PIB
Míriam Leitão: Uma ajuda à mão invisível
Por Alvaro Gribel (Míriam Leitão está de férias)
O economista Ricardo Paes de Barros enxerga uma desorganização tão grande na economia que o mercado sozinho não será capaz de ajustar. Por isso, defende que o Estado dê “uma mãozinha” à mão invisível. Em outras palavras, entende que é preciso não só gerar crescimento do PIB, mas criar programas de reinserção de mão de obra, para acelerar a volta ao trabalho da enorme massa de desempregados, subempregados e desalentados que cresceu durante a pandemia. Na educação, o setor também precisará de ajuda. O risco de evasão em todos os níveis de ensino será muito alto no ano que vem, especialmente no ensino médio, com impacto grande sobre a produtividade do país nas próximas décadas.
Paes de Barros acha que o auxílio emergencial teve pouco foco. Gastou em 10 meses o que seria gasto em 10 anos de Bolsa Família, mas sem fazer nenhum tipo de avaliação sobre a qualidade dessa despesa. Ele está preocupado com o fim do benefício a partir de janeiro, ainda mais com o aumento de casos da pandemia nesta virada de ano, que terá impacto sobre os serviços. Mas avalia que o governo precisaria concentrar esforços e despesas para fazer uma intermediação do trabalho, cruzando informações entre empregadores e empregados que possam gerar novas vagas.
— Precisaríamos chegar em janeiro com ajuda para 25 milhões, que são os desempregados, subempregados e desalentados. Não os 70 milhões do auxílio emergencial. Mas, mais importante do que isso, a gente precisaria criar apoio para que essas pessoas tenham emprego. A forma de fazer isso é com um programa nacional de reinserção do mercado de trabalho. Com uma intermediação eficaz, coordenada pelo governo federal, mas com participação do setor privado e capilaridade pelo país todo — afirma.
O economista defende a agenda de reformas, acha que o governo tem avançado em legislações infralegais, e diz que é crucial o programa de vacinação para superar a pandemia e voltar a ter um mínimo de normalidade na economia. Ainda assim, avalia que será preciso mais do que isso para lidar com o tamanho desta crise.
— É fundamental continuar com as reformas, parte fiscal, tributária, trabalhista, e resolver a crise sanitária. Mas isso só resolve se você acredita na mão invisível. A meu ver esta crise é tão grande que vamos precisar dar uma mãozinha. O teto de gastos é importante, mas o desafio aqui não é de dinheiro, é de organização e coordenação para um programa desse tipo.
Prioridade na educação
Paes de Barros não vê sentido no fechamento de escolas, ao mesmo tempo em que shoppings, bares e restaurantes estão abertos. A educação deveria ter sido a prioridade desde o início durante a pandemia. “Deveríamos estar trabalhando para retomar com a maior segurança possível a educação. Deixar o cérebro dessas crianças com as sinapses não se formando é um prejuízo maior do que o prejuízo econômico. Se for parar tudo, para tudo. Se não for parar, deveria ser a educação aberta. Obviamente com a devida proteção aos professores.”
Bolsas contra evasão
Um dos maiores desafios do setor de educação no ano que vem vai ser combater a evasão, especialmente no ensino médio. Ele defende a criação de bolsas de ensino e diz que será preciso também acolher os alunos, para que eles sejam reavaliados das perdas que tiveram em 2020, mas sem que isso gere um trauma que leve ao abandono escolar. “O esforço gigante é incentivar o aluno a voltar para a sala de aula, mas também será preciso trabalhar o acolhimento desse jovem. Saber receber, para que ele tenha uma sensação de pertencimento.”
Economia mais digital
O comércio chega a este Natal tendo atravessado barreiras que antes pareciam intransponíveis. Várias empresas conseguiram montar em tempo recorde um comércio eletrônico eficiente. As que haviam se preparado para isso, investindo em plataformas digitais eficientes, nadaram de braçada. Boutiques inventaram um modelo híbrido, de levar malas com produtos para seus clientes em isolamento. Houve muita perda, mas também muita criatividade. A economia depois da pandemia será muito mais digital.Essas mudanças, na visão de Paes de Barros, são também uma oportunidade e por isso ele defende a criação de programas para acelerar esse processo.
DW Brasil: Eliminar pobreza extrema no Brasil custaria 0,13% do PIB
OCDE exalta "feito extraordinário" na primeira década do milênio, com 33 milhões de pessoas fora do limiar da pobreza
Em seu relatório anual sobre o Brasil, OCDE projeta nova "década perdida" na economia, mas sugere que uma redução da pobreza extrema, como a registrada no país nos anos 2000, é um objetivo tangível no curto prazo.
A Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Econômico (OCDE) divulgou nesta quinta-feira (17/12) a edição 2020 do relatório publicado anualmente pela entidade sobre o Brasil. Se as projeções para a economia nos próximos anos são pouco favoráveis, com risco de uma nova "década perdida", a redução da pobreza extrema se revela um objetivo tangível no curto prazo.
