política

Elena Landau: ‘Queremos achar convergência política diante do descalabro’

Ex-diretora do BNDES defende alternativa à polarização e diz que empresários ‘caíram no conto’ de Paulo Guedes

Pedro Venceslau, O Estado de S.Paulo

Uma das integrantes da linha de frente do grupo 'Derrubando Muros', a economista e colunista do Estadão Elena Landau comandou nesta terça-feira, 14, um seminário sobre reforma do Estado do qual também participaram ou participarão outros expoentes de sua geração da PUC-Rio: Armínio Fraga, Pérsio Arida André Lara Resende (o evento continua nesta quarta-feira). Autointitulado uma "iniciativa cívica", o movimento tem 92 integrantes, entre empresários, banqueiros, políticos, economistas e intelectuais de várias áreas. O objetivo é buscar pontos de convergência e criar pontes em torno de um objetivo comum: combater o presidente Jair Bolsonaro.        

Elena Landau ganhou notoriedade nos anos 1990, por colaborar com o Programa Nacional de Desestatização. Em 1994, durante o governo do presidente Fernando Henrique Cardoso, ela se tornou diretora do Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES) Ali permaneceu até 1996. Também passou pelo conselho administrativo da Eletrobrás.Nessa entrevista ao Estadão, a economista fala sobre os pontos que podem unir a terceira via. Ela critica duramente o ministro da Economia, Paulo Guedes, que considera “sem noção de realidade”.

Quais propostas econômicas unem a terceira via que vai de Ciro Gomes a João Amoêdo?

O Estado que a gente pensa é progressista, liberal, inclusivo e sustentável. Isso é fácil de a gente discutir. O grande problema é chegarmos a uma convergência sobre os meios de chegar lá. Esse é o desafio do seminário: um mínimo de convergência, não só na economia, mas na política também. A minha visão de Estado vai ser diferente da do Ciro, evidentemente. Um é mais intervencionista, eu sou mais liberal. Temos que achar algum tom de convergência. A ideia (de criar o grupo 'Derrubando Muros') é mais política e institucional diante desse descalabro que estamos vivendo. 

É possível encontrar pontos de convergência na economia com o PT e estar ao lado do partido se o adversário for Borsonaro no segundo turno?

É muito cedo para pensar nesse tipo de coisa. O Derrubando Muros é uma tentativa de construir uma terceira via. Não vou antecipar o segundo turno neste momento. A gente está trabalhando, quando chegar a hora vamos decidir o voto.    

Como avalia a estratégia de privatizações do governo Bolsonaro? Até onde devem ir as privatizações? 

Este governo não está fazendo privatização nenhuma por enquanto. Ele conseguiu autorização do Congresso Nacional para a privatização da Eletrobrás, que saiu muito ruim, e tem outro projeto para os Correios. A minha visão é que se deve privatizar tudo aquilo que o setor privado pode assumir, incluindo os Correios. Sou radicalmente a favor das privatizações, mas o que deve ser um pressuposto de todos no grupo é a responsabilidade fiscal. Prometer responsabilidade fiscal é o mesmo que prometer ser honesto: isso é pressuposto. Sem ele não há responsabilidade social. Não dá para dissociar uma coisa da outra. 

Qual deve ser o papel do Estado na recuperação e no crescimento da economia?

O Estado deve permitir que o setor privado floresça. Tem que dar segurança jurídica, uma boa regulação, fiscalização e respeitar os contratos. Uma coisa importante para ser discutida no grupo são evidências em políticas públicas. Sair do desejo e ver o que deu certo e o que deu errado no Brasil. Todas as políticas de grande intervenção geraram inflação e desemprego.  Temos que ver também o que deu errado: intervenção em juros e no câmbio não dá certo. O Brasil melhorou com o tripé econômico, a flutuação do câmbio e o Banco Central independente. Essas coisas devem ser defendidas, pois passaram por vários governos, independente da ideologia. Imagine se o Banco Central não fosse independente nesse momento?

Vários empresários, banqueiros e pessoas do mercado financeiro estiveram na Avenida Paulista no domingo na manifestação contra Bolsonaro. A ficha caiu?

Não faço parte do mercado financeiro, mas alguns apoiaram Bolsonaro no passado porque eram anti-PT ou caíram no conto do Paulo Guedes. Não é só a questão econômica que importa. Há uma crise institucional muito grave. A defesa das instituições democráticas é a pauta mais importante do Brasil. Isso está unindo os empresários de consciência. Sem democracia não tem mercado nem economia. 

Qual a sua avaliação sobre o desempenho do Paulo Guedes?

É a mesma avaliação de sempre, de 30 anos atrás, 2018 e hoje. Ele é uma pessoa completamente inábil e sem nenhuma noção da realidade. É um economista de palestra. Nada do que está acontecendo me surpreendeu.  

Fonte: O Estado de S. Paulo
https://politica.estadao.com.br/noticias/geral,queremos-achar-convergencia-politica-diante-do-descalabro-diz-landau-sobre-terceira-via,70003840305

      


'Bolsonaro ameaça pilares da democracia', diz Human Rights Watch

Presidente afronta o direito ao voto, viola a liberdade de expressão e o sistema democrático de freios e contrapesos, afirma ONG

DW Brasil

"Há um padrão de ações e declarações do presidente que parecem destinadas a enfraquecer os direitos fundamentais, as instituições democráticas e o Estado de Direito no Brasil", afirma HRW

Com suas tentativas de intimidar o Supremo Tribunal Federal (STF), ataques ao sistema eleitoral e violações da liberdade de expressão de críticos, o presidente Jair Bolsonaro ameaça os pilares da democracia brasileira, afirmou a ONG Human Rights Watch (HRW) em texto divulgado nesta quarta-feira (15/09), data em que se comemora o Dia Internacional da Democracia.

Citando como exemplo os recentes discursos de Bolsonaro em atos pró-governo no feriado de 7 de Setembro– em que mais uma vez fez ameaças ao STF e lançou dúvidas sobre a confiabilidade do sistema eleitoral, sem apresentar provas –, a HRW aponta haver "um padrão de ações e declarações do presidente que parecem destinadas a enfraquecer os direitos fundamentais, as instituições democráticas e o Estado de Direito no Brasil".

José Miguel Vivanco, diretor de Américas da Human Rights Watch, afirma que "o presidente Bolsonaro, um apologista da ditadura militar no Brasil, está cada vez mais hostil ao sistema democrático de freios e contrapesos".

"Ele está usando uma mistura de insultos e ameaças para intimidar a Suprema Corte, responsável por conduzir as investigações sobre sua conduta, e com suas alegações infundadas de fraude eleitoral parece estar preparando as bases para tentar cancelar as eleições do próximo ano ou contestar a decisão da população se ele não for reeleito", diz.

Ataques ao STF

A HRW aponta que o STF se tornou "um dos principais freios das políticas anti-direitos humanos de Bolsonaro" e que o presidente tem respondido com insultos e ameaças.

Novamente citando os discursos de Bolsonaro no 7 de Setembro, quando o presidente voltou a adotar um tom golpista, a ONG chama atenção para as investidas de Bolsonaro contra o Supremo, que recentemente prendeu vários de seus aliados e tem tomado algumas iniciativas para impedir que o governo tumultue as eleições de 2022.

Bolsonaro chegou a mencionar pelo nome o ministro Alexandre de Moraes, seu desafeto na Corte e responsável por inquéritos que afetam bolsonaristas. "Ou esse ministro se enquadra ou ele pede pra sair", afirmou. "Não vamos admitir que pessoas como Alexandre de Moraes continuem a violar nossa democracia."

"O presidente Bolsonaro frequentemente afirma defender a ‘democracia', mas suas declarações levantam dúvidas sobre o que ele entende por democracia", afirma a Human Rights Watch.

Também no 7 de Setembro, Bolsonaro afirmou, em recado direto ao presidente do STF, Luiz Fux, que se ele não "enquadrasse" Moraes, o Judiciário poderia "sofrer aquilo que nós não queremos", sem explicar o que isso significaria, destacou a HRW.

Dois dias depois, Bolsonaro divulgou uma "Declaração à Nação", em tom de recuo tático após a má repercussão de suas falas, que tiveram consequências negativas até mesmo na economia.

"Após inúmeras críticas nacionais e internacionais sobre seus posicionamentos, o presidente Bolsonaro disse em uma declaração escrita que nunca teve a intenção de ‘agredir quaisquer Poderes'. Mas ele não recuou em relação à afirmação infundada de que o sistema eleitoral brasileiro não é confiável, como repetiu em 7 de setembro", diz a HRW.

Ameaças às eleições

Em relação às investidas de Bolsonaro ao sistema eleitoral, a Human Rights Watch cita a decisão de Moraes de incluir, em 4 de agosto, Bolsonaro como investigado no inquérito sobre fake news e atos democráticos que já tramitava na Corte.

