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Política Democrática: Globalização promoveu aumento da riqueza, afirma Vinícius Müller

Doutor em História Econômica e professor do Insper observa que fenômeno também provocou separações sociais

Por Cleomar Almeida

O doutor em História Econômica e professor de Instituto de Ensino e Pesquisa (Insper) Vinícius Müller diz que a globalização é um “fenômeno mais complexo que promoveu aumento da riqueza na mesma medida em que desarticulou antigas estruturas produtivas e sociais”. “A globalização não era, como pensávamos há mais de vinte anos, um novo imperialismo encabeçado pelos norte-americanos”, afirma ele, em artigo publicado na edição de novembro da revista Política Democrática online, produzida e editada pela Fundação Astrojildo Pereira (FAP), vinculada ao Partido Popular Socialista (PPS).

De acordo com Vinícius Müller, as novas separações sociais produzidas pela globalização na sociedade norte-americana não são exclusivamente econômicas. “Elas estão relacionadas ao questionamento que parte da sociedade faz em relação aos valores que construíram aquela nação. De um lado políticas identitárias, de outro, xenofobia. Entre eles um hiato. É neste espaço que mora o diabo”, ironiza ele.

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No fim do século passado, de acordo com o doutor em História Econômica, quando a combinação entre o fenômeno da globalização e a retomada dos valores liberais se arvorava como o modelo único, duas posições antagônicas se estabeleceram, conforme ele escreve. “Uma delas dizia que a abertura dos mercados nacionais, a maior velocidade nas trocas de mercadorias e moedas, assim como a formação de cadeias produtivas globais, garantiriam a ampliação da riqueza e melhoria significativa no padrão de vida de pessoas espalhadas pelo globo”, afirma, para continuar: “Outra, contrária, apostava na hipótese de que a globalização em sua vertente neoliberal nada mais era do que retomada do imperialismo do século XIX, agora liderado pelo EUA. Os resultados, depois de 30 anos, não cabem em slogans tão simples assim”.

No plano geral, conforme destaca o professor do Insper, a produção e a circulação de riquezas aumentaram. “Grupos populacionais imensos foram beneficiados pela ampliação do mercado, descentralização produtiva e aumento da produtividade e da riqueza”, acentua ele, e um trecho do artigo. “A urbanização de contingentes populacionais maiúsculos na China e na Índia, a transferência de partes significativas da produção industrial para países como o Vietnã e o aumento da qualidade de vida em países do leste europeu são visíveis. Em uma constatação anti-intuitiva, os países que mais ganharam com a globalização não foram aqueles que, no início do século, pareciam ser os impositores desta ordem”.

Na avaliação do autor, portanto, o que parecia ser uma imposição voltada à abertura de mercado mundial aos EUA, como um “neoimperialismo”, segundo ele, não se confirmou na medida em que tal processo produziu mais efeitos benéficos, ou que foram proporcionalmente maiores, em países como Chile, Coreia do Sul, Austrália e Lituânia do que nos EUA.

“A constatação de que a globalização, de fato, produziu mais riqueza e ampliou a qualidade de vida de enormes contingentes populacionais, e que hoje a tese de um imperialismo norte-americano parece fruto da ingenuidade da juventude, não significam a confirmação de que tal processo ocorreu sem efeitos colaterais que hoje batem à nossa porta. O mais importante entre eles é a ampliação da desigualdade. Não aquela que os críticos da globalização imaginavam que ocorreria entre os países”, diz outro trecho.

Vinícius Müller também diz que um argumento que atenuava o avanço da desigualdade afirmava que “é melhor viver em um país desigual e rico do que em um igualitário e pobre”. “Tem sentido, até porque a riqueza quando cresce beneficia a todos, mesmo que em níveis diferentes. O exercício retórico era simples: em uma sociedade na qual vive Bill Gates, a renda per capita cresce, mas a desigualdade também”, acrescenta o autor. “E, certamente, é melhor viver numa sociedade que tem a oportunidade de ampliar sua produção de riqueza a partir do uso das ferramentas criadas pelo fundador da Microsoft. O problema é que tamanha desigualdade começa a impactar em outras questões que fogem do escopo deste argumento”, assevera ele.

 

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Política Democrática: “Entramos na era da mentira”, afirma Sérgio Denicoli

Pós-doutor em comunicação analisa avanço da internet, em artigo publicado na edição de novembro da revista Política Democrática online

Por Cleomar Almeida

O pós-doutor em Comunicação e diretor da AP Exata – Inteligência Artificial, Sérgio Denicoli, diz que a expansão da internet, possibilitada pelo surgimento da web, em 1989, sustentou a crença de que “o novo meio online seria um grande campo de liberdade”. No entanto, hoje, segundo ele, “entramos na era da mentira, das teorias da conspiração, que influenciam nossos amigos e familiares”, como escreve em artigo publicado na edição de novembro da revista Política Democrática online, produzida e editada pela Fundação Astrojildo Pereira (FAP), vinculada ao Partido Popular Socialista (PPS).

Com o título “As doces, atraentes e estimulantes fake news”, o artigo ressalta que, no início, a ideia que havia era de que finalmente o mundo se livraria das amarras da mediação da imprensa, que, segundo ele, é “contaminada pelos seus mais diversos interesses e pela sua proximidade com o poder político”.

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No final dos anos 1980, como observa o pós-doutor em Comunicação, acadêmicos e críticos entendiam que a imprensa desenhava toda a narrativa da vida pública e que a internet trazia ao mundo a possibilidade de democratização da informação. “As pessoas comemoraram, então, o surgimento do chamado ‘jornalista cidadão’, aquele que não precisava de intermediários para difundir uma notícia. Foi uma onda avassaladora a transformação dos internautas em produtores e não apenas consumidores de conteúdo”, escreve ele, em um trecho.

No entanto, de acordo com Sérgio Denicoli, houve mudança não apenas no ato de se reportar algo. “A internet viria a colocar em causa muitas profissões que tinham a mediação como norte. Foi assim que aconteceu a revolução do Uber, do Airbnb – que permite às pessoas comuns alugarem suas próprias casas como se fossem hotéis –, dos classificados, do comércio de imóveis, entre tantos outros exemplos. Enquanto essas mudanças eram comemoradas, o mundo não percebeu que, aos poucos, a internet foi sendo capturada”, acrescenta ele.

Segundo o diretor da AP Exata – Inteligência Artificial, empresas ultraglobais, como Google, Facebook, Twitter etc, construíram resorts de comunicação e cooptaram bilhões de usuários, os quais, conforme ressalta ele, foram transformados “em produtos narcisistas municiados de espelhos hipnotizadores”. “Ocorreu, portanto, a digitalização da vida, com ideias, opiniões e momentos privados devidamente classificados e armazenados em data centers espalhados pelo planeta. As pessoas foram agrupadas em bolhas e viraram presas”, afirma Sérgio Denicoli.

