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Mulheres do PPS discutem estratégias para aumentar presença feminina na política
A Coordenação Nacional de Mulheres do PPS realizou na última sexta-feira (7), em Brasília, workshop com o tema “Propostas para avançar com as mulheres no Parlamento”. No encontro foram debatidos a pesquisa encomendada pelo PPS sobre o desempenho feminino do partido nas eleições de 2016, estratégias de campanha e a Reforma da Previdência.
Na abertura, a coordenadora do evento, Tereza Vitale, fez um resumo dos debates que ocorreram no seminário realizado nesta quinta-feira (6). Para ela, é preciso trabalhar mais o envolvimento partidário das mulheres para combater o que a dirigente classificou como a “masculinização dos partidos políticos”.
“Não podemos aceitar de bandeja que os partidos sejam masculinizados. Estamos em outro século. Temos que fazer um trabalho político nas ruas. Não queremos apenas ocupar espaços dentro dos partidos. Vamos fazer reuniões regionais e queremos conhecer o nosso potencial para podermos trabalhar esses nomes e potencializar nossas candidatas”, disse.
Eleições 2018
Na primeira oficina do workshop, a pesquisadora do Grupo de Estudos de Gênero e Política da USP e do Núcleo Democracia e Ação Coletiva do Cebrap, Beatriz Rodrigues Sanchez, apresentou um levantamento (veja aqui) que mostra o desempenho das mulheres do PPS nas eleições de 2016. Ela destacou que os dados são preocupantes.
“As mulheres do PPS tiveram um resultado pior em 2016 quando comparado às eleições de 2012. Na disputa das prefeituras ficamos abaixo da cota de 30%. O PPS está pior que todos os partidos quando se compara o número de candidatas e de efetivamente eleitas”, disse.
Já na segunda oficina, as participantes acompanharam a apresentação da assessora da SPM (Secretaria Nacional de Política para as Mulheres) e da ONU Mulheres Brasil, autora do livro “A mulher candidata – Competindo para vencer”, Silvia Rita de Souza. Na apresentação ela falou como as candidatas devem se preparar para as eleições de 2018.
“É preciso três coisas: honestidade, competência e sensibilidade. Não temos que esperar ninguém. Devemos nos unir e tentar um espaço para nossas candidaturas com uma narrativa para prender o eleitor. A narrativa é o fio condutor que dá sentido a imagem da candidata. Para isso, é preciso saber o que o eleitor quer, não pode falar qualquer coisa. É preciso ouvir o eleitor, principalmente antes do início da campanha”, alertou.
Reforma da Previdência
O presidente do PPS, Davi Zaia, participou do encontro e falou sobre a postura do partido diante da Reforma da Previdência. Apesar de reconhecer que o tema é bastante polêmico na sociedade, o dirigente afirmou a necessidade das mudanças para garantir a aposentadoria das gerações futuras.
“Todos nós temos acompanhado o debate sobre a questão da Previdência. A primeira questão é se ela realmente é necessária e isso gera um grande debate. É preciso tomar cuidado com as versões que nos são repassadas pela internet e pelo canais como o whatsapp. A aposentadoria é um pacto entre gerações em que a atual paga para a anterior. Até aqui foi relativamente fácil pagar, pois tínhamos poucos aposentados, muita gente trabalhando. A pergunta que precisa ser feita é: será que nossos filhos vão querer pagar a conta para nós?”, questionou.
Luiz Carlos Azedo: Primeira fissura
Renan tem poder para emparedar as reformas que forem aprovadas na Câmara. A simples alteração pelo Senado faz o processo dar um largo passo atrás
Surgem as primeiras grandes fissuras na base do governo Temer, a principal delas no Senado, encabeçada pelo líder da bancada do PMDB, Renan Calheiros (AL), que assumiu uma clara dissidência em relação à orientação do governo. Renan é um sobrevivente de todos os governos, desde o de Fernando Collor, que o revelou para a política nacional. É um ás da baldeação: carregou o caixão de Dilma Rousseff até a porta do cemitério. Considerado um dos melhores estrategistas do Senado, ao lado de Jader Barbalho (PMDB-PA), que atua na surdina, seu desembarque do governo é iminente e perigoso.
Na manhã de ontem, Renan criticou mais uma vez a condução dada ao país pelo presidente Temer, o qual acusou de não ouvir ninguém, o que não é verdade. O presidente da República ouve pelo menos três integrantes da equipe de governo, o ministro da Fazenda, Henrique Meirelles, e os ministros da Casa Civil, Eliseu Padilha, e da secretaria de Governo, Moreira Franco, além de Rodrigo Maia, presidente da Câmara, e Romero Jucá, presidente do PMDB e líder do governo, que disputa influência no Senado com o líder da bancada.
Renan fez ontem uma comparação de Temer com a ex-presidente Dilma: “E a impressão de agora, com o presidente Michel, é que com essa política econômica, com esse aumento de imposto, com essa renegação da folha, com tudo isso, parece que, diferentemente da Dilma, que não sabia o que fazer, o Michel não tem o que fazer. E isso é pior para o Brasil”, disparou. E voltou a atacar a reforma da Previdência: “Uma reforma da banca, querendo arrecadar R$ 780 bilhões em 10 anos. Tem que fazer uma reforma da Previdência ideal”.
Ao atacar a política econômica deu uma pista do verdadeiro alvo: “O governo está errando ao querer resolver a crise econômica, colocar a inflação na meta com mais recessão. Isso é um horror. Isso vai levar o país, em um curtíssimo espaço de tempo, infelizmente, a uma crise maior”. O problema de Renan é a negociação da dívida dos estados, em apreciação na Câmara, que está sendo conduzida pelo ministro da Fazenda. Quer flexibilizar o acordo com os estados para favorecer o governo de Renan Calheiros Filho (PMDB), em Alagoas, candidato à reeleição junto com o pai.
Outro ator importante no jogo parece se manter ao largo da disputa, o presidente do Senado, Eunício de Oliveira (PMDB-CE), que tem boas relações com Temer, mas jamais seria eleito para o posto que ocupa sem o apoio de Renan. Eunício costuma virar uma esfinge nessas horas e esperar o vento firmar para escolher o rumo a seguir. Somente assume uma posição mais agressiva quando se sente ameaçado. Todos estão citados nas delações premiadas da Operação Lava-Jato, o que aumenta o estresse entre eles.
Temer já passou por muitas disputas com Renan, que inclusive tentou removê-lo da presidência do PMDB. É dispensável dizer quem foi que até agora riu por último. Quando parecia na iminência de ser derrotado dentro da legenda, Temer fez um acordo com os deputados do PT, foi eleito presidente da Câmara e, depois, vice-presidente da República na chapa de Dilma Rousseff, em 2010. Hoje, é o presidente da República, depois de romper com Dilma Rousseff e atrair o apoio de Renan.
A recidiva dessa velha disputa, porém, pode desestabilizar o governo. Renan tem poder para emparedar as reformas que forem aprovadas na Câmara. A simples alteração pelo Senado do que foi aprovado pelos deputados faz o processo dar um largo passo atrás. Além disso, caso Renan consiga manter a bancada de senadores do PMDB coesa, dificilmente isso não dividirá a bancada de deputados. Não é à toa que o Palácio do Planalto preferiu não alimentar a polêmica. A opção foi correr com a votação do acordo das dívidas dos estados na Câmara.
