditam que a campanha pelo impeachment não é contraditória com os interesses eleitorais.
"Vamos admitir que se consiga fazer o impeachment do Bolsonaro. Você acha que o PT entraria mais fraco ou mais forte o ano que vem? A liderança que mais mobiliza gente nesse país é o Lula. Então, amanhã, acontecendo o impeachment, é o Ciro que vai ser o porta voz do impeachment? Claro que não", argumenta o deputado Arlindo Chinaglia (PT-SP).
"Então, mesmo para quem tem o raciocínio pequeno da conveniência (eleitoral), se a gente derruba o Bolsonaro, a oposição entra muito mais forte ano que vem", disse ainda.
A deputada Maria do Rosário (PT-RS) tem visão semelhante: "É uma avaliação equivocada e simplória (dizer que o PT não quer o impeachment). O PT sabe que quanto mais força existir na luta pelo impeachment, mais claro vai estar para a população que Bolsonaro não pode continuar", afirma.
Para ela, Bolsonaro continua sendo um adversário perigoso em 2022 e deve ser derrubado antes porque representa "uma ameaça à democracia".
"O PT não vai para a eleição achando que já ganhou de ninguém. Vamos ter que trabalhar muito, mesmo o Lula nesse momento sendo o favorito. Não avaliamos que Bolsonaro é o candidato mais fraco, nem que é invencível. É um candidato que, se não for totalmente desmascarado até a eleição, continua sendo o candidato mais perigoso, porque mobiliza uma turba de fanáticos, porque a direita internacional estará mobilizada pelo Brasil, porque o fascismo tem métodos que podem sempre atacar um processo democrático", disse ainda.
Críticos de Bolsonaro consideram que ele seria uma ameaça para a democracia devido a suas declarações contestando a legitimidade das eleições de 2022 sem adoção de um registro físico do voto. O presidente alega que sem esse mecanismo as eleições podem ser fraudadas, o que é contestado pelo Tribunal Superior Eleitoral (TSE). Na visão de adversários de Bolsonaro, o presidente pretende usar essa argumentação para não aceitar o resultado das urnas em 2022, caso não consiga se reeleger.
No feriado de 7 de setembro, ele mobilizou dezenas de milhares de apoiadores em Brasília e São Paulo para pressionar o Poder Judiciário, no que foi visto como um escalada autoritária por parte do presidente. Depois, porém, Bolsonaro divulgou uma carta recuando de seus ataques e ameaças ao STF.
Em entrevista recente à revista Veja, ele disse que não vai "melar" as eleições e elogiou o convite do TSE para que as Forças Armadas participem da uma comissão externa para fiscalizar o processo eleitoral. Bolsonaro afirmou ainda que "a chance de um golpe (de sua parte) é zero". Para ele, a oposição que quer lhe dar um golpe com o processo de impeachment. Seu argumento é que não há denúncias de corrupção que permitam cassá-lo.
Nos mais de cem pedidos de impeachment já apresentados, os denunciantes acusam o presidente de cometer crimes de responsabilidade na condução da pandemia de coronavírus (ao promover aglomerações e demorar a comprar vacinas, por exemplo), assim como por ter participado em 2020 de atos que pediam o fechamento do Congresso e do Supremo Tribunal Federal (STF), ou ao supostamente interferir em instituições de investigação, como a Polícia Federal (PF).
Pedidos recentes também defendem a cassação do presidente devido à denúncias de possível superfaturamento e corrupção envolvendo compra de vacinas no Ministério da Saúde.
Muito perto de 2022
Para o cientista político Sérgio Praça, professor da Escola de Ciências Sociais da Fundação Getúlio Vargas, não é uma boa estratégia política para o PT apostar em um impeachment que "já é uma possibilidade tirada da mesa" por estarmos muito próximos das eleições de 2022".
"O impeachment não vai acontecer independentemente do que o PT faça. É um processo que demora, não faz sentido articular por isso hoje. Teria feito sentido antes, mas não aconteceu e agora ninguém vai lutar sério por isso. A campanha presidencial já começou", afirma Praça.
Segundo ele, os protestos contra Bolsonaro devem ir perdendo força pelo mesmo motivo.
"Na medida em que as eleições se aproximam, eles têm total irrelevância. Para que eu vou sair pra rua se daqui a pouco eu já vou votar?", afirma.