A decisão foi tomada em resposta a um pedido do Tribunal Superior Eleitoral (TSE) para que o presidente fosse investigado devido ao conteúdo de uma live em que exibiu teorias falsas, cálculos equivocados e vídeos antigos, já verificados e desmentidos, mas que ainda circulam na internet, como supostas evidências de fraude no sistema eleitoral.

A HRW destaca que, ao ser informado da decisão de Moraes, Bolsonaro ameaçou reagir "fora das quatro linhas" da Constituição e, dias depois, encaminhou ao Senado um pedido de impeachment do ministro.

"As ameaças do presidente Bolsonaro de cancelar as eleições e agir fora da Constituição em resposta às investigações contra ele são imprudentes e perigosas", afirma Vivanco. "A comunidade internacional deve mandar uma mensagem clara ao presidente Bolsonaro de que a independência do Judiciário significa que os tribunais não estão sujeitos as suas ordens."

A ONG cita ainda o fato de que o Congresso rejeitou a proposta de voto impresso e que, "ainda assim, em 7 de setembro, o presidente deu a entender que as eleições não podem ser realizadas a menos que as mudanças que ele defende sejam implementadas".

"Essa ameaça é uma afronta ao direito dos brasileiros de eleger seus representantes, o que é protegido pela legislação internacional de direitos humanos", diz a Human Rights Watch.

Violações da liberdade de expressão

A HRW afirma ainda que Bolsonaro tem violado a liberdade de expressão, "vital para uma democracia saudável", ao bloquear seguidores que o criticam nas redes sociais.

Além disso, "seu governo requisitou a instauração de inquéritos criminais contra pelo menos 16 críticos, incluindo jornalistas, professores universitários e políticos”, aponta a HRW. "Mesmo que muitos desses casos tenham sido arquivados sem denúncias, as ações do governo mandam a mensagem de que criticar o presidente pode levar à perseguição", diz a ONG.

A HRW destaca que o Pacto Internacional sobre Direitos Civis e Políticos (PIDCP), ratificado pelo Brasil, inclui o direito ao voto e à liberdade de expressão. A independência do Judiciário também está protegida pelo direito internacional por meio Princípios Básicos das Nações Unidas sobre a Independência do Judiciário, cita a ONG.

Fonte: DW Brasil


Rosângela Bittar: Os mitos do mito Jair Bolsonaro

Legislativo e Judiciário mostraram-se mais fortes do que as ameaças do presidente

Rosângela Bittar / O Estado de S. Paulo

Ruíram os mitos que sustentavam a imagem popular de Jair Bolsonaro e que ele usava como argumento de força para ser reconhecido, desde já, presidente vitalício do Brasil. Sem passar por nova eleição.

Bolsonaro havia feito crer que, com seus poderes extraordinários de cavaleiro do apocalipse, daria voz de comando ao Judiciário, ao Legislativo, às espadas e aos fuzis. Imaginava-se, no mínimo, que o País se encaminhava para um golpe. Tal como expresso nas faixas exibidas por seus eleitores que foram às ruas para apoiá-lo: intervenção militar e novo AI-5. A senha do golpe já estava registrada, poderia até ser o insulto violento ao ministro Alexandre de Moraes (STF), que nomeou seu algoz, proferido nos microfones do palanque.

O governo jamais desfez esta impressão, dominante entre seus apoiadores, inclusive.

Antes mesmo do 7 de Setembro, esfumaçaram-se alguns desses mitos. A elite do agronegócio, por exemplo, ao defender a democracia, mostrou que o bolsonarismo radical, em seu meio, é restrito. O sistema financeiro garantiu, de papel passado, a Constituição e suas instituições democráticas. Os poderes Legislativo e Judiciário mostraram-se mais fortes do que as ameaças de destruição feitas pelo presidente da República e seus porta-vozes.

Restava a expectativa sobre de onde viria, então, o primeiro tiro, uma vez que o apoio armado a Bolsonaro não se mostrava ostensivo.

Ao descer, trêmulo, do palco do comício que fez em São Paulo, Bolsonaro mostrou que a manipulação que faria das polícias militares, do Exército Nacional, do Ministério Público e da Polícia Federal tornara-se, sem que percebesse, um sonho impossível.

O domínio discricionário das Forças Armadas, o mais temido dos mitos que cercam o poder de Bolsonaro, nem sequer foi tentado. O Exército não se afastou um milímetro do seu papel constitucional. Os generais em evidência na cúpula presidencial saíram silenciosos da refrega que promoveram na data nacional. Já pequenos, reduziram-se mais.

O País deve observar, na sequência, a descompressão forçada do presidente sobre os comandantes militares de tropa. Poderão estas forças, também, reagir com mais firmeza ao não atender a pedidos de atuação política fora de seus regulamentos, insistentemente feitos pela Presidência e pelo atual Ministério da Defesa.

O apreço dos militares por Bolsonaro permanece elevado. A ele reservam lealdade, respeito à hierarquia e disciplina. E esperam que o presidente faça o mesmo e tenha se convencido de que cumprirão com rigor suas funções, catálogo em que não está previsto o golpe.

Outro mito cuja ausência as manifestações revelaram foi o de controle total das polícias militares, sobre quem, inclusive, Bolsonaro patrocina legislação para torná-las submissas ao comando federal. Nenhuma PM descumpriu ordem de seu governador.

As manifestações apontaram ainda que a Polícia Federal são muitas e nem todas estão sob as ordens diretas de Jair Bolsonaro. Cada delegado é um poder. O presidente domina alguns deles. Não todos. Estão conduzindo inquéritos e fazendo prisões de amigos, parlamentares aliados e cúmplices. O “meu pessoal”, como Bolsonaro os define.

O Ministério Público, outro mito da aliança incondicional, nutrido no comportamento dúbio do procurador Augusto Aras, não está agindo como esperado. Até Aras, e não apenas os demais integrantes da instituição, tem contrariado os caprichos do presidente. Bolsonaro, até hoje, quase três anos de mandato, ainda não entendeu a natureza das funções presidenciais que deveria exercer.

À medida que caíram da mitologia da força irresistível de Jair Bolsonaro, estas instituições cresceram tanto quanto se fortaleceu o Supremo Tribunal Federal. Alvo principal dos tiros de Bolsonaro que, por enquanto, só têm saído pela culatra.


Luiz Carlos Azedo: Três tenores e um anjo torto

Grupo acompanhou a trajetória política do Brasil desde o golpe que destituiu João Goulart, em 1964, até a recente confusão armada por Bolsonaro

Luiz Carlos Azedo / Nas entrelinhas / Correio Braziliense

Um evento importante para a política será realizado, hoje, para discutir a crise brasileira, com a participação dos ex-presidentes José Sarney, Fernando Henrique Cardoso e Michel Temer, no qual o ex-presidente do Supremo Tribunal Federal (STF) Nelson Jobim fará uma abertura sobre a crise institucional que estamos atravessando, com mediação do ex-governador fluminense Moreira Franco. O seminário “Um novo rumo para o Brasil” é promovido pelas fundações do MDB, PSDB, DEM e Cidadania, e contará ainda com os presidentes dos respectivos partidos — o deputado federal Baleia Rossi (SP), o ex-ministro das Cidades Bruno Araújo, o ex-prefeito de Salvador ACM Neto e o ex-senador Roberto Freire, respectivamente.

O evento estava sendo organizado havia meses, para começar em 8 de setembro, mas o ex-presidente Michel Temer, premonitoriamente, sugeriu que fosse adiado por uma semana, não apenas por causa do feriadão do 7 de setembro, mas porque se temia que, no Dia da Independência, algum fato relevante ocorresse, como acabou acontecendo, exigindo certa decantação para que o evento não se transformasse numa operação de apagar incêndio. Ou seja, que deixasse de discutir saídas para a crise política que o país atravessa e o choque entre Poderes. Acabou que foi exatamente isso o que ocorreu no dia 8 de setembro, uma operação para conter as chamas dos discursos incendiários de Bolsonaro, que provocaram um locaute de caminhoneiros e que assombraram os agentes econômicos e aliados do governo.

O título da coluna, obviamente, é uma analogia, porque Sarney, Fernando Henrique Cardoso e Michel Temer nem de longe têm a potência de voz dos três tenores aos quais se remete: Plácido Do- mingo, José Carreras e Luciano Pavarotti, que cantaram juntos, em concertos, durante a década de 1990 e no início da década de 2000. A primeira performance do trio ocorreu nas Termas de Caracala, em Roma, Itália, em 7 de julho de 1990 — no encerramento da Copa do Mundo de Futebol de 1990. Zubin Mehta conduziu a Orquestra Maggio Musicale Fiorentino e a Orquestra do Teatro da Ópera de Roma.