A renegociação
Esse assunto vem se arrastando desde o ano passado, quando os deputados retiraram as contrapartidas do projeto original do Ministério da Fazenda, sob forte pressão dos governadores. Temer enviou um novo texto para socorrer os estados em situação mais dramática, principalmente Rio de Janeiro e o Rio Grande do Sul. Há duas semanas, uma batalha surda se desenvolve entre a equipe econômica e base do governo na Câmara para votar o projeto.
Para renegociar as dívidas, a Fazenda quer que o acordo autorize a privatização de empresas dos setores financeiro, de energia e de saneamento para quitar dívidas, como já aconteceu com a Cedae, no Rio de Janeiro; que eleve a alíquota de contribuição previdenciária dos servidores estaduais; e que reduza incentivos ou benefícios tributários. Tudo enguiça na hora em que o acordo proíbe estados de conceder vantagem, aumento, reajuste ou adequação de salários a servidores; criar cargos ou funções que impliquem aumento de despesa; alterar a estrutura de carreira que gere aumento de gastos; realizar concurso público, ressalvadas hipóteses de reposição de cargos vagos; criar ou aumentar auxílios, vantagens, bônus, abonos ou benefícios de qualquer natureza. São matérias indigestas para candidatos ao Senado e governadores candidatos à reeleição.
Luiz Carlos Azedo: Cartas na mesa
Os partidos políticos, porém, estão sendo pautados pela necessidade de sobrevivência eleitoral de seus parlamentares
Com as principais lideranças do Congresso assediadas pela Operação Lava-Jato, a reforma política ganhou pernas longas e começou a andar bem rápido. Ontem, o relator da reforma, Vicente Cândido (PT-SP), tratou de antecipar os termos de sua proposta, que prevê lista fechada, voto distrital, 30% de financiamento eleitoral de pessoas físicas e o fim dos cargos de vice-presidente, vice-governador e vice-prefeito já no pleito de 2018.
Na véspera, o ex-presidente Fernando Henrique Cardoso, num artigo intitulado Apelo ao bom senso, apresentou também suas sugestões, depois de analisar alguns inconvenientes de propostas mais audaciosas, como o parlamentarismo e o voto distrital misto. “Melhor sermos realistas e começarmos com mudanças menos ambiciosas”, avalia. Eis a proposta do líder tucano:
“Como há limites de prazo para definir novos procedimentos eleitorais (eles devem ser aprovados até setembro para terem vigência em 2018), creio que o indispensável é aprovar logo a “cláusula de barreira”. Neste caso, seriam necessários x por cento de votos, distribuídos por um número mínimo de Estados, para que os partidos pudessem ter representação institucional no Legislativo (menos para o Senado, no qual o voto é no candidato), acesso ao Fundo Partidário e ao tempo de televisão. Também é indispensável aprovar a proibição de coligações nas eleições proporcionais, para evitar que, ao votar num deputado de um partido, se eleja alguém de outro.”
Para abreviar o parto, FHC propõe que o fundo partidário seja distribuído com os mesmos critérios da cláusula de barreira e que, para baratear o custo os custos de campanha, os programas de tevê não tenham “marquetagem”. Além disso, que se adote o voto distrital para as eleições de vereadores e o voto distrital misto nas eleições de 2022. Seria uma maneira de reduzir as resistências ao fim do atual voto proporcional uninominal.
Todas as propostas buscam uma saída para a crise política, pois a sociedade não se sente representada pelo Congresso. Os partidos políticos, porém, estão sendo pautados pela necessidade de sobrevivência eleitoral de seus parlamentares. O pânico é maior, entretanto, quando o desgaste é diretamente causado pela Lava-Jato, porque as investigações em curso no Supremo Tribunal Federal (STF) não vão deixar de pautar a mídia enquanto os julgamentos dos réus não forem concluídos.
Bumerangue
A condição de réu na Lava-Jato, mesmo que o processo corra em segredo de Justiça, pelo sistema atual, representará uma derrota eleitoral quase certa. Além disso, a consequente perda do direito ao foro privilegiado implicará mudança de curso do processo do não-eleito na Lava-Jato, que passaria à esfera do juiz federal Sérgio Moro, em Curitiba, onde os julgamentos costumam acontecer muito mais rápido. Foi o caso, por exemplo, do ex-presidente da Câmara Eduardo Cunha (PMDB-RJ), já condenado a 15 anos de prisão num único processo.
A adoção do voto em lista abriria a possibilidade de evitar a derrota, pois eliminaria a concorrência dos setores dos partidos que desejam sua renovação, lançando candidatos novos e não “queimados” pela Lava-Jato. É esse o raciocínio atribuído à proposta do petista Vicente Cândido, mas ele rebate isso: “O investigado na Lava Jato vai ficar em evidência estando na lista ou fora da lista. Ele poderá ser eleito numa carona de puxador de voto às vezes despercebido pelo eleitor. Então, não é isso. Se ele estiver na lista, o partido vai ter que explicar o porquê, vai ter que apresentar currículo”, argumenta.
Vicente Cândido se inspirou no caso do México, que acabou com a eleição de vice-presidente em 2017, para propor a simples extinção do cargo. Argumenta que isso representará grande economia de gastos e, ao mesmo tempo, o fim das conspirações para destituir presidentes, governadores e prefeitos. O primeiro argumento é válido; o segundo, não, porque a conspiração tende a ser maior ainda, se o chefe do parlamento for de oposição.
O efeito bumerangue do voto em lista, que não permite ao eleitor escolher a pessoa que vai eleger, pois ela pré-ordenada, é uma rejeição ao partido como um todo e não apenas contra os candidatos enrolados. Isso pode enfraquecer bastante os partidos envolvidos na Lava-Jato e, em alguns casos, até provocar o desaparecimento deles, como aconteceu com a antiga Arena, o partido criado pelo regime militar, que já foi “o maior do Ocidente”.
Fonte: blogs.correiobraziliense.com.br/azedo
Luiz Carlos Azedo: A devassa continua
A Operação Quinto do Ouro faz parte da estratégia de regionalização das investigações da Operação Lava-Jato, a partir das delações premiadas da Odebrecht
A condução coercitiva do presidente da Assembleia Legislativa do Rio de Janeiro (Alerj), Jorge Picciani, e a prisão de seis conselheiros do Tribunal de Contas fluminense são um sinal de que a Operação Lava-Jato vai se desdobrar em muitas direções, mirando parlamentares e magistrados nos estados. Picciani é o político fluminense mais poderoso da atualidade, fiador das reformas que o governador Luiz Fernando Pezão tenta aprovar no Legislativo e das negociações com o governo federal para obter recursos para o caixa estadual. Ontem, passou mais de três horas depondo na Superintendência da Polícia Federal no Rio, em razão de mandado de busca e apreensão em sua casa e no seu gabinete na Alerj.
Picciani é o principal alvo político da Operação Quinto do Ouro, que investiga desvios de até 20% de contratos com órgãos públicos para autoridades, em especial, membros do Tribunal de Contas do Estado do Rio (TCE-RJ) e da Alerj. Estão presos os conselheiros Aloysio Neves, atual presidente do TCE-RJ, Domingos Brazão, José Maurício Nolasco, José Gomes Graciosa, Marco Antônio Alencar e Aluísio Gama de Souza. Mesmo assim, Picciani manteve a Assembleia em funcionamento e recebeu a solidariedade dos seus pares.