Sem frente ampla
Se esforçar por um impeachment não é a única ideia que vai ficando para trás conforme as eleições se aproximam, segundo analistas políticos.
A ideia, levantada por parte da oposição, de que seria necessário esquerda e direita se unirem em uma frente ampla contra Bolsonaro também é algo "que não tem a menor chance de acontecer", diz Praça.
Praça diz que as ameaças de Bolsonaro contra a democracia não se concretizaram até agora de forma a fazer a esquerda e direita acreditarem que há necessidade de se unir.
"A única chance de haver essa união é se o presidente tentar dar um golpe de fato, caso perca a eleição. Porque ninguém quer uma ditadura de Bolsonaro. Mas no momento está claro que ele não tem apoio estratégico para isso", afirma o professor da FGV.
Para o cientista político Claudio Couto, a vantagem de Lula nas pesquisas faz com que não faça sentido para o PT tentar uma chapa única de oposição com a direita, que também não tem interesse nisso.
"Nunca acreditei em uma frente ampla no sentido de uma chapa única com objetivo de derrubar Bolsonaro nas eleições. Para o Lula não tem sentido, estando na frente, abrir mão da sua candidatura ou do seu programa. E para os outros partidos, mesmo que uma chamada "terceira via" não se viabilize, vale mais a pena lançar sua própria candidatura do que se unir ao Lula", diz Couto.
A exceção, diz ele, são os partidos como o MBD e os partidos do centrão que não costumam mesmo ter candidatura própria para a presidência e acabam se alinhando ao governo do momento.
Couto também diz que o fato de que uma chapa única não deva acontecer não impede que nomes como Lula, Eduardo Leite ou João Dória façam uma aliança em prol da democracia caso haja um movimento de natureza autoritária, mesma hipótese apontada por Praça.
Isso seria possível, segundo ele, porque até o momento os candidatos de oposição têm jogado limpo já pré-campanha, apesar das críticas eventuais que fazem uns aos outros.
"As críticas dentro da lógica da competição democrática. Tem havido um fair play entre esses vários candidatos. Quem está com atitude muito agressiva ao PT é o Ciro Gomes, mas isso é particular dele, que tenta pegar um público de direita ao ver que perdeu espaço na esquerda", diz Couto.
*Colaborou Letícia Mori, da BBC News Brasil em São Paulo
Fonte: BBC Brasil
https://www.bbc.com/portuguese/brasil-58769735
Baixa adesão e pluralidade política marcam protestos contra Bolsonaro
Manifestantes foram às ruas em diversas capitais neste domingo (12/09), em defesa da democracia e pelo impeachment do presidente da República
Fernanda Fernandes / Correio Braziliense
As manifestações contra o governo e pelo impeachment do presidente da República, Jair Bolsonaro, marcaram o dia de hoje (12/09) em pelo menos 15 capitais do país. Os atos convocados pelo Movimento Brasil Livre (MBL) e pelo Vem Pra Rua (VPR), contaram com apoio de partidos de diferentes espectros políticos. O protesto que a princípio pedia “Nem Bolsonaro, nem Lula”, foi modificado para “Fora, Bolsonaro”, após os discursos antidemocráticos do presidente no último 7 de setembro.
No Rio de Janeiro e em Belo Horizonte os protestos começaram pela manhã e se estenderam até as 13h. Paralelamente, em Brasília, ainda ocorriam manifestações pró-Bolsonaro, com baixa adesão. À tarde, manifestantes da oposição se reuniram na Esplanada dos Ministérios, na capital federal, e na Avenida Paulista, em São Paulo. Com número de participantes bastante inferior ao visto em 7 de setembro, a diversidade ideológica entre os participantes, que protestaram pacificamente, chamou a atenção.
Mauro Vinícius da Silva, membro do Comitê Regional do Partido Comunista do Brasil (PCdoB) e secretário geral da Central dos Trabalhadores e Trabalhadoras do Brasil (CTB), afirmou ao Correio que a unificação das bandeiras contra o atual governo é uma pauta antiga do PCdoB. “Há bastante tempo a gente defende que apenas uma frente ampla, que una não só a esquerda mas todos os democratas e patriotas, é capaz de derrotar o Bolsonaro e o fascismo”, afirmou o bancário e sociólogo, durante o ato em Brasília.