Assim, conforme aponta o artigo, “um ambiente que chegou anunciando liberdade se tornou uma prisão sem muros, com requintes apurados de cooptação ideológica”. “Tudo devidamente disseminado por robôs e alimentado pelo que denominamos de ‘perfis de interferência’, criados especificamente para interferir nos mais diversos processos que envolvem a opinião pública”.

Na avaliação do pós-doutor em Comunicação, a sociedade entrou não somente “na era da mentira”, mas também na das “teorias da conspiração, que influenciam nossos amigos e familiares”. “Estabeleceu-se um surto coletivo, onde, se achando mais que especial, o internauta acredita que sua vida é o centro das atenções e que sua opinião deve prevalecer, sendo ela apoiada em pós-verdades, se assim for necessário. Uma doce ilusão. Tão doce e atraente, como uma bem construída fake news”, escreve ele, no artigo.

 

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Luiz Carlos Azedo: Aventuras da Lava-Jato

“O indulto de Natal já é jogo jogado. Revela que a maioria no Supremo que pode revogar a jurisprudência das prisões em regime fechado após condenação em segunda instância”

O principal eixo das eleições de 2018 foi a Operação Lava-jato, que sepultou as pretensões de muitos políticos tradicionais e alavancou a vitória do presidente eleito, Jair Bolsonaro, além da eleição de governadores, senadores e deputados que surfaram a onda de ojeriza dos eleitores ao establishment político. A prisão do governador Luiz Fernando Pezão (MDB), na manhã de ontem, no Rio, por determinação do ministro Félix Fischer, a pedido da procuradora-geral da República, Raquel Dodge, é uma demonstração de que a Lava-Jato está revigorada e uma nova ofensiva do Ministério Público Federal está em curso para punir os políticos corruptos.

Aos 63 anos, Pezão foi preso durante a Operação Boca de Lobo, após delação premiada de Carlos Miranda, operador de Cabral, que detalhou o pagamento de mesada de R$ 150 mil para o governador fluminense na época em que ele era vice. Haveria também pagamento de 13º de propina e ainda dois bônus de R$ 1 milhão como prêmio. Raquel Dodge acusou Pezão de ter dado continuidade ao esquema de corrupção que levou à prisão o ex-governador Sérgio Cabral, além de montar um sistema próprio de arrecadação. O vice-governador Francisco Dornelles assumiu o comando da administração estadual e deu uma entrevista na qual disse que a prisão de Pezão foi uma violência.

Os quatro últimos governadores eleitos do Rio de Janeiro já foram presos, mas somente Pezão o foi em pleno exercício do mandato, caso semelhante ao do ex-governador do Distrito Federal José Roberto Arruda. Sérgio Cabral, Anthony Garotinho e Rosinha Matheus foram presos quando já não eram mais governadores. Dornelles permanecerá no cargo até o fim do ano. O futuro governador Wilson Witzel, que começará sua gestão em 1º de janeiro de 2019, foi eleito na onda de rejeição aos políticos ligados a Cabral, entre os quais o ex-prefeito Eduardo Paes (DEM), que era o favorito na disputa, mas acabou contaminado pelo desgaste dos aliados presos.

Há um verdadeiro pânico no Congresso em relação às investigações ainda em curso, porque muitos políticos que não se elegeram ou ocupam cargos nos governos que estão se encerrando perderão o foro privilegiado. A prisão de Pezão sinaliza que os desdobramentos da Operação Lava-Jato nos estados ainda não se encerraram.

Prisões
É nesse contexto que o julgamento do indulto de Natal de 2017 concedido pelo presidente Michel Temer, em curso no Supremo Tribunal Federal (STF), passou a ser o centro das atenções em relação à Lava-Jato. A maioria dos ministros, ontem, votou pela manutenção do decreto de indulto, mas um pedido de vista do ministro Luiz Fux, que pleiteou mais tempo para análise do processo, adiou a decisão.

Editado em outubro do ano passado, o decreto estabeleceu que poderia receber o perdão quem cumpriu 1/5 da pena em caso de crimes sem violência ou grave ameaça. Para a Procuradoria-Geral da República, o decreto beneficia presos por crimes de colarinho-branco, como corrupção e peculato. Com a maioria (6 votos a 2) favorável à manutenção do decreto, o ministro Gilmar Mendes propôs a revogação da liminar do ministro Luís Barroso, que sustou o decreto, para permitir a aplicação do indulto.

O presidente do STF, Dias Toffoli, pôs em votação a proposta de revogação da liminar, mas, quando o placar estava 5 a 4 a favor da revogação, o próprio Toffoli pediu vista e suspendeu o julgamento. É que o ministro Ricardo Lewandowski, que votou com a maioria a favor do indulto, estava ausente e, nesse caso, o voto de Toffoli poderia levar a um empate. Votaram pela validação do indulto os ministros Alexandre de Moraes, Rosa Weber, Ricardo Lewandowski, Marco Aurélio Mello, Gilmar Mendes e Celso de Mello. Somente Barroso, ministro-relator, e Fachin votaram pela derrubada de parte do decreto.

Embora não tenha sido formalizada, a decisão sinaliza uma tendência do STF a mitigar os efeitos da Lava-Jato, pois o indulto de Natal de 2018 teria como referência a decisão e, segundo os procuradores, poderia beneficiar mais de 20 condenados de colarinho-branco que cumprem pena em regime fechado.

Entretanto, a decisão do STF sobre o indulto de Natal já é jogo jogado. Revela uma maioria que pode revogar a jurisprudência das prisões em regime fechado após condenação em segunda instância, quando o assunto for posto em pauta novamente. Essa polêmica voltará ao Supremo no próximo dia 4, quando será julgado o pedido de habeas corpus do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva, condenado no caso do tríplex do Guarujá. Ontem, por decisão do Tribunal Regional Federal da 4ª Região, sediado em Porto Alegre, o ex-ministro Antônio Palocci recebeu o benefício da prisão domiciliar, com tornozeleira eletrônica, em razão de sua “delação premiada”, na qual denuncia Lula.

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Política Democrática: “Bolsonaro significa o novo”, diz Paulo Baía

Em artigo da edição de novembro da revista Política Democrática online, sociólogo afirma que presidente eleito estabeleceu “relação de intimidade” com o público

Por Cleomar Almeida

O sociólogo e cientista político Paulo Baía diz que “Bolsonaro significa efetivamente o novo mesmo que seja rejeitado pela vanguarda do pensamento encontrada nas universidades, partidos políticos e centros culturais”. De acordo com ele, durante a campanha, o então “candidato esteve presente junto às multidões a partir do check-in dentro de casa. Em contato permanente com sua imensa rede de seguidores, formadores de opinião”.

