populismo
Luiz Paulo Costa: O populismo autoritário e as eleições municipais
“Quais são as propostas concretas que a oposição tem apresentado?” Esta pergunta feita por vários analistas e operadores políticos convoca a cidadania a cumprir o seu papel fundamental. Em período de populismo autoritário a melhor oposição é a luta e o voto pela democracia. Representativa e consequentemente participativa é a vacina contra o vírus totalitário. E a Constituição Cidadã de 1988 reforçou o exercício da cidadania quando reconheceu em seu Artigo 1º o Município um ente federativo da União como os Estados e o Distrito Federal. Já a Constituição de 1946 da vitória dos Aliados contra o totalitarismo nos legou o entendimento de que ao município cabia tudo que fosse do seu peculiar interesse. Como a democracia representativa.
Mas a Constituição Cidadã de 1988 foi mais conclusiva com a cidadania ao incluir o município como um ente federativo e o seu direito à auto-organização através de suas Cartas Próprias, a Lei Orgânica Municipal. Se a Constituição Federal garante o Estado Democrático de Direito a todos os viventes do País e a Constituição estadual dos federados, a Constituição Municipal leva os seus princípios passíveis de serem exercidos pela cidadania em seu habitat natural: o município. Dizia Franco Montoro que as pessoas vivem no município e é aí que devem exercitar os seus deveres e direitos consagrados pelas Constituições da União e dos Estados.
As eleições municipais de 15 de novembro e o princípio republicano de todo o poder emana do povo e em seu nome é exercido, oferece-nos uma oportunidade ímpar para trazer a democracia mais próxima do cidadão, o que é tudo o que o populismo autoritário não quer. Aliás, já chamava a atenção no artigo “O segundo inverno do governo Bolsonaro”, Pedro S. Malan, ministro da Fazenda no Governo FHC, no “Estadão” em 14/6/20, “que o Brasil elegerá nada menos que 5.570 prefeitos e cerca de 57.800 vereadores”: “Daí a importância das eleições municipais desse ano. Seus resultados terão forçosamente influência nas eleições de 2020.”
E não apenas pelo exercício do direito fundamental de ser governado numa república democrática por representantes eleitos pelo povo e de respirar-se agora também no município o ar da democracia em todos os seus sentidos. É que, como ente federativo, o município deixou de ser uma circunscrição administrativa e passou a ser um ente político com direito à sua auto-organização através da Lei Orgânica, a sua Constituição Municipal. É bom lembrar que o município precedeu a criação do próprio Estado. A Coroa portuguesa reconheceu a sua importância até na defesa do território colonizado contra as invasões holandesas e francesas recrutando os soldados. E a Declaração da Independência e a Proclamação da República foram também legitimadas pelas Câmaras Municipais.
Assim, a Lei Orgânica do Município é elaborada e promulgada pelas próprias Câmaras Municipais. Embora já existissem nos municípios do Rio Grande do Sul e após no Ceará, foi a Constituição Cidadã de 1988 que, consagrando o direto dos municípios à auto-organização, deu maior abrangência às Leis Orgânicas, como verdadeiras Constituições Municipais.
No Estado de São Paulo, a Câmara Municipal de São José dos Campos saiu à frente apresentando, em 1984, a sua Carta Própria com o apoio de renomados juristas e constitucionalistas como Dalmo de Abreu Dallari, Celso Antônio Bandeira de Melo, Michel Temer, Geraldo Ataliba, José Guedes, Bernardo Gomes de Melo, Luís César Amad Costa, baseada no princípio do peculiar interesse do município. E a Assembleia Legislativa com Proposta de Emenda Constitucional, mobilizando assim a opinião pública para o final reconhecimento do Direito à Auto-Organização Municipal pela Assembleia Nacional Constituinte com a promulgação da Constituição Cidadã de 1988.
As eleições municipais de 2020 celebram também os 30 anos da elaboração e promulgação das Leis Orgânicas pelas próprias Câmaras Municipais. E como tal, os candidatos a vereador poderão discutir concretamente o seu conteúdo com os eleitores e os eleitos promover a sua revisão atualizando este estatuto constitucional municipal.
As Leis Orgânicas Municipais tratam desde a organização administrativa do município como também da participação popular, saúde, educação, meio ambiente, ciência e tecnologia, planejamento municipal (plano diretor de desenvolvimento integrado), transporte público, desenvolvimento social e rural, cultura, esporte e lazer. Enfim, de tudo o que diz respeito ao seu peculiar interesse, fixando princípios, diretrizes e ações.
Portanto, as políticas públicas no âmbito municipal são de responsabilidade de prefeitos e vereadores dentro de suas competências legislativas e executivas. E promover o exercício pleno da democracia representativa e participativa na Lei Orgânica do Município é um ato concreto de oposição ao populismo autoritário.
*Jornalista, escritor e vereador de 1977 a 1996 em São José dos Campos-SP
Vera Magalhães: Patriotismo de fancaria
Bolsonaro transforma discurso de amor à Pátria em culto à personalidade
“Patriotismo significa apoiar o País. Não significa apoiar o presidente.” Diferentemente de outras frases citadas com frequência e falsamente atribuídas a pensadores, esta foi de fato escrita por Theodore Roosevelt, 26º presidente norte-americano (republicano), num ensaio de 1918 em que falava sobre Abraham Lincoln e a liberdade de expressão.
Trago a citação a este texto na véspera do Sete de Setembro, feriado nacional que será desculpa para mais um show de uso de fancaria do termo por parte de Jair Bolsonaro e seus seguidores, num truque comum a regimes de corte nacional-populista e do qual o presidente brasileiro lança mão desde que deixou o Exército pela porta dos fundos para entrar na política pela mesma via.
O sequestro do patriotismo permite ao “capitão” desde desqualificar qualquer opositor como sendo inimigo do Brasil até cunhar frases absurdas como a de que donos de supermercados deveriam demonstrar seu amor à Pátria baixando o preço dos produtos.
É essa apropriação indébita que faz com que o discurso propagandista vendido pela Secom, transformada por Bolsonaro num Ministério da Propaganda, eleja aproveitadores como “heróis” e venda uma narrativa parcial como sendo a História do Brasil.
“Nosso presente está repleto de passado”, disse a historiadora e antropóloga Lília Moritz Schwarcz ao ser questionada por mim sobre o uso torpe do patriotismo como muleta por governantes durante o Roda Viva especial da Independência do Brasil que será exibido nesta segunda-feira.
O recurso a um passado falsamente idealizado não é um expediente original do bolsonarismo. Ele é uma das ferramentas básicas por meio das quais regimes e líderes políticos autoritários constroem a mística em torno de si.
No caso do atual ocupante da Presidência do Brasil, essa narrativa inventada inclui dizer que nossa ditadura militar foi um período “mal interpretado”, como o próprio Bolsonaro fez questão de dizer para um incrédulo Al Gore nos corredores do Fórum Econômico Mundial, em Davos, em 2019.
Dentro dessa falsificação, criminosos sanguinários como o coronel Carlos Alberto Brilhante Ustra são metamorfoseados em heróis.