O chefe da Seção Brasil do Departamento de Economia da OCDE, Jens Arnold, calcula que o custo para eliminar a pobreza extrema no Brasil represente apenas 0,13% do Produto Interno Bruto (PIB). A estimativa foi apresentada em webinar organizado pela Fundação Getúlio Vargas sobre o relatório nesta quinta-feira.
A conta de Arnold se baseia no custo para complementar a renda dos brasileiros que vivem nessa situação além do limiar da pobreza extrema, a partir dos indicadores macroeconômicos aferidos periodicamente pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE). Atualmente, o governo federal desembolsa 0,5% do PIB para o programa Bolsa Família.
"O cálculo mostra que o custo de melhoria da renda para os mais vulneráveis não é tão elevado para o Brasil. É menos uma questão de ter mais recursos, e sim fazer melhor, com políticas sociais desenhadas de maneira eficiente", afirmou Arnold.
OCDE fala em "feito extraordinário"
Na edição recém-publicada do relatório sobre o Brasil, a OCDE enaltece o "feito extraordinário" alcançado pelo país na primeira década do milênio, quando 33 milhões de pessoas saíram do limiar da pobreza a partir de 2003. Todavia, a entidade lembra que as desigualdades e a pobreza vêm crescendo no país em decorrência da recessão econômica iniciada entre 2015 e 2016.
Embora reconheça a importância de políticas públicas específicas para lidar com o problema, defendendo a expansão e o aperfeiçoamento do Bolsa Família, a OCDE elenca o aumento de produtividade como o único fator capaz de acarretar mudanças sustentáveis nesse cenário, por meio da criação de novos postos de trabalho e de melhor qualidade.
Na avaliação da entidade, esse objetivo só será alcançado por meio de reformas estruturais que destravem investimentos em setores produtivos. A reforma tributária, principal pauta da agenda econômica do Congresso para 2021, é tida como fundamental, sobretudo no delicado cenário fiscal brasileiro.
"Os subsídios e gastos tributários consomem 4,8% do PIB brasileiro. É quase o mesmo que se gasta com educação. A carga tributária brasileira não é tão alta se comparada a outros países, mas o Brasil é campeão da complicação fiscal", criticou Arnold no evento.
Zona Franca é questionada
Na linha do relatório, que sugere a unificação de impostos para simplificar o regime tributário, o representante da OCDE questiona a eficácia de mecanismos de atração de investimentos por isenção fiscal, como a Zona Franca de Manaus, que consome mais de 0,3% do PIB e acumula benefícios desde os anos 1960.
"Pesquisas recentes não foram capazes de identificar efeitos externos significativos sobre indicadores de desenvolvimento humano na região além da própria Zona Franca, incluindo o bem-estar das mulheres", diz o documento.
O relatório da OCDE observa que as despesas referidas por Arnold vêm crescendo desde 2010. Embora a entidade destaque a redução dos subsídios para operações de crédito direcionadas, de 1,8% do PIB em 2015 para 0,6% em 2019, o documento ataca as isenções concedidas aos serviços de saúde e educação privada.
A OCDE entende que a atual dedutibilidade do imposto de renda referente às despesas privadas de saúde e educação tem efeitos distributivos regressivos – ou seja, que estimulam a concentração de renda.
Ao passo que 90% dos brasileiros têm remuneração abaixo do limite em que pagariam imposto de renda, apenas 25% da população assina planos privados de saúde, enquanto a maioria depende do sistema público de saúde. "Uma redução das despesas tributárias para a ordem de 2% do PIB parece viável", diz o texto.
Década perdida à vista
A recomendação de que o país implemente reformas estruturais na economia acompanha projeções pessimistas do relatório para a próxima década. A OCDE estima uma recessão de 5% do PIB para este ano, com recuperação lenta nos anos seguintes.
"Sem uma ação firme, os custos de financiamento podem subir substancialmente, afetando a sustentabilidade fiscal e a taxa de investimentos. O Brasil pode viver uma recessão prolongada, como a 'década perdida' dos anos 1980", diz o documento.
Com relação à taxa de desemprego, a OCDE espera um aumento do patamar atual de 13,6% para 16% em 2021, com estimativa de chegar a 15% em 2022. O economista José Feres, pesquisador da Escola Brasileira de Economia e Finanças (FGV/EPGE), ressalta o cenário mais desfavorável para os mais pobres.
"A pandemia teve um efeito forte na ocupação das mulheres e pessoas de menor nível educacional. A deterioração do mercado de trabalho afetou os mais vulneráveis, o que tende a acentuar desigualdades. Este é um dos desafios que o governo e as políticas públicas terão que enfrentar num horizonte próximo", diz.
O economista Fernando Veloso, pesquisador do Instituto Brasileiro de Economia (IBRE) da Fundação Getúlio Vargas (FGV), lembra que o país vive um cenário de elevada incerteza fiscal, política e sanitária, o qual não deverá sofrer grandes modificações em 2021.