O assunto é abordado no artigo “Bolsonaro – uma epifania em rede”, publicado na edição de novembro da revista Política Democrática online, produzida e editada pela Fundação Astrojildo Pereira (FAP), vinculada ao Partido Popular Socialista (PPS). Na avaliação do sociólogo, a estratégia do então candidato, durante a campanha eleitoral, sustentou-se em uma “fortaleza de marketing, pois estabeleceu uma relação de intimidade”. “Transformou-se no centro das atenções, mesmo na mais significativa manifestação pró-oposições como #elenão. Foi um movimento capturado pela campanha bolsonarista e ressignificado, devolvendo-o como mais um marketing a seu favor mesmo que por vias indiretas”, diz o autor, em um trecho.

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Paulo Baía afirma que houve a supervalorização de Lula e do PT, Geraldo Alckmin e sua imensa estrutura partidária, do tempo de televisão e rádio no período de propaganda eleitoral e, sobretudo, do custo das campanhas num novo modelo de financiamento que privilegiou as oligarquias partidárias e sua imaginada capacidade de perpetuação. “Todos os indícios pró-Bolsonaro foram descartados, sua visão de mundo extremamente conservadora e religiosa em relação aos costumes e a pauta de enfrentamento ao identitarismo”, afirma ele, em outro trecho.

“Aquilo que o sistema político e demais partidos recriminavam ou zombavam em Bolsonaro era exatamente o que o fortalecia junto à maioria da população. Acusar Bolsonaro de ser um risco à democracia foi uma contradição, pois a percepção da maioria da população era o oposto, ou seja, quem representava ameaça era o PT”, destaca o analista político.

De acordo com Paulo Baía, a arrogância acadêmica e a prepotência intelectual desconsideraram, conforme ele diz, “o sentimento da maioria da população classificado como tosco, vulgar, desqualificado e moralmente inferior, não percebendo que a população havia criado suas próprias redes de debate em suas relações intermediadas pelas diversas plataformas digitais”. O autor observa que “estamos imersos em novos tempos em que a epifania individual é coletivizada pelas redes de afetos digitalizadas. O modelo de democracia representativa está em cheque e formas de participação direta estão-se sobrepondo às intermediações políticas e sociais”.

O sociólogo destaca que as pessoas “estão entrando numa nova fase do Humanismo, sendo transformado por uma radicalidade do individualismo expressada em múltiplas plataformas. É um ser humano hiperconectado”. “Fernando Haddad e os demais apostaram nas relações sociais clássicas do mundo capitalista do século XX. Ignoraram na prática a realidade neocientífica já vivida desde os anos 1990 com a expansão da internet e da telefonia móvel, experimentados nas manifestações de 2013 em diante”, acentua ele.

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Política Democrática: Eleição de Bolsonaro põe fim a um ciclo, diz presidente nacional do PPS

Em artigo da edição de novembro da revista Política Democrática online, Roberto Freire diz que já foi definida a mudança de nome do partido político

Por Cleomar Almeida

O presidente nacional do Partido Popular Socialista (PPS), Roberto Freire, avalia que a eleição de Bolsonaro para a Presidência da República de 2019 a 2022 pode ser visto como “o encerramento de um ciclo político iniciado a partir da Nova República (1985)”. Esse período é posterior ao do regime militar no Brasil (1964-1985). A análise dele está publicada no artigo “Contemporâneos do futuro”, que integra a edição de novembro da revista Política Democrática online, produzida e editada pela Fundação Astrojildo Pereira (FAP), vinculada ao PPS.

Roberto Freire analisa que, ao longo dos 30 anos de democracia no Brasil, houve, em sua maioria, “governos com claro viés progressista”, os quais, na avaliação dele, poderiam ser classificados como de centro-esquerda no aspecto político-ideológico. “Como ficou evidenciado depois do impeachment do presidente Collor de Melo, com a assunção de Itamar Franco, seu vice, que implementou uma série de reformas, começando pela mais importante, o Plano Real, que estancou o crônico processo de inflação que então vivíamos, abrindo as portas para um processo sustentado de desenvolvimento econômico”, diz ele, em um trecho.

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Em seu artigo, o presidente do PPS observa que o PT chegou ao poder com Luiz Inácio Lula da Silva (2003-2010), depois de dois mandatos do ex-presidente Fernando Henrique Cardoso (1995-2002), do PSDB, no período em que, conforme ressalta, o país viu a estabilidade econômica se solidificar. Roberto Freire lembra que o líder petista ocupou o Palácio do Planalto por oito anos e foi sucedido por Dilma Rousseff (2011-2016), reeleita para um segundo mandato em 2014. Ela foi afastada, na opinião do presidente do PPS, de forma “democrática e constitucionalmente, por meio de um processo de impeachment em 2016”.

Para o presidente do PPS, a “desastrosa experiência lulopetista” provocou o desmantelo da corrupção desenfreada e o enxovalhamento moral das esquerdas, o que, de acordo com ele, acabou atingindo todo o campo progressista, inclusive as correntes não alinhadas ao PT. Por isso, conforme avalia, “uma parcela amplamente majoritária da sociedade brasileira desta vez optou por escolher Bolsonaro, um candidato nitidamente de direita, para governar o país pelos próximos quatro anos”.

O presidente eleito não é apenas “um conservador ou até mesmo um nacionalista reacionário, mas um líder político que até se tornou conhecido mundialmente por algumas declarações frontalmente contrárias aos direitos das minorias, às liberdades individuais, às instituições republicanas e à própria democracia”, como lembra Roberto Freire em um trecho de seu artigo.

Mais adiante, o autor lembra que o PPS realizou, em março deste ano, em São Paulo, seu XIX Congresso Nacional, com a participação de militantes de todo o Brasil. No encontro, conforme registra ele, “foram debatidos temas como as alterações no mercado de trabalho, as reformas, a luta pelos direitos das minorias, as novas formas de relações pessoais e profissionais, o papel da esquerda democrática em um cenário de profundas mudanças econômicas, políticas, sociais e nos costumes, entre outros assuntos”.

Roberto Freire ressalta, entre outros pontos, que o PPS também vai realizar, na segunda quinzena de janeiro de 2019, “um Congresso Extraordinário buscando a recomposição do campo democrático e a construção de novo instrumento de organização das demandas da cidadania”. O intuito, segundo ele, é incorporar, de forma mais ampla, tais movimentos, forças políticas e personalidades da sociedade civil comprometidas com a democracia, a liberdade e as instituições, para a gestação de um novo partido. “Já foi definida, inclusive, a mudança de nome do atual Partido Popular Socialista (PPS), um novo Manifesto e Programa, bem como em sua estrutura organizacional, exatamente para que estejamos verdadeiramente conectados com os reais anseios dos brasileiros e com essa nova sociedade que emerge”.