O mau uso do patriotismo – um conceito que, em vez de ajudar a clarear, os setores “progressistas” da sociedade preferem olhar com soberba, nojinho ou enfado – faz com que mentiras como as cunhadas por Bolsonaro para se eleger, para atentar contra as instituições e para boicotar o combate à pandemia se legitimem junto a uma larga faixa do eleitorado.
Patriotismo nada tem a ver com a versão revisitada dos “fiscais do Sarney” que Bolsonaro evocou na sua última viagem de campanha antecipada sem agenda alguma. Uma visão de amor à Pátria por parte do presidente o levaria, por exemplo, a defender a vacinação em massa e obrigatória para seu povo como um direito de todos e um dever do governo, e não uma “imposição indevida”, como fez em mais uma fala criminosa em que usurpou conceitos, dessa vez o de liberalismo, que ele desconhece completamente.
Inebriado por uma circunstancial melhora de sua popularidade à custa de mais uma ilusão, a de que de repente passou a se preocupar com os pobres graças ao auxílio emergencial, Bolsonaro vestiu o figurino populista e com ele acha que poderá escapar ileso da gestão desastrosa em áreas essenciais, como o combate à pandemia e a política ambiental, e das investidas sistemáticas que fez contra a democracia.
É preciso que os verdadeiros patriotas, aqueles que não usam a Bandeira do Brasil como abadá, pensem em feriados como o de amanhã como um momento de reflexão a respeito desse presente cheio de um passado do qual a História sem narrativa não permite sentir saudades nem orgulho.
William Waack: Rumo ou deriva?
A excepcionalidade se parece à normalidade
Os brilhantes almirantes junto a Jair Bolsonaro podiam explicar ao capitão do Exército que um azimute constante em relação a um obstáculo (outro navio, por exemplo, que também está se movendo) vai dar em colisão. O presidente quer gastar para manter a popularidade, e está encantado com as vozes (do ministro do Desenvolvimento Regional, mas não só) que lhe dizem que estaria unindo o útil (reeleger-se) ao agradável (fazer o bem para pessoas ainda mais necessitadas
O obstáculo é o formidável rochedo fiscal, que está aumentando de tamanho. À medida que 2021 se aproxima, fica próximo do irresistível esse canto da sereia de que a excepcionalidade atual imposta pela calamidade pública podia ser esticada um pouquinho mais, só um pouquinho mais, só para algumas obras já orçadas, já iniciadas, necessárias até por razões humanitárias (como levar água para o Nordeste, por exemplo).
Sim, esse argumento procede, tem sólidos fundamentos num país miserável no qual metade da população nem esgoto tem. Sim, as circunstâncias da dupla crise de saúde e economia obrigam a mudar os cálculos (políticos, sobretudo), alteram prioridades (como reforma do Estado ou privatizações) e impõem gastar sem olhar para o fundo do cofre. Afinal, não é o que uma Angela Merkel está fazendo? Deixem os economistas debatendo entre si se esse “novo normal” jogou por terra tudo o que aprenderam na vida acadêmica, pautada ou não pela ortodoxia.
O problema no caso brasileiro, no qual Bolsonaro é uma expressão perfeita de mentalidades e atitudes generalizadas, é o conceito de excepcionalidade. Não há nada de novo no fato de a sociedade brasileira conviver com gastos públicos muito acima da capacidade do nosso espaço econômico de financiá-los. Ao contrário, é o que estamos fazendo há décadas. Também não é novidade alguma o fato de que nos acostumamos a acomodar interesses setoriais e regionais espalhando pela nação inteira os custos dessas acomodações – traduzindo: benefícios, renúncias, incentivos, proteções, privilégios, regimes especiais, a gritante diferença entre o emprego público e o privado.
Circulam no Congresso, e no Planalto, números dando conta de que mais da metade dos 60 milhões de brasileiros que recebem ajuda emergencial acredita que ela será permanente e que a quase totalidade dessas pessoas não está preparada para o momento em que essa ajuda cessar. Para montar já para o ano que vem um grande programa social para Bolsonaro chamar de seu o ministro da Economia, Paulo Guedes, precisa sentar com o Congresso e decidir no que mexer nos R$ 350 bilhões de isenções tributárias – ou seja, onde cortar nas “acomodações” tão ao gosto de nossa sociedade.
Com TCU, STF e o presidente da Câmara dos Deputados avisando que puxadinho no teto de gastos não passa, e que a abertura de créditos extraordinários via MP também não, é com o Centrão que Bolsonaro terá de se entender. O começo dessa relação parece auspicioso: as “novas” lideranças políticas abraçadas pelo presidente garantem a ele governabilidade e a agradável sensação de que o pior da crise ficou para trás, agora que vamos gastar. Convenientemente, ignora-se o fato de que o fisiologismo, que azeita o que for necessário em Brasília, é dono de insaciável apetite (o que isso tem de excepcional?).
Some-se a isto um fator subjetivo muito elucidativo quando se considera a rapidez com que nos acostumamos ao número de mortos na pandemia (um horror em escala mundial): é a de que estamos aparentemente confortáveis dentro da excepcionalidade. Esses tempos “excepcionais” se parecem tanto à normalidade, deixando de lado a chateação das máscaras e as escolas fechadas, com as crianças azucrinando em casa.
Na ponte de comando em Brasília, muitas vezes paralisada por tantas mãos do Executivo, Legislativo e Judiciário mexendo no leme, traçar um rumo é notoriamente uma questão de alta complexidade e mantê-lo também, ainda mais com um “skipper” errático. Que está correndo o risco de confundir rumo com deriva.
Celso Rocha de Barros: Na falta de golpe, Bolsonaro teve que trabalhar para pobre
Teremos um populismo puro-sangue de conservadorismo moral e intervencionismo econômico?
Enquanto o golpe não voltar ao cardápio, não vai ter jeito: Bolsonaro vai ter que dar uma trabalhada pelos pobres, justo ele, que nunca gostou, nem de pobre, nem de trabalhar.
Para pensar os dilemas atuais do bolsonarismo, pode ser útil ler um ótimo livro que saiu recentemente nos Estados Unidos, “Let Them Eat Tweets”, dos cientistas políticos Jacob Hecker e Paul Pierson. O título —“Que Comam Tweets”— é uma brincadeira com o “Que comam brioches”, atribuído a Maria Antonieta.
A ideia é que, em vez de fazer concessões materiais aos pobres como a direita moderada, “populistas plutocráticos” como Donald Trump tentam satisfazer o eleitorado pobre com conservadorismo moral, racismo, homofobia e teorias da conspiração, enquanto dão aos ricos os cortes de impostos insustentáveis que eles querem.
Se isso não funcionar para sempre, há o risco de os conservadores se voltarem contra a democracia, como vem ocorrendo nos esforços para enviesar ainda mais o sistema norte-americano a favor de áreas de predomínio branco.
O interessante na comparação com o caso brasileiro é que o plano “A” de Bolsonaro já era o ataque à democracia. Os pobres que se divertissem com o conservadorismo por alguns meses, depois do golpe eles perderiam o direito ao voto e ninguém nunca mais voltaria a ouvir falar deles.
A falta de interesse de Bolsonaro pelos pobres chegava a ser chocante. É difícil achar um político brasileiro, nos últimos 15 anos, que tenha manifestado tanto desprezo pela ideia de dar dinheiro aos pobres.
