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Luiz Carlos Azedo: O banqueiro de Guedes

“Economistas liberais defendem a tese de que o ajuste deve ser imediato e profundo, para que a econmia possa se recuperar mais rapidamente. É uma aposta que nunca foi adotada”

Para quem tinha dúvidas, a indicação do economista Roberto Campos Neto, executivo do Santander, para comandar o Banco Central no governo Bolsonaro foi a confirmação de que o futuro ministro da Economia, Paulo Guedes, prepara a abertura do setor financeiro para que mais bancos estrangeiros possam operar no Brasil, como parte do choque liberal que pretende anunciar. Talvez seja a indicação mais simbólica da equipe, que incorporou alguns integrantes do atual governo, como Ivan Monteiro, na Petrobras, e Mansueto de Almeida, que deverá continuar na Secretaria do Tesouro, além da polêmica nomeação do ex-ministro Joaquim Levy para o BNDES. Como o sobrenome já diz, é neto do economista Roberto Campos, expoente do pensamento liberal no Brasil, que foi ministro do Planejamento no governo Castelo Branco.

Com 49 anos, formado em economia e com especialização em finanças pela Universidade da Califórnia, Campos Neto trabalhou no Banco Bozano Simonsen e na Caritas, antes de fazer carreira no Santander, onde atualmente ocupa a Tesouraria do banco. Embora a narrativa do novo ministro da Economia seja a favor da autonomia do Banco Central, com a fixação de mandatos para presidente e diretores da instituição não coincidentes, a indicação do economista reforça a interpretação de que Paulo Guedes exercerá rígido controle sobre o BC, que hoje é uma autarquia ligada ao Ministério da Fazenda, ainda que a independência do banco venha a ser aprovada.

A principal missão da autoridade monetária é o controle da inflação, tendo por base o sistema de metas. Quando as estimativas para a inflação estão em linha com as metas, o BC reduz os juros; quando estão acima da trajetória esperada, a taxa Selic é elevada. Outra atribuição do Banco Central é a política cambial, que executa por meio de intervenções no mercado, da oferta de contratos de “swap cambial”, a venda de dólares no mercado futuro, para segurar a alta da moeda. Sempre que ocorre ingerência política nas decisões sobre a taxa básica de juros, a Selic, e na supervisão do sistema financeiro, há reflexos diretos nos juros futuros e nas taxas bancárias. A redução a fórceps das taxas de juros, como no governo Dilma Rousseff, não funciona.

O maior problema de Guedes, entretanto, é o deficit fiscal da União e da maioria dos governos estaduais, cujo epicentro são os gastos com a folha de pagamentos e a Previdência. Economistas liberais defendem a tese de que o ajuste deve ser imediato e profundo, para que a econmia possa se recuperar mais rapidamente. É uma aposta que nunca foi adotada no Brasil desde a redemcratização. Desta vez, dependerá da disposição de Bolsonaro no sentido de enfrentar as corporações federais e os governos estaduais, forçando um ajuste que pode jogar sua popularidade no chão. Como o desemprego no Brasil é muito alto, em torno dos 13 milhões de trabalhadores que procuram colocação, a reação dos sindicatos de trabalhadores tende a ser insignificante, com exceção das entidades de funcionários públicos. Quebrar essa resistência é o maior desafio para aprovação da reforma da Previdência.

Estatais

Muitas coisas na esfera do próprio governo precisam ser resolvidas. As despesas com estatais deficitárias, por exemplo, aumentaram 125% entre 2009 e 2017, crescimento bem acima da inflação do período, de 69,9%. No total, os gastos com as empresas enquadradas nesse critério foram de R$ 67,9 bilhões. Algumas são importantes, como a Embrapa, de pesquisa agropecuária. Mas há coisas inexplicáveis, como a Empresa de Planejamento e Logística (EPL), que deveria cuidar do projeto do trem-bala ligando São Paulo ao Rio, herança do governo Dilma Rousseff.

Esse aumento de despesas tem relação direta com o número de funcionários, que passaram de 37,9 mil em 2009 e chegam a quase 73,5 mil, com salário médio mensal de R$ 13,4 mil. Essas empresas explicam parte do crescimento do deficit primário e da dívida bruta do país. Com patrimônio líquido de R$ 8,244 bilhões, têm perdas previstas de R$ 7,3 bilhões com ações cíveis, trabalhistas, administrativas, fiscais e tributárias. Entre as mais deficitárias, duas são consideradas “imexíveis” pelos militares: a INB, que detém monopólio da produção e comercialização de materiais nucleares, e a Imbel, que fabrica armas, munições e explosivos.

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Luiz Carlos Azedo: O mundo de Bolsonaro

“Os efeitos das tarifas impostas por Trump às importações chinesas, assim como das restrições de acesso a tecnologias americanas, já desaceleram o comércio mundial, o que não é bom para o Brasil”

Na montagem de sua equipe, o presidente eleito, Jair Bolsonaro, já deu pistas de como a banda vai tocar no seu governo em relação a alguns temas da agenda nacional. Por exemplo, ninguém pode dizer que se enganou em relação ao futuro ministro da Justiça, Sérgio Moro, cuja pasta combaterá o crime organizado e a corrupção. A mesma coisa pode-se dizer quanto ao superministro da Fazenda, Paulo Guedes, que o mercado conhece muito bem. Idem para a ministra da Agricultura, Tereza Cristina (DEM-MS), indicada pelo agronegócio de exportação. O futuro ministro da Casa Civil, Onyx Lorenzoni, também não engana ninguém: seu estilo e modo de operar no Congresso são conhecidos.

O que permanece uma incógnita é a relação do futuro governo com a política mundial. Os sinais de Bolsonaro eram no sentido de um alinhamento automático com o presidente dos Estados Unidos, Donald Trump. Deu várias declarações nessa direção, seja em relação aos acordos multilaterais, como o Mercosul e o de Paris, seja em questões mais específicas, como as relações comerciais com a China e a intenção de mudar a embaixada do Brasil em Israel de Tel Aviv para Jerusalém. Ocorre que essas declarações tiveram repercussão muito negativa, e as eleições norte-americanas de 6 de novembro mostraram que o vento mudou em relação a Trump. Com os democratas conquistando a maioria na Câmara, nada será como antes.

Nos bastidores da transição, com o roque do Ministério da Defesa para o Gabinete de Segurança Institucional (GSI), as quatro estrelas do general Augusto Heleno passaram a brilhar mais do que todas as outras, inclusive as do vice-presidente, general Hamilton Mourão, que é mais “moderno”. Essa mudança tem impacto no posicionamento estratégico de governo sobre vários temas, um deles é a política externa. Desde a Guerra das Malvinas, quando os EUA deram apoio logístico aos ingleses e, inclusive, inviabilizaram a utilização de seus mísseis pelos argentinos, a velha Doutrina Monroe caducou.

Vigorava desde 2 de dezembro de 1823, quando o presidente James Monroe, no Congresso norte-americano, disse que o continente não deveria aceitar nenhuma intromissão europeia: “América para os americanos”, proclamou. De uma só vez, os EUA rechaçaram a criação de novas colônias no continente, a interferência de nações europeias em questões internas e a neutralidade norte-americana em conflitos envolvendo países europeus. Esses princípios funcionaram contra a Espanha e a antiga União Soviética, mas não contra o principal aliado dos EUA no Atlântico, a Inglaterra. A guerra das Malvinas aprofundou o chamado “pragmatismo responsável” dos chanceleres Azeredo da Silveira e Saraiva Guerreiro. Durante os governos Geisel e Figueiredo, respectivamente, o Brasil abandonou o alinhamento automático aos Estados Unidos.

