posse

Foto: Gabriela Bila/Folhapress

Revista online | No ataque à democracia, cultura também é alvo da fúria bolsonarista

Henrique Brandão*, jornalista, especial para a revista Política Democrática online (51ª edição: janeiro/2023)

O dia 8 de janeiro se prenunciava um domingo tranquilo, o primeiro depois da emocionante, e carregada de simbolismo, posse de Lula. No entanto, pouco antes das 15 horas, uma horda de militantes de extrema direita, que havia saído do acampamento em frente ao Quartel General (QG) do Exército em Brasília, invadiu a Praça do Três Poderes e promoveu a mais perigosa e explícita tentativa de tomada do poder fora do marco constitucional estabelecido pela Constituição de 1988

As palavras de ordens proferidas, a não aceitação do resultado da eleição, o pedido de estabelecimento de um governo militar-fascista, deixavam claras as intenções dos mais de 4.000 golpistas que se dirigiam ao coração da República, dispostos a vandalizar e quebrar tudo ao seu alcance. 

Estava óbvio, conforme as imagens de TV eram transmitidas para o mundo inteiro, que o objetivo era criar o caos e gerar o terror. Não era, nunca foi, uma manifestação com intenções políticas pacíficas, como algumas lideranças da direita tentaram caracterizar o quebra-quebra instaurado nos prédios – e em seu entorno – que foram alvos dos ataques que os vandalizaram. 

As invasões e depredações tinham alvos muito bem definidos. Não à toa, os prédios visados abrigam as sedes dos Poderes Legislativo, Executivo e Judiciário. Essa separação entre os poderes, cada qual com suas atribuições, é a base da doutrina constitucional liberal na qual se assentam, hoje em dia, as nações do mundo Ocidental, inspirada na obra o Espírito das Leis (1748), de Montesquieu (1689-1755) e adotada pela primeira vez na Revolução Francesa (1789-99), que marcou o fim do Absolutismo na França.

As cenas registradas pelas emissoras de TV, pelas câmeras dos profissionais de imprensa (muitos foram agredidos e tiveram os equipamentos roubados), nos circuitos internos de segurança dos prédios invadidos e até pelos próprios manifestantes são lamentáveis.

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Chamou a atenção, no rescaldo dos escombros, a depredação de obras de arte expostas nesses palácios. Quase nenhuma passou incólume pela cólera dos invasores. A cena de um bárbaro jogando ao chão um relógio de Balthazar Martino, do Século XVII, trazido ao Brasil em 1808 por Dom João VI, é estarrecedora. 

Outro invasor, em fúria, fez sete rasgos na tela As Mulatas (1962), de Di Cavalcanti (1897-1976), principal peça do Salão Nobre do Palácio do Planalto. A tela retrata bem a produção de Di Cavalcanti e traz em sua composição tema recorrente do grande pintor e desenhista, que tem a obra marcada por retratar personagens e figuras icônicas do povo brasileiro.

A escultura de Frans Krajcberg (1921-2017) Galhos e sombras também foi quebrada em diversos pontos. A obra se utiliza de galhos de madeira oriundos de queimadas, colhidos na Mata Atlântica, no Sul da Bahia. Outra escultura, O Flautista, de Bruno Giorgi (1905-1993), foi destruída.

Na Câmara dos Deputados, o alvo foi a linda estátua de Victor Brecheret (1894-1955), A Bailarina, produzida nos anos de 1920, que foi arrancada de seu pedestal.

No STF, vandalizaram o famoso monumento de Alfredo Ceschiatti (1918-1989), localizado em frente ao prédio do Poder Judiciário e que, ao longo do tempo, se transformou em um dos emblemas mais conhecidos de Brasília, por representar a imparcialidade da Justiça.

Não chega a ser surpresa a destruição de símbolos da cultura brasileira pela manada bolsonarista. Durante os quatro anos de seu nefasto reinado, o que imperou na área da cultura foi a tentativa de aniquilamento total do setor. A começar pelo chefe supremo da tropa, que acabou com o Ministério da Cultura (MinC), transformando-o em um apêndice inútil do Ministério do Turismo. 

O secretário de Cultura de Bolsonaro no início de 2020, Roberto Alvim, personificou o modo de agir da extrema direita. Em vídeo nas redes sociais, imitou Goebbles, o ministro da Propaganda de Hitler, a quem é atribuída a célebre frase: “Quando ouço falar em cultura, saco o meu revólver”. Acabou demitido, por pressão da opinião pública. 

Confira, a seguir, galeria:

Atos pró - Bolsonaro levam apoiadores a diversas cidades do país | Foto: Agência Brasil
Bolsonaristas rezam de mãos dadas em manifestação no QG do exército |  Foto: Agência Brasil
Avenida em frente a casa de Bolsonaro é fechada para o trânsito | Foto: Agência Brasil
Bolsonaristas tentam invadir sede da polícia federal  | Foto: Metrópoles
Manifestantes incendiam ônibus e carros em protesto contra a prisão de um indígena bolsonarista | Foto: BBC News Brasil
Acampamento de bolsonaristas no QG do Exército | Foto: Agência Brasil
Manifestações a favor e contra Bolsonaro são registradas em Brasília | Agência BrasilManifestações a favor e contra Bolsonaro são registradas em Brasília | Agência Brasil
Atos pró - Bolsonaro levam apoiadores a diversas cidades do país | Foto: Agência Brasi
Bolsonaristas rezam de mãos dadas em manifestação no QG do exército | Foto: Agência Brasil
Avenida em frente a casa de Bolsonaro é fechada para o trânsito | Foto: Agência Brasil
Bolsonaristas tentam invadir sede da polícia federal | Foto: Metrópoles
Manifestantes incendeiam ônibus e carros em protesto contra a prisão de um indígena bolsonarista | Foto: BBC News Brasil
Acampamento de bolsonaristas no QG do Exército | Foto: Agência Brasil
Manifestações a favor e contra Bolsonaro são registradas em Brasília | Agência Brasil
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Atos pró - Bolsonaro levam apoiadores a diversas cidades do país | Foto: Agência Brasi
Bolsonaristas rezam de mãos dadas em manifestação no QG do exército |  Foto: Agência Brasil
Avenida em frente a casa de Bolsonaro é fechada para o trânsito | Foto: Agência Brasil
Bolsonaristas tentam invadir sede da polícia federal  | Foto: Metrópoles
Manifestantes incendeiam ônibus e carros em protesto contra a prisão de um indígena bolsonarista | Foto: BBC News Brasil
Acampamento de bolsonaristas no QG do Exército | Foto: Agência Brasil
Manifestações a favor e contra Bolsonaro são registradas em Brasília | Agência Brasil
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Modernismo e nazismo jamais se bicaram. Basta se lembrar da exposição Arte Degenerada (Entartete Kunst), promovida pelo regime nazista, em 1937. A exposição reuniu obras modernistas dos acervos de museus alemães e marcou o ápice da campanha do regime nazista contra a arte moderna, considerada artisticamente indesejável e moralmente prejudicial. 

Não é mera coincidência, portanto, que a maioria das obras avariadas no putsch da extrema direita seja de artistas que participaram do modernismo brasileiro, em todas as suas formas de expressão, presentes nos prédios dos Três Poderes, a começar pela arquitetura, imortalizada no traço de Oscar Niemeyer, que sempre chamou artistas contemporâneos para compartilhar os espaços públicos com obras de suas lavras. Athos Bulcão, parceiro constante de Niemeyer, foi outro que teve obras vandalizadas. Esse atentado é também uma agressão à cultura brasileira.  Tudo presente naqueles prédios públicos pertence ao povo brasileiro. 

Que todos os envolvidos, no rigor da lei, sejam punidos, sem exceções. Os bagrinhos, os financiadores, os incentivadores e ideólogos da invasão. Civis, ricos ou pobres. Militares, de alta ou baixa patente. 

A democracia sairá fortalecida. É o que espera o povo brasileiro.

Sobre o autor

*Henrique Brandão é jornalista.

** Artigo produzido para publicação na Revista Política Democrática Online de janeiro/2023 (51ª edição), produzida e editada pela Fundação Astrojildo Pereira (FAP), sediada em Brasília e vinculada ao Cidadania.

*** As ideias e opiniões expressas nos artigos publicados na Revista Política Democrática Online são de exclusiva responsabilidade dos autores, não refletindo, necessariamente, as opiniões da Revista.

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Pouco a pouco, o presidente da República retoma o controle político da situação | Imagem: reprodução/Outras Palavras

Ataque a Brasília: o silêncio da banca

Outras Palavras*

O intervalo foi de apenas uma semana. Entre a maravilhosa e emocionante jornada da posse de Lula na Esplanada dos Ministérios, no 1º de janeiro, e a crueldade criminosa dos atos terroristas perpetrados pela horda fascista do bolsonarismo, neste domingo, fica o retrato contraditório de um país que saiu dividido do processo eleitoral. Não restam muitas dúvidas a respeito da responsabilidade direta do governador reeleito do Distrito Federal (DF), Ibaneis Rocha, bem como de seu secretário de Segurança Pública, Anderson Torres. Ambos sabiam exatamente o que estava sendo preparado para aquele fim de semana, a partir das articulações dos golpistas acampados em frente ao Quartel General do Exército em Brasília.

Além disso, o sistema de informações do governo federal também tinha informações a respeito das caravanas que estavam sendo organizadas nos estados, em especial das regiões Sul e Centro Oeste. Ibaneis sempre foi um aliado de todas as horas do presidente fujão, tendo oferecido a área de segurança do DF para a famiglia Bolsonaro. Anderson Torres é um servidor da Polícia Federal, oferecendo uma fidelidade canina ao esquema de poder derrotado nas urnas. Tanto que foi nomeado Ministro da Justiça e Segurança Pública logo depois da saída de Moro em 2021. Em mais um gesto de reconhecimento do governador do DF, agora foi agraciado com a pasta distrital da segurança. Fez todo o corpo mole possível, sonegou informações, deixou o comando da Polícia Militar (PM) local colaborar como quis com os terroristas e fugiu para os Estados Unidos, com a intenção explícita de se juntar ao clã na Florida.

O Ministro da Defesa nomeado por Lula foi outro fator que ajudou indiretamente na empreitada golpista. José Múcio chegou passando pano nas manifestações em frente às instalações militares pelo Brasil afora, classificando-as como democráticas, tanto que teria amigos e familiares participando das mesmas. Uma loucura! Ora, em uma situação como esta, o recado foi entendido pelos terroristas como um claro sinal verde para seus atos criminosos. Daí para frente, tratou-se de uma sucessão de erros e equívocos na administração da segurança e na estratégia mesmo militar de proteção dos edifícios e da própria Praça dos Três Poderes. O Ministro Flávio Dino se diz enganado pelo governo distrital com a ausência de comando da segurança militar do Palácio do Planalto, o número reduzido de efetivos de segurança para impedir o aceso às áreas estratégicas da Esplanada e até mesmo a cumplicidade da PM/DF com os golpistas, oferecendo apoio às movimentações na região.