Durante a campanha de 2018, por exemplo, alguém enfiou em seu programa de governo uma proposta de renda mínima. Informado pela imprensa, Bolsonaro compartilhou a notícia no Twitter com o comentário: “Meu Deus KKKKKKKKK é inacreditável”.
Carlos Bolsonaro defendeu que mulheres que recebessem o Bolsa Família deveriam ser obrigadas a fazer laqueadura. Faz pouco tempo, Bolsonaro tentou gastar recursos do Bolsa Família com publicidade oficial.
Mas, no primeiro semestre de 2020, Bolsonaro tentou o autogolpe e fracassou.
Desde então, canta “Lula Lá” e se agarra aos R$ 600 que o Congresso o obrigou a pagar aos pobres brasileiros. Bolsonaro odeia pagar os R$ 600. Não queria pagar nada, aceitou pagar R$ 200, o Congresso o obrigou a pagar R$ 600. Sua função foi só organizar a fila do auxílio na Caixa Econômica Federal, o que fez com a habitual incompetência.
Podemos apostar, nesse cenário, que o populismo plutocrático de Bolsonaro/Guedes vai dar lugar a um populismo “puro-sangue” de conservadorismo moral e intervencionismo econômico? É um cenário possível.
Afinal, o lado “liberal” do projeto bolsonarista vai muito mal. Desde que Guedes virou ministro da Economia, o Brasil privatizou o mesmo número de empresas que a Coreia do Norte.
Os novos gastos com os militares vão pesar no fiscal até alguém ter coragem de mexer com eles. Os pobres podem não saber que foi o Congresso que concedeu os R$ 600, mas os ricos sabem que foi Rodrigo Maia quem reformou a Previdência. A equipe de Guedes se desfaz diante de nossos olhos.
De qualquer jeito, o populismo plutocrático de Bolsonaro e Guedes está em crise. Se o bolsonarismo pós-Guedes der errado, podemos ter uma crise econômica terrível. Se der certo, o golpismo pode voltar a qualquer momento. O equilíbrio promete ser difícil.
*Celso Rocha de Barros, servidor federal, é doutor em sociologia pela Universidade de Oxford (Inglaterra).
Bruno Boghossian: Bolsonaro não mudou, mas aprendeu a ser um populista mais eficiente
Popularidade e aliança com centrão ajudam presidente a manter políticas originais
Jair Bolsonaro enfrentou dois choques de impopularidade depois que chegou ao Palácio do Planalto. O primeiro ocorreu no ano passado, quando ele decidiu brigar com meio mundo para esconder a devastação da Amazônia. O segundo refletiu a condução catastrófica do país na crise do coronavírus.
O vento mudou e a aprovação ao governo subiu, mas o presidente continua o mesmo. Na terça (11), Bolsonaro voltou a brigar com os números e disse que "essa história de que a Amazônia arde em fogo é uma mentira". A ideia é omitir o aumento de 28% nas queimadas na região e facilitar a derrubada da floresta.
A pandemia também segue sua marcha, diante do mesmo Bolsonaro que menosprezou a doença desde o primeiro dia. Em visita ao Pará na última semana, o presidente se manteve na função de garoto-propaganda da cloroquina e tentou, mais uma vez, se eximir da culpa pelas mortes provocadas pelo coronavírus.
Bolsonaro ainda cutuca as feridas que derrubaram seus índices de popularidade no passado, mas agora sua aprovação disparou ao maior nível desde o início do governo. A variação coincidiu com um tom diferente em algumas de suas declarações públicas, mas está claro que ele está longe de ser um moderado.
O presidente não mudou. Ele só aprendeu a ser um populista mais eficiente. Os números da última pesquisa Datafolha estimulam Bolsonaro a manter suas políticas originais, desde que segure a língua, cimente uma base social e busque blindagem no Congresso e nos tribunais.
O salto na aprovação ao presidente entre brasileiros de baixa renda indica que o auxílio emergencial e outras ações ajudam a protegê-lo dos maremotos provocados por ele mesmo —ainda que, para isso, tenha que empurrar Paulo Guedes para fora da Esplanada dos Ministérios.
A aliança com o centrão e o apoio de alguns amigos no Judiciário podem completar essa missão.
Enquanto tiver um punhado de boias de salvação à vista, Bolsonaro não precisa ter medo de pular.
Fernando Gabeira: Os caminhos do tecnopopulismo
Sem a cloroquina econômica, com o País mais pobre, Bolsonaro cavalgará para onde?
De modo geral já se conhece como triunfam os populistas. Interpretam as frustrações populares em tempos de crise econômica. Criticam o distanciamento das elites e tendem a valorizar a democracia direta: acham que, uma vez submetidos a escrutínio popular, toda a sua agenda é majoritária.
Ainda estamos por construir uma teoria sobre o declínio do populismo porque, em termos históricos, ele acabou de se instalar em bases novas, num contexto transformado pela revolução digital. A pandemia deu-nos uma pista.
Populistas como Trump e Bolsonaro tendem a afirmar que os problemas têm soluções simples. Diante da complexidade do novo coronavírus, não conseguiram reagir, exceto pela negação.
O fato de ambos se terem apegado à cloroquina como uma saída mágica é, de certa forma, compreensível. A existência de um remédio eficaz colocaria um ponto final em todo o drama.
Mas, como se diz no Brasil, o buraco era mais embaixo. A complexidade da pandemia exigia respostas nacionalmente integradas, aliança com a ciência médica, uma visão mais flexível de gastos na emergência, solidariedade pelo sofrimento das pessoas.
Tanto Trump como Bolsonaro foram incapazes de cumprir esse roteiro. A insensibilidade talvez seja o fator mais impactante no seu fracasso.
No entanto, a pandemia foi o elemento inesperado que precipitou a demonstração da falsidade da tese de que os problemas dos países são muito fáceis de resolver desde que se eleja o homem certo para o papel. Trump já sentiu os efeitos e corre o risco de ser derrotado nas eleições. Bolsonaro, também assustado, saiu em campanha eleitoral, apesar da distância no tempo.
Nem sempre há pandemias. Porém a rapidez com que os acontecimentos se desenrolam é um fator que sempre ajudará a demonstrar que as soluções não são simples e isso encurtará a vida política dos populistas.
No caso brasileiro, existe um fator tradicional. Quase todos os eleitos prometem combater a corrupção. Alguns, no curso de seu governo, como foi o caso de Collor e mesmo de Lula, acabam sendo envolvidos em denúncias.
Bolsonaro trazia um potencial explosivo na sua prática anterior à chegada ao poder. É o método que utilizou para contratar funcionários em seu gabinete e nos de seus filhos.
As investigações prosseguem no seu mandato. Não têm o poder de derrubá-lo. Mas o obrigam a negociações, a buscar apoio em juízes que certamente pedirão algo em troca por seus favores. O resultado disso é que, por necessidade, Bolsonaro tem de se conciliar com as forças que, na campanha eleitoral, ele insinuou que combateria.