Guerra comercial
Nessa época, o redirecionamento da política externa para as relações Norte-Sul mirava principalmente a África e os países árabes; o eixo do comércio mundial não havia se deslocado do Atlântico para o Pacífico, como acontece agora. Mas, com essa mudança, a China acabou se transformando no principal parceiro comercial do Brasil, desbancando os Estados Unidos. Ocorre que nossa infraestrutura de comércio exterior e logística está voltada para o Atlântico, não temos escala de investimentos para redirecioná-la ao Pacífico com a eficiência e a rapidez necessárias. Quem paga o preço é a nossa indústria.

É nesse contexto que o jovem chefe do Departamento de Estados Unidos, Canadá e OEA do Itamaraty, o ministro de primeira classe Ernesto Henrique Fraga Araújo, encantou Bolsonaro com um artigo “presbítero” publicado na revista do Itamaraty, intitulado “Trump e o Ocidente”. No texto, afirma que o presidente norte-americano está salvando a civilização cristã ocidental do islamismo radical e do “marxismo cultural globalista”, ao defender a identidade nacional, os valores familiares e a fé cristã. Música para os ouvidos de Bolsonaro.

Entretanto, o cargo de ministro das Relações Exteriores exige muito mais do que uma visão religiosa de mundo. Outros nomes já foram sugeridos a Bolsonaro, entre os quais o atual embaixador no Canadá, Paulo Bretas, e os ex-embaixadores em Washington Roberto Abdenur, Sergio Amaral e Rubens Barbosa. A escolha de um deles definirá os rumos da política externa de Bolsonaro, num momento em que o Brasil, como outros emergentes, pode virar marisco na guerra comercial entre os Estados Unidos e a China. Os efeitos das tarifas impostas por Trump às importações chinesas, assim como das restrições de acesso a tecnologias americanas, já desaceleram o comércio mundial, o que não é bom para o Brasil, a não ser que os Estados Unidos voltem a reduzir a sua taxa de juros, o que enfraqueceria o dólar e beneficiaria os emergentes. Mas aí já é adivinhação.

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FAP investe R$ 1,8 milhão em eventos político-culturais

Relatório de Gestão de 2016 a 2018 mostra avanços da fundação no diálogo com a sociedade, alcançando mais de 400 mil pessoas, em dois anos, na internet

Por Cleomar Almeida

A Fundação Astrojildo Pereira (FAP), vinculada ao Partido Popular Socialista (PPS), investiu R$ 1.898.438,67 em 41 eventos culturais e políticos para 160.516 pessoas no total, sendo 16.224 delas presencialmente e 144.292 via online, segundo o relatório de atividades da gestão de 2016 a 2018 divulgado nesta sexta-feira (09/11). Reformas Trabalhista e da Previdência, desenvolvimento sustentável, mulheres e negros na política, inclusão social e combate à homofobia estiveram entre os temas levados à discussão na sociedade brasileira, em um dos períodos de maior turbulência política, econômica e social da história do país. Na internet, conforme o documento, os conteúdos da FAP alcançaram mais de 400 mil pessoas no total.

Com foco também na questão cultural, segundo a diretoria, a FAP investiu R$ 542 mil na reforma da Biblioteca Salomão Malina e do Espaço Arildo Dória, mantidos pela fundação no Conic, um importante centro de comércio e de entretenimento próximo à Rodoviária do Plano Piloto de Brasília (DF). Com ambiente confortável e climatizado, a biblioteca ampliou o seu acervo, passando para 6,5 mil livros disponíveis para consulta e empréstimo ao público, e atraiu 4.716 usuários de janeiro a setembro de 2018, de acordo com o relatório. Outros R$ 30,2 mil foram investidos na reforma da sede da fundação, na quadra 509 da Asa Norte, na capital federal.

» Acesse aqui o Relatório de Atividades da Fundação Astrojildo Pereira (2016-2018)

A FAP também tornou-se a primeira fundação privada a firmar acordo de parceria com a Associação de Pais e Amigos de Excepcionais do Distrito Federal (Apae-DF), por ser, de acordo com a diretoria, movida pelo ideal de inclusão social. Dois alunos e uma supervisora da entidade foram contratados, temporariamente, para realizar a higienização do acervo mais antigo da biblioteca, localizado em uma sala da FAP. As obras, em seguida, foram colocadas à disposição do público na Biblioteca Salomão Malina.

Além disso, conforme aponta o balanço de gestão, a FAP distribuiu 57.763 livros para a comunidade, a maioria deles por meio de doações nos eventos, que se realizaram por meio de congressos, seminários, feiras, encontros e lançamentos de obras. Sempre procurando contemplar a maior diversidade possível da população, segundo a diretoria. Jovens envolvidos com a política, pesquisadores, colaboradores, parlamentares, historiadores, escritores, sociólogos e procuradores com atuação no país ou no exterior estiveram entre aqueles que compareceram aos eventos realizados pela fundação, no período.

Avanço na internet
Essa preocupação em atender aos diferentes públicos, de acordo com o documento, levou a FAP a investir em profissionais jornalistas responsáveis pela produção de conteúdo informativo e na divulgação dele na internet, um ambiente que pode ser usado, cada vez mais, de forma democrática e plural. Para ter uma ideia, segundo levantamento do Departamento de Suporte e Tecnologia da fundação, o novo site da FAP e os perfis da fundação nas redes sociais alcançaram, no total, mais de 400 mil pessoas, em dois anos.

Para impulsionar ainda mais o contato com a sociedade em geral, a FAP lançou, em outubro, a versão online da revista Política Democrática, que oferece ao leitor reportagem especial sobre tema atual, relevante e de interesse público, além de análises de renomados especialistas brasileiros. “Com o propósito de dar continuidade a um projeto de publicação impressa, que, desde o começo do século, procura debater política, democracia, esquerda e cultura na conjuntura brasileira”, conforme diz o editoral da primeira edição.

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Luiz Carlos Azedo: Acordar com passarinhos

“Bolsonaro ainda está enrolando o paraquedas. Muito das declarações desencontradas do novo presidente da República e de seus ministros revela dificuldades operacionais futuras”

Nos dois dias que passou em Brasília, o presidente eleito, Jair Bolsonaro, mudou a rotina do prédio da quadra de deputados onde tem apartamento funcional, com a grande movimentação de pessoas a partir das cinco horas da madrugada, já em pleno horário de verão. Participou das comemorações dos 30 anos da Constituição, reuniu-se com os presidentes do Supremo Tribunal Federal e com os ministros do Superior Tribunal de Justiça, trocou figurinhas com o presidente Michel Temer e incorporou à transição dois futuros ministros, o juiz federal Sérgio Moro, que comandará um superministério da Justiça, e a deputada Tereza Cristina (DEM-MS), que assumirá o Ministério da Agricultura sem o pepino do meio ambiente.