Potência de voz no sentido figurado, porque são vozes influentes ainda hoje na política brasileira. Sarney virou um oráculo de muitos senadores influentes; FHC é o único que pode juntar os cacos do PSDB e continua sendo a referência política do grupo de economistas que salvou o país da hiperinflação; finalmente, Temer renasceu das cinzas, sendo o único interlocutor do presidente Jair Bolsonaro no mundo da alta política — os demais são operadores do baixo clero. O ex-ministro Nelson Jobim dispensa apresentação: é um personagem importante na calibragem das propostas que podem surgir do evento, porque foi ministro da Justiça de Fernando Henrique, presidente do Supremo Tribunal Federal (STF) e ministro da Defesa do ex- presidente Luiz Inácio Lula da Silva, além de personagem muito importante na elaboração da Constituição de 1988.\

O anjo torto
Do time de presidentes de partidos, Roberto Freire (Cidadania) é o único que participou da Constituinte. Viveu todos os momentos da transição à democracia, desde sua eleição a deputado federal em 1978. Baleia Rossi (MDB), Bruno Araújo (PS- DB) e ACM Neto (DEM) pertencem à nova geração que comanda o Congresso. No seminário, formarão uma espécie de backing vocal. Na música, muita gente subestima o coro que dá sustentação aos tenores e outros solistas, mas é preciso muita habilidade para desempenhar esse papel. É necessário percepção e habilidades que são desenvolvidas com estudos. Ter um ouvido bem apurado e prestar bastante atenção para não “entrar” na voz principal.

O encontro será transmitido ao vivo pelas redes sociais, a partir das 18h30, o primeiro da série de oito debates programáticos (economia, meio ambiente, saúde, educação, segurança, diversidade, relações exteriores), com grandes especialistas, na tentativa de formular uma agenda nova para o país, entre as quais uma saída sustentável para a crise econômica. Há muita experiência vivida nesse grupo, que acompanhou a trajetória política do Brasil desde o golpe que destituiu o presidente João Goulart, em 1964, até a confusão armada por Bolsonaro, na semana passada.

Para resumir a linha de pensamento vitoriosa nesse processo, há dois eixos: a defesa da democracia e a conciliação política. Mas ninguém se iluda: todos nesse grupo foram capazes de tomar decisões firmes em momentos difíceis e liderar rupturas. Por isso mesmo, não se deve esperar um debate monocórdico, um coro perfeito. Quem será o anjo torto?

https://blogs.correiobraziliense.com.br/azedo/nas-entrelinhas-tres-tenores-e-um-anjo-torto

Fusão PSL-DEM cria maior força de direita na Câmara em 20 anos

Cúpulas dos dois partidos tentam definir fusão até o fim do mês, mas ainda há resistências entre integrantes do DEM

Lauriberto Pompeu, O Estado de S.Paulo

BRASÍLIA – Prestes a ser oficializada, a fusão entre DEM e PSL deve criar uma megapotência partidária. A nova legenda deve nascer com 81 deputados federais e conquistar o posto de maior bancada na Câmara, com força para decidir votações importantes e ter peso significativo num eventual processo de impeachment de Jair Bolsonaro. Será a primeira vez em vinte anos que a direita reúne tantos parlamentares em uma única agremiação. A última vez foi no segundo mandato de Fernando Henrique Cardoso, quando o PFL (atual DEM) elegeu 105 representantes.

Caso a nova sigla seja concretizada, vai desbancar o PT, que desde 2010 lidera o ranking de maiores bancadas na Câmara. Em 2018, foram 54 petistas eleitos. Hoje, o partido tem 53 deputados, empatado com o PSL. Mesmo que com a fusão parlamentares bolsonaristas deixem o novo partido, como esperado, a sigla ainda sem nome seguirá com o maior número de deputados.

LEIA TAMBÉM

DEM cita possível fusão com PSL para atrair Alckmin

A ideia dos dirigentes de PSL e DEM é usar esta megaestrutura que está sendo formada para atrair uma candidatura à Presidência em 2022 capaz de rivalizar com Bolsonaro e com o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva

Além de maior partido da Câmara, a nova legenda deve controlar três Estados, favorecendo a formação de palanques regionais nas disputas eleitorais. Hoje, o PSL governa Tocantins, com Mauro Carlesse, e o DEM administra Goiás, com Ronaldo Caiado, e Mato Grosso, com Mauro Mendes. Até recentemente, o PSL também administrava Santa Catarina, com Carlos Moisés, mas o governador, eleito com apoio de Bolsonaro, saiu da legenda e segue sem partido. Hoje, a sigla com maior número de governadores é o PT, com quatro representantes (BA, CE, PI e RN).

O novo partido, que ainda não tem nome definido, também deve ser o mais rico de todos. Terá perto de R$ 158 milhões por ano de fundo partidário, dinheiro público que abastece as legendas para gastos que vão de aluguel de sede, pagamento de salários, aluguel de jatinhos, entre outros. Em comparação, o PT ganhou R$ 94 milhões dessa verba pública este ano.

A sigla que sairá da fusão DEM-PSL receberá ainda, no que ano vem, a maior fatia do fundo eleitoral, cujo valor ainda deve ser fixado pelo Congresso, mas, provavelmente, será superior a R$ 2,1 bilhões. Se considerada a soma dos valores de 2020 dos fundos eleitoral e partidário, o novo partido teria R$ 478,2 milhões, à frente do PT, que ficou com R$ 295,7 milhões somando as duas fontes de dinheiro público. 

A união é vantajosa para o DEM por causa do aumento do fundo partidário. Para o PSL, os principais atrativos são a capilaridade regional e estrutura que a outra sigla pode oferecer. 

No Senado, a alteração não seria significativa, pois o PSL acrescentaria apenas mais uma parlamentar – a senadora Soraya Thronicke (MS) – à bancada de seis senadores do DEM. 

O partido resultante da fusão terá ainda 554 prefeitos, 130 deputados estaduais e 5.546 vereadores, segundo o número de eleitos nos últimos pleitos para os respectivos cargos. 

Seguidores de Bolsonaro vão desembarcar

Apesar da perspectiva de crescimento e de ser o maior partido do País, os articuladores da fusão já esperam dissidências. Pela legislação, o político pode sair de uma legenda sem perder o mandato em caso de fusão. A previsão é de que 25 dos atuais 53 deputados do PSL, ligados ao presidente Jair Bolsonaro, devem desembarcar na nova legenda. Também são esperadas as saídas de aliados de Bolsonaro no DEM. É o caso do ministro do Trabalho e Previdência, Onyx Lorenzoni.

O processo que pode levar à fusão dos dois partidos tem avançado. Dentro do PSL a união já é dada como certa e esperam anunciá-la em 21 de setembro. Mas a possibilidade de fusão desagrada uma parte do DEM.

Na primeira demonstração pública de atuação conjunta, os dois partidos divulgaram uma nota com críticas a Bolsonaro. Após os ataques do presidente ao Supremo Tribunal Federal (STF) nos atos governistas de 7 de Setembro, DEM e PSL afirmaram que repudiam "com veemência" o discurso de Bolsonaro "ao insurgir-se contra as instituições de nosso País".

O texto gerou insatisfação em parte do DEM. Onyx, que é deputado licenciado pelo DEM do Rio Grande do Sul, afirmou, por meio de vídeo divulgado nas redes sociais, que a nota não o representa. Disse ainda que a nova legenda "talvez nasça grande", mas, "ao final do ano que vem, se não mudarem seu comportamento, serão um partido nanico".

O PSL também está dividido em relação ao governo de Bolsonaro. A ala governista vai desembarcar do partido quando o presidente decidir por qual legenda concorrerá à reeleição em 2022. Bolsonaro está sem partido desde o fim de 2019, quando rompeu com o PSL.

Em Pernambuco, o ex-ministro da Educação e presidente do DEM no Estado, Mendonça Filho, critica fusão. Foto: Valter Campanato/Agência Brasil

Fusão enfrenta resistências no DEM do Rio e de Pernambuco

Estadão apurou que há também conflitos no DEM do Rio. Lá, o deputado Sóstenes Cavalcante comanda provisoriamente o diretório estadual. Trabalha para ficar com o comando permanente.

O DEM resolveu fazer uma intervenção federal no Estado para retirar o ex-prefeito e  vereador Cesar Maia da presidência estadual. O movimento aconteceu após a saída do ex-presidente da Câmara Rodrigo Maia, filho de Cesar, da legenda. Se for concretizada a fusão, o controle do diretório do Rio ficará com quem hoje está no PSL. Isso atrapalhará os planos de Sóstenes Ele já avisou a aliados que não aceita a fusão. 

Em Pernambuco, o ex-ministro da Educação e presidente do DEM no Estado, Mendonça Filho (DEM), também apresenta resistências.

"A minha preocupação é com a governança, como o partido vai se estabelecer, de que forma vai harmonizar os interesses regionais, nomes históricos do partido em posições regionais", disse Mendonça ao Estadão

Na mesma linha do que disse Onyx, o ex-ministro de Michel Temer (MDB) afirmou que a união não necessariamente vai se traduzir em um partido grande.