A operação é um filhote da Lava-Jato e faz parte da estratégia de regionalização das investigações, a partir das delações premiadas da Odebrecht e de outras empreiteiras. Depois da prisão do ex-governador Sérgio Cabral, amplia-se o leque do combate à corrupção na política fluminense, mirando a base parlamentar do grupo e suas ramificações, inclusive no Judiciário. De certa forma, é um “case” do que pode acontecer em outros estados, inclusive Minas e São Paulo.
Não é à toa que o presidente da Câmara, Rodrigo Maia, encaminhou o pacote de medidas anticorrupção para o Senado. Projeto de iniciativa popular elaborado pelos procuradores da Lava-Jato, porém, foi completamente desfigurado ao ser aprovado pelos deputados. No Senado, também começou a andar o projeto de abuso de autoridade, que prevê a punição inclusive de juízes. A cúpula do Senado é o núcleo duro da resistência à Operação Lava-Jato no Congresso e teme o avanço das investigações nos estados, pois isso ameaça a sobrevivência política de muitos senadores.
Num ano pré-eleitoral, a regionalização das investigações terá um efeito devastador nas eleições. No Rio de Janeiro, por exemplo, o clima de revolta da população com os políticos é generalizado. A reação popular ontem à volta da ex-primeira-dama fluminense Adriana Anselmo para casa, onde ficará em prisão domiciliar para poder cuidar dos filhos pequenos, ilustra bem o grau de insatisfação. Vizinhas batiam panelas na calçada e gritavam: “Volta pra Bangu!”. Referiam-se ao complexo prisional na Zona Oeste do Rio, onde Cabral continua preso.
Reação
Os políticos enrolados na Lava-Jato querem mudar as regras do jogo, ou seja, a legislação sobre corrupção, caixa dois eleitoral e abuso de autoridade. Relator da matéria, o senador Roberto Requião (PMDB-PR) quer votar o projeto sobre abuso de autoridade no dia 19 de abril. Ontem, fez a leitura do seu relatório na CCJ, no qual propõe a revogação da lei de 1965 e cria uma nova legislação, com punição mais rigorosa e com a inclusão de mais situações em que uma autoridade pode ser enquadrada na prática de abuso, inclusive procuradores e juízes. Argumenta, porém, que a legislação vigente é obsoleta e o novo texto protegerá os cidadãos das camadas mais populares de abusos, sobretudo, de policiais.
O relatório de Requião propõe punição de 1 a 4 anos e pagamento de multa para a autoridade que divulgar gravação sem relação com a prova que se pretendia produzir, “expondo a intimidade ou a vida privada, ou ferindo a honra e a intimidade” do acusado ou do investigado no processo. Reclusão de 2 a 4 anos para quem realizar interceptações ou escutas sem autorização judicial ou com objetivos não autorizados em lei. Detenção de 6 meses a 2 anos e multa para a autoridade que estende a investigação sem justificativa e em “prejuízo do investigado”. Detenção de um a quatro anos e multa para quem decretar, em processo judicial, a indisponibilidade de ativos financeiros em quantia que extrapole o valor estimado para a satisfação da dívida da parte.
Num recado direto para a força-tarefa da Lava-Jato, pena de 1 a 4 anos de detenção, além do pagamento de multa, para delegados estaduais e federais, promotores, juízes, desembargadores e ministros de tribunais superiores que ordenarem ou executarem “captura, prisão ou busca e apreensão de pessoa que não esteja em situação de flagrante delito ou sem ordem escrita de autoridade judiciária”. Detenção de 1 a 4 anos para a autoridade policial que constranger o preso, com violência ou ameaças, para que ele produza provas contra si mesmo ou contra terceiros; invadir, entrar ou permanecer em casas de suspeitos sem a devida autorização judicial e fora das condições estabelecidas em lei; e obter provas, durante investigações, por meios ilícitos. A pena por não fornecer cópias das investigações à defesa do investigado seria a detenção 6 meses a 2 anos.
Fonte: blogs.correiobraziliense.com.br/azedo
Luiz Carlos Azedo: Um teste de força
Somente um governo eleito com esse programa poderia fazer reformas profundas. Temer terá que fazê-las de forma mitigada, legitimado apenas pela recessão e pelo desemprego
O governo Temer é liberal e reformista, mas vive a contradição de ser de transição, em meio à maior recessão da história republicana, uma crise ética que ameaça levá-lo de roldão com a elite política do país e o colapso do capitalismo de Estado brasileiro, cujo último lance foi esse escândalo da carne. Quis a Fortuna que o Brasil não tivesse até agora um governo liberal. Houve duas oportunidades históricas, mas ambas foram abortadas.
A primeira foi o governo de Sarney, vice como Temer, que não fez o que faria Tancredo Neves, que morreu às vésperas da posse. Foi contingenciado por Ulysses Guimarães à frente da Constituinte. Do entulho autoritário do regime militar, ainda restaram a estrutura vertical do nosso Estado positivista, a forte presença estatal no setor produtivo e corporações poderosas na administração federal, que se reproduzem nos estados e municípios.
A segunda oportunidade perdida foi o brevíssimo governo Collor, eleito com o forte discurso liberal, mas que se embriagou com o poder e tropeçou nas próprias pernas, em meio a um escândalo envolvendo o tesoureiro de campanha e um caixa dois que, resguardada as proporções, parece até cofre de porquinho diante do petrolão e outros escândalos sob investigação da Operação Lava-Jato. Legou ao país, porém, a abertura da economia para a globalização.
O governo de Fernando Henrique Cardoso, um social-democrata, foi reformista, com uma equipe econômica social-liberal, em permanente conflito com a ala desenvolvimentista do PSDB. Todo seu esforço foi focado no combate à inflação, no equilíbrio fiscal, na reforma patrimonial do Estado em crise de financiamento e no desmonte de um setor produtivo estatal que havia se tornado anacrônico e deficitário.
Para a esquerda brasileira, liberal é sinônimo de tudo o que pode haver de ruim na política. Para a opinião pública, ao contrário, é a esquerda que virou palavrão, tamanho o desastre causado pelos governos Lula e, principalmente, Dilma. Esse ambiente é propício à aprovação de medidas reformistas, para reduzir o tamanho do Estado, como as concessões de aeroportos, portos, ferrovias etc. E também de austeridade, como a nova regra do teto dos gastos públicos aprovada pelo Congresso.
O atual governo ousou pouco do ponto de vista do enxugamento da máquina administrativa. Por duas razões: de um lado, foi loteado entre os partidos da antiga base governista que haviam se descolado do governo Dilma, a começar pelo próprio PMDB, e os partidos de oposição, principalmente PSDB, DEM, PSB e PPS, que lideraram a luta pelo impeachment de Dilma; de outro, o ministro da Fazenda, Henrique Meirelles, em razão da recessão, temia que um ajuste forte nos gastos públicos levasse a economia ao colapso e decidiu fazê-lo a médio e longo prazos, o que não foi suficiente para evitar o rombo atual nas contas públicas em razão da queda de arrecadação.