De modo geral, o populismo se escora na democracia direta e afirma que para realizá-la é preciso remover os obstáculos institucionais. Bolsonaro não conseguiu demolir o STF e o Congresso. A prisão de Fabrício Queiroz foi um marco que o fez compreender que precisaria de ambos. Daí partiu para um acordo com o Centrão no Congresso e a distribuição de cargos, como sempre se fez no Brasil.
A bandeira anticorrupção foi para o espaço. Só restava agora empunhá-la contra seus adversários, governadores que também são potenciais candidatos à Presidência.
Ao compreender que o movimento não passaria numa área do eleitorado, Bolsonaro precipitou o mergulho no passado. Não mais combateria a corrupção, exceto na retórica, mas iria apoiar-se nos setores mais fisiológicos do Congresso e concluiria sua transição buscando novos eleitores, escorado no clientelismo, e não mais em demandas de coerência. Sua viagem ao Nordeste, montado a cavalo e usando um chapéu fake de vaqueiro, é a expressão visual de sua metamorfose.
Outro fator que tem peso é a relação dos tecnopopulistas com a imprensa profissional. Eles a incluem no sistema decadente que pretendem destruir. Consideram-na um lixo desprezível e articulam sua comunicação por meio das redes sociais e pequenos veículos que possam comprar com sua verba publicitária. A tática é insultá-la sempre que possível, produzir fatos e oportunidades negativas que possam despertar sua indignação, imperando em suas páginas e telas pela crítica que provocam.
Há duas brechas nessa tática. A primeira delas é que a complexidade da pandemia revitalizou a importância de uma imprensa profissional, associada à ciência, produzindo informações confiáveis para atenuar o desastre sanitário. A segunda brecha é também vital. Apostar apenas nas redes sociais como um espaço em que vale tudo.
Não é mais tão fácil como no passado. Grandes empresas ameaçam retirar sua publicidade se não houver controle do discurso do ódio. E agências especializadas vasculham os perfis inautênticos. O Facebook já derrubou muitos ligados à defesa de Bolsonaro e ataques aos seus adversários.
Ainda faltam elementos essenciais nessa análise. Um deles é a própria economia. O populismo floresceu porque há muito não se sentia um crescimento real do padrão de vida. Enquanto a vida melhorava, era tolerável a relativa distância das elites em relação ao povo. Sem a cloroquina econômica, com o País mais pobre, Bolsonaro cavalgará para onde?
O Estado de S. Paulo: ‘Coronavírus isolou líderes populistas’, diz Steven Levitsky
Para Steven Levitsky, cientista político americano e coautor de 'Como as Democracias Morrrem', ignorar especialistas fez líderes como Trump e Bolsonaro reagirem tarde à pandemia
Para o cientista político Steven Levitsky, coautor do livro Como as Democracias Morrem, que mostra as razões da expansão populista nos últimos anos, o desprezo pela ciência e pela elite caiu por terra com o avanço da pandemia. Pegos de surpresa pelo surgimento do coronavírus, líderes populistas como Donald Trump, nos EUA, Jair Bolsonaro, no Brasil, e Andrés Manuel López Obrador, no México, correm risco de isolamento e de perder mais popularidade em razão da crise econômica.
A pandemia, segundo Levitsky, é o maior desafio dos populistas. Primeiro, porque corrói a popularidade que os sustentam. Sem popularidade, fica mais difícil tomar medidas autocráticas para ameaçar a democracia. Em segundo lugar, por colocar a própria sobrevivência desses líderes em risco. “A pandemia está mostrando que o desprezo desses populistas pela ciência e pelos especialistas vai custar caro”, disse. A seguir, trechos da conversa com Levitsky.
Por que populistas como Trump, Bolsonaro e Boris Johnson foram lentos ao reagir à pandemia?
Líderes populistas costumam se eleger atacando o establishment, dizendo ao povo que, uma vez no poder, varrerão a elite. Mas parte dessa elite é formada por especialistas – economistas, cientistas, técnicos, profissionais de saúde, como os que lideram agora o combate ao coronavírus. E a primeira resposta dos populistas à pandemia foi rejeitar os conselhos dos especialistas, recorrendo a pessoas próximas que não são do ramo. Bolsonaro preferiu ouvir conselhos dos filhos. Trump, do genro. Não é por acaso que Trump, Bolsonaro e (Andrés Manuel) López Obrador (presidente do México) demoraram a reagir. Já o primeiro-ministro britânico, Boris Johnson, é um caso à parte. Embora tenha demorado, ele acabou aceitando os conselhos de especialistas e foi mais rápido em adotar medidas. Mas ficou evidente que a inação inicial deve trazer consequências trágicas, como estamos vendo.
Se fosse possível formar um ranking, quem levaria a medalha de ouro em performance populista na reação ao coronavírus?
Todos cometeram erros, mas vale citar o presidente da Nicarágua, Daniel Ortega, cuja resposta à pandemia foi péssima – mas eu não chamaria ele de líder populista. Portanto, ele fica de fora dessa disputa. Sem sombra de dúvida, a medalha de ouro vai para Bolsonaro. Ele continua a desdenhar da crise. A maior parte do seu discurso (do dia 24) na TV continha inverdades que refletem um nível de ignorância que vai além da demonstrada por Trump. Vale notar que o desprezo do presidente brasileiro pelas recomendações de especialistas, parte da estratégia populista de rejeitar a elite, não tem precedentes na história recente do País. Políticos tradicionais, independentemente se eram de direita ou de esquerda, como José Sarney, Fernando Henrique Cardoso e Lula, tiveram ajuda de técnicos com experiência de governo.
No seu livro, o senhor afirma que parte da estratégia dos populistas é ignorar o respeito mútuo e a tolerância. Numa crise profunda, adotar essa estratégia autoritária tende a levar os populistas ao isolamento?
Depende do líder populista. Situações de emergência nacional, como guerras, desastres naturais e pandemias, exigem cooperação entre a classe política, entre o presidente e o Congresso, entre presidente, governadores e prefeitos, e entre governo e oposição. Os populistas costumam fazer de seus oponentes inimigos ferozes, o que dificulta esse tipo de cooperação durante uma crise.
Essa disputa costuma levar o líder populista ao isolamento?
Normalmente, o populista cria uma espécie de ambiente tóxico na política entre ele e seus oponentes. Isso não torna impossível reunir a classe política para responder a uma crise, mas certamente é mais difícil. Muitas vezes, durante situações do tipo, é comum uma união em torno do presidente. Aparentemente, isso não está acontecendo com Bolsonaro, que parece ser um caso claro de isolamento.
Tanto Trump quanto Bolsonaro culparam a China pela crise e evitaram adotar medidas drásticas, com medo de afetar a economia. Isso configura uma estratégia política populista?
Não sei se essa reação similar é coincidência ou o quanto Bolsonaro está copiando Trump. Mas não acredito que se trata de um movimento ideológico. Um dos mentores do trumpismo, Steve Bannon, foi defensor de uma resposta de saúde pública mais agressiva. Ou seja, neste aspecto, Bolsonaro agiu de forma diferente da preconizada pelo cérebro do trumpismo. Já Obrador, um populista de esquerda, agiu de forma semelhante à de Bolsonaro, criticando a paralisia da economia. Portanto, não acho que seja uma questão ideológica, e sim uma atitude intuitiva de um político personalista, nacionalista e, mais importante, antielitista. Um político com uma grossa camada narcisística, que acredita que ele mesmo, sozinho, sabe mais que os especialistas.