A unificação pode ser confirmada nos atos deste domingo (12/09), onde a pluralidade política foi constatada nas bandeiras e faixas de protestos. As cores do Brasil e o vermelho se misturaram entre os cartazes e camisetas com frases em defesa da democracia e contra Bolsonaro. Muitos optaram pelas vestimentas brancas, como forma de mostrar imparcialidade.
Uma dessas pessoas foi Rodrigo Galletti, servidor público, de 45 anos, que participou dos protestos de forma apartidária. “Estou focado no Fora, Bolsonaro”, disse. “O país de Bolsonaro é um país armado, misógino e preconceituoso, baseado em um cristianismo distorcido. Não é o país que quero para mim, nem no presente, nem no futuro”. Sobre a escolha da cor branca, completou: “Tomaram posse da nossa bandeira e das nossas cores”.
Segundo Silva, o partido tem esperanças de ver um movimento muito maior no dia 2 de outubro. “Não houve da parte do PT, Psol ou do Fora Bolsonaro nenhum ataque. A gente quer que todos estejam juntos no dia 2 de outubro, não para fazer campanha eleitoral, mas para garantir que as eleições de 2022 aconteçam e sejam válidas”, disse o militante do PCdoB.
O protesto de outubro citado por ele foi convocado pelo PT que, ao contrário do PDT, o PCdoB e PSB, se recusou a participar das mobilizações deste domingo, atitude também tomada pelo PsoL. Vale destacar que os dois grupos organizadores dos eventos de hoje, encabeçaram os protestos que levaram à derrubada da ex-presidente Dilma Rousseff (PT) do poder, em 2016.
Para o presidente regional do Cidadania/DF, Chico Andrade, o movimento unificado contra o presidente Bolsonaro ainda ganhará força nas ruas e no Congresso. Andrade lamentou a ausência dos dois grandes partidos de esquerda. “Foi uma pena terem se negado, a gente teria botado muito mais gente na rua. (...) (A manifestação) representa o sentimento de 70% da população. Ou todo mundo se une ou briga por mais dois anos, e ele vai tentar golpe mais uma vez”, alerta o representante do Cidadania.
São Paulo
Na avenida paulista, segundo informações do jornal Valor Econômico, os manifestantes não chegaram a ocupar metade de um quarteirão. O governador de São Paulo, João Doria, esteve presente. Ao relembrar o movimento “Diretas Já”, Dória inflamou os participantes afirmando que, hoje, existem muito mais recursos para uma mobilização nesta esfera. “Não tínhamos em 1984 as redes sociais, não tínhamos a internet, mas tínhamos coração. É isso que vai nos mover”, disse.
Rio de Janeiro
Terra Natal de Bolsonaro, a diversidade também tomou conta das ruas do Rio de Janeiro, na Orla de Copacabana. O ato foi puxado por grupos que fizeram campanha para o presidente em 2018 e, decepcionados com sua gestão, hoje buscam pelo impeachment. Também no Rio, as bandeiras do MBL e do VPR se misturaram às das centrais sindicais, partidos e grupos de esquerda como o PDT, UNE (União Nacional dos Estudantes) e a CTB.
Até o momento, nenhuma Polícia Militar dos estados ou organizadores divulgaram a estimativa de público.
Fonte: Correio Braziliense
https://www.correiobraziliense.com.br/politica/2021/09/4949096-baixa-adesao-e-pluralidade-politica-marcam-protestos-contra-bolsonaro.html
Terras indígenas: STF suspende sessão e retoma julgamento nesta quinta
Corte poderá decidir sobre marco temporal de demarcações de terras
André Richter / Agência Brasil
O Supremo Tribunal Federal (STF) suspendeu mais uma vez o julgamento que pode analisar o marco temporal para demarcações de terras indígenas. Na sessão de hoje (8), a expectativa era pela leitura do voto do relator, ministro Edson Fachin, mas houve apenas uma manifestação inicial, sem conclusão de mérito. O julgamento será retomado amanhã (9).
Protesto contra o Marco Temporal
O STF julga o processo sobre a disputa pela posse da Terra Indígena Ibirama, em Santa Catarina. A área é habitada pelos povos Xokleng, Kaingang e Guarani, e a posse de parte da terra é questionada pela procuradoria do estado.