O governo agora está diante de uma situação dramática, na qual tem que fazer cortes nos gastos públicos, com impacto nas políticas sociais, e aumentar impostos, agravando atividades produtivas, para manter o equilíbrio das contas públicas. Ao mesmo tempo, precisa realizar reformas na Previdência, na legislação trabalhista e no sistema tributário. Somente um governo eleito com esse programa poderia fazer reformas profundas. Temer terá que fazê-las de forma mitigada, legitimado apenas pela necessidade de salvar o país de mais recessão e desemprego.
Ou seja, não basta a vontade do presidente da República de passar à História como grande reformista. Há que se ter uma correlação de forças favorável tanto no Congresso quanto na sociedade. Em ano pré-eleitoral, nada passa no parlamento sem apoio da opinião pública. Não se trata da popularidade de Temer, mas do apoio social ao que está sendo feito para o bem comum. O primeiro teste do governo quanto a isso foi a aprovação da terceirização pela Câmara, que vai à sanção presidencial. Parece um assunto resolvido, mas não é.
Greve geral
A votação dividiu a base do governo, inclusive o PMDB, e colocou em xeque as demais reformas, principalmente a reforma da Previdência, que enfrenta uma ampla coalizão contrária. Temer pode sancionar sem emendas o projeto, como querem os representantes do empresariado que apoiam o governo, mas a contrapartida é a unificação e radicalização do movimento sindical e sua instrumentalização pelo ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva. Essa é a praia do PT.
Uma greve geral está sendo organizada para 28 de abril, o que pode ser um teste de força. Com o desemprego em massa, dificilmente uma greve geral, mesmo que por tempo determinado, terá adesão maciça dos trabalhadores empregados no setor privado, mas há os funcionários públicos e os empregados de estatais, e uma massa de desempregados, sem-teto e sem-terra que estão sendo mobilizados. O PT parece renascer das cinzas da Lava-Jato. De volta às ruas, agita as velhas bandeiras vermelhas contra as reformas.
A terceirização desregulamenta a velha CLT da Era Vargas. Discute-se a aprovação de uma nova lei, complementar, no Senado, para garantir alguns dos direitos trabalhistas e evitar a “precarização” do trabalho assalariado. O governo não deve vetar o projeto aprovado na Câmara, mas na área econômica a “pejotização” é vista como um tiro no pé da arrecadação, com impacto direto na Previdência. Não é fácil ser um governo de transição.
Fonte: blogs.correiobraziliense.com.br/azedo
Ricardo Noblat: Só um expurgo político salvará o país
Publicado no Blog do Noblat em 27/03/2017
Governo, Congresso e partidos respiraram aliviados com o fracasso das manifestações marcadas para ontem em defesa da Lava Jato e contra a anistia ao caixa dois, o voto em lista fechada e a anulação de delações que possam comprometer suspeitos de corrupção.
Governo refém do Congresso depende dele para aprovar reformas. Congresso refém de delatores não merece a confiança de ninguém. Vida que segue.
Em duas ocasiões, na semana passada, talvez por descuido, o PT tirou a máscara ao tratar do uso de dinheiro sujo nas eleições.
Relator da reforma política na Câmara, o deputado Vicente Cândido (SP) defendeu que o Congresso enfrente o desgaste de discutir anistia aos alvos da Lava Jato como forma de "distensionar o país".
Em seu site, o partido postou um estudo que justifica o uso do caixa dois.
“O que é melhor para a sociedade nesse momento? Até aprovar uma anistia, seja criminal, financeira, tudo isso é possível, não é novidade no mundo", justificou Cândido.
O estudo da seção mineira da corrente “Construindo um Novo Brasil”, majoritária dentro do PT, pretende “contribuir para o exercício reflexivo” às vésperas do 6º congresso do partido, a ser realizado até junho próximo.
“As eleições brasileiras foram feitas mediante contribuições não contabilizadas. O PT, provavelmente, se utilizou das mesmas regras que os demais usavam. (...) Como o PT poderia disputar eleições sem recursos enquanto todos os partidos neoliberais o tinham de sobra? Seria impossível disputar com chances de vitória sem os instrumentos necessários”, sustenta o estudo.
Nem Cândido nem o estudo se detiveram sobre a verdade universal de que não existe Estado de Direito sem justiça e sem eleições livres e democráticas. E que eleições corrompidas por qualquer meio, sobretudo pelo abuso do poder econômico, podem ser tudo menos democráticas, livres e justas.
Inexiste o bom e o mau ladrão a não ser na cena da morte de Jesus. Mesmo assim por excesso de bondade do Nazareno.
Em 1994, a poucos meses de disputar a segunda eleição que perderia, Lula avisou de público: "Em princípio, nós não aceitaremos dinheiro da Odebrecht".
Por que a princípio? E por que da Odebrecht? Porque a construtora, na época, já estava envolvida em escândalos e Lula queria marcar distância dela. Em 2002, Lula chamou José Dirceu é disse: “Só disputo outra vez se for para ganhar”.
Ganhou - com a ajuda da Odebrecht. O “partido limpo” beijou a cruz e chafurdou na lama como os demais partidos. Se os neoliberais podiam chafurdar por que o partido dos trabalhadores não?
Tudo por uma boa causa, a de melhorar a vida do povo. Melhorou – e também a vida dos que se diziam destinados pela Providência a tirar o povo da miséria, do analfabetismo e das doenças.
O “Estado Odebrecht” foi uma invenção do PT para permanecer no governo por no mínimo 20 anos. Com Lula durante os oito primeiros (deu certo), com Dilma durante quatro (deu certo) e com Lula por mais oito.
Aí Dilma estragou tudo. Quis ficar por mais quatro. E afundou o país na maior recessão econômica de sua história dos anos 30 do século passado para cá. O resto se sabe.
O que não se sabia com detalhes se torna conhecido com as delações de executivos da Odebrecht. É de arrepiar.
Fora da Lava Jato não haverá salvação. Ou melhor: só haverá se promovermos em 2018 um expurgo político extraordinário que limpe governos, Congresso e assembleias legislativas.
Luiz Carlos Azedo: Cresos e Cassandras
Uma das dificuldades do país hoje são as previsões extremas e antagônicas sobre os problemas nacionais que estão na ordem do dia
O físico Carl Sagan, na coletânea Bilhões e bilhões (Companhia de Bolso), tem um artigo muito interessante, embora publicado há mais de 20 anos, sobre as profecias e previsões entre cientistas preocupados com a poluição e a camada de ozônio às vésperas do Terceiro Milênio. Creso e Cassandra representam, na mitologia grega, as reações extremas às predições de perigo mortal e catástrofe iminente. Num ambiente de radicalização e narrativas exageradas como as que estamos vivendo, vale a pena revistá-los.
Creso, rei da Lídia (hoje Anatólia, na Turquia), conhecido na História pela riqueza e pela criação da moeda no século VII a.C., tinha uma ambição maior que os limites de sua nação. Imaginou que seria vantajoso invadir a Pérsia, a superpotência da Ásia Ocidental, que Ciro havia construído ao unir persas e medas. Para isso, mandou emissários ouvirem a sacerdotisa do Oráculo de Delfos, criado por Apolo para oferecer aos humanos previsões do futuro. Conta Heródoto que chegaram carregados de presentes e uma pergunta: “O que acontecerá, se Creso declarar guerra à Pérsia?”.