Bolsonaro ainda está enrolando o paraquedas. Muito das declarações desencontradas do novo presidente da República e de seus ministros revela dificuldades operacionais futuras. Deve ser até angustiante, principalmente para os generais que compõem seu estado-maior, constatar a desorganização da tropa. Militares têm regras rígidas de “apronto operacional” e “aprestamento pessoal”. No manual, uma tropa “só pode ser considerada adestrada quando dispuser de homens prontos para serem empregados no mais curto espaço de tempo a partir do momento em que for acionada”. Por enquanto, Bolsonaro está muito longe disso. O mais provável é que isso nunca aconteça, pois o governo não é uma unidade militar, é uma organização civil, ainda que com forte presença de militares.

Todo governante assume o mandato cheio de energia e disposição de pôr a tropa na rua; quer dizer, o bloco na rua. Lembro-me do começo do governo de Leonel Brizola no Rio de Janeiro, eleito em 1982, num tsunami, como o que aconteceu agora no Brasil. No primeiro dia de mandato, o governador madrugou no Palácio Guanabara, para desespero dos repórteres que cobriam a administração estadual. Na primeira coletiva, disse que chegaria com os passarinhos. O repórter Ernesto Rodrigues, desde aquele dia, passou a anotar o horário de chegada de Brizola. Ao fim dos 100 primeiros dias de administração, quando geralmente acaba a lua de mel com a imprensa, o jornalista emplacou a manchete do Globo: “Brizola já não chega com os passarinhos”. Houve dias em que o governador nem sequer apareceu no seu gabinete, despachou do próprio apartamento, em Copacabana.

Palácios de governo são “jaulas de cristal”. O governante é cercado pelos áulicos e se isola da sociedade, mas muito do que acontece nos bastidores do seu gabinete acaba chegando à opinião pública. Árbitro de disputas constantes no interior de sua equipe, isso acaba agravando a solidão do poder, pois tudo o que um governante fala e decide acaba pondo mais lenha na fogueira das rivalidades, intrigas e idiossincrasias dos integrantes de sua equipe. Antes mesmo de tomar posse, a disputa se instala: primeiro entre a tropa de assalto, aqueles que chegaram primeiro e carregaram nas costas a campanha eleitoral, e a tropa de ocupação, os que foram chamados a compor a equipe por serem supostamente mais capazes de exercer as funções técnicas de governo.

Pelo Twitter

Divergências na equipe são a parte mais complicada. Muito da crise que levou à renúncia o presidente Jânio Quadros, segundo relato do jornalista Carlos Castelo Branco, que foi assessor de imprensa dele, foi consequência das disputas e intrigas entre José Aparecido e Raul Riff, dois colaboradores íntimos do presidente da República. Na equipe de Bolsonaro, o chefe da transição, Onyx Lorenzoni, e o ministro da Fazenda, Paulo Guedes, superpoderosos, são dois fios desencapados. Não foi à toa que o general Augusto Heleno, homem acostumado a comandar gente da casca grossa, foi deslocado do Ministério da Defesa para o Gabinete de Segurança Institucional (GSI). Apesar de militar, já é o algodão entre os cristais.

O maior embate no interior do novo governo, provavelmente, será com a alta burocracia federal, que votou em massa em Bolsonaro, mas espera recompensas. Políticos se movem pela ética das convicções, quem zela pela legitimidade dos meios, ou seja, a ética da responsabilidade, é a burocracia. Ao defender a reforma fiscal, o enxugamento do governo e a reforma da Previdência, Bolsonaro desperta o mais profundo corporativismo entre os servidores públicos. Além disso, o exercício do poder exige paciência e muita reflexão; o voluntarismo pode ser desastroso. Não é possível governar só pelo Twitter. O tipo de comunicação que adotou na campanha, por exemplo, nem sempre funciona na gestão pública, em que os binômios “comunicar-executar” e “executar-comunicar” se alternam de acordo com as circunstâncias.

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Luiz Carlos Azedo: O livrinho fez 30 anos

“Bolsonaro falou o que todos queriam ouvir, depois de vários discursos dos chefes dos poderes nos quais se reiterou a centralidade do respeito à Constituição para a vida política do país”

O ponto alto das comemorações dos 30 anos da Constituição de 1988, ontem, na sessão solene do Congresso Nacional, foi a declaração do presidente eleito, Jair Bolsonaro, de que a Carta Constitucional é o único norte da democracia brasileira. Usou o que aprendeu na academia militar para fazer uma analogia: “Na topografia, existem três nortes, o da quadrícula, o verdadeiro e o magnético. Na democracia, só um norte, é o da nossa Constituição”, disse num discurso rápido, ao lado das principais autoridades da República.

Bolsonaro falou o que todos queriam ouvir, depois de vários discursos dos chefes dos poderes nos quais se reiterou a centralidade do respeito à Constituição para a vida política do país. Não faltaram recados para o presidente eleito: “Devemos sempre, sempre respeitá-la (a Constituição) e, principalmente, cumpri-la”, ressaltou o presidente do Senado, Eunício de Oliveira (MDB-CE). “Não é trivial que propostas que acenaram para a substituição da Constituição em vigor tenham sido repudiadas pela opinião pública durante o último processo eleitoral”, disse o presidente da Câmara, Rodrigo Maia (DEM-RJ).

“Nossa Constituição reconhece a pluralidade étnica, linguística, diferença de opinião, a equidade no tratamento e o respeito às minorias, garante liberdade de imprensa para que a informação e a transparência saneiem o conluio e revelem os males contra indivíduos de bem comum”, lembrou a procuradora-geral da República, Raquel Dodge. “Não podemos negar que temos passado por episódios turbulentos nos últimos anos, investigações envolvendo a própria classe política e empresarial, um impeachment de uma presidente da República, a cassação de presidente da Câmara, a prisão de um ex-presidente da República. Olho com otimismo, pois todos os impasses foram resolvidos pela via constitucional, com respeito à Constituição e às leis brasileiras”, arrematou o presidente do Supremo Tribunal Federal, ministro Dias Toffoli.

Último a falar, o presidente Michel Temer, que foi constituinte, destacou a grande participação da sociedade na elaboração da Constituição e o fato de que, na democracia, a soberania é uma titularidade do povo, não de seus representados. Sugeriu que Bolsonaro se reúna com os presidentes dos demais poderes regularmente, “para direcionar o país no caminho que a Constituinte de 88 anos indicou”. Testemunha privilegiada desses 30 anos, o ex-presidente José Sarney, que convocou a Constituinte, e foi um crítico do texto constitucional, participou da cerimônia, não discursou. Essa nunca foi a Constituição dos seus sonhos, mas é o seu maior legado político à história do Brasil. Com ela, Sarney garantiu a transição democrática e protagonizou o restabelecimento do Estado democrático de direito, como enfatizou Temer, um professor de direito constitucional.

Reformas

A elaboração de uma nova Constituição foi um dos temas debatidos no primeiro turno das eleições. O candidato do PT, Fernando Haddad, havia proposto a convocação de uma Constituinte exclusiva em seu programa de governo; o vice de Bolsonaro, general Hamilton Mourão, chegou a defender que uma comissão de notáveis elaborasse um novo texto constitucional, que depois seria submetido a um plebiscito. Ambas as propostas foram esquecidas no segundo turno, tamanhas discórdia e polêmica que causaram.

O canto de sereia do revisionismo constitucional partia da ideia de que o ciclo político que a pautou se esgotou. As principais críticas, de vários matizes, são: extensa e prolixa, abarca questões que deveriam ser objeto de legislação ordinária; excesso de direitos outorgados e escassez de deveres; rigidez orçamentária e ordenamento tributário engessado; ampliação de prerrogativas corporativas e manutenção de privilégios, em especial, pelo funcionalismo público; alargamento da autoridade do Judiciário, particularmente do Supremo Tribunal Federal e do Ministério Público Federal.