Durante o julgamento, os ministros poderão discutir o chamado marco temporal. Pela tese, os indígenas somente teriam direito às terras que estavam em sua posse no dia 5 de outubro de 1988, data da promulgação da Constituição Federal, ou que estavam em disputa judicial nesta época.
O processo tem a chamada repercussão geral. Isso significa que a decisão que for tomada servirá de baliza para outros casos semelhantes que forem decididos em todo o Judiciário.
Fonte: Agência Brasil
https://agenciabrasil.ebc.com.br/justica/noticia/2021-09/stf-suspende-sessao-e-retoma-julgamento-de-terras-indigenas-amanha#
Metrópoles: Um país à beira de um ataque de nervos - O que esperar deste 7/9
Ameaças de ruptura institucional após atos da militância bolsonarista em Brasília e em São Paulo aumentam tensão no Brasil
Raphael Veleda / Tácio Lorran/ Otávio Augusto / Metrópoles
O Brasil que chega a este 7 de setembro oscila em um mar de incertezas. Uma nação tensa pela possibilidade defendida por muitos militantes do presidente Jair Bolsonaro (sem partido) de aproveitar os atos de apoio ao chefe do Executivo federal para forçar uma ruptura institucional, com “fechamento do Supremo Tribunal Federal (STF) e do Congresso”. Um país atemorizado pela presença de policiais armados como manifestantes e de eventuais paralisações de caminhoneiros ou de conflitos violentos entre fiéis bolsonaristas e opositores – que também anunciaram protestos. Um país, pelo lado dos bolsonaristas, esperançoso de que atos de grandes proporções em Brasília e em São Paulo, neste feriado da Independência, sejam o início do fortalecimento de um governo que vem colhendo derrotas no Judiciário e no Legislativo, nem que seja às custas das instituições democráticas.
Bolsonaristas mais moderados acreditam estar gestando uma “Nova Independência”, na qual seria possível mostrar ao sistema que o presidente Bolsonaro tem apoio popular – desmentindo o que indicam as pesquisas de opinião. Integrantes da oposição, por sua vez, temem violência e avaliam, em alguns casos, tratar-se de um antecedente de um possível golpe.
A mobilização em Brasília começou bem antes do previsto. No intuito de evitar desordem, a Polícia Militar do DF havia fechado a Esplanada dos Ministérios para o trânsito desde a noite de domingo (5/9), mas cedeu à pressão de manifestantes na noite de ontem e abriu a via para uma carreata de caminhões e ônibus que trouxeram milhares de pessoas para a capital.
O combinado era que esses veículos dariam apenas uma volta pela via, mas eles foram estacionados nas seis faixas e centenas de pedestres começaram a ocupar a região com barracas e sacos de dormir, antecipando o ato. Alguns manifestantes chegaram a arrancar grades da barreira montada em frente ao Congresso, mas foram interrompidos por PMs e por colegas militantes.
A presença precoce de milhares de pessoas na Esplanada coloca em xeque a estratégia da PM. A corporação pretendia revistar todo mundo que entrasse na Esplanada nesta terça e impedir a presença de veículos – e de armas.
Eixos de apoio ao presidente
Os atos pró-governo contam com apoio de evangélicos, ruralistas, caminhoneiros e até de policiais militares. Setores mais radicais do bolsonarismo têm solicitado que o presidente Jair Bolsonaro, por ser o comandante supremo das Forças Armadas, tome medidas mais drásticas contra seus antagonistas. Na Esplanada, na noite de ontem, já havia profusão de cartazes com pedidos desse tipo, apesar de a pauta oficial das manifestações ser a “liberdade de expressão”.
Nas últimas semanas, bolsonaristas foram alvo de mandados de busca e apreensão e de prisão, requeridos pela Procuradoria-Geral da República e autorizados pelo ministro do Supremo Tribunal Federal (STF) Alexandre de Moraes, devido ao extremismo adotado durante a convocação das manifestações.