A gravidade da crise pode estimular os populistas a acumular mais poder?
É provável que líderes autoritários respondam a essa crise com medidas para ampliar seu poder. Mas não está claro quantos serão bem-sucedidos se começarem a tomar essas medidas. Um político isolado, como Bolsonaro, tentar aproveitar a situação para acumular poder tem menos chance de obter sucesso. O mesmo vale para Trump.
Mesmo numa situação especial como essa?
Sim. Se um líder não tem confiança do povo durante uma crise, deve evitar criar mais problemas para ele mesmo. É o que estamos começando ver no Brasil. Os brasileiros não estão respondendo bem a esse grande poder que o Bolsonaro tem para lidar com a pandemia.
Então o temor de que Bolsonaro se aproveite da crise para obter mais poder é exagerado?
Se você imaginar o cenário daqui a seis meses, com a economia em situação mais delicada do que hoje, Bolsonaro provavelmente terá menos apoio do que tinha, o que torna arriscado tentar algum movimento fora do jogo democrático.
É possível que o pronunciamento de Bolsonaro, no dia 24, tenha sido uma manobra para forçar uma situação que justifique medidas autoritárias?
Na crise em que o Brasil se encontra, não há nenhuma garantia de que Bolsonaro se comportará democraticamente. Precisamos nos preocupar todos os dias com o fato de Bolsonaro tentar quebrar as regras do jogo democrático. O fato de estar perdendo popularidade, e também porque muitos atores da política e da sociedade brasileira se recusam a apoiar uma aventura por parte dele, me leva a crer que, caso tente quebrar a ordem democrática, Bolsonaro fracassará.
Por que os populistas sempre buscam a polarização, mesmo em uma crise grave como agora?
Líderes populistas tendem a usar a mesma estratégia que funcionou para eles no passado. Se você chegar ao poder como populista, provavelmente continuará usando essa estratégia no poder.
Você ficou surpreso com o pronunciamento de Bolsonaro, indo na contramão das medidas de isolamento?
O que me impressionou mais foi como ele está copiando Trump. O pronunciamento foi consistente com seu comportamento desde que comecei acompanhar sua trajetória. Fiquei chocado com seu grau de ignorância – e, para ser sincero, não sei se ele é de fato tão ignorante quanto demonstra, como quando afirma acreditar que 90% dos jovens não serão contaminados pelo coronavírus e, portanto, devem voltar às aulas. Mas é arrepiante ver os dois maiores países do hemisfério, Brasil e EUA, governados por presidentes que vivem mentindo, respondendo a essa crise dessa maneira ignorante e irresponsável. Infelizmente, é o custo que temos de pagar por tê-los escolhido. O mundo estará olhando para a eleição presidencial nos EUA deste ano com atenção redobrada.
Com o impacto do coronavírus na economia, uma derrota de Trump sinalizaria que a onda populista pode murchar?
É o que espero. Tudo que Trump pretende agora é reviver a economia para que possa ganhar a reeleição – é com isso que ele se importa. Não há como prever os efeitos que ocorrerão nos próximos meses. De qualquer forma, a tendência é termos uma eleição muito disputada.
Mesmo a economia tendo pouco tempo para se recuperar?
Antes do coronavírus, apesar de a economia estar indo bem e Trump tivesse boas chances de se reeleger, é importante lembrar que sua aprovação era de apenas 43%. Ele não é um presidente muito popular, mas tem uma base muito forte. Não sabemos o que vai acontecer com a economia. Mas há projeções que indicam uma forte queda no segundo trimestre, com recuperação ao fim do terceiro trimestre – o que ajudaria Trump. Mas os EUA são vistos como um modelo para o restante do mundo. Se um líder populista for tirado do poder aqui nos EUA, acho que será um duro golpe para o populismo. É o que espero.
Fernando Gabeira: O psicodrama na divisão do bolo
A discussão sobre o Orçamento acabou revelando mais uma vez os limites do populismo
Não creio que seja demagógico dizer que o momento no Brasil deveria reunir os Poderes para um debate sobre a economia de recursos. Mas a crise surgida nos últimos dias gira em torno de R$ 30 bilhões. O Congresso garantiu para si este naco do Orçamento. O governo vetou. Possivelmente vão rachar esse bolo.
Houve muita hesitação, mas desfecho previsível. Começou com a frase do general Heleno, concluída com um sonoro “f...-se!”. Durante a semana sites nas redes sociais anunciavam a manifestação do “f...-se” para 15 março. Essa batalha pode não acontecer, como a de Itararé. Estão marcadas manifestações da oposição e do governo para dias 14 e 15. Elas podem até ser grandes, mas o sentido original, a disputa pelo dinheiro do Orçamento, é um pouco confuso neste momento histórico.
O Orçamento mesmo está se distanciando da realidade. Primeiro, porque surgem gastos imprevisíveis, como os do combate ao coronavírus, e os militares, com o motim de policiais no Ceará. No caso do coronavírus, não se trata apenas do que se vai gastar, estimado em R$ 350 milhões, suficiente se a situação permanecer num estágio relativamente favorável: não há evidência de transmissão do vírus no território nacional.
O problema econômico do coronavírus é o que se deixa de ganhar. As dificuldades vividas pela China, a semiparalisação na Itália são só alguns indícios de que o crescimento global será reduzido pela disseminação do vírus. Aliás, de passagem, é bom lembrar que o Brasil é um país singular: marca grandes demonstrações de massa num período de coronavírus. Nesta mesma época, a Suíça está proibindo reunião de mais de mil pessoas e a própria Olimpíada de Tóquio pode ser adiada.
No universo paralelo da política, um momento necessário de solidariedade diante do inimigo comum, o vírus, é suplantado pela discussão sobre dinheiro, importante para os deputados que dependem das eleições de 2020. Muitos dependem de vereadores e prefeitos para se reeleger.
A frase do general Heleno foi um rompante. O palavrão, no sentido que usou, significa romper os laços, dinamitar as pontes. O governo teria de sair de seu isolamento encarnando o espírito de Chávez. Mas ele foi até o fim, até o controle do Congresso. Isso no Brasil é difícil. Bolsonaro tem uma frágil base de apoio no Congresso. É duro de cintura.
Dificilmente manifestações populares vão mudar radicalmente a correlação de forças. Ao dar as costas para a política, acabou sendo, de certa forma, engolido por ela. Assim, o que pode acontecer é continuar perdendo e achar uma forma de cantar vitória para seus seguidores.
Entre os muitos caminhos que levam o populismo à tentação autoritária está o próprio processo eleitoral. Líderes carismáticos são eleitos por sua personalidade e arrastam uma bancada heterogênea e incapaz. A história da base de apoio parlamentar de Bolsonaro é constrangedora. Não há um conjunto de ideias coerente. Quando surgem os conflitos, eles se personalizam e descambam rapidamente para a baixaria. Não dá para dobrar o Congresso apenas com manifestações. Mesmo porque os deputados também foram eleitos e se sentem legítimos.