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Luiz Carlos Azedo: Blindagem dos negócios

“Militares passaram a controlar as áreas mais suscetíveis a escândalos de corrupção. São setores que sempre foram muito cobiçados por partidos e lobistas”

Depois da blindagem da equipe econômica, que foi escalada pelo futuro ministro da Economia, Paulo Guedes, as nomeações recém-anunciadas pelo presidente eleito, Jair Bolsonaro, sinalizam uma blindagem para o programa de obras, privatizações e concessões do governo, que deverá ficar a cargo do futuro ministro Santos Cruz, da Secretaria de Governo. A escolha do novo ministro de Infraestrutura, Tarcísio Gomes de Freitas, que responderá pelas áreas de Transportes, Portos e Aviação Civil, vai na mesma direção.

“Vamos intensificar as parcerias em rodovias, ferrovias e aeroportos, tal qual está sendo feito hoje. Isso vai ser intensificado. A ideia é trazer o setor privado para a área de infraestrutura”, disse o futuro ministro, que dirigiu o Departamento Nacional de Infraestrutura de Transportes (Dnit). Tarcísio de Freitas já acompanha o leilão dos próximos 12 aeroportos, cujo edital foi aprovado, ontem, pela Agência Nacional de Aviação Civil (Anac), e da Ferrovia Norte-Sul.

Bolsonaro anunciou que somente iniciará obras quando houver recursos no orçamento para concluí-las, mas pretende dar continuidade àquelas que já foram iniciadas e estão paralisadas: “Não podemos abandonar isso, porque custaria muito caro para nós”, disse. Consultor legislativo da Câmara dos Deputados, Tarcísio de Freitas é engenheiro civil formado pelo Instituto Militar de Engenharia, com pós-graduação em gerenciamento de projetos e engenharia de transportes. Ex-capitão do Exército, foi chefe da seção técnica da Companhia de Engenharia do Brasil na Missão das Nações Unidas para a Estabilização do Haiti.

Com as novas nomeações, os generais que integram a cúpula do governo passaram a controlar as áreas mais suscetíveis a escândalos de corrupção, por envolverem grandes contratos e concessões com empresas privadas. São setores que sempre foram muito cobiçados por partidos e lobistas, que passarão a ser gerenciados pelos militares. Os interesses envolvidos são os mesmos; entretanto, mudaram os gestores e o ambiente, em razão da Operação Lava-Jato.

Indulto de Natal
O procurador Deltan Dallagnol denunciou, ontem, no Twitter, uma “intensa articulação” nos bastidores do Supremo Tribunal Federal (STF) para liberar o indulto de 2017, concedido pelo presidente Michel Temer, que “perdoava 80% da pena dos corruptos”. Segundo o procurador, se isso ocorrer, Temer poderá fazer a mesma coisa no Natal deste ano. O indulto é um perdão de pena e costuma ser concedido todos os anos em período próximo ao Natal, atribuição do presidente da República.

O julgamento deve continuar hoje, com o voto do relator, ministro Luís Roberto Barroso, que concedeu liminar (decisão provisória), em março, limitando a aplicação do indulto e aumentou o período de cumprimento para, pelo menos, um terço da pena. Barroso permitiu o indulto somente para quem foi condenado a mais de oito anos de prisão e vetou a concessão para crimes de colarinho-branco e para quem tem multa pendente. O governo recorreu, alegando que Barroso invadiu a “competência exclusiva” do presidente da República ao alterar as regras do indulto fixadas por Temer. O julgamento no STF se limita à validade do decreto editado em 2017.

Um parecer do criminalista Nabor Bulhões, da Comissão Nacional de Estudos Constitucionais da Ordem dos Advogados do Brasil e advogado de Temer na Lava-Jato, defende a constitucionalidade do decreto de indulto de Natal do ano passado, que foi suspenso por liminar do Supremo Tribunal Federal a pedido da Procuradoria-Geral da República. Segundo o parecer, não há inconstitucionalidade na inclusão dos crimes relacionados à corrupção no perdão presidencial, e a intervenção do Judiciário pode representar uma afronta ao princípio da separação de poderes.

Ao editar o decreto, Temer modificou algumas regras e, na prática, reduziu o tempo de cumprimento de pena pelos condenados, o que gerou críticas da Transparência Internacional e da força-tarefa da Operação Lava-Jato. O artigo 84 da Constituição, XII, estabelece que “compete privativamente ao Presidente da República conceder indulto e comutar penas, com audiência, se necessário, dos órgãos instituídos por lei”.

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Luiz Carlos Azedo: O Haiti é aqui

“A manutenção da Secretaria de Governo com status de ministério e a atual configuração esvaziará a Casa Civil, principalmente a relação política com o Congresso e com os movimentos sociais”

A indicação do general de divisão Carlos Alberto dos Santos Cruz para comandar a Secretaria de Governo consolidou na cúpula do governo um grupo de ex-integrantes da missão de paz da Organização das Nações Unidas (ONU) no Haiti, formado ainda pelo general Augusto Heleno, futuro chefe do Gabinete de Segurança Institucional, e pelo general Fernando Azevedo e Silva, que será o ministro da Defesa. Sua missão mais importante, porém, foi comandar a missão de paz na República Democrática do Congo, integrada por 23,7 mil militares de 20 países, de 2013 a 2015.

Santos Cruz foi o chefe da Secretaria Nacional de Segurança Pública durante parte da gestão do presidente Michel Temer, ostentando ainda no currículo uma passagem por Moscou, como adido militar, em 2001 e 2002, e atuação como conselheiro do Banco Mundial para a elaboração do Relatório de Desenvolvimento Mundial 2011 e do grupo da ONU para a revisão do reembolso aos países que contribuem com tropas em missões de paz. Sua indicação surpreendeu, pois a Secretaria de Governo inicialmente seria incorporada à Casa Civil, sob comando do ministro Ônix Lorenzoni.

Hoje, a Secretaria de Governo da Presidência reúne as subsecretarias de Assuntos Parlamentares, Assuntos Federativos e Juventude, além da Secretaria Nacional de Articulação Social. A manutenção da pasta com status de ministério e essa configuração esvaziará a Casa Civil, principalmente a relação política com o Congresso e com os movimentos sociais. Além disso, fortalece o grupo de generais que forma o estado-maior do governo Bolsonaro, integrado ainda pelo vice-presidente Hamilton Mourão, que não passou pelo Haiti, mas atuou na Missão de Paz em Angola e foi adido militar na Embaixada do Brasil na Venezuela.

Outro militar deverá comandar o Ministério da Infraestrutura, para o qual está cotado o general Joaquim Brandão, atual chefe de gabinete do ministro Sérgio Etchegoyen, ministro do Gabinete de Segurança Institucional (GSI) do governo Michel Temer. O tenente-coronel da Aeronáutica Marcos Pontes, ex-astronauta, no Ministério de Ciência e Tecnologia, completa o naipe de militares que ocupam posições no primeiro escalão. Até agora, ninguém da Marinha foi nomeado para um cargo de destaque no governo.