A Polícia Federal (PF) prendeu, no fim da tarde de segunda-feira (6/9), o ex-policial militar Cássio Rodrigues Costa Souza, de Minas Gerais. Ele foi preso após ter publicado nas redes sociais, na sexta-feira (3/9), uma ameaça a Moraes. “Terça-feira [7 de setembro] vamos te matar e matar toda a sua família, seu vagabundo”, escreveu no Twitter o ex-militar, que depois apagou a postagem.
Recentemente, também foram alvo de mandados o caminhoneiro Marcos Antônio Pereira Gomes, conhecido como “Zé Trovão”, que está foragido; o cantor sertanejo Sérgio Reis; o blogueiro cearense Wellington Macedo de Souza; e o presidente do PTB, Roberto Jefferson; dentre outros.
O que esperar de hoje?
O diretor-presidente do Fórum Brasileiro de Segurança Pública, Renato Sérgio de Lima, aposta haver uma considerável possibilidade de episódios de violência nesta terça. Ele diz que o cenário é imponderável e que qualquer faísca pode levar a uma guerra aberta. “Todas [as capitais] têm cenários de contingência. É torcer pra que funcionem e que não aconteçam depredações”, afirma.
“Os comandos estão preparados. Ninguém vai ser pego de surpresa, mas todos sabem que têm um desafio. É como fazer policiamento de torcida de futebol, saber que o confronto está sendo pensado. Então, é ir pra administrar grupo que quer brigar com outro”, continua, em conversa com o Metrópoles.
Discurso inflamado
A deputada federal Carla Zambelli (PSL-SP), uma das parlamentares mais alinhadas ao presidente Bolsonaro, afirma que o ato tem por objetivo demonstrar que o povo brasileiro está “unido pela liberdade e pelos valores da Constituição”. Ela sustenta que não está indo para a rua para provocar baderna ou infringir qualquer lei.
“Será um sinal claro aos Poderes de que a população não está passiva e não permitirá arroubos autoritários em nosso país. Queremos mostrar à mídia, aos Poderes e ao mundo de que lado o povo brasileiro está: o lado da verdade, da liberdade e da Constituição Federal. […] Esperamos que aqueles que ultrapassaram as quatro linhas da Constituição possam escutar a voz das ruas. A expectativa é que todas as ações que aviltaram a Constituição Federal sejam revistas e que possamos continuar nossa agenda de reconstrução do país”, afirmou, em mensagem ao Metrópoles.
O deputado federal Alexandre Frota (PSDB-SP), ex-bolsonarista, afirma, por sua vez, que a manifestação se tornou “criminosa e antidemocrática” a partir do momento em que um dos apoiadores, preso na segunda-feira (6/9) pela Polícia Federal, afirmou que um empresário estaria oferecendo dinheiro pela “cabeça” do ministro do STF Alexandre de Moraes, e bolsonaristas passaram a exigir insistentemente o fechamento da Suprema Corte e do Congresso.
“Os riscos são os mais variados. Estamos lidando com pessoas extremamente radicais, ideológicas, covardes, acostumadas a agredir mulheres e a imprensa. Então, pode acontecer de tudo. […] Estamos falando de um governo afogado em corrupção, que tenta agora, de alguma forma, mostrar que o povo está com ele. Mas quem está com ele é, na verdade, o bolsonarismo. Ele não conseguiu furar o teto dessa bolha”, dispara o parlamentar paulista, em áudio ao Metrópoles.
Fonte: Metrópoles
https://www.metropoles.com/brasil/um-pais-a-beira-de-um-ataque-de-nervos-o-que-esperar-deste-7-de-setembro
Pesquisa: desaprovação do governo Bolsonaro bate recorde, com 61%
Desempenho do presidente também atingiu a pior fase, com 64% dos entrevistados desaprovando Bolsonaro
Estado de Minas
Um dia antes das manifestações que prometem tomar às ruas neste 7 de Setembro, pesquisa divulgada pelo Instituto Atlas, nesta segunda-feira (6/9), aponta que o percentual de brasileiros que consideram o governo do presidente Jair Bolsonaro (sem partido) ruim ou péssimo chegou a 61%. É o maior índice registrado até o momento.
O desempenho pessoal do presidente também atingiu a pior fase. De acordo com o levantamento, 64% dos entrevistados desaprovam o presidente.
Ainda segundo a pesquisa, o percentual de pessoas que avaliam o governo como ótimo/bom é de 24%. Aqueles que consideram Bolsonaro regular somam 14%, e 1% não soube responder.