Financismo de rabo preso com o golpismo

Depois de todo o estrago consumado, no final da tarde Lula promove a intervenção na área de segurança do DF até o final de janeiro e o ministro do STF e presidente do TSE, Alexandre de Moraes, afasta o governador do DF de suas funções até 31 de março. No início da semana, a realização da reunião com todos os 27 governadores foi um marco importante no processo de construção política de uma união nacional contra o terrorismo bolsonarista. Neste momento, é mais do que fundamental aprofundar o isolamento político do fugitivo e de seus seguidores, marcados pelo fanatismo, que antes pregavam e agora praticam o terror. A manifestação de solidariedade dos governos do resto do mundo com Lula e a condenação do terrorismo também contribuem para afastar qualquer ameaça de golpe militar. Pouco a pouco, o presidente da República retoma o controle político da situação, mas ainda precisa resolver a complexa e sensível “questão militar”. A presença de Múcio na pasta da Defesa deveria ser uma questão de tempo, o necessário para que Lula encontre uma solução que seja de sua absoluta confiança e também conte com algum respaldo nas Três Armas.

O fato interessante é que não saiu nenhuma nota, entrevista ou declaração do povo do financismo a respeito da grave crise que o país viveu e da qual ainda sente os efeitos. Aliás, é sempre assim. Os escribas e especialistas a mando do sistema financeiro adoram deitar falação e cobrar publicamente os governos quando entendem que a sua pauta de austeridade fiscal, privatização e liberalização está correndo algum tipo de perigo. E dá-lhe matérias alertando para catástrofe de aumentos de despesas governamentais na área social, os riscos de um “retrocesso” no processo de venda das empresas estatais ou de alguma flexibilização no arcabouço da política fiscal.

E os efeitos econômicos do terror?

 O financismo não parece considerar o famoso “risco”, tal como costumam quantificar, representado pelas ações terroristas financiadas e patrocinadas por setores importantes de nossas classes dominantes. Apesar de toda a habilidade demonstrada por Lula em “fazer desse limão uma limonada”, o fato concreto é que a imagem internacional do Brasil sofreu arranhões com as cenas, ocupando espaços dos grandes meios de comunicação nos cinco continentes. Nada que não seja recuperável, mesmo no curto prazo. Mas esse tipo de ação não merece atenção, nem nota, nem repúdio da parte desse povo da banca.

Eles adoram calcular o impacto de tal e qual medida voltada a atender necessidades da população mais carente, como o reajuste do Bolsa Família, o aumento real do salário mínimo e outras. Mas não mandaram seus estagiários prepararem a planilha para estimar os custos diretos e indiretos provocados pela depredação do patrimônio físico, cultural e histórico daquele dia triste em que o terrorismo tomou conta do centro do poder em Brasília. Ou ainda não se preocupam em botar suas equipes para realizarem as contas de quais são os custos dos acampamentos, dos transportes e toda a logística que foram bancados pelos empresários que há muito tempo vêm financiando as manifestações golpistas e, agora, o próprio dia do terror.

Silêncio demonstra cumplicidade

Por outro lado, começam a surgir as informações relativas aos movimentos próximos às refinarias e aos ataques contra as linhas e transmissão de energia elétrica em vários cantos do país. Trata-se de claras ações de sabotagem e terrorismo. São custos sociais e econômicos que deveriam ser cobrados na Justiça, juntamente com a condenação pelos crimes tipificados pela legislação antiterrorista. Esse pessoal adora condenar as ações legais e legítimas movidas pelos sindicatos e pressionam a Justiça do trabalho a cobrar das entidades pelo suposto prejuízo causado pelas paralisações. E, agora, como é que fica? Apenas um silêncio que denuncia a cumplicidade e o rabo preso com os golpistas.

Na verdade, outra consequência bastante negativa desse movimento antidemocrático é o retardamento do início do processo de reconstrução nacional. O novo governo já deveria estar se debruçando sobre as pautas de restabelecimento das políticas públicas que foram sistematicamente desmontadas ao longo dos últimos seis anos. Lula poderia estar coordenando as tarefas de recuperação do protagonismo do Estado, uma vez que seu objetivo declarado é fazer 40 anos em 4. Se tal sabotagem era um dos intuitos dos mandantes e financiadores da tentativa de putsch, o fato é que o tiro talvez saia pela culatra. O terceiro mandato pode ter seu início ainda com a ampliação de sua base de apoio político, social e também parlamentar.

O silêncio do financismo sobre os fatos dos últimos dias é carregado de significado. Apesar da oposição de seus principais representantes a algumas das medidas anunciadas por Lula e necessárias para a retomada das atividades econômicas com foco na redução de desigualdades e no desenho de um projeto de desenvolvimento, a cumplicidade com o golpismo pode arranhar sua credibilidade e pode lhes custar mais caro do que imaginam. O governo deve sair fortalecido quando essa poeira toda baixar. E Lula poderá usar esse reforço de autoridade para impulsionar a agenda — que ele sabe ser necessária para que seu terceiro governo — faça mais do que ele conseguiu realizar nos outros dois mandatos. É possível que, no quadro atual, a oposição da banca não encontre tanta ressonância no restante da sociedade. Aguardemos, pois.

Texto publicado originalmente no portal Outras Palavras.


Nas entrelinhas: Simone Tebet no governo Lula esvazia a “terceira via”

Luiz Carlos Azedo/Correio Braziliense*

Qual o significado principal da presença da ex-senadora Simone Tebet no governo Lula? Numa visão economicista, diríamos que servirá de contraponto liberal à política do ministro da Fazenda, Fenando Haddad, supostamente estatizante e sem compromisso com a responsabilidade fiscal, como apontam a maioria dos oposicionistas que criticam o governo Lula por sua política econômica, desde antes mesmo de sua posse. Errado: a presença de Simone Tebet exerce um papel simbólico e político que transcende suas responsabilidades no Ministério do Planejamento e Orçamento: reforça o caráter de centro-esquerda da coalizão democrática de governo. Não é pouca coisa.

É óbvio que a política econômica do novo governo, que está em disputa, terá um papel decisivo para o posicionamento da elite econômica e da classe média que não apoiou Bolsonaro nem Lula no primeiro turno, preferindo Simone Tebet ou Ciro Gomes (PDT). É óbvio que as propostas que rompem a linha de convergência da coalizão e as declarações desastradas sobre pautas específicas dos novos ministros de Lula são um fator de acirramento de desconfianças em relação ao novo governo, que acaba associado ao fracasso da “nova matriz econômica” que levou à derrocada econômica o governo Dilma Rousseff. Mas a questão de fundo, mesmo para esses setores, é política: Simone no governo significa o esvaziamento da chamada “terceira via”, ou seja, da possibilidade de romper a polarização Lula versus Bolsonaro por meio de uma terceira alternativa de poder desde já.

Geraldo Alckmin (PSDB) e Marina Silva (Rede), com 4,76% e 1% dos votos, respectivamente, no primeiro turno das eleições de 2018, por experiência própria, se aperceberam do esvaziamento da “terceira via” a partir daquela eleição. O fracasso levou-os a apoiar Lula sem vacilar. O ex-governador paulista até trocou o PSDB pelo PSB para ter uma legenda que lhe permitisse aceitar o convite de Lula para ser seu vice. Da mesma forma, o então governador de São Paulo Rodrigo Garcia, que concorria à reeleição, diante do mesmo fenômeno, trabalhou fortemente para inviabilizar a candidatura do ex-governador João Doria pelo PSDB. Eduardo Leite (PSDB), mesmo com a desistência de Doria, optou para disputar um segundo mandato no governo do Rio Grande Sul, do qual havia até se desincompatibilizado. Ambos não acreditavam na terceira via. Garcia apoiou Bolsonaro no segundo turno.

Coube a Ciro Gomes (PDT), um sobrevivente de 2018, quando obteve 12,47% dos votos, e a Simone Tebet (MDB) representar o projeto de” terceira via”, que novamente fracassou. Ciro Gomes teve a sua menor votação em quatro disputas: 3,04%. Simone surpreendeu na terceira colocação, mas com 4,6%, ou seja, menos de 1 voto para cada 20 eleitores. Como Lula havia batido na trave no primeiro turno e teve que fazer uma disputa dramática com o presidente Jair Bolsonaro, candidato à reeleição, no segundo turno, o apoio da candidata do MDB ao petista teve um papel decisivo, ainda mais porque Ciro Gomes se recusou a fazer campanha para Lula.

Divergências

Simone nunca foi uma real alternativa de poder, mas seu engajamento na campanha de Lula não somente contribuiu para que o petista aumentasse a votação e ganhasse a eleição, como lhe deu projeção política maior do que tivera no primeiro turno, principalmente por causa das mobilizações de rua, sozinha ou ao lado de Lula. Tanto do ponto de vista eleitoral, em razão da votação que obtivera, quando em razão do alinhamento político com Lula, que a convidou para o Ministério do Planejamento, as possibilidades de projeção política futura de Simone são maiores ao participar do governo. Sem mandato nem apoio do MDB, na oposição, como desejavam alguns aliados que insistem na possibilidade de uma terceira via em 2026, perderia todo o protagonismo político. Além disso, colocaria ambição pessoal acima dos riscos que a democracia corre se contribuísse para desestabilizar o governo Lula.

“Nosso papel, sem descuidar da responsabilidade fiscal, da qualidade dos gastos públicos, é colocar o brasileiro no orçamento”, disse Simone, ontem, ao tomar posse no Ministério do Planejamento, consciente de seu papel no “governo do PT e da frente ampla democrática”. Ao fazê-lo, deixou claro que não renunciaria a convicções políticas: “Ministro Haddad, ministro Alckmin e ministra Esther, temos divergências econômicas”, disse.

Mas de onde vêm essas discordâncias? Dos economistas, que têm sérias divergências e visões de mundo, cada um com um modelo de economia na cabeça. A divergência fundamental está na avaliação do papel do mercado na superação dos problemas econômicos. Economistas neoliberais acreditam que se deixarmos o mercado funcionar livremente tudo se resolverá. Economistas conhecidos como keynesianos e estruturalistas apontam a incapacidade de os agentes resolverem grandes depressões, recessões prolongadas e promover a transformação estrutural ´para o desenvolvimento econômico. Economistas liberais ou “neoclássicos” acreditam no poder dos mercados para levar as sociedades a estados ótimos de bem-estar para as pessoas. Os “novo-keynesianos” acreditam no mercado no longo prazo, mas não no curto prazo.