A resposta de pítia, a serpente, uma das encarnações da sacerdotisa, foi categórica: “Ele vai destruir um poderoso império”. Quando os emissários relataram a resposta a Creso, ele imaginou que tinha o apoio dos deuses e resolveu invadir a Pérsia. Sofreu uma derrota humilhante, seu reino foi destruído e Creso passou o resto dos dias como funcionário da corte persa, distribuindo conselhos inúteis, porque ninguém o levava a sério. Seu erro foi não mandar os emissários perguntarem quem seria destruído. Na política brasileira, abundam situações parecidas. Um dos erros mais frequentes é permitir que as próprias ambições atrapalhem a compreensão da correlação de forças e dos obstáculos políticos.
Outra história sobre os oráculos lembrada por Carl Sagan é a de Cassandra, a princesa de Troia, a mais bela filha de Príamo, por quem Apolo era apaixonado, sem ser correspondido. Para seduzi-la, ofereceu-lhe o dom das profecias. Cassandra aceitou a oferta, mas resistiu aos assédios. Na peça Agamenon, Ésquilo conta que Apolo ficou furioso. Não podia retirar os poderes, porém, por vingança, decidiu que ninguém acreditaria nas suas profecias. Cassandra previu a queda de Troia, mas ninguém levou a sério; como também não a levaram quanto à morte de Agamenon. Cassandra previu a própria morte e é chamada de profetiza do abismo e das trevas. Na política, quando alguém faz uma previsão pessimista, é chamado de Cassandra.
Uma das dificuldades do país hoje são as previsões extremas e antagônicas sobre os problemas nacionais, alguns dos quais estão mesmo na ordem do dia. Por exemplo, a reforma da Previdência. De fato há um grande interesse do sistema financeiro numa reforma radical, que transforme a previdência privada numa necessidade real para a grande massa de servidores públicos e trabalhadores assalariados de nível superior, que futuramente teriam que recorrer a alguma forma de fundo previdenciário para garantir uma renda satisfatória para compensar o novo teto das aposentadorias.
Se opor à reforma por causa dessas intenções, porém, seria uma aposta parecida com a de Creso, pois o adiamento da reforma pode ser um tiro no pé. A médio e longo prazos, a Previdência não tem sustentabilidade. O exemplo do que pode acontecer é a situação daqueles que estão sem receber suas aposentadorias e pensões no Rio de Janeiro, porque o sistema quebrou. De igual maneira, apoiar a reforma incondicionalmente pode não ser a melhor opção. É um erro tratar todos os críticos da reforma da Previdência como os troianos trataram Cassandra.
Apostas radicais
A mesma coisa vale para a legislação trabalhista. A recente votação do projeto de terceirização, por exemplo, se enquadra numa situação semelhante. Os defensores incondicionais da atual legislação trabalhista estão adotando como paradigma o sistema relação taylor-fordista, que foi completamente superado. O toyotismo, os sistemas flexíveis de produção, a automação e a robotização estão revolucionando as formas de produção, as condições de trabalho e as próprias profissões, pois algumas deixam de existir e outras surgem. Talvez o mais emblemático exemplo seja a difícil coexistência entre os táxis e o Uber.
Lidar com apostas radicais é sempre um risco. É a situação do presidente do PSDB, Aécio Neves (MG), autor da ação que pede a cassação da chapa Dilma Rousseff-Michel Temer. O tucano está mais ou menos como Creso na campanha contra Ciro, pois Dilma foi afastada pelo impeachment, mas agora, no julgamento da chapa, quem está na berlinda é o presidente Michel Temer. Além disso, as investigações sobre o caixa dois da Odebrecht, que alimentou a campanha da petista, foram regionalizadas e derivaram para os demais partidos, inclusive o PSDB mineiro.
Deixando a mitologia de lado, o risco de “judicializar” as disputas políticas sempre é perder o controle da situação. No ano passado, a cassação da chapa poderia ter resultado numa eleição direta na qual Aécio teria possibilidades reais; hoje, não, a eleição seria indireta. E a cassação de Temer pelo TSE, em razão da condenação da chapa, lançaria o país num cenário de turbulência exacerbada e absoluta imprevisibilidade política.
Fonte: blogs.correiobraziliense.com.br/azedo
Luiz Carlos Azedo: Partidos sem projeto
O ambiente político no Congresso é pautado pelo instinto de sobrevivência, num momento em que o país precisa se reinventar sob vários aspectos
O ex-presidente Fernando Henrique Cardoso, em vídeo distribuído nas redes sociais, fez um alerta de que o Congresso não está no seu melhor momento para fazer uma reforma política profunda; sugeriu que se limite a discutir as medidas que estão em tramitação na Câmara e no Senado, como o fim das coligações e a cláusula de desempenho. Alertou que a proposta de lista fechada — que ganhou força graças ao relator da reforma política na Câmara, deputado Vicente Cândido (PT-SP) — aparece para a opinião pública como um subterfúgio para que os candidatos enrolados na Operação Lava-Jato mantenham privilégios e se livrem de eventuais processos.
Sua declaração é uma espécie de alto lá para o PSDB e aliados, que já estavam embarcando na proposta petista, que foi agarrada com as duas mãos pelos políticos enrolados do PMDB e outros partidos envolvidos no escândalo da Petrobras. Com a campanha do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva na rua, a proposta da lista fechada interessa, sobretudo, ao PT, que não está sendo oportunista, vale ressaltar, pois historicamente defende essa posição. Está apenas puxando a brasa para sua sardinha em tempos de Murici, digamos assim.
O ambiente político no Congresso é pautado pelo instinto de sobrevivência, num momento em que o país precisa se reinventar sob vários aspectos. Os grandes partidos discutem mudanças eleitorais cujo objetivo não é melhorar a qualidade da representação do Congresso, que está desmoralizado perante a opinião pública, mas manter o controle da Câmara e do Senado. Os partidos que poderiam protagonizar a renovação da política nacional, em vez de discutir projetos para o país, por sua vez, estão mais preocupados em garantir a ampliação de suas bancadas, digamos, para 15 deputados. Esta é a linha de corte que está sendo traçada pelos partidos maiores para canibalizar os menores.
Enquanto isso, o país patina para sair da recessão, sem um projeto nacional. É prisioneiro das corporações e de seus privilégios, de um lado, e de empresas e empresários incapazes de sobreviver sem sugar os recursos do Tesouro, do outro. Até agora, o ônus da crise foi lançado sobre os ombros da grande massa da população, que perdeu empregos e negócios, paga juros escorchantes e somente agora está se livrando da perda acelerada de poder aquisitivo via inflação. É daí que vem a resistência à reforma da Previdência, ao fim das desonerações fiscais e a novas regras do jogo nas relações entre o público e o privado.
Num momento em que o mundo vive uma grande batalha entra a globalização, um fenômeno objetivo, e as forças que a ela se impõem, agora lideradas pelo novo presidente dos Estados Unidos, Donald Trump (quanta ironia!), o Brasil precisa encontrar seu novo lugar no mundo. A crise da “carne podre” é um sintoma de que o modelo de capitalismo de Estado (ou de laços) adotado pelos governos Lula e Dilma era voluntarista e fracassou. Noves fora as trapalhadas do delegado da Polícia Federal que “espetaculizou” a investigação nos frigoríficos, nada disso ocorreria se o setor não concentrasse capital por meio de privilégios e as duas gigantes não operassem um lobby político tão pesado quanto o das empreiteiras nas eleições, com objetivo de garantir benesses e facilidades oficiais para seus negócios.