Entretanto, foi a graças à atual Constituição que todas as crises políticas se resolveram por vias institucionais, pacificamente, sem intervenção dos militares, como até então ocorrera na história republicana. Ao defendê-la, o país pode vir a superar o clima de radicalização que caracterizou a disputa eleitoral. A Carta de 1988 pode não ser enxuta como a norte-americana, de 1789, nem tão antiga, como a Carta Magna inglesa, de 1521, mas ainda é o que nos une.

 

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Luiz Carlos Azedo: A decisão estratégica

“Um alívio de cinco anos no caixa do Tesouro é tudo o que o novo governo precisa para executar seu programa de reformas e retomar o crescimento econômico”

“A decisão mais estratégica é a aprovação da reforma da Previdência que está pronta para ser votada no Congresso. Com ela, o novo governo terá melhores condições para cuidar da economia”, acredita o ministro de Minas e Energia, Moreira Franco, responsável pela elaboração do documento Uma ponte para o futuro, que continua sendo a principal agenda de reformas do país, e um dos artífices das articulações que levaram Michel Temer à Presidência. Moreira já arruma as gavetas para uma retirada em ordem, como se diz no jargão militar. Mas está entre os que defendem a maior colaboração possível com o novo presidente eleito, Jair Bolsonaro, para que a transição de governo seja suave.

Um alívio de cinco anos no caixa do Tesouro é tudo o que o novo governo precisa para executar seu programa de reformas e retomar o crescimento econômico. Mas a prioridade política de qualquer governo que se inicia é a eleição das Mesas da Câmara e do Senado. É aí que está o problema. Bolsonaro tem interesse em aprovar qualquer coisa que o ajude no começo do governo a enfrentar o deficit fiscal, mas precisa da eleição de aliados para as presidências das duas Casas para ter governabilidade, ainda mais diante de uma oposição como o PT, que elegeu a maior bancada da Câmara.

Atual presidente da Câmara, o deputado Rodrigo Maia (DEM-RJ) é candidato à reeleição. Sem seu apoio decidido, a soma de esforços de Temer e Bolsonaro pode não ser suficiente para aprovar a reforma. O ministro extraordinário da transição de governo, Ônix Lorenzoni (DEM-RS), futuro chefe da Casa Civil, responsável pelas articulações no Congresso, sabe disso. Entretanto, é um desafeto de Rodrigo Maia, com quem entrou em rota de colisão quando era líder da legenda e acabou sendo por ele isolado. Deu a volta por cima como dissidente da legenda, que apoiou o tucano Geraldo Alckmin. Lorenzoni foi dos primeiros a embarcar na nau catarineta de Bolsonaro, que o levou ao poder. Sem acordo entre Bolsonaro e Maia a reforma sequer entra na pauta.

Dificuldades

O novo governo tem uma base parlamentar robusta, mas as estrelas do partido de Bolsonaro, o PSL, não têm quilometragem rodada para disputar e vencer uma eleição na Câmara. Eduardo Bolsonaro (PSL-SP), campeão de votos, é um deputado novato, que já se coloca como líder informal do novo governo, mas não tem cancha para articular uma votação que depende do apoio de três quintos da Câmara, ou seja, 308 votos. Além disso, a Previdência é um assunto que divide a própria bancada de Bolsonaro, onde há muitos interesses corporativos cristalizados, e o novo presidente emite sinais de que pretende mudar os paradigmas das negociações com o Congresso, fechando acordos em bloco com os partidos, sem troca de cargos e liberação de verbas.

Ao contrário de Temer, que loteou o governo para garantir a permanência no cargo, Bolsonaro tem a legitimidade das urnas para se impor ao Congresso, mas não necessariamente o atual, cujos integrantes se consideram “sobreviventes” ou foram mesmo derrotados, pois houve uma renovação de 47% na Casa. Segundo o relator do projeto, deputado Arthur Oliveira Maia (DEM-BA), um dos que se reelegeu, para que o projeto avance é necessário que haja articulação política por parte do novo presidente eleito.

Segundo o cientista político Murilo Aragão, da Arko Advice, mesmo sendo uma reforma mais enxuta, encontra um rol de dificuldades. Não há um texto consensual. Ainda é necessário um amplo processo de negociação com as lideranças partidárias. Por se tratar de emenda constitucional, são necessários 308 votos.

“O prazo é curto, porque faltam apenas sete semanas de atividade parlamentar até o recesso do Congresso, que começa no dia 22 de dezembro. Aqueles que não foram reeleitos creditam sua derrota à aprovação da reforma trabalhista; por isso, não querem sair aprovando outra medida impopular. Os atuais parlamentares não querem aprovar uma reforma mais enxuta se, no próximo ano, terão de aprovar uma reforma ainda mais agressiva. A diminuição do número de ministérios e a reduzida quantidade de indicações políticas para cargos relevantes restringem a motivação política do atual Congresso para aprovar a reforma ainda este ano”, avalia Aragão.

Pesquisa realizada entre 9 e 11 de outubro pela Arko Advice com 164 deputados mostrou que 51,82% não acreditavam na aprovação da reforma da Previdência em 2018, caso Bolsonaro vencesse as eleições presidenciais. “Portanto, a chance de aprovação da reforma ainda este ano fica em torno de 40%. Para que seja viabilizada, Bolsonaro teria de participar ativamente das negociações. Contudo, em caso de derrota, seu envolvimento direto traria mais desgaste ao novo governo do que os benefícios advindos de uma eventual aprovação”, conclui o cientista político.

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Luiz Carlos Azedo: Os mascates

“O Brasil ainda recebe refugiados de braços abertos. É o caso das famílias palestinas do Rio Grande do Sul, que buscaram a integração plena e uma nova cidadania no Brasil”

Há um mês, cerca de mil pessoas — homens, mulheres crianças e até idosos —, fugindo da fome e da violência, deixaram a cidade de São Pedro Sula, em Honduras, em busca do sonho americano. A notícia se espalhou pelas redes sociais, e milhares de pessoas de outros países da América Central se juntaram a elas na Guatemala, em direção ao México. Às vésperas das eleições legislativas de 6 de novembro, a marcha virou uma dor de cabeça para o presidente dos Estados Unidos, porque já reúne quase 10 mil pessoas e chegou ao México, sendo acompanhada pela mídia do mundo inteiro.

Trump já anunciou a intenção de impedir a entrada dos imigrantes e mandou mais 15 mil homens da Guarda Nacional para a fronteira. Acusa o Partido Democrata de estimular a marcha. O risco é os mexicanos aderirem em massa ao movimento, autodenominado “Pueblo Sin Fronteiras” (Povo Sem Fronteiras). Cerca de 10% da população da Guatemala, El Salvador e Honduras já deixaram seus países para fugir da criminalidade e do recrutamento forçado por gangues, em busca de poucas oportunidades de trabalho. Trump ameaça cortar a ajuda norte-americana aos países de América Central. Segundo a Agência Americana para o Desenvolvimento Internacional, a Guatemala recebe mais de US$ 248 milhões por ano; Honduras, US$ 175 milhões; e El Salvador, US$ 115 milhões.