"Não adianta você compatibilizar excluindo. Em política, muitas vezes a soma de um conjunto de forças significa subtração. O que eu entendo é que a gente tem de ter como objetivo uma soma que de fato adicione", declarou.

Conterrâneo do presidente nacional do PSL, deputado Luciano Bivar, Mendonça ressaltou que "respeita a figura de liderança" do dirigente partidário. Pregou, porém, que a discussão seja feita com calma. "Respeito todos os líderes que têm, com a melhor das intenções, tracionado uma maior celeridade nesse processo. Peço calma, paciência e que sejam cumpridas as etapas de uma discussão amadurecida", declarou.

Bivar, Rueda e ACM Neto dividirão comando

Detalhes como nome e número da nova sigla ainda não estão definidos. A operação tem como principais articuladores Luciano Bivar, o vice-presidente do PSL, Antonio Rueda, e o presidente do DEM, ACM Neto. Bivar deve ser o presidente do novo partido, Rueda deve ficar com a vice-presidência e Neto, com a secretaria-geral. 

Mesmo com o desembarque da ala bolsonarista do PSL, o novo partido nasceria com o maior tempo de rádio e televisão e o maior Fundo Partidário. No entanto, críticos da fusão afirmam que o crescimento só poderia ser dimensionado de verdade após o resultado das eleições de 2022, quando novas bancadas serão eleitas para o Congresso. A composição do fundo pode mudar drasticamente caso o novo partido não consiga manter o tamanho resultante da fusão.

O presidente do DEM, ACM Neto, quer ajustar a união internamente na sigla até o fim deste mês. Aliado do presidente do partido, o deputado Elmar Nascimento (DEM-BA) avalia que a fusão deve mesmo acontecer.

"Grandes chances. Está bem avançado", declarou Nascimento.

Apesar das resistências no DEM, a fusão tem o apoio de Neto e também do ex-ministro da Saúde Luiz Henrique Mandetta, que diz que o processo "leva tempo", mas é "possível". Quando lhe foi perguntado sobre a data de 21 de setembro, citada por integrantes do PSL como anúncio da fusão, Mandetta disse: "Talvez um anúncio político, mas leva bem mais tempo (para definir totalmente a fusão)".

O ex-ministro tem articulado a sua pré-candidatura ao Palácio do Planalto. Pelo lado do PSL, o pré-candidato é o apresentador José Luiz Datena. Embora não fale sobre o assunto publicamente, outro nome que é citado como opção para 2022 é o do presidente do Senado, Rodrigo Pacheco (DEM-MG). O senador é cobiçado pelo PSD, pode acabar saindo do DEM para ir para a legenda presidida por Gilberto Kassab.

A fusão também é usada como uma estratégia para manter Pacheco no DEM. O presidente do Senado participou de algumas reuniões para tratar da união dos partidos. 

Fonte: O Estado de S. Paulo
https://politica.estadao.com.br/noticias/geral,psl-e-dem-podem-formar-megapartido-com-maior-bancada-da-camara-e-igualar-pt-em-governadores,70003839923


Luiz Carlos Azedo: Oposição é forte, mas dividida

O PT não facilitará a vida de nenhum candidato de oposição. Pelo contrário, tentará mostrar nas próximas manifestações que é a única força capaz de derrotar Bolsonaro

Luiz Carlos Azedo / Nas Entrelinhas / Correio Baziliense

Convocados por dois grandes movimentos cívicos que emergiram a partir das manifestações de junho de 2013, no primeiro mandato da presidente Dilma Rousseff, o MBL (Movimento Brasil Livre) e o VPR ( Vem Pra Rua), os protestos de domingo passado receberam a adesão dos partidos de oposição moderada e alguns pré-candidatos a presidente da República, como o ex-governador cearense Ciro Gomes (PDT), o governador paulista João Doria (PSDB), a senadora Simone Tebet (MDB), o senador Alessandro Vieira (Cidadania-SE) e o ex-candidato a presidente da República João Amoedo (Novo). O PT, do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva, e o PSol boicotaram os atos, que nem de muito longe tiveram a força das mani- festações realizadas em apoio ao presidente Jair Bolsonaro, no Dia da Independência, 7 de setembro. Por quê?

Não existe um motivo apenas. Sem hierarquizar, podemos enumerar alguns, a começar pelo fato de que os organizadores do evento fizeram tudo o que podiam para restringir a presença dos partidos de esquerda, inclusive proibindo bandeiras vermelhas. De outra parte, não havia também nenhuma grande motivação por parte desses partidos para partici- par de um evento no qual a palavra de ordem “Nem Bolsonaro nem Lula” era, literalmente, o pano de fundo. Mas essa foi uma disputa de bastidores da organização do evento. Com a ressalva de que toda manifestação em defesa da democracia deve ser saudada, uma avaliação serena leva à inevitável conclusão de que as ambições de seus organizadores foram frustradas. Não por acaso, o presidente Jair Bolsonaro disse que seus opositores “são dignos de dó, de pena”, na manhã de ontem, à saída do Palácio da Alvorada.

A divisão entre as forças de oposição é mais profunda. Todos estão de acordo com o #ForaBolsonaro, mas o mesmo não ocorre em relação ao impeachment do presidente da República, principalmente de parte do PT. A avaliação da cúpula do partido é de que o ex-presidente da República está quase com o caneco na mão, o negócio é não fazer muita marola e chegar à campanha eleitoral de 2022. Faz sentido, embora seja inconfessável, os petistas serem contra o impeachment de Bolsonaro. Primeiro, por causa da turbulência política e dos riscos de a radicalização isolar a legenda; segundo, porque Bolsonaro
fora da disputa abre espaço para que um candidato de perfil mais moderado ocupe o centro político e receba os votos conservadores por gravitação.

Todos os pré-candidatos que subiram no carro de som dos protestos da Avenida Paulista sonham com Bolsonaro de fora do segundo turno das eleições, em razão do favoritismo de Lula. É da lógica das disputas eleitorais em dois turnos que a segunda vaga ser disputada com chutes nas canelas e dedos nos olhos entre os que seguem o líder. As pesquisas indicam ser mais fácil tomar a vaga de Bolsonaro do que a de Lula. Nove entre 10 analistas avaliam que Bolsonaro perdeu as condições de se reeleger. Entretanto, se outro candidato chegar ao segundo turno contra Lula, o petista pode ser derrotado. Por essa razão, o PT não facilitará a vida de nenhum candidato de oposição. Pelo contrário, tentará mostrar nas próximas manifestações que é a única força capaz de derrotar Bolsonaro.

Resistência institucional

É um erro comparar as manifestações golpistas do dia 7 de setembro com as de domingo para avaliar a capacidade de resistência da democracia aos arroubos autoritários de Bolsonaro. A comparação, porém, serve para demonstrar que não foram os partidos de oposição que barraram a ofensiva antidemocrática. O presidente da República foi obrigado a recuar devido à força das instituições republicanas, principalmente os demais Poderes, sob a liderança do Supremo Tribunal Federal (STF). Bolsonaro também não tem o apoio das Forças Armadas para dar um golpe de Estado, como ficou evidente na semana passada. A alta burocracia federal, principalmente nas carreiras típicas de Estado, tem verdadeira ojeriza ao estilo de gestão adotado pelo presidente da República.

Voltemos ao começo. As manifestações de domingo mostraram que os chamados movimentos cívicos perderam força, como normalmente acontece com as correntes de opinião pública que surgem nas crises, quando suas organizações e lideranças se institucionalizam. Esses movimentos tiveram um caráter antissistema, ou seja, “contra tudo o que está aí”, no impeachment de Dilma Rousseff. Porém, nas eleições de 2018, sua base mais conservadora foi capturada por Bolsonaro, que as transformou em redes de apoio na internet. Os setores mais moderados, identificados com as ideias e propostas de caráter liberal ou social-democrata, que se deslocaram do bolsonarismo, estão diante de um problema que os movimentos cívicos, por sua natureza, não podem resolver sem os partidos de oposição: encontrar um candidato para chamar de seu.

https://blogs.correiobraziliense.com.br/azedo/nas-entrelinhas-oposicao-e-forte-mas-dividida

Senadores repercutem carta de recuo do presidente Bolsonaro

Por meio de suas redes sociais, Pacheco, afirmou que é necessário "respeito entre os Poderes e obediência à Constituição"

Agência Senado

O presidente do Senado, Rodrigo Pacheco, defendeu nesta quinta-feira (9), pelo Twitter, “respeito entre os Poderes, obediência à Constituição e compromisso árduo no trabalho em favor do desenvolvimento do país”. Ele ressaltou que "é disso que o país precisa".

Pacheco publicou essas declarações após o presidente Jair Bolsonaro divulgar carta em que afirma não ter tido "nenhuma intenção de agredir quaisquer dos poderes" durante suas manifestações no dia 7 de setembro e que suas "palavras, por vezes contundentes, decorreram do calor do momento".