Porto seguro
A vocação natural do Brasil na divisão internacional do trabalho é produzir alimentos, minérios e petróleo, mas isso não basta. O que vamos pôr no lugar da nossa indústria tradicional para desenvolver a economia, que cada vez emprega menos mão de obra nas atividades nos polos mais dinâmicos, como a indústria automobilística, que está sendo automatizada? Como reinventar o Estado brasileiro para que ele atenda às demandas da sociedade e se livre do patrimonialismo e do fisiologismo na política? Qual o futuro dos nossos jovens, marginalizados da atividade produtiva pela recessão, com a perspectiva de baixas taxas de crescimento nos próximos anos e a má qualidade do ensino? Muito provavelmente, não será a atual elite política que resolverá essas questões.
O establishment do país respira de canudinho, na esperança de que a Lava-Jato passe ao largo. Quem sabe a nova novela da Globo, uma superprodução sobre a chegada da família real e as peripécias de D. Pedro I, faça a crítica dos nossos velhos costumes políticos, muitos dos quais surgiram exatamente nessa época, protagonizados pelo imperador e sua corte, já se vão quase 200 anos. Talvez o folhetim eletrônico seja uma paródia do que estamos vivendo, no estilo do falecido Dias Gomes, autor da novela O Bem Amado, cujo protagonista, Odorico Paraguaçu, satirizou nossa tradicional política.
O porto seguro da democracia brasileira é o pleito de 2018. Até lá, a maior dificuldade será produzir uma nova síntese política, que aponte um rumo para a maioria da sociedade.
Fonte: blogs.correiobraziliense.com.br/azedo
Luiz Carlos Azedo: A reforma trabalhista
A terceirização divide o movimento sindical: a Central Única dos Trabalhadores, controlada pelo PT, é contra; a Força Sindical, ligada ao Solidariedade, é a favor
A reforma trabalhista começa nesta semana com a aprovação do projeto que regulamenta a terceirização do trabalho, anunciada ontem pelo presidente da Câmara dos Deputados, Rodrigo Maia (DEM-RJ), na Câmara Americana de Comércio (Amcham) em São Paulo. O projeto foi aprovado pelo Senado em 2002, ainda no governo do então presidente Fernando Henrique Cardoso (PSDB), e tramita no Congresso desde 1998. São quase 20 anos.
Caso seja realmente aprovado, o texto será sancionado pelo presidente Michel Temer, para quem a chamada reforma trabalhista não passa de uma regulamentação do dispositivo da Constituição que trata do “reconhecimento das convenções e acordos coletivos de trabalho”. Em função de decisão do Tribunal Superior do Trabalho (TST), a terceirização no Brasil está restrita às atividades-meio das empresas, o que gera uma grande confusão.
“Milhões e milhões de empregos hoje são gerados por terceirização”, disse Maia, que aposta na desregulamentação e chegou a defender publicamente o fim da Justiça trabalhista. “Nós temos que parar com este mito de que com maior regulação, maior número de leis, é melhor para o trabalhador”, defendeu. O presidente da Câmara acredita que a modernização das leis trabalhistas criará um ambiente mais favorável para aprovação da reforma da Previdência.
A terceirização divide o movimento sindical: a Central Única dos Trabalhadores, controlada pelo PT, é contra; a Força Sindical, ligada ao Solidariedade, é a favor. Na terceirização, uma empresa prestadora de serviços é contratada por outra empresa para realizar serviços determinados e específicos. Não existe vínculo empregatício entre a empresa contratante e os trabalhadores ou sócios das prestadoras de serviços. A prestadora de serviços emprega e remunera o trabalho realizado por seus funcionários, ou subcontrata outra empresa para realização desses serviços.
A Súmula 331 do Tribunal Superior do Trabalho (TST), que regulamenta a matéria, é considerada um anacronismo. A súmula serve de base para decisões de juízes da área trabalhista e estabelece que somente podem ser terceirizados os serviços de vigilância, conservação e limpeza, bem como “serviços especializados ligados à atividade-meio do tomador”, “desde que inexistente a pessoalidade e a subordinação direta” do funcionário terceirizado com a empresa contratante.
Há quatro grandes polêmicas sobre a lei da terceirização: primeira, a abrangência das terceirizações tanto para as atividades-meio como atividades-fim; segunda, o fato de as obrigações trabalhistas serem de responsabilidade somente da empresa terceirizada — a contratante tem apenas de fiscalizar; terceira, a representatividade sindical, que passa a ser do sindicato da empresa contratada e não da contratante; e, quarta, a terceirização no serviço público. No mundo empresarial, a nova lei é vista como um instrumento de redução de custos, formalização dos serviços e a criação de vagas de trabalho.
Na carne
O ministro da Agricultura, Blairo Maggi, proibiu a exportação de carnes produzidas por 21 frigoríficos investigados pela Polícia Federal. A venda no mercado brasileiro, porém, está liberada. A Operação Carne Fraca revelou um esquema de corrupção envolvendo fiscais do Ministério da Agricultura e produtores de carnes. Além de pagamento de propina a fiscais e partidos, a PF investiga a adulteração de produtos e a venda de carne vencida e estragada. Chile, União Europeia, Coreia do Sul e China, que consomem 27% da carne exportada pelo Brasil em 2016, já suspenderam a compra de carne.
O governo brasileiro quer circunscrever a crise aos frigoríficos investigados, mas o escândalo contaminou a imagem de todo o setor. Estão envolvidas a BRF Brasil, que controla marcas como Sadia e Perdigão, e também a JBS, que detém Friboi, Seara, Swift, entre outras marcas, mas também frigoríficos menores, como Mastercarnes e Peccin.
Fonte: blogs.correiobraziliense.com.br/azedo
Luiz Carlos Azedo: O gene dos políticos
A política é velha no Brasil não somente pelos costumes, mas também pela falta de renovação de suas lideranças
O gene egoísta, de Richard Dawkins, publicado em 1976, é uma síntese dos estudos sobre o surgimento e a diversidade das espécies, cujo ponto alto é análise do comportamento dos indivíduos. A tese central é de que somos uma máquina de sobrevivência de um gene egoísta perpetuador da espécie. Apesar da importância dos grupos e organismos (arranjos biológicos), o gene é que comanda. O altruísmo é apenas uma estratégia de sobrevivência: os organismos interagem entre si e com o mundo inanimado, e assim alteram seu ambiente e promovem a propagação de genes presentes em outros corpos.
As delações premiadas da Odebrecht revelaram no Congresso o gene egoísta de deputados e senadores. O melhor exemplo de gene egoísta é o comportamento do cuco, que não faz ninho nem toma conta das crias. Em vez disso, procura o ninho de outra ave. O cuco espera que esta se afaste do ninho. Quando tal acontece, retira um dos ovos e coloca o seu. O ovo é semelhante aos outros em cor e tamanho, para que o truque não seja percebido. A cria do cuco é a primeira a nascer; a ave enganada não nota a diferença e alimenta-a como se fosse sua. É aí que o filhote de cuco mostra sua genética: lança os ovos da outra espécie para fora do ninho para se livrar da concorrência e ser o único a receber comida.