Esse fenômeno parecia distante do Brasil, mas também já é vivido por nós em razão da crise venezuelana. A diferença é que o governo brasileiro, depois dos incidentes entre brasileiros e venezuelanos em Pacaraima (RR), na fronteira com a Venezuela, com apoio das Forças Armadas, montou uma infraestrutura adequada para receber milhares de refugiados, que são redistribuídos para os diversos estados do país. O êxodo de 2,4 milhões de venezuelanos, em apenas dois anos, já é o maior da história da América do Sul e atinge praticamente todos os países do subcontinente. A diferença é que o presidente Michel Temer, ele próprio descendente de imigrantes libaneses, seguindo a tradição de nossa política externa, tem uma posição oposta à xenofobia de Trump.

Jerusalém

O Brasil ainda recebe refugiados de braços abertos. É o caso das famílias palestinas do Rio Grande do Sul, que buscaram a integração plena e uma nova cidadania no Brasil. O documentário “A Palestina Brasileira”, de Omar de Barros Filho, mostra como essas famílias vivem uma “nakba” (palavra árabe que significa catástrofe) que já dura 70 anos. A vida de um casal residente na região metropolitana de Porto Alegre resume a tragédia: a família abandonou a Palestina com a criação do Estado de Israel, em 1948; mudou-se para Bagdá, onde reconstruiu a vida. Com a invasão do Iraque pelas tropas dos EUA, refugiou-se no campo de Al Rweished, em pleno deserto, na fronteira da Jordânia. Após alguns anos, o casal foi trazido pela ONU para o Rio Grande do Sul, mas a família se desgarrou: o filho vive na Indonésia, a filha está em Bagdá.

A produção do filme foi uma aventura. Uma das locações foi o campo Al Fawwar, próximo a Hebron, onde palestinos ainda são refugiados dentro da própria Palestina. Nunca recuperaram seus bens, propriedades ou terras tomadas por Israel. A equipe de filmagem, hospedada em Ramallah, teve seu alojamento invadido. Portas foram arrombadas, bagagens, reviradas; o hotel foi depredado. A equipe foi detida por um longo tempo em um checkpoint israelense no histórico mercado de Jerusalém. O guia palestino brasileiro foi expulso do local. O diretor foi conduzido ao centro de controle policial do Muro das Lamentações e proibido de realizar entrevistas e de utilizar equipamento de som e luz. Quando tentaram entrar na mesquita de Al Aqsa, foram bloqueados por policiais de Israel. No aeroporto Ben Gurion, em Tel Aviv, uma das câmeras foi confiscada e nunca devolvida.

O marco inaugural da nossa diplomacia com o mundo árabe é a visita de D. Pedro II ao Líbano, em 1880. Proibidos de entrar nos Estados Unidos, cristãos sírios e libaneses perseguidos pelos turco otomanos optaram pelo Brasil, que estava em franca urbanização. Exímios comerciantes, tornaram-se “mascates” e tiveram um papel fundamental na ligação comercial do litoral com o sertão. Numa época em que a moeda era escassa e rigidamente controlada pelo governo, conquistaram a confiança dos brasileiros no fio do bigode: vendendo fiado.

Entretanto, as boas relações com o mundo árabe podem se deteriorar por causa de uma decisão anunciada pelo presidente eleito Jair Bolsonaro: transferir a embaixada brasileira de Tel Aviv para Jerusalém, a pedido do presidente Trump e do primeiro-ministro de Israel, Benjamin “Bibi” Netanyahu. Temos excelentes relações com Israel, mas romper com a moderada Autoridade Palestina é trazer para o Brasil, principalmente para a Tríplice Fronteira, onde já atuam militantes clandestinos do Hamas e agentes israelenses do Mossad, uma briga que nunca foi nossa.

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Luiz Carlos Azedo: Vamos às urnas!

“Os eleitores querem segurança, saúde, educação, emprego e moradia. Não se resolve esses problemas com uma retórica vazia”

Antes de mais nada, o eleitor brasileiro está cada vez mais consciente da importância de seu voto e do poder que isso lhe atribui para mudar a realidade política do país. Foi um longo aprendizado, que passou de geração em geração. Em 1974, por exemplo, o tsunami acabou com a maioria absoluta que o governo militar tinha no Senado. Em 1978, impôs a necessidade de abertura política, que resultou na anistia. Em 1982, se não foi suficiente para restabelecer as eleições diretas para presidente da República, em 1985, viabilizou a eleição de Tancredo Neves. O caminho para a conquista da democracia foi o voto popular, sem embargo dos protestos, greves e articulações políticas. Não foi a luta armada, uma trágica tolice política, por mais glamorizada que seja por alguns.

Há uma astúcia popular no voto sufragado que precisa ser levada em conta. Desde 1989, o povo vem fazendo escolhas nas eleições que fazem algum sentido. Foi assim, com Fernando Henrique Cardoso e Luiz Inácio Lula da Silva. Quando viu o desejo manifesto nas urnas frustrado, foi às ruas apoiar o impeachment do presidente da República. Foi o que aconteceu com Collor de Mello e Dilma Rousseff. Golpe? Golpe coisa nenhuma. Ambos foram apeados do poder com base na Constituição de 1988, que estabelece as regras do jogo, e por erros graves na condução do país.

Ninguém leva o eleitor para votar puxando-o pelo nariz. O povo tem seus motivos para fazer escolhas. Nessas eleições, consideradas atípicas, há um claro sentido de ruptura, por causa do desgaste do sistema político, da violência no cotidiano, da corrupção desnudada dada pela Operação Lava-Jato, do desemprego em massa e da falta de perspectivas. Isso está mais do que evidente. Apesar de ter feito uma contrarreforma política para blindá-la, a elite política caiu do galho. Uma geração está sendo aposentada pelas urnas, outra foi expurgada pela Lei da Ficha Limpa.

Isso não significa que a renovação política está concretizada, mas essa foi a sinalização do eleitor. Uma das dificuldades para entender o sentido dessa disruptiva no processo político é narrativa dos candidatos, que tem um caráter regressivo. A discussão eleitoral parece uma “vendeta”, que remonta à crise política de 1964. Lá se vão 54 anos! A maioria dos eleitores nem havia nascido. A radicalização direita versus esquerda protagonizada por Jair Bolsonaro (PSL) e Fernando Haddad (PT) é um grande “dejà vu”, não passa disso.

Por que isso acontece? Talvez porque as forças conservadoras que apoiaram o regime militar durante 20 anos, nos últimos 30 anos ficaram sem representação política à altura de um novo projeto de poder. Seu último grande representante foi o senador Jarbas Passarinho (PDS-PA), que foi ministro da Justiça de Collor de Mello e presidiu a CPI do Orçamento, perdendo a seguir a reeleição ao Senado, em 1994. Talvez porque as forças que governaram o país durante os governos Lula e Dilma, após o impeachment da presidente Dilma Rousseff, fizeram de tudo para se perpetuar no poder e não querem ficar muito tempo fora dele, o que será provável se perderem.

Contingências

A nossa realidade parece um copo d’água pela metade. O Brasil tem a maior democracia de massas do mundo, com eleições livres, diretas e secretas, à prova de fraude e apuradas no mesmo dia. Mas ambos os candidatos já constroem teorias conspiratórias para não aceitar seu resultado. Entretanto, o que surgir das urnas é o veredicto popular, “duela a quien le duela”.