Entretanto, é por causa dessas divergências que os políticos têm o poder de decisão sobre a política econômica. Suas escolhas são mais importantes do que as teorias econômicas. Quando Lula admite divergências entre seus ministros da área econômica, estabelece o contraditório e, a partir dele, aumenta sua capacidade de acertar nas decisões.

https://blogs.correiobraziliense.com.br/azedo/nas-entrelinhas-simone-tebet-no-governo-lula-esvazia-a-terceira-via/

Lula anuncia composição de seu ministério / Crédito: José Cruz/Agência Brasil

Veja quem são os 37 ministros que farão parte do governo Lula

Jota*

O presidente eleito Luiz Inácio Lula da Silva começou a anunciar os nomes para os ministérios no dia 9 de dezembro: o ex-ministro e ex-prefeito Fernando Haddad (Fazenda); o governador da Bahia, Rui Costa (Casa Civil); o ex-governador e senador eleito Flávio Dino (Justiça); o ex-ministro José Múcio Monteiro (Defesa); e o diplomata Mauro Vieira (Relações Exteriores).

Em pronunciamento no dia 22/12, Lula anunciou mais 16 nomes. Os anunciados para compor o ministério do governo Lula de 2023 foram: Alexandre Padilha (Relações Institucionais), Marcio Macedo (Secretaria-Geral da Presidência),  Jorge Messias (Advocacia-Geral da União), Nísia Trindade (Saúde),  Camilo Santana (Educação), Esther Dweck (Gestão), Márcio França (Portos e Aeroportos), Luciana Santos (Ciência e Tecnologia), Cida Gonçalves (Mulher), Wellington Dias (Desenvolvimento Social), Margareth Menezes (Cultura), Luiz Marinho (Trabalho), Anielle Franco (Igualdade Racial), Silvio Almeida (Direitos Humanos), Geraldo Alckmin (Indústria e Comércio) e Vinícius de Carvalho (Controladoria-Geral da União).

O plantel de ministros foi completo nesta quinta-feira (29/12), com os anúncios de: general Marco Edson Gonçalves Dias (Gabinete de Segurança Institucional), Paulo Pimenta (Secretaria de Comunicação Social), Carlos Fávaro (Agricultura e Pecuária), Waldez Góes (Integração e Desenvolvimento Regional), André de Paula (Pesca), Carlos Lupi (Previdência), Jader Filho (Cidades), Juscelino Filho (Comunicações), Alexandre Silveira (Minas e Energia), Paulo Teixeira (Desenvolvimento Agrário), Ana Moser (Esporte), Marina Silva (Meio Ambiente), Simone Tebet (Planejamento), Daniela do Waguinho (Turismo), Sônia Guajajara (Povos Originários) e Renan Filho (Transportes).

Os ministros anunciados por Lula tomam posse também no dia 1º de janeiro, em cerimônia no Palácio do Planalto. O evento ocorre depois que o próprio Lula for empossado no Congresso Nacional.

Veja quem são todos os 37 ministros do governo Lula

Waldez Góes, ministro da Integração e Desenvolvimento Regional | Foto: Reprodução/Facebook
Marco Edson Gonçalves Dias, ministro do Gabinete de Segurança Institucional | Foto: Reprodução/Gov-BA
Paulo Teixeira, ministro do Desenvolvimento Agrário | Foto: Reprodução/Facebook
Ana Moser, ministra do Esporte | Foto: Reprodução/Facebook
Renan Filho, ministro dos Transportes | Foto: Reprodução/Facebook
Paulo Pimenta, da Secretaria de Comunicação Social | Foto: Reprodução/Facebook
Carlos Fávaro, ministro da Agricultura | Foto: Reprodução/Facebook
Juscelino Filho, ministro das Comunicações | Foto: Reprodução/Facebook
Alexandre Silveira, ministro de Minas e Energia | Foto: Reprodução/Facebook
Daniela do Waguinho, ministra do Turismo | Foto: Reprodução/Facebook
André de Paula, ministro da Pesca e Aquicultura | Foto: Reprodução/Facebook
Jader Filho, ministro das Cidades | Reprodução/Facebook
Marina Silva, ministra do Meio Ambiente | Foto: Reprodução/Facebook
Simone Tebet, ministra do Planejamento | Foto: Reprodução/Facebook
Carlos Lupi, ministro da Previdência Social | Foto: Reprodução/Facebook
Sônia Guajajara, ministra dos Indígenas | Foto: Reprodução/Instagram
Nísia Trindade, ministra da Saúde | Foto: Reprodução/Facebook
Camilo Santana, ministro da Educação | Foto: Reprodução/Facebook
Alexandre Padilha, ministro das Relações Institucionais | Foto: Reprodução/Facebook
Luciana Santos, ministra da Ciência e Tecnologia | Foto: Reprodução/Facebook
Márcio Macêdo, ministro da Secretaria-Geral da Presidência | Foto: Reprodução/Wikipédia,
Esther Dweck, ministra de Gestão | Foto: Divulgação
Cida Gonçalves, ministra da Mulher | Foto: Marcelo Camargo/Agência Brasil
Wellington Dias, ministro do Desenvolvimento Social | Foto: Reprodução/Facebook
Anielle Franco, ministra da Igualdade Racial | Foto: Reprodução/Facebook
Jorge Messias, advogado-geral da União | Foto: Divulgação
Vinicius de Carvalho, ministro da Controladoria-Geral da União | Foto: Reprodução/LinkedIn
Silvio Almeida, ministro dos Direitos Humanos | Foto: Reprodução/Facebook
Márcio França, ministro dos Portos e Aeroportos | Foto: Reprodução/Facebook
Geraldo Alckmin, ministro da Indústria e Comércio | Foto: Reprodução/Facebook
Fernando Haddad, ministro da Fazenda | Foto: Reprodução/Facebook
Rui Costa, ministro da Casa Civil | Foto: Reprodução/Facebook
Flávio Dino, ministro da Justiça | Foto: Reprodução/Facebook
José Múcio Monteiro, ministro da Defesa | Foto: Reprodução/Wikipédia
Mauro Vieira, ministro das Relações Exteriores | Foto: Reprodução/Wikipédia
Margareth Menezes, ministra da Cultura | Foto: Reprodução/Estúdio Gato Louco
Luiz Marinho, ministro do Trabalho | Foto: Reprodução/Facebook
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Waldez Góes, ministro da Integração e Desenvolvimento Regional | Foto: Reprodução/Facebook
Marco Edson Gonçalves Dias, ministro do Gabinete de Segurança Institucional | Foto: Reprodução/Gov-BA
Paulo Teixeira, ministro do Desenvolvimento Agrário  | Foto: Reprodução/Facebook
Ana Moser, ministra do Esporte | Foto: Reprodução/Facebook
Renan Filho, ministro dos Transportes | Foto: Reprodução/Facebook
Paulo Pimenta, da Secretaria de Comunicação Social  | Foto: Reprodução/Facebook
Carlos Fávaro, ministro da Agricultura | Foto: Reprodução/Facebook
Juscelino Filho, ministro das Comunicações | Foto: Reprodução/Facebook
Alexandre Silveira, ministro de Minas e Energia | Foto: Reprodução/Facebook
Daniela do Waguinho, ministra do Turismo | Foto: Reprodução/Facebook
André de Paula, ministro da Pesca e Aquicultura | Foto: Reprodução/Facebook
Jader Filho, ministro das Cidades | Reprodução/Facebook
Marina Silva, ministra do Meio Ambiente | Foto: Reprodução/Facebook
Simone Tebet, ministra do Planejamento | Foto: Reprodução/Facebook
Carlos Lupi, ministro da Previdência Social | Foto: Reprodução/Facebook
Sônia Guajajara, ministra dos Indígenas | Foto: Reprodução/Instagram
Nísia Trindade, ministra da Saúde | Foto: Reprodução/Facebook
Camilo Santana, ministro da Educação | Foto: Reprodução/Facebook
Alexandre Padilha, ministro das Relações Institucionais | Foto: Reprodução/Facebook
Luciana Santos, ministra da Ciência e Tecnologia | Foto: Reprodução/Facebook
Márcio Macêdo, ministro da Secretaria-Geral da Presidência | Foto: Reprodução/Wikipédia,
Esther Dweck, ministra de Gestão | Foto: Divulgação
Cida Gonçalves, ministra da Mulher | Foto: Marcelo Camargo/Agência Brasil
Wellington Dias, ministro do Desenvolvimento Social | Foto: Reprodução/Facebook
Anielle Franco, ministra da Igualdade Racial | Foto: Reprodução/Facebook
Jorge Messias, advogado-geral da União | Foto: Divulgação
Vinicius de Carvalho, ministro da Controladoria-Geral da União | Foto: Reprodução/LinkedIn
Silvio Almeida, ministro dos Direitos Humanos | Foto: Reprodução/Facebook
Márcio França, ministro dos Portos e Aeroportos | Foto: Reprodução/Facebook
Geraldo Alckmin, ministro da Indústria e Comércio | Foto: Reprodução/Facebook
Fernando Haddad, ministro da Fazenda | Foto: Reprodução/Facebook
Rui Costa, ministro da Casa Civil | Foto: Reprodução/Facebook
Flávio Dino, ministro da Justiça | Foto: Reprodução/Facebook
José Múcio Monteiro, ministro da Defesa | Foto: Reprodução/Wikipédia
Mauro Vieira, ministro das Relações Exteriores | Foto: Reprodução/Wikipédia
Margareth Menezes, ministra da Cultura | Foto: Reprodução/Estúdio Gato Louco
Luiz Marinho, ministro do Trabalho | Foto: Reprodução/Facebook
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Waldez Góes, ministro da Integração e Desenvolvimento Regional

Aliado do senador Davi Alcolumbre (União Brasil), o governador do Amapá Waldez Góes (PDT) foi anunciado por Lula para ser o ministro da Integração e Desenvolvimento Regional. Ele deverá deixar o PDT em breve e migrar para o União Brasil. Leia o perfil de Waldez Góes, ministro da Integração e Desenvolvimento Regional.

Marco Edson Gonçalves Dias, ministro do Gabinete de Segurança Institucional

O general da reserva Marco Edson Gonçalves Dias será o comandante do Gabinete de Segurança Institucional (GSI) no terceiro mandato de Luiz Inácio Lula da Silva (PT). Ele chefiou a segurança da presidência primeiros oito anos que o petista ocupou o cargo. Veja o perfil de Gonçalves Dias, que comandará o GSI do governo Lula.

Paulo Teixeira, ministro do Desenvolvimento Agrário

O presidente eleito Luiz Inácio Lula da Silva (PT) nomeou o deputado federal Paulo Teixeira (PT-SP) para o Ministério do Desenvolvimento Agrário. Reeleito em outubro para cumprir seu quinto mandato consecutivo, Teixeira é reconhecido pelo bom trânsito na área jurídica. Ele é mais um petista a ser apontado como ministro. Leia o perfil de Paulo Teixeira, ministro do Desenvolvimento Agrário.

Ana Moser, ministra do Esporte

Ana Moser foi escolhida pelo presidente eleito Luiz Inácio Lula da Silva (PT) para liderar o Ministério do Esporte a partir de 2023. Ponteira da geração que trouxe a primeira medalha olímpica do vôlei feminino ao Brasil, em 1996, ela se tornou empreendedora social ao deixar as quadras. Ela integrou o grupo de trabalho do Esporte na equipe de transição. Leia o perfil de Ana Moser, ministra do Esporte do governo Lula.