A mensagem de Bolsonaro repercutiu entre os senadores, que também se manifestaram nas redes sociais.

“Quantas horas vai durar o espírito pacífico e respeitador das leis de Bolsonaro? Talvez até a próxima live. Quem acredita nas intenções democráticas de Bolsonaro? Para a situação do Brasil só há uma saída segura: o impeachment do presidente”, publicou o senador Humberto Costa (PT-PE).

Para o senador Fabiano Contarato (Rede-ES), Bolsonaro "é o barril de pólvora que está implodindo o país”. Ele disse ainda que o presidente da República é um “fabricador de crises, viúvo da ditadura, péssimo governante, tiranete desequilibrado. Sua nota de hoje [a carta divulgada nesta quinta-feira] é mais uma vergonha para a República. Impeachment para esse terrorista! Bolsonaro é um típico covarde manipulador. Faz da ameaça um método de governabilidade para conseguir o que quer. E tem funcionado! Avança e recua, afrouxando todos os limites do Estado Democrático de Direito. É só aguardar o próximo ataque: ele virá!”.

Já o senador Alvaro Dias (Podemos-PR) avaliou que a reação de Bolsonaro após os protestos já era esperada. “Recuo previsto, acontece”, publicou o parlamentar.

Michel Temer

O senador Alessandro Vieira (Cidadania-SE) também fez críticas à carta de Bolsonaro e à notícia de que o documento teria sido escrito sob orientação do ex-presidente Michel Temer. “Li a cartinha do Temer que o Bolsonaro assinou. Será que agora o Temer passa a governar também? Será que vai redigir cartinha explicando mansões e rachadinhas? Vai vendo, Brasil. Quem votou ‘para mudar tudo isso aí’ faz o quê? Espera cartinha para baixar o preço da gasolina? Desenhando para inocentes apaixonados. Bolsonaro é só mais uma peça no sistema, preocupado em esconder rachadinhas, mansões e incompetência. E o sistema adora presidentes fracos. Facilita demais o acesso a cargos, grana e impunidade. Basta ler a sequência de notinhas ensaiadas.”

O senador Rogério Carvalho (PT-SE), por sua vez, disse que Bolsonaro cometeu crime de responsabilidade e não pode ficar impune. “Até o golpista Temer aconselhou o Bolsonaro a recuar da brava autoritária. As instituições precisam permanecer vigilantes aos arroubos antidemocráticos de Bolsonaro, que não irão parar. Os crimes de responsabilidade já cometidos não podem passar impunes!”

Diálogo

Outros senadores, no entanto, elogiaram a mensagem divulgada por Bolsonaro e defenderam o diálogo. Um deles foi o senador licenciado Ciro Nogueira (PP-PI), atual ministro da Casa Civil. “A harmonia e o diálogo entre os poderes compõem as bases nas quais se sustenta nosso país. O gesto do presidente Jair Bolsonaro demonstra que estamos unidos no trabalho pelo que mais importa, a recuperação do nosso país e o cuidado com os brasileiros.”

O diálogo também foi defendido pelo senador Vanderlan Cardoso (PSD-GO). “Sou um pacificador. Sempre defendi o diálogo, o entendimento e o respeito entre poderes, partidos e pessoas. É disso que o Brasil precisa, sobretudo neste momento de retomada.”

Para o senador Elmano Férrer (PP-PI), é oportuna a declaração de Bolsonaro sobre os Poderes ("Democracia é isso: Executivo, Legislativo e Judiciário trabalhando juntos em favor do povo e todos respeitando a Constituição"). Elmano disse que “Executivo, Legislativo e Judiciário devem trabalhar juntos. Com diálogo e entendimento, é possível fortalecer a democracia brasileira. Esse é o caminho que vamos continuar defendendo”.

Presidente da Comissão Parlamentar de Inquérito (CPI) da Pandemia, o senador Omar Aziz (PSD-AM) também manifestou-se no Twitter. “O dia 9 de setembro é histórico. Dia em que Bolsonaro fez autocrítica sobre a China. E dia em que ele recuou na tensão com outros Poderes. Se for ato genuíno, é louvável. Se for jogada para liberação dos recursos de precatórios para programas eleitoreiros em 2022, é lastimável. Estaremos alerta!”

Fonte: Agência Senado
https://www12.senado.leg.br/noticias/materias/2021/09/09/senadores-repercutem-carta-divulgada-por-bolsonaro-apos-manifestacoes-em-7-de-setembro


Os recuos de Bolsonaro entre os dias 7 e 9/9

Confira quatro pontos claros de recuo do presidente em um comparativo de seu discurso no último dia 7 e na nota deste dia 9

Mariana Sanches / BBC News Brasil

Congressistas e integrantes do Supremo Tribunal Federal (STF), além de especialistas em direito e analistas políticos consideraram que as declarações de Bolsonaro tinham "teor golpista" e eram passíveis de ser enquadradas como crime de responsabilidade, punível com abertura de processo de impeachment.

Entre outras coisas, Bolsonaro afirmou que não mais cumpriria decisões judiciais do ministro Alexandre de Moraes, responsável pelo inquérito das fake news do qual Bolsonaro é alvo, e ameaçou fechar o STF caso seu presidente, Luiz Fux, não "enquadrasse" Moraes.

Também afirmou que apenas Deus poderia retirá-lo da cadeira presidencial e afirmou: "quero dizer aos canalhas que nunca serei preso".

Diante da repercussão negativa das falas tanto no mundo político, que retomou as discussões de impedimento do presidente, como no mercado, que reagiu com alta do dólar e tombo da bolsa de valores, Bolsonaro deu um passo atrás. Na nota, justificou-se: "quero declarar que minhas palavras, por vezes contundentes, decorreram do calor do momento e dos embates que sempre visaram o bem comum".

Bolsonaro também disse que "na vida pública as pessoas que exercem o poder não têm o direito de "esticar a corda", a ponto de prejudicar a vida dos brasileiros e sua economia". Sua manifestação do dia 7 levou à paralisação de caminhoneiros em mais de 15 Estados e provocou desabastecimento de combustíveis em alimentos em partes do país. Isso deve pressionar ainda mais a economia do país, em recuperação frágil da recessão causada pela pandemia de covid-19. O PIB do último trimestre teve resultado negativo e a inflação se aproximou dos dois dígitos no acumulado dos 12 meses.

Veja a seguir quatro pontos claros de recuo do presidente em um comparativo de seu discurso no último dia 7 e na nota deste dia 9.

1. Supremo Tribunal Federal

Bolsonaro em 7/9: "Ou o chefe desse Poder enquadra o seu ou esse Poder pode sofrer aquilo que nós não queremos."

Bolsonaro em 9/9: "Nunca tive nenhuma intenção de agredir quaisquer dos Poderes."

2. Ministro Alexandre de Moraes

Bolsonaro em 7/9: "Não vamos mais admitir que pessoas como Alexandre de Moraes continuem a açoitar a nossa democracia."

Bolsonaro em 9/9: "Em que pesem suas qualidades como jurista e professor, existem naturais divergências em algumas decisões do Ministro Alexandre de Moraes."

3. Respeito a decisões de outros poderes

Bolsonaro em 7/9: "Qualquer decisão do senhor Alexandre de Moraes, esse presidente não mais cumprirá. A paciência do nosso povo já se esgotou."

Bolsonaro em 9/9: "Reitero meu respeito pelas instituições da República, forças motoras que ajudam a governar o país."

4. Democracia

Bolsonaro em 7/9: "Tinha que esperar um pouco mais de modo que a população aos poucos ou cada vez mais fosse se conscientizando do que é um regime ditatorial. Agora chegou o momento de nós dizermos a essas pessoas que abusam da força do poder para nos subjugar, dizer a esses poucos que agora tudo vai ser diferente".

Bolsonaro em 9/9: "Democracia é isso: Executivo, Legislativo e Judiciário trabalhando juntos em favor do povo e todos respeitando a Constituição."

Fonte: BBC Brasil
https://www.bbc.com/portuguese/brasil-58510022


'Game over': bolsonaristas se revoltam com recuo do presidente

Recuo do presidente Jair Bolsonaro (sem partido) em nota divulgada nesta quinta (9/9) foi mal recebido por seus apoiadores

BBC Brasil

"Game Over", disse o blogueiro Allan Santos no Twitter — o termo em inglês pode ser traduzido como "fim do jogo" ou simplesmente "acabou".Pule Twitter post, 1

GAME OVER pic.twitter.com/EiEgzB5FPV— Allan Dos Santos  (@allanldsantos) September 9, 2021

Final de Twitter post, 1

Rodrigo Constantino usou a mesma expressão, mas foi mais enfático nas críticas ao presidente. Para ele, Bolsonaro demonstrou "fraqueza" e "levou um xeque-mate".