As forças moderadas e centristas do país, que sempre se movimentaram pendularmente, viraram marisco nas eleições, mas não foram riscadas do mapa. Continuam influentes nas estruturas de poder, nas instituições republicanas, na grande mídia e na chamada sociedade civil. Podem até influenciar o resultado da eleição e surpreender! A disputa eleitoral parece uma guerra de movimentos; devido à radicalização, uma guerra de posições se iniciará após as eleições. Entretanto, a dicotomia fascismo ou comunismo que deu o tom nesta reta final não faz o menor sentido. Se fosse verdadeira, nos levaria a uma guerra civil.

Os vitoriosos também logo descobrirão que tropas de assalto não são eficientes para ocupação.É preciso ir devagar com o andor. Na verdade, as contingências são outras. A primeira é o equilíbrio entre os poderes Executivo, Legislativo e Judiciário. A segunda, a relação entre os entes federados: União, estados e municípios. A terceira, a relação entre Estado e sociedade, que passa também pela economia. Quem vencer as eleições assumirá um governo que gasta mais do que arrecada, não tem capacidade de investimento e presta péssimos serviços à população. Os eleitores querem segurança, saúde, educação, emprego e moradia. Não se resolve esses problemas sem reforma fiscal e com uma retórica vazia. Trocando em miúdos, como em toda democracia, quem ganhar deve levar. Mas terá que trabalhar muito para não frustrar seus eleitores. Não fará o que quer, quando e como quiser; será escravo das suas próprias circunstâncias.

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Luiz Carlos Azedo: Algo se move

“Pesquisas demonstram alterações de comportamento do eleitor na reta final da campanha, que será encerrada amanhã. No primeiro turno, houve grandes surpresas nesses três últimos dias”

A pesquisa do Ibope de terça-feira sinaliza que algo se move entre os eleitores. O dado mais surpreendente é a virada do candidato do PT na cidade de São Paulo, na qual Fernando Haddad ultrapassou Jair Bolsonaro (PSL): 51% a 49%. No primeiro turno, Haddad recebeu 19,7% dos votos dos paulistanos, contra 44,58% de Bolsonaro. Em 2014, Aécio Neves venceu com 63,85% dos votos na capital paulista, contra 36,15% de Dilma Rousseff (PT). Haddad foi prefeito da capital, mas não se reelegeu em 2016. Foi derrotado por João Doria (PSDB) no primeiro turno. Analistas consideram essa mudança um caso isolado e atribuem o fenômeno à rejeição do tucano, que abandonou a Prefeitura de São Paulo com 15 meses de mandato. Os resultados no interior corroboram a tese, porque Bolsonaro lidera a disputa no estado de São Paulo com 64% dos votos válidos contra 36% de Haddad.

Em todo o país, o resultado do Ibope mostra oscilação no limite da margem de erro: Bolsonaro caiu de 59% para 57%, enquanto Haddad subiu de 41% para 43% dos votos válidos. Na votação espontânea, a queda de Bolsonaro é de cinco pontos, de 47% para 42%, enquanto Haddad sobe ligeiramente, de 31% para 33%. Esses números estão diretamente relacionados à rejeição dos candidatos. A de Haddad caiu de 47% para 41%, enquanto a de Bolsonaro subiu de 35% para 40%. As intenções de voto do candidato do PSL oscilaram para baixo na faixa entre 25 e 55 anos, entre homens e mulheres, brancos, negros e pardos, em todas as faixas de escolaridade, (exceto nível superior) e na faixa de renda entre 2 e 5 salários-mínimos.

Os dados da eleição por região revelam indícios de movimentação eleitoral: na região Nordeste, Bolsonaro subiu de 33% para 34%; Haddad, caiu de 57% para 53%. No Norte/Centro-Oeste, o militar da reserva caiu de 59% para 55%; o petista subiu de 33% para 36%. No Sudeste, Bolsonaro caiu de 58% para 54%, e Haddad subiu de 29% para 31%. No Sul, o candidato do PSL oscilou de 62% para 60%, e o petista, de 28% para 29%. Esses resultados demonstram alterações de comportamento do eleitor na reta final da campanha, que será encerrada amanhã. No primeiro turno, em alguns estados, houve grandes surpresas nesses três últimos dias.

O PT faz uma campanha dura e agressiva contra Bolsonaro, na qual resgata posturas e atitudes que o candidato do PSL gostaria que fossem esquecidas pelos eleitores. A estratégia de Haddad é caracterizar a eventual eleição de Bolsonaro como uma volta à ditadura, o que não é verdade, mas ganha veracidade quando acompanhada de antigas declarações do candidato e episódios recentes de sua campanha. As ameaças de seu filho Eduardo Bolsonaro, deputado eleito com a maior votação do país, contra o Judiciário, continuam sendo exploradas por Haddad. Bolsonaro também ameaçou adversários com a prisão e o exílio.
Essas declarações se tornaram verdadeiros bumerangues na campanha eleitoral. O candidato do PSL sentiu o golpe. Orientou seus partidários a não entrarem em confronto físico com os petistas e voltou a dar declarações para suavizar sua imagem e neutralizar os ataques dos adversários. Tem uma vantagem robusta ainda, mas eleição não se ganha de véspera. Mesmo quando já se está com a mão na faixa, ela precisa passar pela cabeça.

Fake news

A Polícia Federal está jogando duro com as usinas de fake news. Encarregado das investigações sobre crimes eleitorais na internet, o delegado Flávio Coca comandou operações em cinco estados para combater violações de sigilo de voto e ameças de morte: “As pessoas pensam que a polícia não vai chegar nelas ou que a Justiça não vai alcançá-las por estarem na internet, estarem atrás de um celular, de um teclado de computador. Mas se enganam, porque os olhos alcançam até as pessoas que estão imaginando que estão ocultas na internet. Não estão!”

A PF executou quatro mandados de busca e apreensão nas cidades de São Paulo (SP), Sorocaba (SP), Uberlândia (MG) e Caxias do Sul (RS). Foram intimados investigados nos municípios de Juiz de Fora (MG), Varginha (MG), Recife (PE), Caxias do Sul (RS) e Tomé-Açu (PA). Em Uberlândia, um jovem de 21 anos, que postou mensagens incitando a violência dois dias após o primeiro turno, foi identificado. Em Juiz de Fora, uma jovem de 25 anos. Um dos investigados foi identificado por reconhecimento facial.

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Luiz Carlos Azedo: O mito positivista

“Bolsonaro está sendo obrigado a desdizer não somente seus auxiliares, como Paulo Guedes, futuro ministro da Fazenda, e o vice, general Mourão, mas principalmente a si próprio”

No cavalo de pau dado pela campanha do PT, em razão da inviabilidade do projeto de “democracia popular”, que foi derrotado no primeiro turno, o candidato à Presidência Fernando Haddad deveria procurar nos seus alfarrábios um velho livro de Karl Marx, O 18 Brumário de Luís Bonaparte, publicado em 1852. Talvez o professor de ciência política da Universidade de São Paulo, que virou clone do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva, encontre uma explicação para o que aconteceu em 7 de outubro. O “cretinismo parlamentar” desgraçou boa parte da elite política da Câmara e, principalmente, do Senado; o “transformismo” de seu partido fez do antipetismo uma força eleitoral avassaladora a favor de Jair Bolsonaro (PSL), protagonista de uma possível “restauração conservadora”, tal qual “o lunático Luís Napoleão, com meia dúzia de oficiais desconhecidos e cheios de dívidas”, nas palavras de Friedrich Engels, em carta ao seu amigo Marx.