"O grau de incerteza mensurado pelo IBRE atingiu o maior nível da série histórica em abril. Desde então, tem caído, mas subiu em novembro e está muito acima do nível pré-pandemia. O cenário que se desenha é o padrão observado antes da pandemia: incerteza alta, informalidade elevada e baixo crescimento da produtividade", explica.
Entrada do Brasil na OCDE
Conhecida como o "clube dos países ricos", a OCDE é composta por 37 países. O objetivo-fim da entidade é fomentar boas práticas de economia de mercado e democracia entre as nações-membros.
O presidente Jair Bolsonaro e a equipe de política externa do governo moveram esforços, desde o início do mandato, para que o Brasil ingresse no grupo. Para atrair o apoio dos Estados Unidos à candidatura brasileira, o governo adotou uma série de concessões comerciais junto à administração do aliado Donald Trump.
Após se ver frustrado com a indicação da Argentina pelos EUA para uma das vagas abertas na OCDE, o apoio de Trump à nomeação do Brasil foi concretizado em janeiro deste ano. Porém, a troca de comando na Casa Branca gera dúvidas sobre os próximos passos.
O diretor do departamento de economia da OCDE, Álvaro Pereira, afirmou que a entrada do Brasil no organismo internacional é "uma questão de tempo".
"Eu acho que o Brasil tem mostrado ao mundo que tem vontade de reformar e quer abrir-se mais ao mundo. Eu não tenho dúvidas que o Brasil vai entrar na OCDE. É uma questão de tempo. E vai ser um dos países mais importantes que nós temos na OCDE", disse no fim do lançamento do relatório da OCDE sobre a economia brasileira.
Celso Ming: PIB em boa recuperação
Fator positivo inesperado foi o aumento da poupança, o pedaço da renda não consumido, na participação do Produto Interno Bruto
Foi bom, vá lá… Não foi uma grande vitória, mas foi uma vitória, especialmente quando seu resultado é comparado com o que se esperava no início da crise. O avanço do Produto Interno Bruto (PIB) no terceiro trimestre do ano (sobre o anterior) foi de 7,7%, um pouco menor do que tinha sido cravado na expectativa dos analistas.
É um número que parece graúdo, mas não deve enganar. Foi medido sobre uma base anterior muito baixa e ainda não pode ser tomado como garantia de que haverá uma recuperação firme nos trimestres seguintes.
Baseou-se no consumo turbinado pelo auxílio emergencial que distribuiu mais de R$ 275 bilhões para 68 milhões de beneficiários. Não foi possível contar com o avanço da agropecuária, o setor campeão deste ano, porque o terceiro trimestre coincide com a entressafra. Fator positivo inesperado foi o aumento da poupança, o pedaço da renda não consumido, na participação do PIB. Deveu-se ao comportamento mais conservador do consumidor, que temeu por dias piores e entendeu que devesse guardar algum dinheiro para enfrentar dias ruins.
Para fugir da crítica de uma análise excessivamente focada pelo espelho retrovisor, convém avaliar o que vem pela frente. O fator mais positivo é a perspectiva de vacinação. O ritmo de distribuição da vacina no Brasil deverá ser inferior ao de muitos países avançados por conta da política negacionista e confusa sobre os efeitos da pandemia mantida até aqui pelo governo federal. Mas, já no primeiro trimestre do ano que vem, haverá progresso, com forte impacto sobre o setor produtivo e, também, sobre o consumo.
Outro fator positivo para a economia brasileira é a melhora da economia mundial. Além de providenciar vacinação em massa, os governos das grandes potências continuam empenhados em investimentos destinados a destravar a economia.
O novo governo Biden, nos Estados Unidos, anunciou um programa robusto de infraestrutura. E os grandes bancos centrais seguem com políticas monetárias (políticas de juros) frouxas para evitar restrições ao crédito.
Mas essa não é toda a história, pelos enormes riscos que estão logo aí, a começar pela desorganização das contas públicas. O governo federal continua sem planejamento claro sobre como resolvê-la. Esse é o principal fator que deverá impedir a distribuição de mais parcelas do auxílio emergencial. Também não está claro como o governo pretende tocar as reformas tributária e administrativa.
Essas omissões são fontes de incertezas que seguram os negócios, os investimentos e a criação de empregos, num cenário já minado por nada menos que 14,1 milhões de desempregados e pelo menos outros tantos de subempregados.
Resumo da ópera: a queda do PIB em todo este ano ultraproblemático pode ficar um pouco aquém dos 4,5% agora projetados.
E, para 2021, já há quase certeza de bom crescimento da renda nacional. Mas é preciso um pouco mais de quilometragem rodada para ter uma boa ideia de suas proporções.