Segurança
Ontem, o futuro ministro da Justiça, Sérgio Moro, anunciou a criação de uma Secretaria de Operações Policiais Integradas, que ficará a cargo do delegado da Polícia Federal Rosalvo Franco, ex-superintendente da PF no Paraná, que atuou na Operação Lava-Jato. “A ideia da secretaria é coordenar operações policiais a nível nacional. Hoje nós temos muitos grupos criminosos que transcendem as fronteiras estaduais, e essa ação precisa muitas vezes de coordenação a nível nacional”, explicou. Atualmente, esse tipo de operação vem sendo realizada pelo Ministério da Segurança Pública, que será extinto.

Moro também escolheu o delegado da Polícia Federal (PF) Fabiano Bordignon para o comando do Departamento Penitenciário Nacional (Depen), também com atuação no Paraná. Além de chefiar a PF em Foz do Iguaçu, Borgidnon foi diretor de penitenciária federal de Catanduvas (PR). Moro teve contato com o delegado quando era juiz corregedor da penitenciária. “É uma função estratégica, nós todos sabemos que os presídios no Brasil constituem uma espécie de problema devido à questão de superlotação e fragilidade de certos presídios”, declarou Moro.

A indicação de procuradores e delegados federais para funções estratégicas no Ministério da Justiça, porém, já está gerando insatisfação entre os integrantes da chamada “bancada da bala” no Congresso, principalmente entre os parlamentares que são policiais militares e estão sendo pressionados pelos coronéis da ativa. O maior foco de insatisfação está em São Paulo, corporação à qual pertence o deputado e recém-eleito senador Major Olímpio.

Diretor da Associação dos Oficiais da Polícia Militar do Estado de São Paulo, o parlamentar é uma estrela em ascensão na política paulista e já exerce grande liderança entre os parlamentares do PSL, partido de Bolsonaro, porque é um dos mais experientes da bancada. Foi deputado estadual e assumiu seu primeiro mandato como deputado federal após ser eleito no pleito de 2014, com 179.196 votos. Agora, em 2018, foi eleito senador por São Paulo, com 9.039.717 votos.

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Luiz Carlos Azedo: A falta de Tancredo

“Bolsonaro tenta implementar uma radical agenda liberal na economia, mas ainda não tem uma base parlamentar que a respalde no Congresso”

“Bolsonaro tenta implementar uma radical agenda liberal na economia, mas ainda não tem uma base parlamentar que a respalde no Congresso”

Uma das causas históricas da crise fiscal que o país atravessa e da radicalização política que estamos vivendo talvez tenha sido a morte prematura do presidente Tancredo Neves, que não chegou a tomar posse, em 1985. Explico: a decorrência natural de sua eleição no colégio eleitoral, amparada por ampla mobilização popular, seria a formação de um governo liberal-conservador, capaz de executar um programa com essas características tanto do ponto de vista econômico quanto social, o que nenhum de seus sucessores até hoje fez.

Provavelmente, a Constituinte de 1988 também teria outras características, pois o processo seria liderado por um presidente eleito e parlamentarista; e não por José Sarney, um vice presidente contingenciado por um partido que ganhou e não levou, mas deu as cartas na elaboração da Constituição, sob comando de Ulysses Guimarães, um democrata radical, que era presidencialista e havia liderado a campanha das Diretas, já!

Tancredo havia participado de todas as manifestações dessa campanha, mas nunca afastou a possibilidade de o PMDB disputar a Presidência no colégio eleitoral, onde a eleição era indireta, caso a emenda Dante de Oliveira não fosse aprovada por maioria absoluta, como acabou acontecendo em 25 de abril de 1984. No final de junho, o PDMB lançou seu nome à sucessão do presidente João Figueiredo. Quatro dias depois, a Frente Liberal, dissidência do PDS, rompeu com o governo, e aderiu à candidatura de Tancredo. Na formação da Aliança Democrática, a Frente Liberal indicou Sarney para a vice-presidência.

Com 480 votos, Tancredo Neves atraiu setores conservadores que até então apoiavam o regime militar e derrotou Paulo Maluf, o candidato do antigo PDS, que obteve apenas 180 votos. O presidente eleito estava gravemente enfermo, porém, escondeu a doença e tentou retardar sua internação para depois da posse, temendo que esta não ocorresse. Um dia antes da posse, marcada para 15 de março de 1985, acabou submetido à uma cirurgia de emergência. José Sarney tomou posse como vice-presidente na manhã do dia 15. Depois de ter sido submetido a sete cirurgias, Tancredo faleceu na noite de 21 de abril. Na manhã do dia 22, Sarney foi confirmado na Presidência, depois de muitas negociações de bastidor entre a oposição e os militares. Na posse, Sarney leu o discurso que Tancredo havia rascunhado:

“Não celebramos, hoje, uma vitória política. Esta solenidade não é a do júbilo de uma facção que tenha submetido a outra, mas festa da conciliação nacional, em torno de um programa político amplo, destinado a abrir novo e fecundo tempo ao nosso país. A adesão aos princípios que defendemos não significa, necessariamente, a adesão ao governo que vamos chefiar. Ela se manifestará também no exercício da oposição. Não chegamos ao poder com o propósito de submeter a Nação a um projeto, mas com o de lutar para que ela reassuma, pela soberania do povo, o pleno controle sobre o Estado. A isso chamamos democracia!”

Reformas
O ministro da Fazenda de Tancredo era seu sobrinho, o ex-secretário da Receita Federal Francisco Dornelles, que foi mantido por Sarney, mas deixou o cargo para ser candidato a deputado federal em 1986. Em vez do ajuste fiscal, da reforma tributária e da desestatização que Tancredo pretendia fazer para combater a inflação, mas provocariam uma recessão, Sarney apostou no sucesso do Plano Cruzado, ao escolher Dílson Funaro para o comando da economia. “Sei que estou colocando a cabeça na guilhotina, mas vou arriscar, porque o povo brasileiro merece que se faça isso”, justificou, lançando o slogan “Tudo pelo social”. A principal medida do pacote econômico, o congelamento de preços por um ano, ganhou apoio imediato da população. Sarney convocou os brasileiros a fiscalizar as metas e os preços dos produtos. O sucesso foi espetacular.

Quando o ano terminou, o Brasil registrava seu menor índice de indigência e de pobreza e um crescimento do PIB de 7,49%. O nível de desemprego chegara a 2,16%. Nas eleições, o MDB venceu de ponta a ponta: elegeu 22 dos 23 governadores, 49 senadores e 260 de 487 deputados federais, a ampla maioria da Constituinte. O plano Cruzado previa reajuste automático dos salários sempre que a inflação alcançasse 20%. Com a economia muito aquecida, porém, houve excesso de demanda. Os juros negativos desestimulavam a poupança e pressionavam o consumo. O congelamento de preços fez a rentabilidade dos produtores cair para perto de zero e os produtos sumiram do mercado. O governo não controlava seus gastos, além de perder grandes quantias de reserva internacional. O plano fracassou enquanto o país discutia sua atual Constituição, que foi promulgada em 1988.