Ao estudar a história da França entre a Revolução de fevereiro de 1848, que pôs fim à monarquia constitucional de Luís Felipe, e a Comuna de Paris, de 1871, Marx conceituou o “bonapartismo”, que até hoje gera controvérsias entre acadêmicos de esquerda, porque seria um meio-termo entre a “democracia burguesa” e o “fascismo”. Durante a ditadura militar, aqui no Brasil, provocou muita polêmica entre intelectuais e militantes de oposição, que se dividiam entre os que caracterizavam o regime como fascista, por causa do terrorismo político de Estado, e os que rejeitavam essa caracterização, porque não havia um partido de massas como na Itália de Mussolini e na Alemanha de Hitler. A essência do bonapartismo é a autonomia do Estado em relação às classes sociais e a existência de um líder político carismático e populista.

O chefe de Estado concentra um poder desproporcional em relação ao Legislativo e ao Judiciário, promove a centralização política em relação aos demais níveis de poder. Para governar, apoia-se na burocracia e nas Forças Armadas; suprime liberdades e reprime com violência a oposição e os movimentos sociais. Luís Bonaparte eliminou o Parlamento e tentou restabelecer o Império, mas tudo não passou de uma farsa. Por isso, o golpe de Estado de 2 de dezembro de 1851 foi chamado de 18 Brumário por Marx, numa alusão ao golpe de Estado de Napoleão Bonaparte de 9 de novembro de 1799 (18 brumário no calendário da Revolução Francesa), que resultou no fim da Primeira República, proclamada em 1792, e no Consulado, que logo se transformaria no Império de Napoleão. Luís Bonaparte derrubou a república burguesa e instaurou o Segundo Império (1851-1870), no qual se proclamou Napoleão 3º, com a ambição de restaurar a obra de Napoleão 1º, seu suposto tio.

O projeto “bonapartista” subjacente no discurso de Bolsonaro, como a “democracia popular” de Haddad, pode ter sido derrotado no primeiro turno. Propostas de elaboração de uma Constituição por notáveis, a ser submetida a um referendo popular, e de alteração da composição do Supremo Tribunal Federal (STF), que ferem frontalmente a atual Constituição, já foram descartadas. Para vencer, Bolsonaro está sendo obrigado a desdizer não somente seus auxiliares, como Paulo Guedes, futuro ministro da Fazenda e do Planejamento, e o vice, general Hamilton Mourão, mas principalmente a si próprio. Sobram declarações e episódios que podem lhe tirar a vitória, se não forem renegados. O tema da violência, que catapultou sua candidatura, virou uma faca de dois gumes, porque a narrativa do duro combate ao crime organizado também alimenta a radicalização política e ideológica de seus partidários contra os adversários.

Positivismo
O Brasil já teve três presidentes militares eleitos: Floriano Peixoto (1991-1894); Hermes da Fonseca (1910-1914); e Eurico Gaspar Dutra (1945-1950). Foram duros com a oposição, especialmente Floriano, o “Marechal de Ferro”, que governou a maior parte do tempo com o país em Estado de Sítio. Ao concluir o mandato, todos entregaram o poder a presidentes civis. Durante o regime militar, o militar que permaneceu mais tempo no poder foi João Figueiredo, que governou por seis anos, perdeu a própria sucessão e devolveu o poder aos civis, com a eleição de Tancredo Neves no colégio eleitoral. Getúlio Vargas, que foi ditador por 15 anos, presidente eleito, encerrou a carreira com um tiro no próprio peito. Não é fácil ser ditador no Brasil.

Na política brasileira, nunca o poder central teve tão pouca influência nas eleições. Os destinos do país estão sendo decididos pela sociedade, num pleito democrático, com ampla liberdade. A alternância de poder e o direito ao dissenso estão assegurados. O projeto político de Bolsonaro tangencia o velho positivismo da Escola Militar da Praia Vermelha e o castilhismo gaúcho, que são incompatíveis com nossa democracia. A atual Constituição, nosso mais valioso ativo democrático, só pode ser modificada pelo Congresso, que representa todos os eleitores, não apenas uma maioria eventual, caso do presidente eleito. Por isso, qualquer que seja o resultado das urnas, é melhor aceitar o resultado, com espírito autocrítico, para não repetir os erros no futuro. E respeitar a vontade popular.

 

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Luiz Carlos Azedo: O piloto sumiu

“Haddad não esperava que a transferência de votos do petista batesse no teto tão cedo, bem abaixo da rejeição que fez Bolsonaro subir ainda mais e quase vencer no primeiro turno”

O candidato do PT à Presidência da República, Fenando Haddad, volta ao horário eleitoral hoje repaginado, vestido de verde-amarelo e com um discurso paz e amor. O ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva, seu mentor intelectual e chefe político, desaparecerá da propaganda do petista. Resta saber se a dissimulação, que atende aos apelos dos setores “golpistas” que querem apoiá-lo como “um mal menor”, trará votos suficientes para vencer o pleito ou se a tática tipo “o piloto sumiu” confundirá ainda mais os eleitores. O tracking de ontem mostrava que Bolsonaro continua subindo e Haddad, caindo: a distância entre os dois seria de 18 pontos percentuais, com 10% de nulos e brancos.

Haddad mudou completamente a linha de campanha. Para chegar ao segundo turno, o PT alimentou a tática do ódio nas eleições, com o discurso “nós contra eles”, pois Lula considerava Bolsonaro o adversário ideal a ser batido no segundo turno. Quem eram “eles”? Os “golpistas neoliberais”, claro. Um post do petista Breno Altman, do site Opera Mundi, nas redes sociais, intitulado “Quem é o inimigo principal?”, no momento em que essa linha política passou a ser questionada internamente no PT, ilustra como Haddad chegou ao segundo turno: “São diferentes os alvos da primeira e da segunda volta, a meu juízo. No primeiro turno, os inimigos principais são os partidos e candidatos que comandam o bloco golpista, a começar por Geraldo Alckmin, mas se estendendo a Meirelles, Alvaro Dias, Amoedo e Marina Silva. A centro-direita deve continuar a ser destroçada por sua cumplicidade com o impeachment e a agenda antipopular, antidemocrática e antinacional do governo Temer. Sua destruição política é fundamental para a regeneração do país. Caso haja alguma chance, em algum momento, de levantar a cabeça, toda artilharia possível deve ser voltada para aniquilar os aliados de Temer.”

Intérprete fiel da lógica política petista, Altman antecipava o que viria depois: “No segundo turno, por óbvio, o inimigo principal será o neofascismo representado por Jair Bolsonaro. A inversão de objetivos táticos é tudo o que deseja o partido do golpe para buscar um caminho que enfraqueça a polarização entre Haddad e o capitão reformado, dando algum fôlego para uma candidatura de centro que possa ser apresentada como ‘mais viável’, ‘mais moderada’, para derrotar o neofascismo.” Haddad manteve a rotina de visitas semanais a Lula, vestiu a camiseta vermelha da campanha Lula livre e chegou ao segundo turno sem mudar o discurso. Não esperava, porém, que a transferência de votos do petista batesse no teto tão cedo, bem abaixo da rejeição que fez Bolsonaro subir ainda mais e quase vencer no primeiro turno.