Renan Filho, ministro dos Transportes

O ex-governador de Alagoas e senador eleito Renan Filho (MDB) será o novo ministro dos Transportes do governo Lula (PT). O estado alagoano está no topo do ranking das melhores rodovias públicas do país. O futuro ministro dos Transportes de Lula é filho do senador Renan Calheiros. Leia o perfil de Renan Filho, ministro dos Transportes de Lula.

Paulo Pimenta, da Secretaria de Comunicação Social

Jornalista de formação, Paulo Pimenta graduou-se pela Universidade Federal de Santa Maria (UFSM), onde iniciou sua trajetória política. Em 1988, foi eleito vereador em Santa Maria, tendo sido reconduzido em 1992. Chegou à Assembleia Legislativa do Rio Grande do Sul em 1998 e, quatro anos depois, à Câmara dos Deputados. Foi reeleito em 2006, 2010, 2014, 2018 e 2022. Leia o perfil de Paulo Pimenta, ministro da Secretaria de Comunicação Social de Lula.

Carlos Fávaro, ministro da Agricultura

O senador Carlos Fávaro (PSD-MT) é ligado ao agronégocio. No período de 2012 a 2014, por exemplo, foi presidente da Associação dos Produtores de Soja e Milho do Estado de Mato Grosso (Aprosoja-MT). O fato o credenciou para assumir o ministério da Agricultura. Leia o perfil de Carlos Fávaro, futuro ministro da Agricultura.

Juscelino Filho, ministro das Comunicações

José Juscelino dos Santos Rezende Filho nasceu em 1984 no município de São Luís (MA). Formou-se médico pelo Centro Universitário do Maranhão (Uniceuma) e é vice-líder de seu partido na Câmara dos Deputados. Atualmente, está em seu segundo mandato e foi reeleito para o terceiro nas eleições de outubro com 142.419 votos. Leia o perfil de Juscelino Filho, futuro ministro das Comunicações de Lula.

Alexandre Silveira, ministro de Minas e Energia

O senador Alexandre Silveira (PSD-MG), que participou da campanha eleitoral de Lula em Minas Gerais, será o novo ministro de Minas e Energia. Coordenador da equipe de transição na área de infraestrutura, Silveira também foi relator da PEC da Transição na Comissão de Constituição e Justiça (CCJ) do Senado.  Leia o perfil de Alexandre Silveira, futuro ministro de Minas e Energia.

Daniela do Waguinho, ministra do Turismo

Pedagoga, a deputada federal Daniela do Waguinho (União Brasil-RJ) foi indicada para o Ministério do Turismo. Ela é esposa do prefeito de Belford Roxo (RJ), Wagner dos Santos Carneiro, o Waguinho, importante cabo eleitoral de Lula na Baixada Fluminense. Leia o perfil de Daniela do Waguinho.

André de Paula, ministro da Pesca e Aquicultura

André de Paula (PSD-PE) é deputado federal pelo estado de Pernambuco e está atualmente em seu sexto mandato. No PSD, ele exerce a função de presidente regional pelo estado em que foi eleito, e é o 2° vice-presidente da Câmara dos Deputados. Além de sua carreira política, André possui formação em Direito pela Universidade Federal de Pernambuco. Leia o perfil de André de Paula, futuro ministro da Pesca.

Jader Filho, ministro das Cidades

O próximo ministro das Cidades será o filho do senador Jader Barbalho (MDB-PA) e irmão mais velho do governador reeleito Helder Barbalho (MDB), Jader Filho. Ele é empresário do setor de comunicação e preside atualmente o diretório do MDB no Pará. Leia o perfil de Jader Filho.

Marina Silva, ministra do Meio Ambiente

A deputada federal eleita Marina Silva (Rede-SP) será novamente ministra do Meio Ambiente (MMA), levando seu prestígio nacional e internacional na área para o terceiro governo de Luiz Inácio Lula da Silva (PT), que prometeu zerar o desmatamento da Amazônia e dar um novo impulso à agenda climática. Leia o perfil de Marina Silva.

Simone Tebet, ministra do Planejamento

A futura ministra do Planejamento é advogada e professora. Nascida em Três Lagoas (MS), formou-se em Direito pela Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ) e obteve o título de mestrado pela Pontifícia Universidade Católica de São Paulo (PUC-SP). Foi uma aliada importante durante o segundo turno e um símbolo da frente ampla que congregou críticos ao PT para impedir a reeleição de Jair Bolsonaro. Veja o perfil de Simone Tebet.

Carlos Lupi, ministro da Previdência Social

O presidente nacional do PDT, Carlos Lupi, foi o escolhido para comandar o Ministério da Previdência. Carlos Roberto Lupi já foi ministro de Lula. Em seu segundo mandato presidencial, o político assumiu o Ministério do Trabalho e Emprego, cargo que exerceu até 2011, durante o mandato de Dilma Rousseff (PT), quando foi acusado de envolvimento em um esquema de desvio de dinheiro por meios de contratos com ONGs. Leia o perfil de Carlos Lupi.

Sônia Guajajara, ministra dos Povos Originários

Primeira deputada federal indígena eleita pelo estado de São Paulo, a ativista Sônia Guajajara foi escolhida pelo presidente diplomado Luiz Inácio Lula da Silva (PT) para assumir a pasta do Ministério dos Povos Indígenas, pasta que será criada pelo novo governo. Guajajara será a primeira indígena a ocupar um ministério. Veja o perfil de Sônia Guajajara.

Nísia Trindade, ministra da Saúde

Primeira mulher a presidir a Fundação Oswaldo Cruz (Fiocruz) e condecorada pela atuação durante a pandemia de Covid-19. É a primeira mulher a presidir o Ministério da Saúde no Brasil. Veja o perfil de Nísia Trindade.

Camilo Santana, ministro da Educação

Ex-governador do Ceará e senador eleito, ele desbanca a até então mais cotada Izolda Cela, vice na chapa dele e atual governadora. Santana, que já havia cumprido dois mandatos, atuou como articulador da candidatura de Elmano de Freitas (PT), eleito para o governo cearense nestas eleições. Também apoiou a campanha de Luiz Inácio Lula da Silva (PT) no estado, mesmo tendo longa aliança com a família de Ciro Gomes (PDT).  Leia o perfil de Camilo Santana.

Alexandre Padilha, ministro das Relações Institucionais

Atualmente deputado federal, ele foi ministro da SRI entre 2009 e 2010, quando o então presidente Luiz Inácio Lula da Silva encerrava seu segundo mandato. Ele já trabalhava no ministério há mais tempo: começou como chefe de gabinete até galgar a chefia pasta, como o mais jovem ministro do governo, aos 38 anos. Também foi ministro da Saúde no governo Dilma Rousseff. Leia o perfil de Alexandre Padilha. 

Luciana Santos, ministra da Ciência e Tecnologia

Vice-governadora de Pernambuco e presidente nacional do partido. Ela será a primeira mulher e a primeira pessoa negra a ocupar a posição de forma permanente. A engenheira foi eleita deputada federal por dois mandatos, e ocupou o cargo entre 2011 e 2019. Integrou comissões de Ciência e Tecnologia, Comunicação e Informática, de Desenvolvimento Urbano e de Cultura. Veja o perfil de Luciana Santos. 

Márcio Macêdo, ministro da Secretaria-Geral da Presidência

Deputado federal em fim de mandato, tem 52 anos e vai comandar um ministério importante pela proximidade com o chefe do Executivo federal. O indicado despacha dentro do Palácio do Planalto e influencia, por exemplo, na agenda do presidente. Na função, é preciso ter boa interlocução com a sociedade civil e os partidos da base, com o objetivo de dialogar e diminuir eventuais tensões. Leia o perfil de Márcio Macêdo. 

Esther Dweck, ministra de Gestão

Foi secretária do Orçamento Federal no governo de Dilma Rousseff (PT). Integrou a coordenação do grupo técnico de Planejamento, Orçamento e Gestão na transição de governo. Ela é professora do Instituto de Economia da Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ), com pesquisas focadas em economia do setor público, regime fiscal e participação do Estado e crescimento e desenvolvimento econômico. Leia o Perfil de Esther Dweck.

Cida Gonçalves, ministra da Mulher

Foi secretária de enfrentamento à violência contra a mulher durante o governo de Dilma Rousseff (PT), mesma função que desempenhou no governo Lula. Leia o perfil de Cida Gonçalves. 

Wellington Dias, ministro do Desenvolvimento Social

Dias foi governador do Piauí duas vezes, totalizando quatro mandatos – primeiro entre 2003 e 2010, depois novamente entre 2014 e 2022. Na última eleição, foi eleito senador, cargo que já havia ocupado no intervalo entre seus governos estaduais. Leia o perfil de Wellington Dias.

Anielle Franco, ministra da Igualdade Racial

Jornalista e ativista feminista e antirracista, ela cofundou o Instituto Marielle Franco após o homicídio da irmã, então vereadora no Rio de Janeiro, em 2018. Hoje, ela é diretora do Instituto. Leia o perfil de Anielle Franco.

Jorge Messias, advogado-geral da União

Atualmente procurador da Fazenda Nacional, órgão do qual é funcionário de carreira, foi o nome mais sugerido para ocupar a posição por procuradores da Fazenda e advogados da União, por meio do Fórum Nacional da Advocacia Pública Federal. Leia o perfil de Jorge Messias.

Vinicius de Carvalho, ministro da Controladoria-Geral da União

Durante o governo de Dilma Rousseff, Carvalho esteve à frente do Conselho Administrativo de Defesa Econômica (Cade). Entrou no órgão em 2008 como conselheiro. Por cerca de um ano, antes de liderar o órgão antitruste, ocupou a Secretaria de Direito Econômico do Ministério da Justiça, na gestão de José Eduardo Cardozo. Leia o perfil de Vinicius de Carvalho.

Silvio Almeida, ministro dos Direitos Humanos

Professor da Faculdade de Direito da Universidade Presbiteriana Mackenzie e da Escola de Direito da Fundação Getúlio Vargas, em São Paulo.  É especialista em direitos humanos e relações raciais. Atualmente, desenvolve estudos em áreas como racismo estrutural, compliance e práticas antidiscriminatórias. Nesse tema, ele publicou o livro “Racismo Estrutural”, em 2019. Leia o perfil de Silvio Almeida.

Márcio França, ministro dos Portos e Aeroportos

França foi governador de São Paulo quando Geraldo Alckmin (PSB) deixou o posto para concorrer à Presidência nas eleições de 2018. Ao tentar se eleger para continuar no Palácio dos Bandeirantes, foi derrotado no segundo turno por João Doria (PSDB). Tentou se eleger senador este ano, mas perdeu a disputa para Marcos Pontes (PL). Leia o perfil de Márcio França.

Geraldo Alckmin, ministro da Indústria e Comércio

A vaga foi, originalmente, oferecida a Josué Alencar, filho de José Alencar, vice de Lula durante os dois mandatos. Diante da recusa, o ex-governador de São Paulo foi o escolhido. Alckmin disputou duas vezes a Presidência da República pelo PSDB, mudou para o PSB recentemente e compôs a chapa presidencial com Lula.