Míriam Leitão: O PIB sobe e fica devendo
O dado de crescimento de 7,7% no terceiro trimestre é bom, mas veio abaixo do esperado por bancos, consultorias e até pelo governo. Houve um aumento forte da poupança e isso pode ajudar a recuperação nos próximos meses. O problema da economia é que neste quarto trimestre aumentou a intensidade da pandemia, foi reduzido o valor do auxílio emergencial e ele vai desaparecer no fim do ano. Outro problema é que não voltamos ao ponto de antes da queda. O PIB ainda ficou devendo.
Apesar de o dado ter vindo abaixo do esperado, quase nada mudou na visão dos economistas. Como houve a revisão para melhor na série pelo IBGE, o entendimento é que tudo veio de acordo com as projeções. Até no governo eu ouvi isso. “Como o IBGE melhorou os dados do segundo trimestre, de queda de 11,4% para queda de 10,9%, então no combinado nada muda e continuamos prevendo recessão de 4,5% em 2020”. O Itaú Unibanco espera que o quarto trimestre ainda tenha um crescimento de 2,9% sobre o trimestre anterior. Com isso, o carregamento estatístico para 2021 ficaria em 3,4%. Ou seja, mesmo que a economia fique parada ao longo de todo o ano que vem, estatisticamente, haveria essa alta forte sobre 2020. Já o Ibre FGV tem uma leitura mais conservadora, e acha que esse efeito será de 2%, porque o quarto trimestre será pior do que se previa , com o aumento das medidas de isolamento social.
Uma das apostas da equipe econômica é que a alta da poupança durante a pandemia sirva agora como um estímulo ao consumo. No terceiro trimestre, a taxa de poupança subiu a 17,3% do PIB, o maior percentual desde o terceiro trimestre de 2013. Esses recursos agora podem ser usados para a compra de bens e serviços, mantendo a atividade econômica aquecida. O governo acha que parte disso é poupança dos pobres que economizaram alguma coisa do auxilio emergencial, por outro lado, na classe média o medo do futuro, o risco do desemprego elevaram a propensão a poupar. Esse dinheiro poupado pode sustentar a demanda por bens e serviços e manter parte do crescimento futuro.
Mas não se pode subestimar a dimensão da crise econômica. O país acumula queda de 5%, a alta do terceiro tri atenua a queda da economia, mas os fatos recentes aumentam as dúvidas sobre o futuro.
O setor agropecuário é o único que fechará o ano positivo, mas teve uma queda no terceiro trimestre comparado ao segundo. “A expectativa é de um crescimento da agropecuária de 2,3%, muito abaixo dos 14,2% de 2017”, lembra a MB Associados. Mas, explica a consultoria, “o resultado efetivo do setor em 2020 é muito melhor do que o de 2017, com crescimento de mais de 20% na renda da agropecuária”.
Houve uma queda na construção civil, mas o setor está num bom momento, com produção de tijolos e cimento apresentando resultados positivos. Todos os segmentos do setor de serviço cresceram, mas, em parte, porque haviam caído demais. Destaque para o comércio, que cresceu 15,9%, um setor que no distanciamento social teve que inventar o caminho digital até o consumidor, apressando uma transição que pensou que teria tempo para fazer.
Os números parecem todos desencontrados, como a de uma economia que foi chacoalhada. A disparidade entre os setores é muito grande nesta recuperação, o que já havia sido alertado por vários economistas. Se a indústria cresceu 14,8% no terceiro trimestre, os serviços subiram bem menos, 6,3%, enquanto a agricultura surpreendeu negativamente, com uma queda de 0,5%. Até mesmo dentro de um mesmo setor, as velocidades foram muito diferentes. A indústria de transformação cresceu 23,7%, já a extrativa teve alta menor, de 2,5%. O comércio cresceu 15,9%, mas depois de três trimestres de queda. Os serviços financeiros subiram 1,1%, mas não tiveram recuo durante a pandemia.
Na equipe econômica trabalha-se com o cenário de que o distanciamento social está no fim e que isso permitirá a retomada da economia. Por isso, na visão da equipe, o auxílio não seria mais necessário. Mas o cenário que parece mais provável é o de que o novo crescimento dos casos de Covid-19 manterá a economia travada, e a oferta de emprego, muito abaixo do necessário. A taxa de desemprego deve subir até mais fortemente no começo do próximo ano.
O erro inicial do governo na economia foi não se preparar para o pior cenário. E o pior aconteceu. A resposta foi improvisada, com erros e atrasos. É fundamental que a área econômica saia desta segunda onda de negação. O Brasil está num momento de agravamento da doença e essa variável precisa entrar na equação do Ministério da Economia.
Vinicius Torres Freire: Ano Novo, PIB melhor e mais miséria
Não haverá auxílios em 2021, economia pode resistir e prestígio de Bolsonaro azedar
As notícias mais importantes em dia de PIB foram a certidão de óbito do auxílio emergencial, que passará desta para a pior em janeiro de 2021, diz o governo, e o enorme aumento da taxa de poupança.