Em julho, na sondagem anterior, 59% consideravam o governo Bolsonaro ruim/péssimo, 26% ótimo/bom, 15% regular e 1% não soube responder. A desaprovação do presidente foi representada por 62% das respostas.
"A tendência continua sendo de deterioração. No entanto, há um núcleo-duro do bolsonarismo que continua muito resiliente, e essa tendência de erosão será cada vez mais lenta", avalia o cientista político Andrei Roman, CEO do Atlas Intel.
O Instituto Atlas coletou respostas de 3.146 pessoas por meio de questionário on-line, entre 30 de agosto e 4 de setembro. A margem de erro é de dois pontos percentuais para mais ou para menos.
O 7 de SetembroPUBLICIDADE
As manifestações do 7 de Setembro foram inflamadas pelo presidente Jair Bolsonaro (sem partido). Nos últimos meses, ele vem falando para apoiadores que ganhou as eleições presidenciais de 2018 em primeiro turno.
Para o presidente, as eleições foram fraudadas pelo Tribunal Superior Eleitoral (TSE). As declarações ampliaram as tensões entre Bolsonaro e o presidente do TSE, ministro Luís Roberto Barroso, também ministro do STF.
Barroso defende que as eleições são justas e que as declarações do presidente não passam de fake news.
Após diversos xingamentos do presidente direcionados a Barroso, ao TSE e também ao STF, o ministro Alexandre de Moraes incluiu Bolsonaro no inquérito das fake news.
A ação implodiu uma verdadeira “guerra” contra o Supremo. Agora, apoiadores do presidente marcham a Brasília para protestar contra a Corte, pedir o voto impresso e auditável, o impeachment de Barroso e Moraes, e caso a Corte não seja extinta, a implantação de um regime militar.
Fonte: Correio Braziliense / Estado de Minas
https://www.correiobraziliense.com.br/politica/2021/09/4948039-pesquisa-desaprovacao-do-governo-bolsonaro-bate-recorde-com-61.html
'Politização, extremismo e manipulação ameaçam o Brasil'
Massa das pessoas de bem não deve servir de escudo para extremistas, irresponsáveis e inconsequentes
Carlos Alberto dos Santos Cruz / O Estado de S.Paulo
7 de Setembro é o aniversário da Independência do Brasil. Dia especial, sempre comemorado com desfiles escolares e militares, recreação e atividades culturais exaltando a história e as cores nacionais.
Neste ano, o feriado e as cores nacionais foram sequestrados por interesses políticos.
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As manifestações dentro da lei são válidas e importantes. As liberdades de expressão e de opinião são fundamentais. No entanto, não se deve confundir liberdade de opinião com liberdade de acusação e de ações irresponsáveis.
A vontade popular é bem intencionada. Os fanáticos não representam a maioria da população ordeira que se manifesta. Extremistas não representam aqueles que votaram por transformações em ambiente de paz, legalidade e prosperidade.
Não é hora de rodeios. Os riscos precisam ser avaliados e mitigados, pois a politização, o extremismo e a manipulação da opinião pública ameaçam gravemente o Brasil. Alguns “super-heróis” irresponsáveis de internet empurram pessoas de boa-fé para o radicalismo e a violência. Aqueles que estimulam ilegalidades desaparecem e ficam impunes, deixando o preço para os inocentes úteis. Os fanfarrões estimulam ações, mas não têm coragem de assumir responsabilidades e nem são os primeiros a liderar as ilegalidades propostas.
O fanatismo de pessoas e grupos sempre acaba em violência. Se não generalizada, ao menos em atos isolados. As autoridades e as pessoas de bem não podem deixar que isso aconteça. Normalmente a maioria é motivada por interesses honestos, mas os extremistas são motivados por interesses pessoais, campanha política e ideologia extremada.
Há poucos dias, em visita do presidente da Guiné-Bissau ao Brasil, a Esplanada dos Ministérios teve os postes enfeitados alternadamente, de maneira organizada, com as cores verde e amarelo do Brasil e verde, amarelo e vermelha da Guiné-Bissau. Vi pessoas indignadas, dizendo que era absurda a ousadia da “esquerda”; vi outros dizendo que era coisa "da direita”, tentando incriminar a esquerda, violando as cores verde e amarelo com a cor vermelha. Esse é um exemplo do fanatismo ignorante e inconsequente. Os extremos sempre irão se acusar mutuamente.