Fernando Haddad, ministro da Fazenda

Ex-prefeito de São Paulo, tem fama de pragmático e é admirador de Galbraith. É visto como alguém que coloca a lealdade ao chefe acima dos seus projetos pessoais. Veja o perfil completo de Haddad. 

Rui Costa, ministro da Casa Civil

Filiado ao PT e economista formado pela Universidade Federal da Bahia, é governador da Bahia, eleito em 2014 e reeleito em 2018.  Começou a trajetória política no movimento sindical ainda na década de 1980. Foi vereador de 2000 a 2007. Também foi eleito deputado federal em 2010, mas licenciou-se para assumir o cargo de Secretário da Casa Civil da Bahia, a partir de 5 de janeiro de 2012. É próximo de Jaques Wagner, ex-governador da Bahia, e foi como secretário do amigo que ganhou maior notoriedade. Veja o perfil completo de Rui Costa. 

Flávio Dino, ministro da Justiça

Ex-governador do Maranhão e senador eleito no pleito deste ano, era um dos coordenadores do grupo técnico que discute Justiça e Segurança Pública. Defendeu a revogação de decretos do presidente Jair Bolsonaro que flexibilizaram o acesso a armas e também uma atuação mais restrita da Polícia Rodoviária Federal. Na entrevista em que anunciou Dino, Lula disse que o indicado tem a missão de consertar o funcionamento da Pasta da Justiça, numa referência ao que ocorreu durante a gestão no governo Bolsonaro. Veja o perfil de Flávio Dino.

José Múcio Monteiro, ministro da Defesa

Tem uma extensa carreira na vida pública. Foi deputado federal por quase duas décadas, integrou a equipe do segundo governo de Lula e presidiu o Tribunal de Contas da União (TCU). Era um dos principais cotados para a Defesa em razão de seu perfil articulador e do bom trânsito nas Forças Armadas. Veja o perfil de José Múcio Monteiro.

Mauro Vieira, ministro das Relações Exteriores

Um dos mais experientes diplomatas em atuação, com mais de 40 anos de carreira na área, foi chanceler no governo de Dilma Rousseff, de 2015 a 2016. Depois, foi representante do Brasil do Brasil junto às Nações Unidas. Antes foi embaixador nos Estados Unidos (2010 – 2015) e na Argentina (2004 – 2010). É um dos diplomatas mais próximos do ex-ministro das Relações Exteriores Celso Amorim, conselheiro de Lula para assuntos internacionais. Veja o perfil de Mauro Vieira.

Margareth Menezes, ministra da Cultura

Já fazia parte da equipe de transição da cultura do governo Lula. A cantora nasceu em Boa Viagem, região de Salvador, em 13 de outubro de 1962. Filha de uma costureira e de um motorista, é a mais velha de cinco irmãos. Conquistou dois troféus Caymmi, quatro troféus Dodô e Osmar e foi indicada ao Grammy Awards e ao Grammy Latino. Veja o perfil de Margareth Menezes. 

Luiz Marinho, ministro do Trabalho

Ele esteve à frente do Ministério ainda no primeiro governo de Lula, entre 2005 e 2007, quando então migrou para a Previdência. Marinho é ex-prefeito de São Bernardo do Campo e foi presidente do sindicato dos metalúrgicos da região do ABC na década de 1990 e início dos anos 2000. Veja o perfil de Luiz Marinho.

Texto publicado no portal Jota.


Decisão de Moraes vale a partir das 18h desta quarta-feira (28) - Nelson Jr./SCO/STF

Por segurança na posse, Moraes suspende porte de armas em Brasília até segunda-feira

Brasil de Fato*

Em decisão assinada pelo ministro Alexandre de Moraes, o Supremo Tribunal Federal (STF) determinou a suspensão temporária do porte e transporte de armas de fogo em todo o território do Distrito Federal, visando a segurança dos eventos de posse do presidente eleito Luiz Inácio Lula da Silva (PT) no próximo domingo (1º).

A medida vale para todo o território do Distrito Federal (DF) a partir das 18h desta quarta-feira (28), e se estenderá até a próxima segunda (2), dia seguinte às cerimônias que marcarão o início do novo mandato de Lula na presidência da República.

A decisão de Moraes atende a um pedido da equipe de transição de governo. As preocupações com a segurança das pessoas que estarão em Brasília para a posse cresceram depois que um homem foi preso ao tentar acionar uma bomba nos arredores do aeroporto da capital federal no último sábado (24).

Quem desrespeitar a decisão deverá ser detido em flagrante por porte ilegal. Serão afetados pela medida os chamados CACs, grupo composto por colecionadores de armas, atiradores e caçadores, que tiveram o acesso a armas e munição facilitado e incentivado pelo governo de Jair Bolsonaro (PL).

Integrantes das Forças Armadas, do Sistema Único de Segurança Pública (SUSP), da Polícia Legislativa, de empresas de segurança privada e de transporte de valores não serão afetados pela decisão de Moraes.

Texto publicado originalmente no Brasil da Fato.


Nas entrelinhas: Com Simone, Lula montou uma coalizão de centro-esquerda

Luiz Carlos Azedo | Correio Braziliense

A senadora Simone Tebet, que disputou a Presidência pelo MDB e, no segundo turno, se engajou na campanha do presidente eleito Luiz Inácio Lula da Silva, cumprindo um papel fundamental para sua eleição, aceitou participar do governo de coalizão, como ministra do Planejamento. O MDB estará contemplado ainda com mais dois ministérios, o das Cidades e o do Turismo, muito provavelmente. Com isso Lula, montou um governo de centro-esquerda, que contará, também, com a participação formal do PSD, do União Brasil, do Solidariedade e do Podemos. A incógnita é a participação do Cidadania, já que o PSDB, com quem está federado, anunciou que fará oposição ao novo governo.

A pressão para que Simone não aceitasse participar do governo foi enorme, somando-se à própria frustração da senadora por não ter assumido o Ministério do Desenvolvimento Social, como desejava. A pasta foi destinada ao senador Wellington Dias (PT), que governou o Piauí por quatro mandatos, estado no qual Lula teve a sua maior votação, proporcionalmente. Setores da oposição que votaram em Simone e muitos que apoiaram Bolsonaro no segundo turno passaram a fazer a leitura de que Lula montou um governo de esquerda, puro-sangue, sob o hegemonismo do PT. A hegemonia petista no governo é uma coisa mais ou menos óbvia, até porque foi Lula que venceu as eleições. O hegemonismo é outra coisa: a canibalização dos aliados, na medida em que a correlação de forças é favorável para isso, como aconteceu nos países do Leste Europeu após a Segunda Guerra Mundial.

De certa forma, Lula contribuiu para essa leitura. Empoderou a área meio com ministros de sua confiança — Rui Costa na Casa Civil, Flávio Dino na Justiça, Fernando Haddad na Fazenda, José Múcio Monteiro na Defesa e o chanceler Mauro Vieira —, e entregou para a esquerda as políticas sociais e as pastas ligadas aos direitos humanos para os movimentos identitários. Somente nesta semana começou, de fato, a ampliação da equipe em direção ao centro, para dar à coalizão de governo o caráter da verdadeira frente ampla que o elegeu no segundo turno.

Pelo andar da carruagem, ao contemplar o presidente do Senado, Rodrigo Pacheco (PSD-MG), e o presidente da Câmara, Arthur Lira (PP-AL), que indicarão aliados para os ministérios de Minas e Energia e Integração Nacional, Lula terá sua governabilidade garantida. A capacidade de governança já estava assegurada pela qualidade técnica e experiência política da maioria dos ministros dessas áreas.

Qual é o pomo da discórdia dos setores não bolsonaristas que insistem em permanecer na oposição? A política econômica de Lula, que não prevê um choque fiscal e tem viés desenvolvimentista. Esses setores também  se beneficiaram com a política de Paulo Guedes, o ministro da Economia de Bolsonaro, e não veem com bons olhos a narrativa de Lula de que os pobres vão ter renda e os ricos pagarão mais impostos. Em parte, com razão, porque a mudança de perfil da distribuição de renda no Brasil somente é possível com a retomada do crescimento. Sem isso, o conflito distributivo continuará dividindo o país: a grande massa da população de baixa renda que elegeu Lula, de um lado, e a maioria da classe média e da elite economica, que apoiou a reeleição de Bolsonaro, de outro.

Contaminação

Essa visão, de certa forma, contaminou setores da oposição que fazem uma leitura economicista do governo e insistem na construção de uma terceira via supostamente progressista, indiferentes à centralidade da questão democrática, que continua na ordem do dia. A propósito, a semana está sendo muita tensa por causa das manifestações de extrema direita que pedem uma intervenção militar e uma tentativa de atentado terrorista em Brasília.

O atual comandante do Exército, general Marco Antônio Freire Gomes, antecipou a saída do comando da Força Terrestre para sexta-feira. Segundo o ministro da Defesa, José Múcio Monteiro, o general Júlio Cesar de Arruda assumirá o cargo no dia 30, às 10h30. Em última instância, será o responsável pela segurança na posse de Lula, caso as forças policiais do Distrito Federal, a Polícia Federal e a Guarda Presidencial não consigam conter os manifestantes bolsonaristas.

A troca de comando na Aeronáutica será na próxima segunda-feira. O tenente-brigadeiro do Ar Marcelo Kanitz Damasceno vai assumir o posto do brigadeiro Carlos de Almeida Baptista Junior, aliado de Bolsonaro. A troca de comando da Marinha ainda não foi marcada. O almirante de Esquadra Marcos Sampaio Olsen deverá assumir o cargo, no lugar do almirante Almir Garnier Santos, outro insatisfeito com a vitória de Lula. Já o comandante do Estado-Maior das Forças Armadas será o almirante de Esquadra Renato Rodrigues de Aguiar Freire.

Nos bastidores da troca de comandos das Forças Armadas, que seguiu o critério de antiguidade, Lula se reuniu com os ex-comandantes do Exército, da Marinha e da Aeronáutica de seu governo anterior. Eles estão atuando na transição para neutralizar a influência de Bolsonaro junto aos oficiais generais da ativa. Embora deixe o posto antecipadamente, o atual comandante do Exército, general Freire Gomes, fez uma saudação de Natal aos subordinados na qual reiterou o compromisso da Força com a hierarquia e a disciplina.

https://blogs.correiobraziliense.com.br/azedo/nas-entrelinhas-com-simone-lula-montou-uma-coalizao-de-centro-esquerda/

O presidente eleito Luiz Inácio Lula da Silva apresenta seu indicado ao ministério da Fazenda, Fernando Haddad, no CCBB, sede do governo de transição - Pedro Ladeira/Folhapress

Lula assume com economia fraca, incerteza sobre inflação e recuperação menor do emprego

Folha de São Paulo*

Um cenário econômico que analistas costumam chamar de desafiador aguarda o novo governo Luiz Inácio Lula da Silva (PT) em 2023.