Sem auxílios ou “Renda Brasil”, Jair Bolsonaro fará um arrocho de gastos por inércia, sem recorrer a mudanças constitucionais, por ora (corte de salários de servidores, em saúde e educação, INSS, abono salarial etc.). Assim, mais gente ficará mais pobre ou mais miserável no início do ano que vem. Mas não haveria tumulto financeiro por causa de gambiarras “fura teto”, sururu que prejudicaria a despiora da economia em 2021, embora essa dita tranquilidade também não garanta que a recuperação do crescimento continue.
Os economistas da Secretaria de Política Econômica de Paulo Guedes escreveram o seguinte, em nota sobre o PIB: “A forte recuperação da atividade, do emprego formal e do crédito, aliadas ao aumento da taxa de poupança, pavimentam o caminho para que a economia brasileira continue avançando no primeiro semestre de 2021 sem a necessidade de auxílios governamentais”.
Rodrigo Maia, presidente da Câmara, disse que não votaria extensão do período de calamidade e de auxílio emergencial. Bolsonaro diz de novo que a conversa de “Renda Brasil” está morta. No mais, o Congresso está paralisado, em especial por causa da eleição do comando da Câmara.
Muito economista diz que a poupança acumulada na pandemia pode sustentar o consumo no início de 2021. Não quer dizer que todo mundo tenha algum dinheiro guardado, claro, mas que, no conjunto do país se ganhou mais do que se consumiu desde meados do ano, grosso modo. Essa poupança poderia compensar o fim dos auxílios e a insuficiência da renda do trabalho. Essa é a tese.
Se vai acontecer, são outros novecentos. Pessoas e empresas podem não gastar ainda por cautela (epidemia persistente, medo de desemprego etc.). Não sabemos.
Quanto ao emprego, nem por milagre serão recuperados os 9 milhões de postos de trabalho perdidos na epidemia _quer dizer, não até o final do primeiro trimestre de 2021. As pessoas com menos chance de conseguir trabalho são as que tendem a depender de emprego informal, as que mais sofreram nesta crise (sem carteira assinada, “por conta própria” sem CNPJ, o popular bico).
O arrocho por inércia, sem “reformas”, impediria a deterioração das condições financeiras (juros, dólar etc.). Além disso, a melhora nas condições financeiras no mundo já causou algum alívio por aqui. Vacinas e a solução da crise eleitoral americana ajudaram.
Mais dinheiro vai para os fundos que aplicam em países emergentes. Por tabela, parte dessa dinheirama pinga no Brasil. O dólar ficou mais barato, as taxas de juros no atacadão de dinheiro caíram, a Bolsa está animada.
Logo, não é desarrazoado especular que a economia pode evitar uma recaída no início de 2021, “tudo mais constante”, mesmo que mais gente seja largada na pobreza e na miséria. Sim, é horrível. É o que se pretende demonstrar.
Mesmo na hipótese de despiora branda, o cenário mais comum para 2021, o prestígio do governo pode azedar mais, porém. O desemprego vai crescer até pelo menos o fim do primeiro trimestre. A inflação continuará a subir até meados do ano, chegando a uns 5,5% anuais. Milhões de pessoas que perderão o auxílio estarão entre desamparadas e iradas, mesmo aquelas que ficarão com os R$ 200 mensais médios do Bolsa Família.A economia pode ir “bem”, não ter recaída, mas o povo mais miúdo vai levar um tombo.
Fernando Abrucio: O que fica para 2022 e o que falta ainda jogar
Se algo novo vier, seu sucesso dependerá de entender que houve uma mudança no clima político do país
O jogo político presidencial começou com as eleições de 2020, seja por causa da ascensão de uma nova agenda, seja por suas consequências, pois os atores políticos não serão mais os mesmos na segunda parte do mandato do presidente Bolsonaro, incluindo o próprio. Mas ainda falta definir os jogadores e as táticas que vão vigorar no campeonato nacional do sistema político. Por ora, não dá para saber quem estará efetivamente em campo, nem quem vai liderar e chegar ao segundo turno. Muita coisa pode acontecer. De todo modo, alguns sinais foram dados e quem souber interpretá-los melhor terá vantagens na próxima disputa.
As eleições municipais deixaram, basicamente, três legados que vão influenciar os próximos dois anos da política brasileira, com possíveis impactos sobre a disputa presidencial. O primeiro legado é o mais importante: houve uma mudança no clima de opinião. O humor político que se iniciou em 2016 e teve seu auge em 2018, baseado na visão antipolítica, na proeminência da luta contra a corrupção e no discurso bélico como forma de garantir a segurança pública, perdeu a hegemonia no discurso dos políticos e a efetividade para conseguir votos em 2020.