A agenda liberal foi retomada em 1989, quando o presidente Collor de Mello foi eleito pelo voto direto, mas seu governo também fracassou, por erros na condução da economia, falta de articulação política e crise ética provocada por uso de caixa dois. Agora, o presidente eleito, Jair Bolsonaro, muito conservador nos costumes, tenta implementar uma radical agenda liberal na economia, mas ainda não tem uma base parlamentar que a respalde no Congresso. Por recomendação médica, e não por teimosia, como foi o caso de Tancredo, adia para depois da posse uma cirurgia para a retirada da bolsa de colostomia que utiliza desde quando recebeu a facada em Juiz de Fora (MG), em plena campanha eleitoral. A operação estava prevista para 12 de dezembro, dois dias após a sua diplomação. Os médicos do Hospital Albert Einstein constataram “inflamação do peritônio e processo de aderência entre as alças intestinais” que poderiam complicar a cirurgia. Como não se lembrar de Tancredo?

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Cristovam Buarque: Partido sem Escola

Uma das artimanhas das forças políticas conservadoras é esconder os problemas da sociedade para desviar a atenção da população. Um exemplo é a obsessão com que muitos defendem a ideia de “escola sem partido”, para esconder a realidade de que nossos partidos e nossos políticos não passaram pela Escola. Para esconderem a falta de escolas com qualidade para todos, defendem que é preciso impedir que elas debatam livremente nossos problemas e soluções.

Querem evitar o despertar dos alunos para a necessidade do ensino com qualidade para todos, garantindo que o Brasil não desperdiçará seus cérebros; colocando os filhos dos pobres em escola com a qualidade daquelas onde os filhos dos ricos estudam. Além de esconder que no Brasil os pobres não têm escola com qualidade e os ricos têm escolas com qualidade medíocre, a “escola sem partido” levará professores e alunos a um campeonato de denúncias contra ideias dentro de sala de aula, onde será implantado o terror: a “escola sem partido” será “escola aterrorizada”.

Muito mais do que escola sem partidos, o Brasil precisa de partidos e políticos que tenham passado pela escola, que conheçam história e saibam que houve tempo de “escola sem partido”, na Rússia Soviética, na Alemanha nazista, no Portugal salazarista, na Itália fascista, na Espanha franquista, no Brasil da ditadura. Não sabem e não percebem os danos decorridos na formação da juventude durante aqueles períodos; ou sabem e desejam aqueles tempos de volta. Na verdade, eram tempos de escola com partido único: o partido no poder, com ideia única para explicar a realidade social, política e mesmo científica. Uma escola precisa de todos os lados do mundo das ideias, não de nenhum partido ou um partido único.

É certo que devemos impedir a dominação política por partidos, com narrativas que não respeitam outras opiniões e que tentam doutrinar, no lugar de ensinar. Isso tem ocorrido nos últimos anos, na Universidade de Brasília, por exemplo, onde é proibido debater a diferença entre golpe e impeachment e comparar 2016, no caso de Dilma, com 1992, no caso Collor. Ainda na UnB, filha da liberdade e da democracia, há hoje impeachment para manifestações de apoio ao Bolsonaro.

O caminho não é proibir o debate, denunciar o professor que manifesta uma opinião, o caminho é abrir o debate para todas as opiniões. Se na universidade prevalece uma única narrativa, a falha não é do partidarismo de alguns professores doutrinadores sem capacidade de diálogo. De fato, grande parte de nossos alunos universitários sofrem lavagem cerebral, acreditam em fantasmas históricos que seus partidos lhes ensinam, são intolerantes com ideias diferentes das que receberam como doutrina. A solução não é proibir o partido dominante, nem substituí-lo por uma nova dominação.

A solução não virá mais para os atuais universitários, já são geração perdida. A saída é investir na educação de base, com total liberdade para o debate de todas as ideias, todos os partidos — uma “escola sem censura” que defenda a necessidade de professores bem remunerados, bem preparados, bem dedicados, em escolas bem equipadas, todas públicas e com compromisso em horário integral para formar uma nova geração. Manter escolas nas atuais condições de penúria intelectual, e ainda mais sob censura, com os alunos transformados em denunciadores e não em participantes dos debates, será cair no desastre dos países que passaram por isso no passado. Precisamos de “partidos com escola”, e não de “escola sem partido”.

Quando olho os próximos anos, a sensação de alívio por não ter os compromissos da agenda do mandato (agora mesmo que escrevo da China onde participo de seminário sobre economia dos BRICS) é substituída pela sensação de frustração, por não poder votar contra “escola sem partido”, nem poder continuar a luta por um “país com escola” de qualidade para todos, criando eleitores e dirigentes educados. Fica a frustração de saber que meus substitutos provavelmente votarão pela “escola sem partido”.

Mesmo longe do parlamento, continuarei defendendo que a saída não é proibir partidos nas pobres escolas que temos, mas construir escolas de qualidade, onde todas as ideias e todos os partidos possam participar do debate, inclusive sobre “escola sem partido”, como atualmente. Isso não será permitido se a proposta de censura for aprovada, porque “partido sem escola” constitui um partido que deseja negar o direito de “partidos na escola”. (Correio Braziliense – 20/11/2018)


Luiz Carlos Azedo: Tropa de choque aflita

“O futuro chefe da Casa Civil, Onyx Lorenzoni, está sendo acusado de escantear o PSL e favorecer o DEM. Bolsonaro precisou acalmar a própria bancada”

O presidente eleito, Jair Bolsonaro, precisou passar na reunião das bancadas do PSL na Câmara e no Senado, ontem, para apagar um princípio de incêndio por causa do descontentamento do seu próprio partido com a nomeação de três ministros do DEM em áreas politicamente estratégicas do futuro governo: a poderosa Casa Civil, que coordenará a articulação política e ficará a cargo de Onyx Lorenzoni, e os dois titulares da área política indicados até agora, o deputado Luiz Henrique Mandetta (DEM-MS), na Saúde, e a deputada Tereza Cristina (DEM-MS), na Agricultura. A senadora Soraya Thronicke, eleita pelo PSL no Mato Grosso do Sul, puxou o coro de descontentes, porque ficou sabendo da nomeação de Tereza Cristina pela imprensa.

Na Câmara, o foco de descontentamento vem de Goiás: o deputado Delegado Waldir lançou sua candidatura a presidente da Câmara e pleiteia o apoio da bancada do PSL, que é a segunda da Casa, com 52 parlamentares. Foi preciso que a deputada Joice Hasselmann (PSL-SP), aliada incondicional de Bolsonaro, saísse em defesa do futuro chefe da Casa Civil, Onyx Lorenzoni, que está sendo acusado de escantear o PSL e favorecer o DEM na montagem do governo. Ela minimizou o desagrado: “Foi uma reunião em que alguns parlamentares apresentaram certo descontentamento, certo desconforto”, declarou.