É mais ou menos essa a operação em curso no Congresso. Parlamentares de todos os partidos discutem uma estratégia comum de salvação dos mandatos. Há um consenso de que as delações premiadas, diante do número de políticos envolvidos com o caixa dois da Odebrecht, ameaçam a sobrevivência da elite política do Congresso e podem implodir o sistema partidário. Não se trata apenas da criminalização do caixa dois. O desgaste político que pode inviabilizar a sobrevivência eleitoral dos citados, ainda que consigam se safar ou empurrar com a barriga os processos da Lava-Jato. Trata-se, isso sim, de garantir a própria sobrevivência eleitoral.
Por uma dessas ironias da política, o relator da comissão especial da reforma política na Câmara é o deputado Vicente Cândido (PT-SP). Sua indicação é resultado de um acordo feito entre a bancada do PT e o presidente da Câmara, Rodrigo Maia (DEM-RJ), por ocasião de sua primeira eleição. Para os deputados enrolados na Operação Lava-Jato, o petista é o cara certo, no lugar certo e na hora certa. Por uma simples razão, o PT sempre defendeu o financiamento público de campanha e o voto em lista. Ninguém poderá acusá-lo de adotar um expediente para se safar das delações premiadas.
Mas é disso que se trata, quando os demais partidos começam a aceitar a proposta. Diante do tremendo desgaste causado pela Lava-Jato, o voto em lista é como o ninho invadido pelo cuco. Essa pode ser a única possibilidade de os políticos que controlam os grandes partidos assegurarem a sobrevivência eleitoral. O eleitor vota numa lista, na qual são eleitos os primeiros da fila, na proporção da votação de cada partido. Atualmente, são eleitos os mais votados de cada chapa, embora a proporcionalidade também exista. Assim, seria possível o político queimado viabilizar sua eleição com base na votação da sua lista partidária, dependendo da posição que nela ocupe e do número de vagas conquistadas pela legenda. Com certeza, vai tomar o lugar de alguém com a ficha limpa, como aquele filhote de cuco que não admite concorrência no ninho.
Reforma política
O presidente Michel Temer entrou de cabeça na operação para salvar a elite do Congresso. Amanhã, vai discutir a reforma política e o financiamento de campanhas eleitorais com os presidentes da Câmara, Rodrigo Maia; do Senado, Eunício Oliveira (PMDB-CE); e do Tribunal Superior Eleitoral (TSE), Gilmar Mendes, de quem partiu a iniciativa. O financiamento público de campanha, testado nas eleições municipais, impediu o financiamento de empresas, mas não a existência de caixa dois; além disso, criou uma situação que favorece candidatos apoiados por organizações religiosas e meios de comunicação. O ministro Gilmar é a favor do financiamento privado, votou contra o financiamento público no Supremo Tribunal Federal (STF).
O fato concreto, porém, é que a discussão não ocorre motivada pela necessidade de renovação política. Pelo contrário, a articulação tem um caráter regressivo. Seu objetivo é exatamente o contrário: bloquear o surgimento de uma nova elite parlamentar. A política é velha no Brasil não somente pelos costumes, mas também pela falta de renovação de suas lideranças. Talvez a reeleição tenha empurrado a fila para trás. Uma simples comparação com os principais líderes mundiais torna evidente a necessidade do surgimento de uma nova geração de políticos. Há muitos jovens parlamentares no Congresso, mas a maioria foi catapultada pelas respectivas oligarquias, basta conferir os sobrenomes.
Fonte: blogs.correiobraziliense.com.br/azedo
Luiz Carlos Azedo: ABC do caixa dois
Políticos e empresários recorrem ao caixa dois para pagamento de propina, campanhas eleitorais e enriquecimento ilícito
Na tradição política brasileira, o que apartava políticos honestos dos desonestos não era o caixa dois eleitoral — quase sempre fruto do superfaturamento de contratos de obras e serviços —, era o desvio de recursos públicos para enriquecimento pessoal, a formação de patrimônio com o dinheiro da campanha eleitoral; as famosas “sobras de campanha” estão numa espécie de limbo entre uma coisa e outra. Essa tortuosa linha divisória, do ponto de vista jurídico, porém, nunca existiu, embora fosse um segredo de polichinelo no mundo da política.
Acontece que esse entendimento nunca foi o dos cidadãos, nem da Justiça Eleitoral, muito menos do Ministério Público e da Polícia Federal. Ou seja, não existe uma suposta linha divisória entre o joio e o trigo do ponto de vista legal. Só existe na política, mesmo assim é unilateral, porque os malvados não aceitam que os mocinhos citados nas delações premiadas fiquem safos da Operação Lava-Jato. Desculpem-me a expressão, querem “suruba” geral, como diria o presidente do PMDB e líder do governo no Senado, Romero Jucá (PMDB-RR).
Esse assunto esquentou depois que Marcelo Odebrecht e os ex-executivos Hilberto Mascarenhas, Cláudio Mello Filho e Benedito Barbosa da Silva Junior prestaram depoimentos contraditórios no Tribunal Superior Eleitoral (TSE), ao ministro Hermann Benjamin, relator da ação do PSDB que pede a cassação da chapa Dilma Rousseff-Michel Temer. Os depoimentos foram verdadeiros bumerangues, pois acabaram envolvendo o presidente do PSDB, Aécio Neves (MG), que teria pedido R$ 15 milhões para aliados, depois que Odebrecht se recusou a doar dinheiro diretamente para sua campanha. Sobrou também para o presidente Michel Temer, que pediu ajuda financeira à Odebrecht para a campanha do PMDB, o que teria resultado na entrega de dinheiro do caixa dois da empreiteira para o ministro da Casa Civil licenciado, Eliseu Padilha, via escritório do advogado José Yunes, amigo e ex-assessor do presidente da República.
O ex-presidente Fernando Henrique Cardoso, que estava na Itália, saiu em defesa de Aécio, criticando versões que não refletiam exatamente os depoimentos. A polêmica sobre a separação do joio do trigo, uma imagem bíblica, que ganhou as páginas dos jornais e os programas de televisão, surgiu de uma frase do ex-presidente: “Há uma diferença entre quem recebeu recursos de caixa dois para financiamento de atividades político eleitorais, erro que precisa ser reconhecido, reparado ou punido, daquele que obteve recursos para enriquecimento pessoal, crime puro e simples de corrupção”.
O debate foi parar na Segunda Turma do Supremo Tribunal Federal (STF), que acolheu denúncia contra o senador Valdir Raupp (PMDB-RO), por um placar apertado: três a dois, com o relator da Lava-Jato, ministro Luiz Édson Fachin, que acolheu a denúncia, sendo apoiado pelos ministros Celso de Mello, decano da Corte, e Ricardo Lewandowski, contra os votos dos ministros Gilmar Mendes, presidente da Turma, e Dias Toffoli. Entendeu-se que não há separação entre o joio e o trigo, no caso de Raupp, que teria recebido, na campanha de 2010, uma doação legal de R$ 500 mil da construtora Queiroz Galvão. Os recursos teriam sido desviados de contratos que a empresa mantinha com a Petrobras.
Doações legais
A expressão caixa dois tecnicamente se refere a recursos financeiros não contabilizados e não declarados aos órgãos de fiscalização. A lavagem de dinheiro e a organização criminosa com esse fim agravam o crime. É utilizado por algumas empresas que deixam de emitir ou emitem notas fiscais com valor menor ao da transação realizada para pagar menos tributos. A diferença entre o faturamento real e o valor declarado forma o caixa dois da empresa. Na política, governantes e grandes corporações recorrem ao caixa dois para formar fundos destinados ao pagamento de propina, financiamento de campanhas eleitorais, enriquecimento ilícito e outras ilegalidades.