"Bolsonaro pode ter assinado sua derrota", afirmou no Twitter.

Se era xadrez 4D, parece que Bolsonaro tomou um xeque-mate de uma rainha tridimensional. Depois da demonstração de força do povo, o presidente demonstra fraqueza. Situação bem complicada para os patriotas. Bolsonaro pode ter assinado sua derrota hoje...— Rodrigo Constantino (@Rconstantino) September 9, 2021

O empresário Leandro Ruschel fez um prognóstico semelhante sobre o futuro político do presidente.

"Impressão inicial, ainda provisória: com o ato de hoje, Bolsonaro está abrindo mão da candidatura à reeleição. A conferir", disse ele.

Impressão inicial, ainda provisória: com o ato de hoje, Bolsonaro está abrindo mão da candidatura à reeleição.

A conferir.— Leandro Ruschel 🇧🇷🇺🇸🇮🇹🇩🇪 (@leandroruschel) September 9, 2021

O pastor Silas Malafaia deixou claro que não pretende seguir o presidente em sua recém-adquirida moderação e voltou a atacar Alexandre de Moraes, o ministro do Supremo Tribunal Federal (STF).

"Continuo aliado, mas não alienado", tuitou. "Minhas convicções são inegociáveis."

CONTINUO ALIADO , MAS NÃO ALIENADO ! Bolsonaro pode colocar a nota que quiser , Alexandre de Moraes continua a ser um ditador da toga que rasgou a constituição e prendeu gente inocente . MINHAS CONVICÇÕES SÃO INEGOCIÁVEIS !— Silas Malafaia (@PastorMalafaia) September 9, 2021

'No calor do momento'

Bolsonaro divulgou a nota um dia após o presidente do STF, Luiz Fux, afirmar que suas ameaças poderiam culminar em um processo de impeachment.

O presidente participou de atos no 7 de setembro que pediram o fechamento do STF e do Congresso. Em seus discursos, ele atacou a Corte e seus ministros e disse que poderia não cumprir novas decisões de Moraes, a quem chamou de "canalha".

No comunicado divulgado pelo Planalto, Bolsonaro baixou o tom e afirmou que as declarações foram feitas no "calor do momento" e que "nunca teve intenção de agredir quaisquer dos poderes".

O presidente ainda disse que "não tem direito de esticar a corda a ponto de prejudicar a vida dos brasileiros e sua economia" e que suas divergências com o ministro Alexandre de Moraes — seu maior desafeto no STF e a quem chamou de "canalha" em sua fala nos protestos — deveriam ser resolvidas por meio da via judicial.

"Reitero meu respeito pelas instituições da República, forças motoras que ajudam a governar o país", afirmou Bolsonaro.

'Traidor'

Apoiadores do presidente em Brasília
Apoiadores de Bolsonaro em frente ao Congresso Nacional. Foto: EPA

Em grupos de apoio ao presidente no aplicativo Telegram, os bolsonaristas se dividiram entre a revolta, a incredulidade e a decepção com a reação do presidente.

"Traidor", disse uma integrante de um grupo com mais de 11 mil participantes.

"Eu vim para Brasília apoiar o presidente e ele faz isso", comentou outro membro.

Em outro grupo, com 2 mil pessoas, um apoiador disse: "O presidente se rendeu, se acovardou. Eu esperava muito mais".

"Também não acreditei!!! Será alguma estratégia?!?", respondeu outra participante.

"Será que o presidente vai renunciar à reeleição? Será que o sistema fez com Bolsonaro o mesmo que fez com Trump?", questionou uma terceira.

Em outro grupo, com 36 mil inscritos, um membro interpretou assim o comunicado: "Nosso capitão recuou".

"Infelizmente", respondeu outro.

"Alguém confirma", questionou um integrante, que ouviu em resposta: "Sim, é verdade. O presidente nos abandonou."

"Ele disse que não ia respeitar o STF e agora tá se desculpando por nota", comentou um apoiador.

Outra participantes disse que a atitude de Bolsonaro foi uma "falta de respeito com o povo que ele pediu para ir às ruas".

"Não vivia falando que tá com o povo aonde o povo estiver e agora??? Somos chacota da esquerda."

"Que decepção", escreveu um terceiro, "mas acredito que isso tenha sido só para pacificar as coisas apenas uma estratégia a mando de alguém;"

"Decepção total, o sistema venceu o nosso presidente", afirmou mais um

Mas nem todos perderam a confiança em Bolsonaro.

"Não recuou não, estão malucos? Ele tem razão em fazer, tenham certeza, é uma demonstração de bom senso e autoproteção. Parem para pensar caramba", disse um membro desse mesmo grupo.

Outro afirmou que "recuar não é derrota".

"Temos que ter paciência, galera", pediu um outro apoiador.

Fonte: BBC Brasil
https://www.bbc.com/portuguese/brasil-58510232


A crise, as instituições e os "diálogos institucionais"

Jair Bolsonaro afronta reiteradamente as instituições do Estado democrático de Direito, disseminando insegurança jurídica

José Eduardo Faria / Horizontes Democráticos / O Estado de S. Paulo

Autocrata, ignaro e incapaz de agir politicamente dentro das regras democráticas estabelecidas pela Constituição, como está sendo evidenciado neste feriado de 7 de setembro, desde que ascendeu ao poder o presidente Jair Bolsonaro afronta reiteradamente as instituições do Estado democrático de Direito, disseminando insegurança jurídica, levando a economia a se deteriorar e deflagrando uma crise de governabilidade permanente.

Em seu primeiro ano de gestão, ele afirmou que devia lealdade apenas ao “povo brasileiro”, desprezando a mediação parlamentar e, por conse’quência, o perfil liberal da democracia brasileira. Já no segundo ano, ao participar de agressões dominicais ao Supremo Tribunal Federal, defendendo o uso da violência contra alguns de seus ministros, passou a testar os limites da Constituição. E agora, em seu terceiro ano de mandato, quando praticamente todas as iniciativas de seu governo tiveram sua constitucionalidade questionada na corte, o presidente da República se apropriou dos festejos da Independência para promover uma manifestação por ele classificada como um “ultimato” a dois ministros. Ele se esquece — ou melhor, não aceita — que a Constituição promulgada após a redemocratização do País tenha conferido ao STF o poder de rever a constitucionalidade dos atos dos demais poderes.

Diante dessa escalada, dois fatos passaram a ocupar as manchetes dos jornais nos últimos tempos. De um lado, lideranças políticas, governadores e entidades empresariais começaram a propor sucessivos diálogos entre os presidentes dos três Poderes, e até um pacto interinstitucional, com o objetivo de preservar a ordem jurídica e a democracia. De outro lado, em decorrência das diatribes autoritárias presidenciais e de projetos de lei e propostas de emenda constitucional sem mínima consistência jurídica, bem como da aprovação pelo Legislativo de várias leis economicamente insensatas, a vida política do país tornou-se cada vez mais dependente das posições da cúpula do Poder Judiciário.

Esses dois fatos dão a medida da profunda crise institucional que o País atravessa. No primeiro caso, como a judicialização da vida política ocorreu somente porque o Executivo não soube e/ou não quis formar uma coalização majoritária para governar e porque as lideranças do Legislativo necessitaram de uma arbitragem externa por não conseguir resolver seus impasses internos, o que uma corte suprema pode oferecer nesses diálogos a não ser fazer cumprir o que a Constituição determina?

Mas não é só. O STF é um órgão colegiado e seu presidente tem uma ação basicamente administrativa. Nos julgamentos, pode sugerir ou orientar seus pares nos julgamentos. Contudo, não pode não impor sua vontade. Desse modo, como firmar um pacto com o chefe do Executivo, comprometendo-se em nome da corte e se responsabilizando por seus resultados? Ao agir assim, não estaria entregando a outros Poderes a última palavra quanto a certas matérias decididas por uma corte suprema? Em suma, de que modo o STF pode abrir mão de sua atribuição funcional de julgar como inconstitucional uma iniciativa do inquilino do Palácio do Planalto só porque ela foi politicamente negociada em troca de uma promessa do presidente da República de que passará a respeitar o Judiciário? Além de paradoxal, esse cenário seria a negação da democracia, sob a justificativa de preservá-la.

Já o segundo fato aponta uma outra importante faceta da crise institucional. Ainda que Bolsonaro e seu entorno militar insistam em afirmar que a Constituição não os deixa governar, eles se esquecem de que, se há de uma trava constitucional limitando a discricionaridade dos governantes na gestão pública, ela é uma decorrência da ditadura militar que até hoje justificam, defendem e canonizam. Ainda que Bolsonaro e seu entorno militar insinuem que a Constituição de 1988 não os deixa governar, eles se esquecem de que, se há uma trava constitucional, ela se justifica historicamente, ainda que de maneira indireta, como proteção contra práticas tornadas rotineiras na ditadura militar que até hoje eles justificam, defendem e canonizam.