Bolsonaro justificou as nomeações com o argumento de que as indicações de Mandetta e Tereza Cristina não foram feitas pelo partido, mas por frentes parlamentares que eles representam, da saúde e do agronegócio, respectivamente. O fato de ambos serem do DEM e do Mato Grosso do Sul, segundo o presidente eleito, foi mera coincidência. O problema é que o DEM, com apenas 29 deputados eleitos para a próxima legislatura, ocupa postos estratégicos do governo. Atrás somente do PT, que elegeu 56 parlamentares, o PSL pretende filiar deputados dos partidos que não atingiram a chamada cláusula de barreira e se tornar a maior bancada da Câmara. Atualmente, tem apenas oito deputados, ou seja, a grande maioria da bancada é formada por estreantes.

O deputado Major Olímpio, eleito senador por São Paulo, defende uma posição mais agressiva do PSL na Câmara, confrontando o presidente da Casa, Rodrigo Maia (DEM-RJ), que pleiteia a reeleição. Para isso, pretende lançar a candidatura de Luciano Bivar, presidente do PSL, ao comando da Câmara. Se isso ocorrer, será uma saia justa para Bolsonaro, que publicamente vem anunciando a intenção de manter distância da disputa no Legislativo. Ontem mesmo, manifestou essa posição em conversa com um dos concorrentes de Maia, o deputado Fábio Ramalho (MDB-MG), vice-presidente da Câmara. A indicação do advogado Gustavo Bebianno para a Secretaria-Geral da Presidência também pode acalmar um pouco o PSL. Um dos conselheiros de Bolsonaro, ele exerceu a presidência interina do partido durante a campanha eleitoral e conquistou a confiança do presidente eleito.

Com apenas quatro senadores, o PSL não tem a menor chance de disputar a Presidência do Senado. A tendência é fazer uma composição com o senador Renan Calheiros (MDB-AL), mas esse acordo pode ser uma espécie de anticlímax na estratégia parlamentar de Bolsonaro, que fez uma campanha contra o sistema político e renegou o chamado “presidencialismo de coalizão”. Característica de todos os governos formados desde a redemocratização, o loteamento da Esplanada dos Ministérios entre os partidos da base fez do MDB, do DEM e do PP os fiadores da estabilidade dos governos no Congresso, na base do toma lá dá cá, ou seja, da distribuição de cargos e verbas em troca de apoio para votação de matérias de grande interesse do governo. Um compromisso de campanha de Bolsonaro é mudar essa relação, daí a estratégia de composição com as frentes parlamentares. Entretanto, o apoio desses parlamentares está relacionado às agendas corporativas que defendem; o problema é que isso não significa apoio a todas as propostas do governo, como a reforma da Previdência, que enfrenta o lobby das corporações.

Militares
O futuro ministro da Defesa, general Fernando Azevedo e Silva, anunciou, ontem, os novos comandantes militares:
Antônio Carlos Moretti Bermudez, da Aeronáutica, é gaúcho, foi comandante da Base Aérea de Brasília, diretor-geral do Departamento de Ensino da Aeronáutica e adido de Defesa e Aeronáutico nas embaixadas do Brasil na França e na Bélgica. Atualmente, é o comandante-geral de Pessoal da FAB.
O general Edson Legal Pujol, futuro comandante do Exército, é colega de turma de Bolsonaro. Foi comandante Militar do Sul, secretário de Economia e Finanças, chefe do Centro de Inteligência do Exército, e instrutor na Academia Militar das Agulhas Negras. Comandou a Força de Paz Minustah, no Haiti, e atuou como observador militar da ONU em El Salvador.
O almirante Ilques Barbosa Júnior, paulista, é o chefe do Estado-Maior da Armada (EMA), foi comandante do 1º Distrito Naval, secretário de Ciência, Tecnologia e Inovação da Marinha e diretor de Portos e Costas.

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Luiz Carlos Azedo: O enxugamento da Petrobras

Para Castello Branco, futuro presidente da estatal, a empresa precisa intensificar a exploração e a extração de petróleo, porque, em algumas décadas, o combustível “perderá relevância”

A indicação do economista Roberto Castello Branco para a presidência da Petrobras, confirmada ontem pelo presidente eleito, Jair Bolsonaro, consolidou o poder do futuro ministro da Economia, Paulo Guedes, na equipe econômica e sinaliza que nenhuma empresa estatal está a salvo de enxugamento e fora do programa de privatizações. “É uma indicação do Paulo Guedes. Eu estou dando carta branca a ele. Tudo que é envolvido com economia é ele que está escalando o time. Eu só, obviamente, e ele sabe disso, estamos cobrando produtividade. Enxugar a máquina e buscar, realmente, fazê-la funcionar para o bem-estar da nossa população”, disse Bolsonaro.

O futuro presidente da estatal, que é formado em Chicago, como Guedes, já anunciou que a empresa vai focar sua atuação nas áreas de exploração e extração de petróleo. Para Castello Branco, a Petrobras precisa intensificar a exploração e a extração de petróleo, porque, em algumas décadas, o combustível “perderá relevância”, ou seja, será substituído por outras fontes de energia. Também defende que a empresa, que praticamente monopoliza o refino, venda suas refinarias. Não adiantou se pretende privatizar a BR Distribuidora, mas esse é o espírito da coisa. O atual presidente da empresa, Ivan Monteiro, que também estava cotado para presidir a Petrobras, talvez seja indicado para comandar o Banco do Brasil.

A indicação de Castello Branco encerrou uma queda de braços entre Guedes e o grupo de militares encabeçado pelo vice-presidente eleito, Hamilton Mourão, e o general Augusto Heleno, futuro ministro-chefe do Gabinete de Segurança Institucional (GSI), pelo controle da estatal. Ícone do desenvolvimentismo brasileiro e fruto da maior campanha nacionalista da história do país, “O petróleo é nosso”, a Petrobras sempre foi uma linha divisória do nosso patriotismo, explorada em sucessivas campanhas eleitorais. O ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva, por exemplo, alavancou sua campanha à reeleição contra o tucano Geraldo Alckmin, acusando-o de pretender privatizar a estatal e o Banco do Brasil.

A Petrobras, porém, foi alvo do maior escândalo de corrupção investigado pela Operação Lava-Lato, o que levou à prisão diversos executivos da empresa. Ontem mesmo, a juíza substituta Gabriela Hardt condenou o ex-diretor de Serviços da Petrobras Renato Duque em uma ação da Lava-Jato pelos crimes de corrupção passiva, lavagem de dinheiro e dissimulação de produto de crimes. Duque foi condenado a três anos e quatro meses apenas, e não a 6 anos e 8 meses, porque colaborou com a Justiça. Segundo as investigações, era o principal quadro ligado ao PT na operação de caixa dois da Petrobras. A juiza Hardt é a mesma que interrogou o ex-presidente Lula na semana passada.