Populistas e oportunistas se manifestam de maneira demagógica, com discursos incentivando a violência e palavras de ordem sem objetividade, mas com aspirações teoricamente válidas – "liberdade", "segunda independência" (de quem?), "última excelente oportunidade" (para que?), "estamos em guerra" (com quem?), ultimatos fanfarrões sem dizer para quem, incentivo para comprar armas por motivação política (total irresponsabilidade e inconsequência), Brasil à beira do abismo, teoria da conspiração, e, finalmente, a grotesca necessidade de um salvador da Pátria. Tudo isso estimula o ódio e a agressão a instituições e pessoas.
Militares (Forças Armadas, policiais e bombeiros) têm o direito de ter preferências políticas e partidárias, mas também têm responsabilidade institucional. Militares fazem parte de instituições que têm como fundamentos a disciplina e a hierarquia. São instituições armadas para defender a Pátria, as instituições, a lei e a ordem. Não é possível ser militar apenas quando interessa. Os militares têm responsabilidade institucional com o Estado brasileiro, com a Constituição, e não podem cair na armadilha de serem arrastados como instrumento de uso político individual e de grupos. Polícias e bombeiros militares são muito bem preparados e têm sua estrutura hierárquica estadual, subordinadas aos governadores e são comprometidos com a proteção das populações de seus Estados. Incentivar militares a romper suas obrigações legais e seu comportamento institucional e estimular a quebra da disciplina e da hierarquia é subversão. Sempre foi.
Casos isolados de violação da disciplina não caracterizam as instituições e precisam ser tratados pelas autoridades de acordo com a lei.
O governo não pode jogar a sua responsabilidade política para as Forças Armadas e Polícias Militares. Ele precisa é ter coragem e capacidade de assumir as suas obrigações.
A maneira mais eficiente de corrigir e evitar problemas é governar corretamente, promover a união e a paz social, estabelecer critérios, praticar a transparência ao máximo, combater a corrupção, eliminar privilégios e reduzir a desigualdade social.
A grande massa das pessoas de bem, motivada por boas intenções, não deve servir de escudo para extremistas, irresponsáveis e inconsequentes.
O 7 de Setembro é dia de celebração e não deve ser transformado em dia de conflito.
Fonte: O Estado de S. Paulo
https://politica.estadao.com.br/noticias/geral,artigo-o-7-de-setembro-e-dia-de-celebracao-e-nao-deve-ser-transformado-em-dia-de-conflito,70003832836
Carta: Brasil vive ameaça de 'insurreição' antidemocrática
Grupo composto por políticos de 27 países alerta para "insurreição" e riscos à democracia brasileira neste Sete de Setembro
BBC Brasil
"Estamos muito preocupados com a iminente ameaça às instituições democráticas brasileiras, e estaremos vigilantes do 7 de Setembro em diante. Os brasileiros lutaram décadas para garantir a democracia ante o regime militar, e não se pode deixar que Bolsonaro roube isso deles agora."
Para os signatários da carta, divulgada na segunda-feira (6/9), as manifestações convocadas por Bolsonaro e seus aliados, como "grupos racistas, policiais militares e autoridades do governo federal", buscam intimidar instituições como o Supremo Tribunal Federal (STF) e o Congresso e ampliam os temores de golpe de Estado na terceira maior democracia do mundo.
O presidente brasileiro, como cita o documento, tem ampliado suas ameaças autoritárias. Ele já disse publicamente diversas vezes que pode impedir a realização de eleições presidenciais em 2022. Pesquisas de intenção de voto apontam como favorito o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT).
Em suas declarações, Bolsonaro tem deixado de lado a defesa do voto impresso (proposta derrotada no Congresso) e passado a acusar ministros do STF de atuar fora da Constituição, o que lhe serviria de pretexto para agir "fora das quatro linhas da Constituição".
Os signatários da carta aberta contra os protestos de 7 de Setembro citam uma mensagem compartilhada por Bolsonaro que fala em "contragolpe" contra o Congresso, o Judiciário e a esquerda, que teriam, sem apresentar provas, perseguido o presidente e esvaziado seu poder.