Quando alguém repete o termo do general Heleno no cotidiano, de modo geral temos a tendência a dizer: “Calma, pense bem”. No caso do governo, não tem saída senão continuar negociando. A única atenuante possível é transformar as concessões em aparente vitória.
Além disso, existem alguns temas convergentes entre governo e maioria no Congresso, como foi a reforma da Previdência. Mesmo aí foi necessário fazer concessões às demandas parlamentares. É muito possível, no futuro, que o próprio Congresso evolua e novos presidentes levem consigo bancadas mais sólidas e capazes. Mas o único caminho é o processo eleitoral, o amadurecimento democrático.
Bolsonaro passou 28 anos na Câmara, mas quase não participou de negociações políticas, era um cavaleiro solitário. Inegável que existem muitas coisas repulsivas ou simplesmente condenáveis em acordos políticos. Mas é inegável, também, que a atividade parlamentar ensina muito, descobrem-se alguns atalhos, conquistam-se vitórias parciais.
Agora, ele tem o poder, mas não sabe como se relacionar com o universo que habitou por quase três décadas, como explorar algumas de suas qualidades, atenuar os grandes defeitos. Bolsonaro não apenas abriu esse flanco. Ele não foi capaz de trazer uma equipe da sociedade e teve de recorrer a um número excessivo de militares.
Não dá para ligar o “f...-se”. É preciso aprender alguns passos no caminho ou, então, arriscar-se a ver o termo voltando-se contra ele mesmo.
No front da saúde o governo sai-se bem, mas o coronavírus não se restringe a um campo. Tem repercussão na economia, aciona o aparato científico do País e pode até estimular grandes programas sanitários que não estão diretamente ligados a ele, como o saneamento básico. A única referência que o vi fazendo sobre tema foi a expressão “este vírus aí”. Este país aí, o Brasil num mundo complicado, está precisando cada vez mais de elos e pontes e cada vez menos da tática do general Heleno.
Discussões sobre orçamento costumam ser monótonas, mas esta, com todo o psicodrama, acabou revelando mais uma vez os limites do populismo.
Marcus Pestana: Populismo e ação governamental
Populismo é uma categoria analítica imprecisa. Vai desde o uso corrente para caracterizar líderes políticos demagógicos, de discursos fáceis e vazios, repletos de promessas descoladas da realidade, para afagar a opinião pública e conquistar eleitores até a visão mais complexa que caracteriza a prática de líderes carismáticos, que prescindem das mediações institucionais, estabelecendo vínculos emocionais e de liderança forte, acionando diretamente a etérea noção de “povo”, esbarrando no autoritarismo, ao governar interpelando diretamente as massas. Hoje há o “populismo autoritário” ameaçando a democracia.
O termo populismo é tão impreciso que serviu, ao longo da história, para caracterizar personagens diversos como Trump, Vargas, Perón, Brizola, Berlusconi, o “Cinco Estrelas”, Órban, Hitler, Mussolini, Chávez, Putin, Lula e Bolsonaro.
Seja qual for a apropriação que se faça do conceito, o populismo é fácil de praticar nos palanques, mas negativo e corrosivo na prática governamental. E um vírus perigoso e tentador, que contamina as boas práticas governamentais e, muitas vezes, saí pela culatra.
Digo isto a propósito de dois fatos recentes. O primeiro foi o apelo de nosso Presidente para que os governadores, que ficaram expostos como vilões da história, reduzam o ICMS dos combustíveis. Ora, todos sabem da irracionalidade de nosso sistema tributário, daí a necessidade urgente da reforma. Mas os governos estaduais estão em graves dificuldades orçamentárias. O ICMS, na média, representa 70% da receita líquida total. Disso, cerca de 20% é sobre combustíveis, ou seja, 14% da receita líquida total. Como um estado como Minas Gerais, que sequestrou os recursos constitucionais dos municípios, se apropriou das parcelas do consignado dos servidores, atrasa salários e só está funcionando porque uma liminar assegura o não pagamento dos juros da dívida, vai de repente, numa penada, abrir mão de uma receita essencial?
Outra preocupação é a sustentabilidade dos aumentos anunciados pelo governo de Minas (13% em 2020,12% em 2021 e 12% em 2022) para os servidores das polícias, corpo de bombeiros e agentes penitenciários, comprometendo a adesão ao Programa de Ajuste Fiscal. De imediato, jogo uma vacina contra o clima de Atlético x Cruzeiro instalado no atual cenário político. Como secretário de planejamento, saúde e deputado, sempre construí grandes amizades e parcerias no setor. Tenho a noção exata da prioridade que é hoje a segurança pública. Mas, o tesouro estadual não está em condições de bancar aumentos reais muito acima da inflação projetada. Não adianta lotear a lua e na hora de honrar os compromissos não haver recursos disponíveis. As políticas públicas estão desmoronando, os investimentos em infraestrutura são pífios, o Brasil já compromete 80% de suas despesas primárias com salários e previdência. O orçamento expressa o conflito distributivo presente tanto na arrecadação como nas despesas. E os dois fatos narrados explicitam isso.
Minas Gerais tem uma situação pré-falimentar. É preciso tornar pública e transparente a gravidade da situação. Não adianta privatizar e antecipar receitas como a do nióbio para alimentar uma equação sem solução.
Todos os que têm espírito público têm que apoiar o ajuste fiscal estrutural de longo prazo. Fora isso, será o caos.
Pedro Cavalcanti Ferreira e Renato Fragelli Cardoso: Regras contra o populismo
Somente o estado de direito observado nas democracias tranquiliza empreendedores a fazer investimentos de longo prazo
A longa defasagem temporal entre a adoção de uma política econômica e a plena observação de seus efeitos constitui um dos principais impedimentos à solução de problemas econômicos estruturais, em países democráticos. Há vários sinais de que o Brasil começa a aprender como resolvê-los, mas também outros em direção contrária que são motivos de preocupação.
O enfrentamento de problemas que afligem a sociedade por décadas, não raro séculos, impõe custos políticos no curto prazo, mas seus benefícios só se tornam visíveis após decorrido um longo período desde sua implantação. Por isso, muitas reformas estruturais são sistematicamente adiadas ou, quando implantadas, acabam abandonadas. A mesma defasagem permite que políticas populistas que trazem benefícios de curto prazo, mas criam novos problemas para o futuro, levem muitos anos até que suas consequências nefastas sejam percebidas pelo eleitorado. A defasagem entre causa e efeito cria um viés que favorece o imediatismo irresponsável.
Em muitas democracias, o eleitorado leigo em assuntos econômicos, diante do grande interregno entre a implantação de uma política estrutural e a percepção de seus resultados, não enxerga a relação de causa e efeito. A incompreensão de problemas complexos é oportunistamente explorada por partidos políticos de diferentes matizes. Quando estão no poder lutam pelas reformas, mas as combatem quando se tornam oposição. O partido que promove um ajuste estrutural não apenas perde as próximas eleições, como ainda deixa a casa arrumada para que seu adversário político, que lutou contra as mesmas reformas, possa fazer um ótimo governo, alcançando a reeleição. Promover reformas estruturais é percebido como um suicídio político. A argentina constitui um caso proverbial desse fenômeno.