Os abusos e absurdos cometidos pelos militares entre março de 1964 e 14 de março de 1985 foram tantos que não restou aos constituintes de 1988 outra saída a não ser incluir no texto constitucional – e assegurar sua preservação por meio da figura jurídica das cláusulas pétreas, em alguns casos — uma série de dispositivos não só no campo das liberdades fundamentais e das garantias públicas, mas, igualmente, em matérias econômicas e sociais. A ordem constitucional daí resultante foi de caráter aspiracional, não só no sentido de assegurar direitos básicos, mas, também, de caminhar rumo a uma sociedade menos desigual e iníqua e mais justa e igualitária.

Resultante de uma circunstância histórica, essa ordem constitucional foi concebida de modo deliberadamente abrangente, transferindo questões do campo da política para o âmbito do direito positivo. Foi uma estratégia pensada para tentar impedir que, nas eleições futuras, as novas configurações do Legislativo revogassem esses direitos e essas orientações programáticas.

Ato de promulgação da Constituição Federal de 1988. Foto: Reprodução

Dessa maneira, conforme lembra o historiador J. Reinaldo de Lima Lopes, como nem mesmo as propostas de emendas constitucionais poderiam reduzi-los, a saída que restou aos governos das chamada Nova República foi recorrer à judicialização e à hermenêutica jurídica. Mais precisamente, à tentativa de fazer com que o STF, devidamente demandado por ações de controle de constitucionalidade, interpretasse os dispositivos da Carta conforme as respectivas agendas de cada governo. Isso ocorreu em todas as gestões presidenciais após a redemocratização, desde a primeira eleição de Fernando Collor pelo voto direto, em 1989, até a de Bolsonaro, em 2018, o que levou as ações de constitucionalidade a judiciais a se multiplicarem no STF. Só nas duas primeiras décadas após a promulgação da Constituição, por exemplo, foram propostas perante o STF mais de 4 mil Ações Diretas de Inconstitucionalidade. Na mesma corte, o número de novos processos por exercício passou de 18,5 mil em 1990, para 160,4 mil em 2002, segundo as estatísticas do Conselho Nacional de Justiça.

Foi a partir daí que surgiu um conceito equivocado, o de ativismo judicial, utilizado por quem tinha a expectativa de que os ministros da corte alterassem o alcance dos direitos e das orientações programáticas da Constituição por vias hermenêuticas. Também foi a partir daí que começaram as pressões contra os magistrados “ativistas” — o que se exacerbou quando o atual governo autocrata, assessorado por advogados públicos medíocres e por juristas oportunistas, passou a afrontar o Supremo e a convocar manifestações de protesto sob a justificativa de dar “um ultimato” a dois de seus onze ministros.

Com isso, o círculo se fecha. Caso ceda às pressões, aceitando as propostas de um diálogo entre os três Poderes e de um pacto interinstitucional, ou, então, curvando-se a manifestações populares organizadas com explícito viés golpista, os ministros do STF perderão sua independência, que está na essência de sua razão de existir. Por consequência, teriam sua credibilidade e legitimidade comprometidas, na medida em que estariam negando a Constituição que juraram cumprir. Resistir às diferentes estratégias antidemocráticas, é claro, tem um custo. Mas ele nunca será mais alto do que o preço a ser pago por aquele que, entre os onze ministros da corte, acabar com sua imagem enxovalhada pela subserviência, deixando-se dobrar à ofensiva antidemocrática bolsonarista.

Fonte: Estado da Arte, 07 de setembro de 2021 / Blogo Horizontes Democráticos
https://estadodaarte.estadao.com.br/jef-07-setembro-dialogos-stf/
https://horizontesdemocraticos.com.br/a-crise-as-instituicoes-e-os-dialogos-institucionais/


O que esperar do Brasil após o 7 de Setembro?

Com intenção de não mais cumprir decisões do STF, Bolsonaro escala a crise institucional. Defesa da democracia entra na ordem do dia

Jornal da USP

O 7 de Setembro galvanizou as atenções do País, acelerando o processo político em direção a um horizonte incerto. No lugar dos tradicionais desfiles militares em Brasília e outras capitais, o cenário foi tomado tanto pelas manifestações orquestradas pelo presidente Jair Bolsonaro quanto pelas convocadas pelas oposições. Em Brasília e na Avenida Paulista, em São Paulo, o presidente Bolsonaro, após dois meses de pregação preparatória dos eventos por todo o País, discursou para públicos expressivos, mas bem menores do que o esperado pelos organizadores. Nem uma palavra sobre os problemas reais que afligem o País, muito menos sobre como resolvê-los.

Suas falas se concentraram em críticas ao uso das urnas eletrônicas nas eleições, sistema recentemente confirmado e mantido por votação na Câmara dos Deputados. E em ataques ao ministro Alexandre de Moraes, do Supremo Tribunal Federal, que comanda inquéritos que o envolvem e podem atingir filhos e correligionários — e será presidente do Tribunal Superior Eleitoral nas eleições de 2022.

Em meio ao seu discurso em São Paulo, Bolsonaro disse que não mais acatará qualquer decisão emanada do ministro Moraes, apontando para uma possível futura postura de desrespeito à Constituição.

As manifestações das oposições, também por todo o País, concentraram-se em fortes críticas a problemas como o desemprego, fome, inflação, que estão dificultando a vida das camadas mais pobres da população, e as confusões na campanha de vacinação contra a pandemia do coronavírus, que se desenvolve mais lentamente do que o necessário.

Os discursos de Bolsonaro já estão gerando repercussões e reações no mundo jurídico e político e na sociedade. Abaixo, o Jornal da USP publica a opinião e a análise de especialistas da Universidade de São Paulo.

Renato Janine Ribeiro – Foto: Reprodução/Vermelho

Renato Janine Ribeiro
Professor da Faculdade de Filosofia, Letras e Ciências Humanas da USP e presidente da Sociedade Brasileira para o Progresso da Ciência (SBPC)

“O presidente manteve seu discurso habitual, inclusive ameaçando o Judiciário […] Faltou a menção aos quase 600 mil brasileiros mortos por covid […] Faltou menção à crise econômica que estamos vivendo […]. Faltou uma menção à educação, ciência e pesquisa […]. Faltou preocupação com a vida das pessoas […]. É uma pena que o presidente não se preocupe com essas questões.”


José Álvaro Moisés – Foto: Cecília Bastos/USP Imagens

José Álvaro Moisés

Professor da Faculdade de Filosofia, Letras e Ciências Humanas da USP

“As manifestações se constituíram, de certo modo, num ato de campanha eleitoral do presidente para concorrer à eleição – campanha fora de tempo é crime, e isso é mais grave se envolve o uso de recursos públicos, como parece ter ocorrido nesse caso […]. Mas o ponto mais controverso constitui o fato de Bolsonaro ter dado elementos para a atualização das propostas do seu próprio impeachment. Ao propor, em nome da Constituição, medidas que burlam a autonomia e a independência de alguns dos Poderes republicanos mais importantes, como é o caso do Supremo Tribunal Federal, o presidente pode ter oferecido precisamente a base para a abertura de um processo de seu impedimento.”Tocador de áudio00:0000:00Use as setas para cima ou para baixo para aumentar ou diminuir o volume.


Simão Silber – Foto: Reprodução

Simão Silber

Professor da Faculdade de Economia, Administração e Contabilidade da USP

“Sem os discursos, a situação da economia brasileira já era ruim […]. Com os dois discursos pregando rupturas com as instituições, trazendo uma incerteza muito grande, mexeu com as expectativas dos agentes econômicos […]. O resultado veio hoje na abertura dos mercados, com a bolsa caindo mais que 1% […] e uma pressão sobre o dólar que se desvalorizou e tem uma tendência a se desvalorizar mais ainda […]. Foi um beijo na morte que estava faltando.”Tocador de áudio00:0000:00Use as setas para cima ou para baixo para aumentar ou diminuir o volume.


Marcos Fava Neves – Foto: Arquivo pessoal

Marcos Fava Neves

Professor da Faculdade de Economia, Administração e Contabilidade de Ribeirão Preto da USP

“Este 7 de Setembro me deixou com sensações mistas […]. As manifestações foram muito bem organizadas, pacíficas, bonitas de se ver […]. As pautas contra o ambiente democrático não têm o meu apoio, isso custa muito caro para um país […]. Para a economia, esse ambiente belicista que o Brasil vive, não bastasse a crise sanitária […] A crise da economia melhorou um pouco, mas poderia estar mais forte [ainda mais com] a crise hídrica brutal no País […]. Para o ambiente econômico isso não é bom, o Brasil precisa passar por um processo de pacificação.”Tocador de áudio00:0000:00Use as setas para cima ou para baixo para aumentar ou diminuir o volume.