Bolsonaro, seus filhos e aliados se tornaram alvo de investigações sob suspeita de ligação com atos antidemocráticos, ataques a ministros do Supremo e disseminação de informações falsas, entre outras acusações. Além disso, o STF também garantiu que prefeitos e governadores agissem com autonomia na pandemia de covid-19, o que é visto por Bolsonaro como um ataque a suas prerrogativas.
O documento sobre os riscos dos protestos no Brasil foi assinado por 158 líderes políticos e ativistas, entre eles José Zapatero (ex-primeiro-ministro da Espanha), os ex-presidentes Ernesto Samper (Colômbia), Fernando Lugo (Paraguai), Martín Torrijos (Panamá) e Rafael Correa (Equador), além de parlamentares de países como Reino Unido, EUA, França, Espanha, México, Alemanha, Argentina, Chile, Austrália, Grécia e Nova Zelândia.
Na carta, os signatários comparam os protestos de 7 de Setembro com a invasão do Congresso dos Estados Unidos em 6 de janeiro de 2021 por apoiadores incitados pelo então presidente Donald Trump, que não aceitava a derrota nas urnas para Joe Biden.
O ato, que acabou com cinco mortos, foi considerado uma tentativa de golpe de Estado por alguns políticos e especialistas ao tentar impedir a oficialização do resultado das urnas.
Depois da invasão violenta na capital dos EUA, dezenas de manifestantes acabaram identificados pela polícia e condenados à prisão pela participação na insurreição.
Temores de violência em Brasília e SP no 7 de Setembro
Os protestos marcados para 7 de setembro em Brasília e em São Paulo, principalmente, têm despertado temores de violência física e patrimonial.
O STF, por exemplo, estabeleceu planos para "todos os cenários possíveis": de manifestação pacífica a tentativas de depredação e invasão do edifício. O clima entre os ministros da Corte é de preocupação e atenção à adesão de policiais militares aos protestos (algo proibido por lei) e à reação de Bolsonaro caso haja violência ou ataques ao Congresso ou Supremo.
Para tentar mitigar riscos de manifestantes tentarem invadir o Congresso e o Supremo, ou até jogar bombas caseiras nos edifícios, o Governo do DF decidiu restringir os atos à Esplanada dos Ministérios.
Isso significa que os manifestantes não poderão "descer" a avenida em direção à Praça dos Três Poderes, onde ficam Palácio do Planalto, Congresso Nacional e Supremo Tribunal Federal.
Em São Paulo, onde Bolsonaro também discursará, está previsto um forte de esquema de segurança para acompanhar a manifestação na avenida Paulista e evitar confrontos violentos com participantes de protestos ligados a grupos de esquerda a poucos quilômetros dali, no vale do Anhangabaú. Atos como o Grito dos Excluídos ocorrem tradicionalmente no 7 de setembro, feriado nacional em homenagem à independência do país.
Eventual participação de militares e policiais militares
Pela legislação brasileira, nenhum militar ou policial militar da ativa pode participar de atos políticos com símbolos que remetam às instituições onde eles atuam. Só podem participar de manifestações se estiverem à paisana, como cidadãos comuns, e desarmados.
Se descumprirem essa regra, podem ser enquadrados no Código Penal Militar pelos crimes de motim ou revolta (quando há dois ou mais envolvidos). E as penas podem chegar a 20 anos de prisão em regime fechado.
Mas há expectativa de que número significativo de policiais da reserva ou de folga no dia compareçam aos protestos.
Especialistas explicam que a lei permite que qualquer cidadão peça mudanças de políticas públicas, desde que seja de maneira democrática. Mas esse não é o caso, segundo eles.
"Não é um pedido de mudança de política pública. Está claro nas entrelinhas que eles querem uma quebra na democracia. É um discurso como se fosse a favor da democracia, mas pedem que não tenha um Congresso que atrapalhe Bolsonaro, sem STF e sem um Poder Judiciário independente", disse Luiz Alexandre Souza da Costa, cientista político, professor da Uerj e major da reserva da Polícia Militar do Rio de Janeiro, em entrevista à BBC News Brasil.
Fonte: BBC Brasil
https://www.bbc.com/portuguese/brasil-58466032