No Brasil, a Lei de Responsabilidade Fiscal, aprovada em 2000, foi a reforma que consolidou a estabilização monetária iniciada pelo Plano Real. A LRF gerou uma década e meia de superávits primários, mas derrubou o prestígio político de FHC junto ao eleitorado que lhe havia dado duas vitórias em primeiro turno, abrindo caminho para o triunfo do PT em 2002. Este colheu os frutos das reformas que combatera duramente quando estava na oposição. A LRF foi, posteriormente, enfraquecida por Dilma Rousseff, resultando na mais prolongada recessão da história brasileira. No curto prazo aumentou sua popularidade, mas o país pagou os custos desse populismo por muitos anos.
No passado, incentivos perversos de curto prazo, como os ilustrados acima, foram oportunistamente usados até como justificativa para a supressão da democracia. A premissa era que um governo competente e bem-intencionado, desde que pudesse desconsiderar restrições político-eleitorais, conseguiria implantar as necessárias reformas sempre adiadas pelas disputas eleitorais, rompendo o ciclo vicioso do subdesenvolvimento.
A falha dessa visão está na sua premissa, pois nada garante que, na ausência das liberdades individuais asseguradas pela democracia, o poder venha a ser realmente exercido pelos tecnicamente mais competentes, muito menos que suas prioridades coincidam com as verdadeiras necessidades da população. Adicionalmente, somente o estado de direito observado nas democracias tranquiliza empreendedores a fazer investimentos de longo prazo, sem temor de mudanças abruptas e arbitrárias das regras do jogo. A Rússia de Putin é um exemplo típico de país que atrai poucos investimentos externos, devido à incerteza gerada pela ausência de um confiável estado de direito.
É perfeitamente possível conciliar eficiência econômica com democracia. Basta que se modifiquem as regras do jogo que mantêm muitos países democráticos prisioneiros do populismo de curto prazo. No Brasil, a já mencionada LRF gerou uma década em meia de estabilidade macroeconômica. A Emenda do Teto do Gastos restabeleceu a confiança dos mercados na solvência da dívida pública, propiciando a queda inédita da taxa real de juros. O modelo de agências reguladoras, cuja missão é fiscalizar o cumprimento de regras estáveis de longo prazo desconsiderando pressões eleitoreiras de curto prazo, viabilizou importantes investimentos privados. Na direção contrária, indicações políticas para essas mesmas agências e a recente intervenção do presidente Bolsonaro na discussão sobre taxação de energia solar, passando por cima da Aneel, aumentam a insegurança do ambiente de negócios, podendo mesmo inviabilizar investimentos de longo prazo.
No momento, tramitam no Congresso reformas destinadas a criar novas regras do jogo que, ao reduzir a liberdade de ação do governo de turno, viabilizam a perseguição de importantes objetivos de longo prazo. A independência operacional do Banco Central assegurada em lei, ao garantir aos mercados que a instituição não sofrerá interferência do governo, como observado na gestão Dilma Roussef, aumentará a potência da política monetária, com redução do prêmio de risco pago sob forma de juros e atenuação do ciclo econômico-eleitoral.
Outro bom exemplo é a PEC 186, alcunhada de emergencial, que não apenas propõe limites prudenciais para os gastos permanentes de estados e municípios, como fornece os instrumentos jurídico-administrativos para se observá-los. Em caso de descumprimento dos limites, governadores e prefeitos poderão reduzir em 25% a jornada de trabalho de servidores, com queda proporcional de remuneração, bem como a demitir servidores estáveis. Paradoxalmente, essas medidas extremas serão raramente aplicadas, pois os próprios sindicatos de servidores serão os primeiros a moderar pressões salariais, por temer o atingimento dos referidos limites.
Em direção contrária está o processo de privatizações. Apesar do discurso, até agora pouco foi feito, o que indica fraca vontade política. Mais ainda, a eleição de vacas sagradas a serem preservadas - Petrobrás, CEF e BB - deixa uma enorme dúvida sobre o futuro.
Apesar das melhorias de governança nessas empresas e de gestões bem mais eficientes, o que garante que uma mudança de governo no futuro, ou a mera troca de equipe econômica, não as leve de novo à corrupção, ao uso político e ao desperdício de recursos, com toda a insegurança que isso traz ao ambiente econômico?
A democracia oferece soluções criativas para os problemas que ela mesmo cria. O Brasil parece estar aprendendo as lições de seus próprios sucessos e fracassos, mas ainda há muito a ser feito para garantir um futuro com pouco espaço para populismos de direita ou esquerda.
*Pedro Cavalcanti Ferreira é professor da EPGE-FGV e diretor da FGV Crescimento e Desenvolvimento
*Renato Fragelli Cardoso é professor da EPGE-FGV
Roberto Simon: Populismo das redes sociais fracassou
Ao colocar Brasil em perspectiva global, limites do bolsonarismo ficam evidentes
Desde o início, a emergência de Jair Bolsonaro foi corretamente interpretada em seu sentido global, à luz dos populismos nos EUA de Donald Trump e na Europa do brexit e da extrema direita “anti-globalista”.
Em cinco meses de governo, essa mesma perspectiva internacional —ao se comparar o Brasil a modelos de populismo na Europa de hoje e na América Latina de décadas recentes— agora ajuda a entender a acelerada deterioração da versão tupiniquim.
Experiências populistas mundo afora somaram a ambição de um governo “da maioria silenciosa” e “contra as elites” à hipertrofia do poder Executivo.
Governantes acumularam poder em detrimento do Legislativo, Judiciário, imprensa e sociedade civil.
Bolsonaro vive a contradição de almejar a primeira parte da equação, em textos de WhatsApp ou lives de Facebook, enquanto seu governo se atrofia com espantosa rapidez.
Várias causas arrastam o Brasil a esse populismo distinto, com outros riscos institucionais. Mas uma das questões-chave é a natureza da base de apoio ao poder populista. Hungria, Venezuela e Peru oferecem comparações ilustrativas.
O centro do poder do premiê húngaro, Viktor Orbán, é o Parlamento. Orbán e seu partido, o Fidesz, jamais consolidaram um apoio popular acima dos 50%. Mas o sistema parlamentar e as regras eleitorais húngaras, somadas à fraqueza do establishment e ao clima de xenofobia, deram à extrema direita sucessivas supermaiorias legislativas, desde 2010.
Com poderes de mudar a Constituição, Orbán passou a desmantelar a democracia.
Bolsonaro vive situação oposta. Da reforma da Previdência ao destino do Coaf, o noticiário recente é uma lista de evidências de sua debilidade frente ao Congresso.
No presidencialismo latino-americano, populistas acharam outras bases de apoio.
O venezuelano Hugo Chávez usou a colossal renda do petróleo para cooptar setores sociais, sobretudo os mais pobres, elevando sua popularidade à estratosfera.
Apesar do maior colapso de que se tem registro na história econômica latino-americana, a nostalgia de Chávez ainda garante a seu partido, o PSUV, mais de 25% de apoio popular.
O Brasil passa por um cenário de crise fiscal à beira de uma recessão, no extremo oposto de uma petro-economia num período de bonança.
O peruano Alberto Fujimori usou a guerra civil contra o Sendero Luminoso para abater antagonistas, incluindo com o fechamento do Congresso. Seu poder popular nasceu da luta contra o inimigo interno.