Em substituição a esse clima de opinião, surgiram pelo menos três grandes referências que ganharam força agora e têm tudo para se estabelecer como tendências majoritárias no caminho para o pleito presidencial. A primeira é uma aversão ao bolsonarismo como forma extremista de se fazer política em todas as suas dimensões; a segunda é a ascensão da questão social como a dominante na agenda pública; e a terceira é a volta da política como algo positivo e necessário para articular grupos, interesses e valores.
Os eleitores demonstraram cansaço do modelo bolsonarista, com seu negacionismo em relação à ciência, sua forma de comunicação baseada em fake news e na polarização, sua lógica de só reclamar dos outros e não apresentar soluções. O clima de ódio como instrumento eleitoral não só perdeu força, como tendeu a ser rechaçado. Esse modelo que Bolsonaro abraçou, ademais, tende a ser bombardeado pelas mudanças no cenário internacional. Será muito difícil ser trumpista em 2022 e ganhar as eleições.
A tendência política mais importante que emergiu das eleições de 2020 é a ascensão da questão social ao centro da agenda política, que dominou a campanha dos vencedores - os de esquerda, os de centro e os de centro-direita. A pandemia foi fundamental neste processo, ao escancarar uma desigualdade imensa, aumentando a consciência do país sobre a centralidade desse tema. Mas a longa estagnação econômica e a organização da sociedade contra os diversos tipos de injustiça também têm um papel relevante na mudança do humor político.
Como não deve haver um crescimento econômico relevante até a eleição presidencial, mantendo-se provavelmente um desemprego alto, o presidente Bolsonaro ficará marcado pela pauperização da população. A emergência da questão social vem, ainda, da eclosão de episódios como os de George Floyd e do assassinato de João Alberto, que modificaram a percepção da temática racial não só de forma difusa, mas também nas elites sociais. E outras manifestações da desigualdade, como a educacional e a de gênero, vão ser cada vez mais abordadas até 2022. E Bolsonaro não se preparou para essa mudança no clima político - na verdade, ele tem uma noção preconceituosa das origens e formas de propagação da desigualdade, como revelam seus vários discursos ao longo da vida.
A transformação do clima de opinião completa-se com a recuperação da política como forma de juntar grupos partidários e sociais em torno de compromissos com a coletividade. Esse ponto se coloca como antípoda da polarização e do ódio entre adversários. É bem provável que a arte do diálogo e, sobretudo, a capacidade de articular os diferentes ganhem força nos próximos dois anos, de tal modo que não se sabe se haverá uma frente ampla ou “frentes progressistas” e de centro contra o bolsonarismo, porém, é nítido que o candidato que conseguir convencer a sociedade que ele representa múltiplos atores e expressar isso no universo de seus apoiadores terá mais chances de vencer a disputa presidencial.
A recuperação da política também envolve construir propostas e candidaturas mais orgânicas com setores sociais e grupos técnicos. A ideia do “salvador da pátria” que tem um “posto Ipiranga” não se sustenta mais, particularmente porque ela não é capaz de dar conta dos problemas do país. As pessoas querem soluções práticas para suas vidas, o que envolve conversas com a sociedade e políticas públicas bem definidas.
Bolsonaro representa o contrário dessa tendência de dar maior organicidade à política. De um lado, ele reduziu a participação social institucionalizada e retirou o papel da Presidência da República de ser uma mesa de diálogo e negociação com os diversos grupos (como FHC e Lula faziam). De outro, houve um enfraquecimento da profissionalização das políticas públicas, seja com a escolha de gente desconhecida e amadora para comandar os setores, seja com o desprezo das evidências cientificas como bússola das decisões governamentais.
A mudança no clima de opinião é o principal legado de 2020 para 2022. No entanto, há outros dois efeitos da eleição municipal que deverão ter um impacto também relevante. Um é o fracasso do bolsonarismo em seu formato atual. A maioria dos candidatos que o presidente apoiou acabou perdendo a disputa, não porque ele seja um pé-frio, mas porque a sua proposta de governo não entregou o que havia prometido e não dá conta dos desafios surgidos no meio do caminho. Ou Bolsonaro muda o seu estilo de governança, colocando as políticas públicas na frente da ideologia, ou então seus próximos dois anos serão muito difíceis, comprometendo a reeleição.
O terceiro e último legado da eleição municipal é a consolidação do isolamento petista. Mais do que uma derrota, o que 2020 revelou é a impossibilidade de o PT ter a mesma hegemonia na esquerda e na sociedade que teve por mais de dez anos. Se Lula conseguir se viabilizar juridicamente como um candidato presidencial, ele ainda terá uma força não desprezível, que pode ficar entre 20% e 30% dos votos. E se o percentual alcançado levar o Partido dos Trabalhadores ao segundo turno, o resto já se sabe: será muito difícil juntar outros para esse projeto político.
Uma saída para o PT seria abdicar, pelo menos por ora, de seu papel hegemônico, procurando construir uma aliança mais ampla. Será que o partido está preparado para isso? Ou melhor, será que Lula, um dos maiores líderes populares da história do país, conseguiria vestir esse figurino? Tal qual foi dito para o caso de Bolsonaro, fica ao petismo o desafio: é mudar ou caminhar para o fracasso em 2022.