Também foram condenados João Bernardi Filho e Julio Gerin de Almeida Camargo, a 5 anos e 6 meses de reclusão, mas ambos têm acordo de delação premiada e cumprem penas acordadas com o Ministério Público. Renato Duque e João Bernardi Filho participaram de um esquema de corrupção e lavagem de dinheiro para favorecer a empresa italiana Saipem na contratação de obras da Petrobras. Bernardi, que era representante da Saipem, ofereceu e prometeu o pagamento, em 2011, de vantagem indevida a Renato Duque em troca da obtenção pela Saipem de um contrato para a instalação do gasoduto submarino de interligação dos campos de Lula e Cernambi com a Petrobras.

Haddad
A propósito, ontem, o ex-prefeito de São Paulo Fernando Haddad (PT) virou réu por corrupção passiva e lavagem de dinheiro, após o juiz Leonardo Barreiros, da 5ª Vara Criminal da Barra Funda, aceitar denúncia do Ministério Público com base em delações feitas na Operação Lava-Jato. Além de Haddad, cinco pessoas viraram rés na ação, incluindo o ex-tesoureiro do PT João Vaccari Neto e o doleiro Alberto Youssef. De acordo com a denúncia, entre abril e maio de 2013, Ricardo Ribeiro Pessoa, presidente da empreiteira UTC Engenharia S/A, recebeu um pedido de Vaccari da quantia de R$ 3 milhões para pagamento de uma dívida de campanha de Haddad nas eleições de 2012.

O ex-prefeito de São Paulo e candidato derrotado do PT à Presidência da República nega as acusações. Segundo a denúncia, o valor serviria para o pagamento de uma dívida de campanha do então prefeito de São Paulo Fernando Haddad com gráfica do ex-deputado estadual do PT Francisco Carlos de Souza, o Chicão. João Vaccari Neto, segundo a acusação, representava e falava em nome de Haddad. A denúncia é uma pedra no sapato do petista, que obteve 47 milhões de votos (44% do total) no segundo turno das eleições presidenciais. Com Lula preso, Haddad seria o principal líder da oposição a Bolsonaro, mas sua transformação em réu, sem direito a foro especial, limitará sua capacidade de atuação.

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Luiz Carlos Azedo: O bom e o ruim

“O Brasil vive sob o signo do maniqueísmo. Entretanto, os grandes problemas não decorrem das ideologias, mas da realidade objetiva do país”

Maniqueu, filósofo cristão do século 3, também conhecido como Manes ou Mani, dividia o mundo simplesmente entre Bom, ou Deus, e Mau, ou o Diabo. Ganhou influência no mundo greco-romano a partir das antigas Babilônia e Pérsia, sincretizando ideias do hinduísmo, do budismo, do judaísmo e do cristianismo, depois de viajar pela Índia, China e Tibete. Foi perseguido pelos sacerdotes do zoroastrismo, os Magos, durante o reinado de Vararanes 1º (274–277). Preso e condenado como herege, foi esfolado vivo: sua carne foi atirada ao fogo e a pele, crucificada em praça pública, na cidade de Bendosabora, no atual Iraque.

Para Maniqueu, a luz e as trevas originaram o mundo material, essencialmente mau. Por isso, os “pais da Justiça” vieram à Terra redimir os homens, mas a mensagem deles foi corrompida. Maniqueu pretendeu completar a missão deles, como o salvador prometido por Cristo, que detinha os segredos para a purificação da luz, destinados apenas àqueles que tinham uma vida ascética. No dualismo maniqueísta, a matéria é intrinsecamente má, e o espírito, intrinsecamente bom. Com o tempo, maniqueísta passou a ser um adjetivo para toda doutrina fundada nos dois princípios opostos do bem e do mal.

Seu mais famoso discípulo foi Agostinho de Hipona, Santo Agostinho, que fundou as bases da filosofia adotada pela Igreja Católica, depois de romper com o maniqueísmo. Até então, os filósofos cristãos defendiam que o fundamento e a essência da vida deveriam ser a fé. A partir dela, os homens tomariam decisões importantes em suas vidas e realizariam os julgamentos morais. A razão regia decisões menores e rotineiras da vida cotidiana. Profundo conhecedor de diversas religiões, porém, Agostinho buscou na Razão a justificativa para a fé. Foi além da própria fé para levar os descrentes a considerá-la. Por exemplo, defendeu o livre-arbítrio como uma graça divina. De fato, liberdade não combina com maniqueísmo.

Mais médicos
Desde a campanha eleitoral, o Brasil vive sob o signo do maniqueísmo; talvez tenha sido determinante do resultado das eleições, tanto para bolsonaristas como para petistas. Esse maniqueísmo vem desde o “nós contra eles” da reeleição do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva, em 2006, e contamina toda o debate político. Entretanto, os grandes problemas nacionais, ao contrário do que muitos imaginam, não decorrem das ideologias, mas da realidade objetiva do país.

Exemplo de maniqueísmo é a discussão sobre o programa Mais Médicos, que está contaminada pela disputa eleitoral. O problema atinge 2.885 prefeituras, das quais em 1.575 municípios com menos de 20 mil habitantes. São 8.500 equipes de Saúde da Família que ficarão desfalcadas em 40 dias, em razão da decisão do governo cubano de repatriar esses profissionais, antes da posse do presidente eleito Jair Bolsonaro.

Bolsonaro sempre foi um crítico do programa. Diz que os médicos trabalham em regime de escravidão e que a maior parte do que deveriam receber vai para o governo cubano. Também questiona a qualificação dos médicos. A sua posição tem a ver com a narrativa da campanha eleitoral, ou seja, é uma promessa de campanha endossada pela maioria dos eleitores. A decisão cubana, obviamente, tem a ver com a nova política externa a ser implementada por Bolsonaro, cuja teologia é maniqueísta, se levarmos em conta os novos paradigmas do futuro ministro de Relações Exteriores, Ernesto Fraga Araújo. Essa é a parte ruim do caso Mais Médicos.

A parte boa, digamos assim, é que Bolsonaro mudou sua agenda dos 100 primeiros dias de governo, que naturalmente seria focada nas questões da segurança pública e da corrupção, além da Previdência e do corte de gastos. Com o fim da parceria com Cuba, a agenda da saúde pública caiu antecipadamente no colo de novo presidente da República, que precisa de um novo programa para enfrentar o problema. Uma das alternativas seria militarizar a contratação de médicos para atuar em locais remotos, pequenos municípios e periferia das grandes cidades, oferecendo serviço temporário nas Forças Armadas para médicos residentes e recém-formados , como acontece com os atletas olímpicos.

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