“Aconteça o que aconteça, na delícia ou na dor, um objetivo estratégico terá sido alcançado nessas eleições: a destruição da centro-direita, do centro golpista, como alternativa viável para o comando do país”, disparou Altman, quando isso aconteceu. “A soma do arco Alckmin-Marina, somando Amoedo, Meirelles e Alvaro Dias, mal chega a 20% das intenções de voto. Essa é uma vitória importante do campo popular, que pavimenta o segundo turno e a marcha rumo ao triunfo em 28 de outubro.” Essa estratégia, porém, se tornou uma maldição para Haddad. A maioria dos partidos derrotados no primeiro turno optou pela neutralidade, alguns já se posicionam para permanecer em oposição, outros para aderir ao novo governo, vença Bolsonaro ou Haddad. Por ora, acompanham o jogo da arquibancada.
Tática do medo

Entretanto, ninguém morre de véspera numa eleição tão disputada, ainda mais para presidente da República. Desde a reeleição de Lula, o PT tem uma fórmula eficaz para disputar o segundo turno: a tática do medo. Não será diferente agora, com a ajuda de atitudes fascistas dos partidários de Bolsonaro. Poderia ter sido usada antes, mas isso não interessava, porque o objetivo era o atual confronto. O problema de quem vende a alma a Mefistófeles, como Dr. Fausto, é que o Diabo quererá o seu corpo no inferno. Foi o que aconteceu com Haddad. Bolsonaro é acusado de machista, misógino e homofóbico, isso despertou os maus instintos das profundezas de uma sociedade traumatizada pela violência, pela corrupção e pela desestruturação das famílias. Essa narrativa até agora não foi capaz de superar a força do antipetismo, porque o partido governou como uma espécie de erva daninha.

Bolsonaro, porém, sentiu a pressão em relação a temas que atingem diretamente a população mais pobre. Nas eleições de 2006, quando Lula foi reeleito, Alckmin foi derrotado porque se disseminou que ele venderia a Petrobras e o Banco do Brasil e acabaria com o Programa Bolsa Família, que abriga 13 milhões de famílias. A tática se repetiu contra José Serra, em 2010, e Aécio Neves, em 2014. Agora está sendo usada novamente. Não foi à toa que Bolsonaro anunciou que não pretende privatizar as estatais e vai criar o 13º do Bolsa Família. A radicalização e a disseminação do ódio nas redes sociais, por uma militância que não mede as consequências do que escreve, já evoluem para confrontos físicos, que precisam ser contidos, porque isso a sociedade não suporta. Não fazem parte do jogo democrático, são atitudes realmente fascistas.

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Luiz Carlos Azedo: Bolsonaro larga na frente

“Em termos de votos válidos, Bolsonaro tem 58% e Haddad, 42%, ou seja, uma diferença de 16 pontos, que não é impossível de ser revertida, mas é difícil”

A realização de segundo turno obrigou Jair Bolsonaro (PSL) e Fernando Haddad (PT) a buscar a maioria de votos válidos que faltou no domingo passado. Na pesquisa divulgada ontem pelo Datafolha, Bolsonaro larga bem na frente, com 49% de intenções de voto, e Haddad tem 36% dos votos totais, o que confirma as previsões quanto à deriva dos eleitores após o primeiro turno. Brancos e nulos somam 8%; não sabem, não respondeu, 6% dos eleitores.

Em termos de votos válidos, Bolsonaro tem 58% e Haddad, 42%, ou seja, uma diferença de 16 pontos, que não é impossível de ser revertida, mas é difícil. Para isso, Fernando Haddad mudou as cores da campanha, tirou a camiseta vermelha do Lula, livre! e pediu para beijar a mão do ex-presidente Fernando Henrique Cardoso. O tucano já pode cantarolar um velho samba do Bezerra da Silva: “A necessidade obrigou/ Você a me procurar. /Você era, orgulhosa. /Mas a necessidade acabou com a sua prosa.”

Embora à frente nas pesquisas, a equipe de Bolsonaro também pôs as barbas de molho. O general Augusto Heleno, um dos coordenadores de sua campanha, deu uma entrevista recomendando humildade aos correligionários. Bolsonaro, porém, não mudou o estilo e bate duro em Haddad, a quem chamou de “marmita de corrupto preso”, depois de ser criticado pelo petista, por não ir ao primeiro debate na TV, alegando proibição médica.

No Congresso, nesta semana, deputados reeleitos e derrotados trocavam informações sobre o tsunami eleitoral que varreu parte da antiga elite do Senado e também afastou da Câmara dezenas de cabeças coroadas. Há quatro blocos em formação.

Câmara
O primeiro bloco é liderado pelo PSL, o partido de Bolsonaro, que elegeu a segunda maior bancada da Câmara, com 52 deputados (tinha 8). A orientação de Bolsonaro é atrair parlamentares dos pequenos partidos que não conseguiram ultrapassar a cláusula de barreira, para se tornar a maior bancada da Casa. A movimentação, coordenada pelo deputado Onix Lorenzoni (DEM-RS), tem por objetivo articular uma base parlamentar de 300 parlamentares. A articulação fez a candidatura à reeleição do atual presidente da Câmara, Rodrigo Maia (DEM-RJ), subir no telhado.

O segundo bloco é liderado pelo PT, que elegeu a maior bancada, com 56 parlamentares, um êxito inquestionável. No segundo turno, com as articulações feitas pela campanha de Haddad, agora sob comando do ex-governador e senador eleito Jaques Wagner, esse bloco deve incorporar os parlamentares do PDT, com 34 deputados, e PSB, com 32 deputados, além do PSol, com 10, e o PCdoB, com 9, mas que não alcançou o número de votos exigidos pela cláusula de barreira. Essa frente de esquerda pode se tornar uma oposição radical, se Bolsonaro vencer, ou nuclear a atração das forças ao centro, como aconteceu no governo Lula, caso Haddad vença as eleições. Com certeza, o bloco lançará um candidato à Presidência da Câmara.

O terceiro bloco deve ser articulado pelas bancadas do PP, com 37 deputados; e do MDB e do PSD, com 34 cada, e tentar agrupar os partidos menores que resistirem ao assédio do PSL. É a chamada turma do “Hay gobierno? Soy a favor”. Os três partidos estão encastelados na Esplanada dos Ministérios e serão os mais atingidos na formação do novo governo, em razão dos cargos que hoje ocupam. Um quarto bloco é constituído pelos partidos de esquerda mais moderada: o PSDB, com 29 deputados; o PPS, com oito; o PV, com quatro; e a Rede, com um. Esses partidos terão de se reinventar, qualquer que seja o vencedor do pleito.

Senado
No Senado, o MDB, elegeu sete senadores; Rede e PP têm cinco senadores cada um. DEM, PSD, PT, PSDB e PSL, quatro. Esse resultado alterou a correlação de forças na Casa, reduzindo o peso do MDB, que continua com a maior bancada, com 12 senadores. O PSDB tem nove; o PSD, sete; o DEM, seis; o PDT, seis; Podemos, cinco.

Tradicionalmente, o Senado elege o presidente indicado pela maior bancada e preenche os cargos na Mesa e presidências de comissões pelo critério da proporcionalidade. O senador Renan Calheiros(PMDB-CE), com a não reeleição de Eunício Oliveira, já se movimenta para voltar à Presidência da Casa. Acontece que apoia Haddad; se Bolsonaro vencer, a sua candidatura subirá no telhado, porque a tradição em relação à proporcionalidade poderá ser quebrada na eleição, o que nunca antes aconteceu.

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