Em vez de uma insurgência maoísta, o bolsonarismo declarou guerra a uma esquerda desnorteada, ao centrão e ao moinho de vento do “globalismo”.
Bolsonaro não conta com a força legislativa, o poder econômico ou a violência política para sustentar sua posição antissistema. A base de apoio ao seu radicalismo é WhatsApp, Twitter e Facebook.
O Brasil traiu Abraham Lincoln e ergueu um governo das mídias sociais, pelas mídias sociais e para as mídias sociais. Elas de fato foram decisivas na campanha presidencial de 2018. Mas um populista cujo poder emana do mundo virtual não governa na realidade, muito menos é capaz de subjugar os demais poderes do Estado.
Em vez do acúmulo de poder, o grande risco institucional desse populismo atrofiado é a ingovernabilidade crônica.
*Roberto Simon é diretor sênior de política do Council of the Americas e mestre em políticas públicas pela Universidade Harvard e em relações internacionais pela Unesp.
Cristiano Romero: Populismo, volver?
O populismo jogou a Argentina numa penosa decadência
O populismo costuma brotar nos momentos de fraqueza dos governantes, quando as coisas não vão bem ou quando uma política que promete o paraíso na Terra não dá certo. No caso do governo Jair Bolsonaro, emergiu em menos de quatro meses de mandato. Testado pela primeira crise real de sua gestão, o presidente reagiu de forma populista ao ordenar que a Petrobras suspendesse o reajuste do preço do óleo diesel, que não se move há mais de 20 dias, mesmo em meio à forte escalada do petróleo neste ano.
Esse era o risco mais temido pelos eleitores "móveis", aqueles que vão além da base social de qualquer candidato e que, por puro pragmatismo, são capazes de votar em Dilma Rousseff (PT) numa eleição e em Bolsonaro (PSL) na seguinte, dois extremos do espectro político nacional. Se dependesse apenas dos eleitores que se identificam com suas ideias, Bolsonaro não estaria hoje em Brasília, no comando do país cuja economia é a 9ª maior do planeta, segundo o Fundo Monetário Internacional (FMI) - no auge do último "boom" (2004-2010), chegou a ser a 6ª e nós, brasileiros crédulos, confiamos que ultrapassaria a da Inglaterra, tomando-lhe a 5ª posição. Depois de chegar em 2º lugar em três corridas presidenciais, Lula venceu em 2002 porque os eleitores "móveis" decidiram lhe dar um voto de confiança.
Mas, afinal, como se define um político populista? Populista é aquele que promete durante a campanha eleitoral algo que sabe que não poderá cumprir. É o governante que adota políticas que não cabem no orçamento público. Revestidas de forte apelo social, são deliberações feitas para conquistar eleitores a qualquer preço e, assim, sustentar projetos de poder.
O populismo enfraquece a democracia. Seus adeptos iludem os eleitores com a ideia de que suas ações são legítimas porque atendem aos interesses do cidadão comum, dos pobres e desvalidos. Não é à toa que, mesmo sem representação parlamentar, os pobres constam da "exposição de motivos" da grande maioria das políticas aprovadas em Brasília. Apesar disso, o nível de miséria e pobreza da população segue vexaminoso, escancarando o verdadeiro caráter de iniciativas adotadas em nome dos mais necessitados.
É curioso, por exemplo, que ninguém questione o fato de o Bolsa Família atender hoje praticamente o mesmo número de pessoas (cerca de 50 milhões, quase um quarto da população) que atendia quando o programa foi lançado, há 15 anos. O elogiado esquema de transferência de renda, de inspiração liberal, diga-se de passagem, seria mais efetivo se fosse a base para a emancipação de cidadãos que, por falta de acesso à educação e à saúde, têm desde sempre a miséria como destino e não como partida. Os beneficiários estão cadastrados, o poder público conhece suas necessidades, mas nada é feito para tirá-los dessa situação.
Historicamente, diz-se que o político populista alicia as classes sociais de menor poder aquisitivo. É um fato, mas é preciso registrar que isso só é possível graças à opinião favorável das elites culturais, que, convenhamos, não se importam em estar na companhia desse tipo de polítoco, muitas vezes até lhes dando um lustre intelectual, obviamente, imerecido.
O populismo, claro, não é exclusivo dos partidos de esquerda. A história do país é pródiga nesse aspecto. Até na segunda metade da ditadura militar (1964-1985), foram concedidas benesses, principalmente à classe média, para conter o clamor desse segmento da população pelo retorno das liberdades civis. A conta ficou para as gerações seguintes. Veio na forma de explosão da inflação, baixo crescimento do PIB, contração dos investimentos públicos etc.
Alguns indagam: "Se a medida [de caráter populista] é para melhorar a vida dos mais pobres, então, é válida". Como são adotadas sem lastro no orçamento, políticas populistas provocam, ao longo do tempo, severas crises fiscais que, no fim, aumentam a pobreza, penalizando justamente os grupos sociais que justificaram a adoção das medidas.
A América Latina é o continente onde o populismo fez mais estragos ao longo da história. O caso da Argentina, nação que iniciou o século XX entre as mais ricas do planeta, é o exemplo mais acabado do que os populistas são capazes de fazer. Outro triste exemplo é a Venezuela, onde, para supostamente ajudar os pobres, criou-se um Estado insustentável que transgrediu a democracia e colapsou a economia. Dono da maior reserva de petróleo do mundo, a nação vizinha vive as consequências do populismo desbragado: no ano passado, o PIB teve contração de 18% (neste ano, a expectativa é de novo recuo, desta vez, de 25%), a inflação chegou a incomensuráveis 1.560.000% (é isso mesmo, 1,5 milhão; neste ano, estima-se variação de 10.000.000%) e a taxa de desemprego, a 35%. O caos é a antessala de uma tragédia que pode jogar a nação numa guerra civil, evento que todos julgávamos superados, pela América Latina, depois da década de 1980.
Bolsonaro não foi eleito para fazer um governo populista. Na verdade, ao perceber que a ruinosa gestão de Dilma Rousseff disseminou forte sentimento antipetista na sociedade, ele se apresentou como aquele que, instalado no poder, faria tudo diferente. Em sua peregrinação pelo país e usando as redes sociais como veículos de propagação de sua cruzada, o então pré-candidato ainda tomou o cuidado de não se apresentar como o antiLula. Sabia que, mesmo preso em Curitiba, o ex-presidente gozava de amplo apoio popular e que a principal razão para isso foi o sucesso econômico de seus dois mandatos, medido pela elevada popularidade com que deixou o Planalto Central.
O populismo de Dilma foi do tipo que se adota após o fracasso de políticas mal traçadas, inspiradas em experiências comprovadamente equivocadas, erradas em sua essência. Quando a "Nova Matriz Econômica" fez o avião da economia brasileira embicar - em 2013 -, contrariando a política econômica que levou a ex-presidente ao poder sem nunca ter disputado um cargo eletivo anteriormente, Dilma entrou em modo pânico e passou a adotar freneticamente, dali em diante, medidas populistas que, ao fim da jornada, afundaram o país numa crise interminável e da qual ainda não saímos, passados cinco anos do início do pesadelo.