Terminada a contagem dos votos, já se quer saber quem será o favorito para 2022 e com quem ele estará aliado. Eis aqui algo que está muito longe de ser definido. Há muito jogo pela frente, com quatro grandes incógnitas. A primeira diz respeito ao desempenho dos governantes nos próximos dois anos. É provável que a segunda parte do mandato de Bolsonaro seja bem mais difícil do que a primeira, com impactos sobre sua popularidade. Mas os outros possíveis concorrentes também apoiam governos no plano subnacional. Doria, por exemplo, tem baixíssimas taxas de aprovação em seu Estado, e é muito cedo para saber se será capaz de mudar esse cenário. Os partidos de centro e centro-direita, os que mais cresceram nas eleições municipais, agora terão a responsabilidade de fornecer soluções à população. Se fracassarem, o povo pode procurar outras alternativas.
De todo modo, o jogo dos governos, nacional e subnacionais, ainda está sendo jogado. Todos os principais partidos e a maioria dos presidenciáveis têm uma vitrine para ser responsabilizada pelos eleitores. Neste sentido, o desempenho das políticas públicas até 2022 vai ser um elemento importante de comparação na definição do voto.
Uma segunda incógnita, e das bem grandes, relaciona-se às alianças entre os partidos. Haverá muita conversa, mas o destino das legendas e de possíveis parcerias só serão definidos mais para o final de 2021, porque os partidos vão esperar até o último minuto para escolher seu caminho, especialmente aqueles que provavelmente não tenham candidato presidencial, mas que serão peças centrais na eleição em termos de vice e, sobretudo, de arranjos para as governadorias e Congresso Nacional.
Um terceiro ponto diz respeito ao papel das principais lideranças políticas. Bolsonaro, Ciro, Doria, Huck e Lula, além dos líderes dos partidos do centro que provavelmente não terão a cabeça da chapa (como ACM Neto e Kassab), serão decisivos. O quanto serão capazes de ultrapassar o seu próprio autointeresse e enxergar um caminho coletivo melhor? Eis a pergunta de um milhão de dólares.
Por fim, muitos fatos e novidades podem mudar o rumo da política nacional. Quem diria que uma pandemia marcaria o mandato de Bolsonaro? Será que não há algum presidenciável que não estamos prestando atenção? Seria ele o prefeito Kalil ou um líder carismático em gestação? O imponderável existe na política e não podemos ignorar os caprichos do destino. Mas se algo novo vier, seu sucesso dependerá de entender que houve uma mudança no clima político do país.
*Fernando Abrucio, doutor em ciência política pela USP e professor da Fundação Getulio Vargas.
Alon Feuerwerker: O PIB
O PIB do terceiro trimestre veio um pouco abaixo das expectativas, com um crescimento de 7,7% em relação ao anterior. A boa notícia é que indústria, comércio e investimentos puxaram o índice para cima (leia).
Ainda que no acumulado final do ano a maior parte das atividades vá mostrar queda em relação a 2019.
Os números positivos do Caged de outubro (leia) já haviam sido um indicador de recuperação. Mesmo a recente alta na taxa de desemprego medida pelo IBGE refletiu mais o aumento da busca por trabalho que qualquer outra coisa.
A dúvida agora é se a recuperação vai resistir ao fim dos mecanismos financeiros de suporte criados para enfrentar as consequências da pandemia. O governo parece apostar que sim, pois até o momento deixou de lado qualquer ideia de prorrogá-los. Até o momento.
Passadas as eleições municipais, o ritmo de recuperação da economia em 2021 vai ajudar a desenhar o retrato político do ano, com a óbvia consequência na sucessão presidencial de 2022. Pois daqui a dois anos, com as vacinas, espera-se que a Covid-19 tenha deixado de ser assunto.
Não custa ser otimista.
*Alon Feuerwerker é jornalista e analista político/FSB Comunicação
Rubens Barbosa: Visões de futuro, China e Brasil
Os chineses fazem um sólido planejamento e o País deixa o grupo das dez maiores economias
A quinta sessão plenária do 19.º Comitê Central do Partido Comunista da China (PCCh), concluída em 29 de outubro, apresentou as linhas gerais do 14.º plano quinquenal econômico e social do país (2021-25). O plano quinquenal registra os objetivos gerais para os próximos cinco anos e, além disso, estabelece o planejamento de médio prazo, até 2035. Mantendo a retórica de “paz e desenvolvimento”, o PCCh traçou as principais linhas estratégicas levando em conta, sobretudo, a crescente competição global. Os documentos indicam que as lideranças do partido, refletindo as incertezas no cenário global, buscaram mudanças em três áreas: fortalecimento da economia, autossuficiência em tecnologia e mudança de clima.