Do ponto de vista legal, é um crime financeiro, de sonegação fiscal, com pena prevista na Lei nº 7. 492, de 16 de junho de 1986. De forma mais ampla, aplica-se o artigo 1º da Lei nº 8.137, de 1990, para relações tributária, econômica e de consumo. Pode resultar em condenações de 1 a 5 anos de reclusão e multa (quando não se caracterizar como lavagem de dinheiro e organização criminosa). O que está em discussão na Operação Lava-Jato e outras investigações é o caixa dois eleitoral associado à lavagem de dinheiro e às doações legalizadas junto à Justiça Eleitoral.
O ex-secretário da Receita Federal Everardo Maciel faz uma analogia com os critérios adotados pelo Leão para caçar os sonegadores: se alguém usa dinheiro não declarado para pagar o dentista e ele declara que recebeu o dinheiro, quem usou caixa dois foi o primeiro; se o paciente informa a origem dos recursos e o pagamento, e o dentista não declara, o sonegador é o segundo. Quando os dois não declaram, ambos estão ocultando receitas e operando com caixa dois. O problema se complica no caso das doações eleitorais por causa da origem do dinheiro, o superfaturamento ou desvio de recursos públicos. Se o beneficiado ou autor é o ordenador de despesa, é uma situação; se não é esse o caso, a situação é outra. Tudo isso começa a ser examinado pelo Tribunal Superior Eleitoral, no caso das contas da campanha da chapa Dilma-Temer, e pelo Supremo Tribunal Federal (STF), no julgamento das doações da Queiroz Galvão para a campanha de Raupp.
Fonte: blogs.correiobraziliense.com.br/azedo
Luiz Carlos Azedo: Monopólio da política
Publicado no Correio Braziliense em 07/03/2017
Há uma contradição entre a sensível melhora do ambiente econômico e a deterioração crescente do ambiente político, em razão da degenerescência dos partidos
Há muito que a política deixou de ser monopólio dos políticos, dos diplomatas e dos militares. No caso brasileiro, embora pareça o contrário, os atores políticos decisivos para a irrupção de crises que balançam o coreto dos mais poderosos costumam ser personagens à margem do processo decisório, como o motorista do ex-presidente Fernando Collor de Mello, o caseiro do ex-ministro da Fazenda Antônio Palocci e, mais recentemente, a secretária do Setor de Operações Estruturadas da Odebrecht, Maria Lúcia Tavares, que, por 11 anos, cuidou dos pagamentos nacionais do caixa dois da empreiteira. Os pagamentos internacionais são outra história, que já começa a aparecer.
No Tribunal Superior Eleitoral, Maria Lúcia explicou ao ministro Hermann Benjamin, relator da ação do PSDB que pede a cassação da chapa Dilma Rousseff-Michel Temer, a atual dor de cabeça do Palácio do Planalto e do stablishment político do país. “A gente recebia uma planilha. Nessa planilha havia uns codinomes, esses codinomes vinham com os valores e a data da entrega. Esperava o chefe mandar pra mim os endereços e eu passava para o prestador de serviço”, disse Maria Lúcia. Uma das planilhas, chamada Programa Especial Italiano, contabilizava os repasses para o Partido dos Trabalhadores. Entre 2008 e 2013, teriam sido R$ 128 milhões.
Ontem, o engenheiro civil Fernando Sampaio Barbosa, ex-diretor da Odebrecht, arrolado como testemunha de defesa do ex-presidente da Odebrecht S.A. Marcelo Odebrecht e, ao prestar depoimento ao juiz federal Sérgio Moro, em Curitiba, confirmou o que os investigadores da Operação Lava-Jato já sabiam: o operador do esquema de caixa dois do PT na campanha de 2010 era o ex-ministro da Fazenda de Lula, que chefiou a Casa Civil nos primeiros meses do governo Dilma Rousseff, posição conquistada por sua atuação na campanha. “A gente sabia que o ‘Italiano’ era o Palocci”, disse Barbosa. O petista é réu no processo porque recebeu R$ 128 milhões em propinas e repassou ao PT, entre os anos de 2008 e 2013. O “Italiano” era citado num e-mail enviado por Marcelo Odebrecht para Barbosa e outros executivos da empresa. Palocci nega. Havia outro italiano no esquema da campanha de 2014: o ex-ministro da Fazenda Guido Mantega, denunciado pelo próprio Marcelo Odebrecht na semana passada.
A débâcle
Ontem, três delatores da Odebrecht prestaram depoimentos sigilosos no Tribunal Superior Eleitoral: os ex-executivos Cláudio Melo Filho, Hilberto Mascarenhas e Alexandrino de Salles Ramos de Alencar, que ocupou a diretoria de Relações Institucionais da Odebrecht; na semana passada, depuseram Marcelo Odebrecht, ex-presidente da companhia; Benedicto Júnior, ex-presidente da Odebrecht Infraestrutura; e Fernando Reis, ex-presidente da Odebrecht Ambiental. Cláudio Melo Filho era responsável pelo contato da cúpula da empresa com políticos no Congresso. Revelou que a doação de R$ 10 milhões para o PMDB em 2014 foi feita a pedido do presidente Temer, então vice de Dilma Rousseff.
Vem muito mais por aí. Alexandrino de Alencar era o companheiro de viagens internacionais do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva, patrocinadas pela Odebrecht, na prospecção, digamos, assim, de negócios no exterior, principalmente grandes obras de engenharia. Hilberto Mascarenhas era um dos executivos do “Setor de Operações Estruturadas”, uma engrenagem complexa, com empresas que lavavam dinheiro, como cervejarias, e até mesmo uma transportadora de valores. A conexão entre as investigações da Operação Lava-Jato e o julgamento da ação do PSDB contra a chapa Dilma-Temer são dois lados de um triângulo de fogo. A incógnita é a temperatura de ignição, ou seja, o clima político no país.
A decisão estratégica de promover uma ampla, geral e irrestrita delação do esquema de propina da Odebrecht, que era considerado inexpugnável até a secretária entregar o ouro, depois de 10 dias de prisão, foi tomada por Emílio Odebrecht, que reassumiu o comando da empresa para tentar salvá-la do colapso total. O acordo de delação premiada deslocou o eixo das investigações do modus operandi das grandes empreiteiras e do nosso capitalismo de laços para o financiamento eleitoral dos partidos e dos políticos, que se confunde com os desvios de recursos públicos, o enriquecimento ilícito e a lavagem de dinheiro. Engenheiros conhecem muito bem a teoria do caos e parece ter sido essa a grande aposta para escapar de longas penas de prisão, como a de Katia Rabelo, do banco Rural, no julgamento do mensalão.
Há uma contradição entre a sensível melhora do ambiente econômico e a deterioração crescente do ambiente político, em razão da degenerescência dos partidos. Para que o país possa reencontrar o rumo do desenvolvimento, terá que fazer escolhas difíceis. O grande problema é que os políticos acreditam que têm o monopólio da política. Temos, porém, uma Constituição democrática, um calendário eleitoral e uma democracia de massas, com 145 milhões de eleitores. Se a Constituição for respeitada, sempre haverá uma saída democrática, mesmo se houver uma implosão do sistema partidário por causa da Lava-Jato.