Para o próximo ano, as projeções indicam um crescimento menor do PIB (Produto Interno Bruto) brasileiro, que tende a desacelerar devido a uma combinação de fatores.

Juros altos, perda de ritmo da economia mundial, fim do estímulo da reabertura após as restrições na pandemia e endividamento das famílias fazem parte dessa lista.

Com o possível freio do PIB, a expectativa é de um desempenho morno para o mercado de trabalho, enquanto as previsões sinalizam inflação ainda pressionada no país.

É claro que esse cenário pode mudar —para melhor ou pior— a partir das decisões do próximo governo. Por ora, analistas aguardam mais sinalizações sobre a política econômica de Lula e suas diretrizes na área fiscal.

O temor de elevação de gastos durante a gestão petista já provocou ruídos no mercado financeiro e segue como motivo de alerta para parte dos economistas.

Outro ponto de atenção é o cenário externo, especialmente em relação ao rumo da política monetária nos EUA.

"O cenário para 2023 é de crescimento mais baixo do que neste ano", afirma Sergio Vale, economista-chefe da consultoria MB Associados. A MB projeta avanço de 0,5% para o PIB do próximo ano, após previsão de alta de 3% em 2022.

O especialista menciona que a agropecuária tende a colher uma "safra excelente" em 2023, mas o campo, sozinho, não deve garantir um avanço mais expressivo para a atividade econômica.

Com isso, a taxa de desemprego deve ficar "mais estabilizada", segundo o economista, após o ciclo de queda que levou o indicador a 8,3% no trimestre até outubro, o mais recente com dados disponíveis.

"O que traz a taxa de desemprego para baixo é o crescimento econômico. Então, é provável que ela fique rondando 8% ou 9%."

O economista Luca Mercadante, da Rio Bravo Investimentos, projeta taxa de desocupação entre 9% e 10% no próximo ano, com uma alta "gradual", e "não abrupta".

Mercadante também aponta que o efeito defasado dos juros elevados deve frear a atividade econômica em 2023.

A Rio Bravo estima avanço de 0,7% para o PIB no próximo ano, mas não descarta um aumento de até 1%, após uma alta prevista de 3,1% em 2022.

"A atividade econômica vai crescer, mas bem menos do que neste ano, principalmente pelo efeito da política monetária", afirma.

"Tem outros pontos que merecem destaque, como o bom desempenho da agropecuária. A safra de grãos vai ser muito boa no ano que vem. A gente também deve ter alguma resiliência do mercado de trabalho. O rendimento, que ficou mais alto, deve ter impacto na atividade", diz.

O C6 Bank prevê um resultado mais baixo para o PIB de 2023. A estimativa do banco é de estagnação da atividade econômica, com o indicador marcando 0%, após avanço de 2,8% em 2022.

"A gente já vê sinais de desaceleração", aponta a economista Claudia Moreno, do C6 Bank.

Ela avalia que a provável perda de fôlego pode ser atribuída a pelo menos três fatores: o fim do processo de reabertura da economia, a desaceleração global e o impacto dos juros altos.

O C6 Bank também projeta que a inflação oficial do Brasil, medida pelo IPCA (Índice Nacional de Preços ao Consumidor Amplo), fechará o próximo ano em 5,9%, depois dos efeitos dos cortes tributários que devem levar o indicador para 5,6% em 2022.

Assim, 2023 marcaria o terceiro ano consecutivo de estouro da meta de inflação no país. "É um quadro de preços ainda pressionados", diz Moreno.

A Rio Bravo, por sua vez, prevê IPCA de 5,2% em 2023, depois de avanço de 6% estimado para 2022. A MB Associados projeta inflação de 5,3% no próximo ano, após alta de 6% em 2022.

Para esfriar a economia e tentar conter o aumento dos preços no país, o BC (Banco Central) elevou os juros básicos (Selic) a 13,75% ao ano. Analistas avaliam que a taxa só deve começar a cair a partir de meados de 2023.

O que pode atrasar o início dos cortes, diz Sergio Vale, da MB, é o risco fiscal. "O ponto-chave é entender qual será a regra fiscal a ser criada no primeiro semestre do ano que vem."

José Pena, economista-chefe da Porto Asset Management, está com uma projeção de crescimento mais otimista para 2023, de 1%, mas afirma que o número tende a ser revisto para baixo em breve. Essa possível revisão se deve a um nível de incerteza maior, no cenário interno e externo, em relação ao que se esperava há um ou dois meses.

O quadro atual é de risco de aumento das expectativas de inflação, com indicações de crescimento do gasto público para sustentar uma demanda que ainda é relativamente forte, em meio a uma baixa ociosidade, o que posterga o cenário de corte de juros.

O que pode ajudar a manter viva a expectativa de redução da taxa básica Selic em um futuro não tão distante seria uma reversão do ciclo de alta de juros no exterior, especialmente nos EUA, e a continuidade do processo de normalização das cadeias globais de suprimento.

"Se começar a se materializar uma perspectiva de que o Fed [banco central dos EUA] está prestes a acabar seu ciclo de alta, isso vai nos ajudar. Se o Fed surpreender com uma alta maior, isso vai punir ainda mais os ativos de risco mundo afora, os brasileiros entre eles", afirma Pena.

Texto publicado originalmente na Folha de São Paulo.


Vinicius Sassine: Braga Netto assume Defesa com Exército ressentido e crítico a gestos de Bolsonaro na pandemia

Cúpula militar volta a se incomodar com o presidente após anúncio de uso das Forças Armadas como reforço à vacinação

O general da reserva Walter Braga Netto toma posse no cargo de ministro da Defesa nesta terça-feira (6), na presença de Jair Bolsonaro e com parte expressiva da cúpula do Exército ainda ressentida com a troca dos principais postos de comando efetuada pelo presidente na semana passada. A ação detonou a maior crise militar já vista desde a redemocratização.

Generais que integram o Alto Comando do Exército (a maior das três Forças Armadas) criticam em conversas reservadas o mais recente discurso de Bolsonaro sobre a pandemia.

No sábado (3), ao lado do novo ministro da Defesa, o presidente afirmou que as Forças vão começar a participar da aplicação de vacinas contra a Covid-19 e que os quartéis têm condições de colaborar nesse sentido.

No mesmo contexto da fala de Bolsonaro, Braga Netto e o ministro Marcelo Queiroga (Saúde) discutiram no fim de semana a participação dos militares na vacinação. Queiroga afirmou que essa era uma determinação do presidente.

A fala incomodou a cúpula do Exército porque, segundo militares em postos de decisão, a Força já colabora há tempos com a vacinação, em parceria com instituições e governos locais.

Militares também defendem que, após ser demitido por Bolsonaro, o general Edson Leal Pujol não deve sair pela porta dos fundos do comando do Exército.

A recente crise militar começou quando o presidente demitiu o general da reserva Fernando Azevedo e Silva do cargo de ministro da Defesa, no começo da tarde da segunda passada (29). Braga Netto, então, foi deslocado da Casa Civil da Presidência para o ministério.

No dia seguinte, diante de um movimento dos líderes das três Forças para entregar os cargos, Bolsonaro demitiu os comandantes. Na quarta (31), os novos comandantes de Exército, Aeronáutica e Marinha foram escolhidos e anunciados pelo ministro.

Até agora, não há informações sobre quando e como serão feitas as trocas de comandos. “A data e outros detalhes de passagem de comando do Exército serão definidos após a avaliação e adequação das agendas das autoridades envolvidas no evento, sendo oportunamente informada”, disse o Exército, em nota.

A cúpula da Força quer que a troca de comando ocorra de maneira formal e conforme protocolos militares de eventos do tipo, dentro das limitações impostas pela pandemia, e não sem nenhum tipo de cerimônia.

Em 11 de janeiro de 2019, Pujol assumiu o cargo com pompa, no Clube do Exército em Brasília, com o ritual militar adotado tradicionalmente nessas cerimônias. Seu antecessor, o bolsonarista Eduardo Villas Bôas, hoje abrigado em um cargo no Palácio do Planalto, compareceu e levou um discurso de transmissão do posto. Bolsonaro e diversas autoridades estiveram presentes.

Um consenso também se formou entre integrantes do Alto Comando do Exército: o general da ativa Eduardo Pazuello, demitido do cargo de ministro da Saúde, não tem condições de retornar à Força, muito menos de voltar a comandar uma tropa.

Pazuello foi ministro de junho de 2020 a março de 2021. Exerceu o cargo e permaneceu na ativa do Exército, com o aval de Pujol. Foi demitido em meio ao descontrole da pandemia –no momento da demissão, o país se aproximava de 2.000 mortes por dia; agora a quantidade diária está perto de 4.000.

O general e ex-ministro é investigado pela Polícia Federal por supostos crimes ao se omitir diante da anunciada crise de escassez de oxigênio em Manaus, em janeiro. Pazuello era investigado em inquérito no STF (Supremo Tribunal Federal).

Ao perder o foro especial, o caso foi remetido à primeira instância da Justiça Federal em Brasília. Um processo ainda não foi formalizado.

Na avaliação de generais do Alto Comando, o cargo exercido por Pazuello foi essencialmente político. Tanto que o general encampou a política de “tratamento precoce” que é o carro-chefe de Bolsonaro no combate à pandemia. Medicamentos como a cloroquina não têm eficácia comprovada para Covid.

A cloroquina movimentou as estruturas do Exército e da Aeronáutica. Com aval de Pujol e intermediação do então ministro da Defesa, Azevedo e Silva, o Laboratório Químico Farmacêutico do Exército fabricou 3,2 milhões de comprimidos da droga, a um custo de R$ 1,2 milhão. Aviões da FAB transportaram o medicamento a regiões isoladas na Amazônia.

Um ato do último dia 25, assinado por Pujol, “reverteu, a contar de 23 de março de 2021, ao respectivo quadro o general de divisão intendente Eduardo Pazuello”.

O ex-ministro ainda está sem destino definido. Antes de assumir um cargo da linha de frente do governo Bolsonaro, Pazuello comandou tropas da 12ª Região Militar, em Manaus.

Uma semana depois do começo da maior crise militar desde 1977, as relações ainda não estão integralmente pacificadas, ao contrário do que faz crer uma foto divulgada pelo Exército na quinta-feira (1º), dia seguinte ao anúncio do nome do novo comandante da Força, general Paulo Sérgio de Oliveira.

Aparecem na foto Oliveira, Pujol e Villas Bôas. É o registro de uma visita feita pelos dois primeiros ao ex-comandante, que ganhou um cargo de assessor especial no Planalto desde sua saída do comando do Exército.

Para tentar evitar um aprofundamento da crise, Bolsonaro decidiu respeitar critérios de antiguidade na escolha dos novos comandantes.

Oliveira era o terceiro mais antigo na lista de militares com quatro estrelas e na ativa. O novo comandante da Marinha, almirante Almir Garnier, era o segundo em antiguidade. E o brigadeiro Carlos de Almeida Baptista Júnior, o primeiro da Aeronáutica.