Rafael Mafei – Foto: Reprodução

Rafael Mafei

Faculdade de Direito da USP

“As manifestações do 7 de Setembro de que o presidente participou foram marcadas por pautas declaradamente antidemocráticas, a principal das quais a retaliação e ameaça contra o Supremo Tribunal Federal, em especial a dois de seus ministros […]. A Constituição é taxativa em dizer que o Judiciário tem poder para rever atos da Presidência da República e de ministros de Estado […]. Quando toma qualquer medida que porventura invalide uma política do presidente, o Judiciário está cumprindo o seu papel de fazer com que a Constituição seja observada […]. O presidente não tem o direito constitucional de não ser contrariado por juízes […]. A Constituição e as leis estabelecem que o presidente tem o dever de acatar decisões judiciais e tem o dever de não ameaçar ou incitar a população.”Tocador de áudio00:0000:00Use as setas para cima ou para baixo para aumentar ou diminuir o volume.

Maria Hermínia Tavares – Foto: IEA

Maria Hermínia Tavares

Professora aposentada da Faculdade de Filosofia, Letras e Ciências Humanas e do Instituto de Relações Internacionais, ambos da USP

“As manifestações promovidas pelo presidente Jair Bolsonaro ontem são mais um passo na escalada que ele tem promovido de ataque às instituições brasileiras. Embora fale de liberdade, o presidente frequentemente assedia jornalistas e ameaça opositores […], embora fale de democracia, o seu entendimento é aquele sistema no qual as eleições entregam para quem teve a maioria dos votos um mandato ilimitado […]. Isso não é democracia, é um autoritarismo de base eleitoral […]. A democracia verdadeira é aquela na qual o poder legítimo dos mandatários eleitos é limitado pelas leis e instituições do sistema democrático […]. O presidente é um autoritário que foi eleito pela regra democrática […]. Ontem, nas ruas, vimos a extensão e a limitação do seu poder […]. Ele divide o País, um País que precisa estar unido.”Tocador de áudio00:0000:00Use as setas para cima ou para baixo para aumentar ou diminuir o volume.


Deisy Ventura – Foto: Arquivo pessoal

Deisy Ventura

Professora da Faculdade de Saúde Pública da USP

“O que estamos vendo acontecer no Brasil não é novidade nem em relação ao que o presidente da República, que é um agitador extremista, vem anunciando e prometendo […], mas também não é novidade histórica nenhuma […]. Os movimentos totalitaristas agem exatamente dessa forma […], muitas vezes chegam ao poder pela via eleitoral, como no Brasil, e depois utilizam o aparelho do Estado contra a população […]. Quem está hipnotizado por esse movimento […] realmente não o vê como o perigo que é […]. Essa é a hora de surgirem os estadistas […] esta é a hora de surgirem as lideranças sociais […]. Este é um momento de enorme gravidade que precisa ser tratado como tal.”Tocador de áudio00:0000:00Use as setas para cima ou para baixo para aumentar ou diminuir o volume.

Fonte: Jornal da USP
https://jornal.usp.br/atualidades/o-que-esperar-do-brasil-apos-o-7-de-setembro/


Presidente do TSE critica ameaças à democracia brasileira

Barroso ressaltou que a 'democracia tem lugar para conservadores e progressistas, só não tem lugar para quem pretenda destruí-la'

Ascom / TSE

Ao abrir a sessão plenária na manhã desta quinta-feira (9), o presidente do Tribunal Superior Eleitoral (TSE), ministro Luís Roberto Barroso, mais uma vez defendeu a Justiça Eleitoral e os servidores que nela atuam com verdadeiro patriotismo, trabalho duro e dedicado. Segundo ele, essas pessoas não podem ficar indefesas diante da linguagem abusiva e da mentira, ao se referir aos eventos e pronunciamentos do último dia 7 de setembro em que novas acusações foram feitas em relação à credibilidade da Justiça Eleitoral.

O presidente do TSE defendeu enfaticamente a democracia e criticou a polarização. “A democracia tem lugar para conservadores, liberais e progressistas. O que nos une na diferença é o respeito à Constituição, aos valores comuns que compartilhamos e que estão nela inscritos. A democracia só não tem lugar para quem pretenda destruí-la”, disse.

O ministro respondeu objetivamente às acusações feitas à Justiça Eleitoral e, na oportunidade, afirmou que o debate público permanente e de qualidade é o que permite que todos os cidadãos recebam informações corretas, formem sua opinião e apresentem seus argumentos. Portanto, esse debate não pode ser contaminado por discursos de ódio, campanhas de desinformação e teorias conspiratórias infundadas, sob pena de afronta à democracia.

“O slogan para o momento brasileiro, ao contrário do propalado, parece ser: “conhecerás a mentira e a mentira te aprisionará”, destacou.

Em relação às críticas à segurança do sistema eleitoral, Barroso detalhou novamente todas as fases de transparência, segurança e auditabildiade da urna eletrônica e afirmou que “o sistema é certamente inseguro para quem acha que o único resultado possível é a própria vitória”. Acrescentou ainda que “para maus perdedores não há remédio na farmacologia jurídica”.

Ele ainda reafirmou que as eleições brasileiras são totalmente limpas, democráticas e auditáveis e lembrou novamente que nunca se documentou fraude e que por esse sistema foram eleitos Fernando Henrique Cardoso, Luiz Inácio Lula da Silva, Dilma Rousseff e Jair Bolsonaro.

Ministro Luís Roberto Barroso - STF


Ministro Luís Roberto Barroso. Foto: Nelson Jr/SCO/STF
Plenário do STF. Foto: Fellipe Sampaio/SCO/STF
Ministro Luís Roberto Barroso. Foto: Carlos Moura/SCO/STF
Ministro Luís Roberto Barroso. Foto: Nelson Jr/SCO/STF
Ministro Luís Roberto Barroso. Foto: Rosinei Coutinho/SCO/STF
Ministro Luís Roberto Barroso. Foto: Rosinei Coutinho/SCO/STF
Ministro Luís Roberto Barroso. Foto: Carlos Moura/SCO/STF
Ministro Luís Roberto Barroso. Foto: Nelson Jr/SCO/STF
Ministro Luís Roberto Barroso. Foto: Nelson Jr/SCO/STF
Ministro Luís Roberto Barroso. Foto: Rosinei Coutinho/SCO/STF
previous arrow
next arrow
 
Ministro Luís Roberto Barroso. Foto: Nelson Jr/SCO/STF
Plenário do STF. Foto: Fellipe Sampaio/SCO/STF
Ministro Luís Roberto Barroso. Foto: Carlos Moura/SCO/STF
Ministro Luís Roberto Barroso. Foto: Nelson Jr/SCO/STF
Ministro Luís Roberto Barroso. Foto: Rosinei Coutinho/SCO/STF
Ministro Luís Roberto Barroso. Foto: Rosinei Coutinho/SCO/STF
Ministro Luís Roberto Barroso. Foto: Carlos Moura/SCO/STF
Ministro Luís Roberto Barroso. Foto: Nelson Jr/SCO/STF
Ministro Luís Roberto Barroso. Foto: Nelson Jr/SCO/STF
Ministro Luís Roberto Barroso. Foto: Rosinei Coutinho/SCO/STF
previous arrow
next arrow

“Depois de quase três anos de campanha diuturna e insidiosa contra as urnas eletrônicas, por parte de ninguém menos do que o presidente da República, uma minoria de eleitores passou a ter dúvida sobre a segurança do processo eleitoral. Dúvida criada artificialmente por uma máquina governamental de propaganda. Assim que pararem de circular as mentiras, as dúvidas se dissiparão”, afirmou.

Conforme destacou o presidente do TSE, são retóricas vazias. “Hoje em dia, salvo os fanáticos (que são cegos pelo radicalismo) e os mercenários (que são cegos pela monetização da mentira), todas as pessoas de bem sabem que não houve fraude e quem é o farsante nessa história”.

Por fim, Barroso destacou que “insulto não é argumento e ofensa não é coragem”. Acrescentou ainda que a falta de compostura nos envergonha perante o mundo e a marca Brasil sofre, atualmente, uma desvalorização global.

“Somos vítimas de chacota e de desprezo mundial”, afirmou, ao destacar que vivemos um desprestígio maior do que a inflação, do que o desemprego, do que a queda de renda, do que a alta do dólar, do que a queda da bolsa, do que o desmatamento da Amazônia, do que o número de mortos pela pandemia, do que a fuga de cérebros e de investimentos. “Não podemos permitir a destruição das instituições para encobrir o fracasso econômico, social e moral que estamos vivendo”, enfatizou.

 “Com a bênção de Deus – o Deus do bem, do amor e do respeito ao próximo – e a proteção das instituições, um presidente eleito democraticamente pelo voto popular tomará posse no dia 1º de janeiro de 2023”, finalizou.

Confira a íntegra do pronunciamento.

Fonte: TSE
https://www.tse.jus.br/imprensa/noticias-tse/2021/Setembro/presidente-do-tse-critica-ameacas-a-democracia-brasileira