A posse de Braga Netto estava prevista para as 9h no Planalto, sem presença da imprensa e com transmissão pelos canais oficiais do governo federal.

Também participam da cerimônia formal, na mesma ocasião, mais seis ministros anunciados por Bolsonaro no último mês: Flávia Arruda (Secretaria de Governo da Presidência), general da reserva Luiz Eduardo Ramos (Casa Civil), Anderson Torres (Justiça e Segurança Pública), Carlos Alberto França (Itamaraty), André Mendonça (AGU) e Marcelo Queiroga (Saúde).


Dorrit Harazim: A hora é agora

Será obrigatório transformar sociedade que se estruturou no racismo e deu 74 milhões de votos a Trump

Neste 20 de janeiro de 2021, nada foi como a catártica festança de novembro, quando ruas, praças e lares explodiram de júbilo pela derrota de Donald Trump. Na cerimônia de posse de Joe Biden e de sua vice, Kamala Harris, aconteceu algo mais sutil e profundo. Algo como ser coberto por uma manta familiar, quando nem sabíamos quanto ainda estávamos com frio. Fomos sorrindo, revendo rostos conhecidos, revivendo brincadeiras e nos surpreendendo, totalmente desarmados. Um repentino conforto cívico fez emergir uma doce alegria interior.

Durou só um dia. Mas aconteceu, e foi lindo.

Impossível tirar os olhos e desplugar os ouvidos da performance de Amanda Gorman, a jovem poeta negra que, em menos de 6 minutos, cativou geral recitando “The Hill We Climb” (A colina que subimos). Trazia no dedo um imenso anel em forma de pássaro aprisionado (tributo ao primeiro livro da imortal Maya Angelou, “Eu sei por que o pássaro canta na gaiola”). Encadeou cada palavra para compor um mosaico histórico do país, com técnica inspirada no épico “Hamilton”, de Lin-Manuel Miranda. Sua récita foi iniciada com um questionamento: “Quando o dia amanhece, nos perguntamos onde podemos encontrar luz nesta sombra que nunca acaba?”. Ela mesmo deu a resposta: “Sempre há luz se formos suficientemente corajosos para vê-la. Se ao menos fôssemos suficientemente corajosos para sê-la… Não voltaremos ao que foi, mas vamos nos transportar ao que será um país ferido, íntegro, benevolente, mas ousado, feroz e livre”.

Exatamente um ano antes, o veterano Joe Biden, branco, centrista e com 77 anos, se arrastava pelo Iowa rumo a nova derrota nas prévias partidárias, competindo com a safra 2020 de democratas mais jovens, mais diversos, mais progressistas. Conseguiu chegar aonde sempre quis estar graças ao próprio ocupante do cargo — talvez não chegasse à vitória sem a trágica, criminosa, deliberada porteira aberta pela Casa Branca à Covid-19. As previsões para fevereiro são de 500 mil mortos em solo americano. America First, como diria Trump. No 20 de janeiro de um ano atrás, a pandemia nem sequer foi mencionada por Biden num comício em Des Moines. Hoje seu lugar na história depende em boa parte de como se sairá no embate com o vírus.

Por vezes o julgamento da história é mais veloz que o tempo. Donald Trump pôde ser avaliado bem antes de se esgotarem os 2.044 dias em que ocupou e dominou a mídia — mais precisamente, desde 16 de junho de 2015, quando o showman e empreendedor fraudulento surgiu de uma escada rolante dourada para se declarar candidato. Os 1.460 dias em que ocupou o Salão Oval, e de lá quase teve de ser retirado na marra, apenas consolidaram o veredito: difícil de ser superado como o mais ruinoso presidente da nação. Em quatro anos de mandato, foram dois impeachments, o abandono de responsabilidades, uma insurreição contra eleições livres e contra a verdade, um assalto ao Congresso, a criação de um culto à personalidade, a mudança da sede do governo para o Twitter.

Por enquanto, Trump está exilado em Mar-a-Lago, visto como material tóxico. Até o ex-ator mirim Macaulay Culkin já se juntou ao diretor Chris Columbus para que seja removida a microcena de “Home Alone 2” em que Trump faz uma ponta. A ressaca do ex-presidente será grande. Por não suportar a invisibilidade, deverá tentar prosseguir a “guerra incivil” em porões da democracia.

O discurso inaugural de Biden foi o segundo mais longo desde a posse de Ronald Reagan, em 1981. Se falou muito, foi por ter o que dizer, e o fez com notável franqueza. Pela primeira vez nos mais de 230 anos da nação, um presidente americano pronunciou a palavra maldita — “supremacia branca”. Disse mais: “Precisamos confrontar e vamos derrotar o crescimento do extremismo político, da supremacia branca, do terrorismo doméstico”. Em outras palavras, salvar os Estados Unidos de si mesmos. Tarefa hercúlea para um homem que é, sempre foi e sempre será um moderado de raiz, movido pela cautela e confiante no poder do diálogo. Sua crença no estado de direito, na decência humana, na verdade são louváveis para “restaurar a alma da América”, como anunciou. Só que, a partir de 2021, não basta mais restaurar a alma da história passada. Será obrigatório, também, transformar essa sociedade que nasceu e se estruturou no racismo, não dispõe nem sequer de uma saúde pública para chamar de sua, e deu 74 milhões de votos a Donald Trump. A iniquidade social, a justiça desigual, a vulnerabilidade subitamente exposta dessa democracia tida como farol do mundo vai exigir muito de Joe Biden. Talvez demais para a urgência e pouco tempo.

O mundo torce. “Se não fizermos mudanças audaciosas, corremos o risco de terminar com alguém pior do que Trump dentro de quatro anos”, disse em entrevista ao jornalista Anand Giridharadas o veterano Chuck Schumer, que agora assume a liderança da maioria democrata no Senado. O que foi chamado de mudança nas duas últimas décadas, incluindo aí os dois mandatos de Barack Obama, não foram “nem suficientemente grandes nem corajosas o bastante”, acrescentou. A hora é agora para Biden ousar se medir com Franklin D. Roosevelt ou com o Lyndon Johnson dos Direitos Civis. Que tempos históricos temos pela frente! Lá e cá.


Elio Gaspari: Amanda Gorman arrastou as fichas ao encantar o mundo na posse de Biden

E Aras da aval a extravagâncias institucionais

A geração de Greta Thunberg (18 anos) e Malala Yousafzai (23 anos) trouxe Amanda Gorman (22 anos), a poeta que encantou o mundo na festa da posse de Joe Biden. A “menina magra, descendente de escravos, criada por uma mãe solteira (que) pode sonhar em se tornar presidente, apenas para se descobrir recitando para ele.”

Criada em Los Angeles, Amanda chegou à cena como figura conhecida num mundo de poetas jovens e ativistas. Escolhida por Jill Biden, a mulher do presidente, ela estava com o poema entalado até a tarde do dia 6, quando Donald Trump soltou sua milícia contra o Capitólio. Foi o que bastou:

“Uma nação não está quebrada, mas apenas inacabada.”

“Embora olhemos para o futuro, a história está de olho em nós.”

Outros poetas já marcaram as posses de presidentes. Aos 86 anos, Robert Frost, não conseguiu ler o poema que fez para John Kennedy e recitou outro, de memória. Maya Angelou iluminou a posse de Barack Obama, e Amanda homenageou-a com um anel onde havia um pássaro preso numa gaiola.

O poema de Amanda Gorman (“A Colina que Escalamos”) foi dissecado na sua beleza por Dwight Garner, crítico do “The New York Times”. É uma exaltação dos Estados Unidos, com pouco a ver com a colina no alto da qual brilhava a cidade de Ronald Reagan. A inspiração da jovem veio do motim miliciano, da história dos Estados Unidos e também da genialidade de Lin-Manuel Miranda, o criador do musical “Hamilton”. Miranda é um descendente de porto-riquenhos e recebeu a centelha lendo a biografia do pai do capitalismo americano. Alexander Hamilton era um imigrante caribenho, educado por judeus expulsos do Recife. O Thomas Jefferson de Miranda é negro.

Amanda Gorman tornou-se uma celebridade vestindo Prada, mas veio de uma nascente que não produz fama. Malala tomou um tiro, Amanda entrou no mundo dos livros porque tinha uma limitação neurológica que lhe afetava a audição e a fala. (É hipersensível ao som e não conseguia pronunciar os “rr” dobrados.) Formou-se em Harvard e foi premiada pela rede de estímulos que a nação americana oferece à cultura. Era famosa antes de se tornar celebridade. Fundou e dirige uma organização destinada a promover a leitura entre os jovens. É militante de quase todas as causas: igualdade racial, de gênero, ambientalismo, uma vida melhor para todos, enfim.

Seu poema celebrou a alma americana:

“Enquanto sofríamos, crescíamos.

Mesmo sofrendo, esperávamos

Mesmo cansados, tentávamos.”

Amanda quer ser eleita presidente dos Estados em 2036. Boa sorte.

O apocalipse de Aras

Quando o procurador-geral da República, Augusto Aras, diz que o estado de calamidade é “antessala do Estado de Defesa”, pode-se supor que ele ouviu o galo cantar e sabe onde. Bolsonaro já falou em saques e desordens. O general Eduardo Pazuello, com seus conhecimentos científicos, expôs há poucos dias o que ele julga ser a ameaça de uma “quarta onda” da pandemia.

Nas suas palavras:

“Vocês sabem o que é a quarta onda? Talvez não saibam. É o choque no emocional das pessoas. É a depressão, a automutilação, o suicídio, todos causados pela queda da capacidade de manter a sua própria família e de se manter. Essa é a quarta onda de uma pandemia. Se a economia quebrar, nós vamos estar acelerando a quarta onda.”

Há uma epidemia, já morreram mais de 200 mil pessoas, os doutores fazem parte de um governo que receita cloroquina, condena o distanciamento social e amaldiçoou a vacina “do João Doria”. Sem terem feito o que deviam, ameaçam com o Apocalipse. Aras vai além, pois diz que as lambanças do Executivo são problemas do Legislativo.

Aras foi rebatido por seis subprocuradores. Cristalizou as saudades de Raquel Dodge, sua antecessora, e disputa a fama deixada por Rodrigo Janot, ameaçando o legado de Geraldo Brindeiro, o procurador-geral do tucanato, que ganhou o apelido de engavetador-geral.

Brindeiro engavetava problemas, mas nunca desengavetou extravagâncias institucionais.

O Itamaraty improvisa

Os diplomatas estrangeiros costumavam reconhecer o profissionalismo da chancelaria brasileira repetindo que “o Itamaraty não improvisa”. Foi-se o tempo em que se fazia o dever de casa. O ministro Ernesto Araújo e Bolsonaro produziram uma desastrosa carta de felicitações a Joe Biden. Retardatária, longa e professoral, servirá para nada.

Se o doutor Araújo e o pelotão palaciano fizessem o dever de casa, teriam consultado a carta de felicitações do presidente Ernesto Geisel ao americano Jimmy Carter, em 1977. Durante a campanha eleitoral, Carter havia cuspido mais fogo contra o governo brasileiro do que Biden. Um de seus colaboradores, Brady Tyson, havia sido expulso do Brasil.

A carta de Bolsonaro tem 771 palavras, a de Geisel tinha metade disso, era gentil, porém vaga.

Geisel corrigiu a minuta mandada pelo Itamaraty. Nela, felicitaria Carter por assumir “o alto de honroso cargo”. O general cortou o “honroso”. Adiante, mandou colocar um “peço-lhe” onde haviam posto um “rogo”.

O Itamaraty e o Planalto não improvisavam.

Bolsonaro repetiu a lenda segundo a qual os Estados Unidos foram o primeiro país a reconhecer a independência do Brasil. Falso. Foi a Argentina.

Um artigo do diplomata Rodrigo Wiese Randig, publicado nos Cadernos da Fundação Alexandre de Gusmão, já demonstrou que o governo da Argentina reconheceu o Brasil no dia 25 de junho de 1823, e seu representante entregou as credenciais em agosto. Os Estados Unidos só reconheceram a independência um ano depois, e o ministro brasileiro entregou suas credenciais ao presidente James Monroe no dia 26 de maio de 1824.

Sábio

Do advogado Marcelo Cerqueira ao ouvir o discurso de posse de Joe Biden:

 “Eles importaram o Tancredo Neves”.

Mestre da costura, Tancredo construiu a única conciliação da história nacional que partiu da oposição. Em 1984, ele sepultou a ditadura militar num clima de festa.

Cerqueira foi um dos seus escudeiros.

Placas da memória

Cemitérios também guardam a história dos povos. O de Arlington, em Washington, era a fazenda da família do general Robert Lee, que comandou as tropas da secessão sulista. Inicialmente, dava sepultura aos soldados do Norte.

Alguém poderia colocar umas placas em alguns cemitérios do Amazonas. Elas diriam o seguinte:

“Sendo governador do Estado o senhor Wilson Miranda Lima e ministro da Saúde o general Eduardo Pazuello, aqui foram sepultados cidadãos que morreram asfixiados por falta de oxigênio durante a pandemia de 2020/2021”.

Impeachment

Quem conhece a Câmara faz um raciocínio aritmético:

Quem acha que Arthur Lira vem da mesma cepa que Eduardo Cunha pode estar fazendo a escolha certa, se dá de barato que o Planalto cumprirá tudo o que combina com ele.

Se, por hipótese, essa pessoa acha que pode não cumprir o combinado, deve lembrar o que aconteceu a Dilma Rousseff.


João Gabriel de Lima: A Terra volta a ser redonda. Hora de o Brasil embarcar

Foi semana de benditas obviedades. Só falta o Brasil ajustar sua rotação com a do planeta

Stefani Germanotta, a Lady Gaga, cantou o hino dos Estados UnidosJennifer Lopez deu um twist latino à sua interpretação de God Bless America; e, no encerramento, a poeta Amanda Gorman, de 22 anos, declamou versos que resumem o sentimento da nova geração. Na posse do presidente Joe Biden, as três mulheres nos lembraram que os Estados Unidos são um país ítalo-americano, hispano-americano, afro-americano – sem contar outras etnias e misturas. Muito de sua força e riqueza se deve à bênção de ser uma nação de imigrantes.

Parece óbvio. É como dizer que a Terra é redonda.

No momento-chave de seu discurso, Biden disse: “Nós devemos tratar os outros com dignidade e respeito. Juntar forças, parar o tiroteio e baixar a temperatura. Sem unidade não há paz – só amargor e fúria. Não há progresso – só ultraje exasperante. Não há nação – só um estado de caos”.

Dignidade e respeito. Condições óbvias para o debate inteligente nas democracias. A Terra é redonda.

No mesmo dia da posse de Biden, Portugal assumiu a presidência rotativa do Conselho da União Europeia. Em Bruxelas, o primeiro-ministro António Costa traçou as linhas gerais dos próximos seis meses: foco no social, na economia digital e no combate às alterações no clima. “Temos um planeta para proteger, e não podemos perder mais tempo,” disse Costa em seu discurso.

A Terra é redonda, e temos que cuidar dela.

Aqui em Portugal vivemos o momento mais dramático da pandemia. O governo decretou confinamento total. A trajetória da covid no país confirma o mantra dos cientistas: as duas únicas formas de controlar uma pandemia são vacina e distanciamento social. Portugal achatou a curva quando optou pelo confinamento, em março passado e no início de dezembro. Quando abriu mão dele, no “alívio” de Natal e ano-novo, deu-se o inverso. Turbinados pela variante inglesa, os casos explodiram.

Seguir o que diz a ciência: outra obviedade.

Enquanto isso, no Brasil, as obviedades são colocadas em dúvida todos os dias. O distanciamento social é minimizado, a floresta que ajudaria a deter a mudança climática enfrenta recordes de desmatamento e o “tiroteio” e o “ultraje” se tornam a regra em Brasília. Em ensaio publicado recentemente, o cientista político José Álvaro Moisés – personagem do minipodcast da semana – examina as razões de vivermos em permanente crise política. Uma delas pode ser o sistema de governo. Segundo Moisés, o semipresidencialismo – que vigora em Portugal e na França – distribui melhor o poder e facilita a negociação.

Portugal vai às urnas neste domingo para escolher o presidente. O atual ocupante do cargo, Marcelo Rebelo de Sousa, é o favorito à reeleição. Marcelo, que os portugueses chamam pelo primeiro nome, é de centro-direita, e divide o poder com o primeiro-ministro Costa, de centro-esquerda. Eles conversam “com dignidade e respeito” – e, pela saúde dos cidadãos, foram capazes de unificar o discurso durante a pandemia, em pleno tiroteio eleitoral.

Respeito aos que pensam diferente e aos que vêm de países diferentes. Respeito à ciência. Foco no social num momento em que muitos ficam sem empregos. Foco no combate à mudança climática – se ela ocorrer, nada restará para nossos filhos e netos.

Foi uma semana de benditas obviedades. Como se a Terra, depois de um momento de loucura, tivesse voltado a ser redonda.

Só falta o Brasil ajustar sua rotação com a do planeta.


Monica de Bolle: A posse e seus símbolos

Joe Biden e seu discurso em prol da democracia, da união e da justiça foi radicalmente distinto das alusões à carnificina feitas por Trump há 4 anos

Foram quatro anos de “meu jeito”. Se “meu jeito” tivesse alguma relação com o mundo real, talvez esses anos tivessem sido ligeiramente mais toleráveis, ainda que não muito menos terríveis. Mas, não. O jeito de Trump foi constituir uma realidade alternativa desde o início. Fatos alternativos, a expressão e a insistência na fantasia, começaram no dia da posse, e ele agiu todos os dias para implantá-los. Pois hoje, no tão esperado dia da partida do pior presidente dos Estados Unidos na história recente, o avião decolou para Mar-a-Lago ao som de “My way”, na voz de Frank Sinatra. Assisti à cena com uma alegria feroz e uma ponta de decepção, porque adoro Frank Sinatra. Mas esse foi tão somente o início do dia.

Na sequência da partida, que fez pensar como ética e estética se relacionam, vieram outras cenas. Solenes, esperançosas, alegres, até, apesar da tragédia, das mortes, das desavenças, de uma crueldade orgulhosa. Como normalmente ocorre em solenidades, foram vários os momentos marcantes da posse de Joe Biden e não tenho a pretensão de cobrir todo o seu simbolismo. O Mall, área central de Washington, D.C., que reúne seus monumentos e prédios históricos, parques, museus e galerias, aparecia na TV coberto de bandeiras dos Estados Unidos. Cada uma representava uma pessoa morta pelo vírus causador da Covid-19. Foi uma forma simples e eficaz de comunicar o valor da vida individual para o país. Lady Gaga, um ícone LGBT, cantou o hino com seu estilo inigualável. Já a cantora de origem porto-riquenha Jennifer Lopez clamou “justicia para todos”, após quatro anos de injúrias de Trump contra negros e latinos. Kamala Harris se tornou, no ato, a primeira vice-presidente: uma mulher, negra e filha de imigrantes. Joe Biden e seu discurso em prol da democracia, da união e da justiça foi radicalmente distinto das alusões à carnificina feitas por Trump há 4 anos.

Quem capturou a atenção na cerimônia, entretanto, foi Amanda Gorman, jovem poetisa de 22 anos, que declamou seu poema “O monte que galgamos” com alegria e bravura. Foi emocionante, e não houve sentimentalismo em suas palavras ou sua postura. Por isso foi tão impactante. Como ela disse, “nós, sucessores de um país e de uma época em que uma menina negra magricela, descendente de escravos e criada por uma mãe solteira pode sonhar em ser presidente, apenas para se ver recitando para um presidente”. Há promessa e poesia nessas palavras: promessa da política, pelo novo que irrompe anunciando aos que vieram antes que o mundo não perecerá, e poesia da política também. O poema de Gorman deixou claro que um ciclo se encerrava para que outro se abrisse. Novo. O novo como cumprimento da promessa, ainda que em situação de crise.

Os ritos pareciam encerrar a transição que se iniciou logo após a eleição. A seu término, Biden partiu para a Casa Branca com o propósito de desfazer males feitos por Trump.

O novo presidente vinculou os Estados Unidos de novo ao Acordo do Clima de Paris, tomou medidas para frear a pandemia e assinou decretos se comprometendo com a proteção social.

Comunicou por atos três pilares de seu governo: a proteção social, o meio ambiente e a saúde pública, além do multilateralismo. Sem ter tido muito tempo para refletir sobre o que tudo isso representa, fui chamada para uma entrevista. Nela me perguntaram: “Como ficam as relações entre o Brasil e os Estados Unidos”. Relações? Que relações? O Brasil de Bolsonaro tem relações frágeis com uns Estados Unidos imaginários, pois o amigo fantasia do presidente brasileiro, Trump-My-Way, jamais deu a mínima para ele ou para o país. De bate-pronto, respondi: vejamos os decretos que Biden acaba de assinar, os compromissos que acaba de assumir e os comparemos com o Brasil. Proteção social? Bolsonaro extinguiu o auxílio emergencial. Meio ambiente? Bolsonaro tem criado condições propícias ao desmatamento, com desmonte institucional e restrições orçamentárias. Saúde pública? Bolsonaro deixou morrerem centenas de milhares de brasileiros e fez de tudo para que a pandemia chegasse a seu pior momento. Multilateralismo? Seu ministro das Relações Exteriores, Ernesto, é, ao mesmo tempo, antiglobalista e árduo defensor de um liberalismo econômico sem peias. Trata-se da política do “E daí?” em todas as áreas que são caras para Biden. Portanto, que relação Brasil-EUA?

É preciso muito pensar. Pensar nesse 20 de janeiro, nas promessas da política. Cultivar esse momento em que as possibilidades são muitas e estão em aberto a quem tem disposição para disputá-las.

*Monica de Bolle é Pesquisadora Sênior do Peterson Institute for International Economics e professora da Universidade Johns Hopkins