Na sua visão de futuro, os líderes chineses abandonam a ênfase no crescimento econômico com o aumento do PIB e passam a focar “o aumento significativo no poderio econômico e tecnológico” do país até 2035, com foco em questões estruturais e qualidade de vida. O comunicado final do plenário do congresso não fixa uma taxa de crescimento para 2035 e menciona somente o objetivo de alcançar, “em termos de PIB per capita, o nível de países moderadamente desenvolvidos”. Manter o foco no crescimento faz sentido para a China num momento de crescente competição entre grandes potências, que o comunicado, em outras palavras, denomina “profundos ajustes no equilíbrio de poder internacional”. Uma economia forte vai “assegurar que a China tenha recursos necessários para a defesa nacional e a pesquisa científica” e para a expansão de seus interesses globais.
Em vista da gravidade da crise pandêmica, a China teve de adiar o projeto da Rota da Seda (Belt and Road Initiative), uma forma de projetar seu poderio econômico além-fronteira.
As sanções dos EUA e as restrições à venda de semicondutores a empresas chinesas motivaram mudanças na atitude da liderança do PCCh no tocante à dependência de tecnologia do exterior. As vulnerabilidades da China foram exploradas geopoliticamente pelos EUA, apesar dos custos econômicos e da oposição de parte da indústria norte-americana. O plenário do partido afirmou que “autossuficiência em ciência e tecnologia é um pilar estratégico do desenvolvimento nacional” e demandou que “importantes avanços sejam conseguidos em tecnologias críticas” para que a China se torne “líder global em inovação”. Essa diretriz já estava presente nas medidas tomadas para o avanço na política industrial Made in China 2025, com resultados concretos em várias áreas, entre as quais o país já mostra significativa liderança global: tecnologia 5G e 6G e inteligência artificial.
A liderança chinesa passou a ver na política ambiental e de mudança do clima uma forma de ganhar prestígio global e obter benefícios econômicos. A proteção ambiental tem sido uma prioridade crescente para as autoridades chinesas nos fóruns internacionais. Em setembro, na ONU, Xi Jinping anunciou que a China fixou a meta de o pico das emissões de gás carbono ser alcançado em 2030 e a de emissão zero, obtida em 2060. Embora ambiciosos, esses objetivos indicam a participação cada vez mais intensa da China nas discussões sobre políticas ambientais, com potenciais reflexos sobre outros países.
Enquanto a China faz seu sólido planejamento com visão de futuro, o Brasil mantém uma atitude preocupante em termos de planejamento de médio e longo prazos. O FMI projeta uma queda de perto de 5% em 2020 e um crescimento de mais de 4% em 2021, apesar de estimativas de analistas econômicos de que as questões fiscais, a ausência de reformas, a queda no crescimento do comércio exterior e nos investimentos externos não prenunciam uma saída em V, como repetido pelo ministro da Economia. Por outro lado, o baixo crescimento da economia nos últimos anos, agravado pela pandemia, fez o Brasil deixar de ser uma das dez maiores economias globais, segundo o Ibre/FGV. Em termo de PIB em dólares, neste ano, Canadá, Coreia do Sul e Rússia devem ultrapassar o Brasil, que cairá para a 12.ª posição.
A preocupação aumenta quando se verifica não haver um plano claro de saída da crise atual, nem prioridades para avanços econômicos, sociais e tecnológicos. Sem maior discussão, o governo editou decreto que institui a Estratégia Federal de Desenvolvimento para o Brasil no período de 2020 a 2031, com cinco eixos: econômico, institucional, infraestrutura, ambiental e social. Trata-se um uma medida tímida, que vai na direção correta. O Congresso e a sociedade civil deveriam ser chamados a participar da análise e discussão dessa estratégia. Dois aspectos chamam a atenção no documento do governo federal: a ausência de uma clara prioridade para a inovação e a tecnologia e de metas claras no eixo ambiental no tocante à preservação da Floresta Amazônica e à mudança do clima.
China, Europa, Japão e EUA (com Biden), no atual cenário internacional, colocam mudança de clima e tecnologia como objetivos centrais, como ficou evidente na reunião do G-20 no final da semana. Quando o Brasil vai juntar-se a eles?
*Presidente do Irice
José Roberto Mendonça de Barros: Vamos bater no muro?
A percepção de que a situação fiscal se deteriorou muito é agora universal
Do ponto de vista econômico, a resposta brasileira ao coronavírus foi muito robusta, pois algo como 12% do PIB foi transferido para mais de 65 milhões de pessoas, um valor bastante concentrado a partir de junho. Isso provocou um grande salto na demanda das famílias, que ativou parte do comércio e da indústria. Como resultado, a queda do PIB deste ano será menor do que se projetava, ficando entre -4% e -5%.
Entretanto, boa parte do setor de serviços não viveu essa melhora. Falo aqui de viagens, de toda a cadeia de hospitalidade, da economia criativa e de tudo o que depende de aglomeração. Essa situação não mudará de forma substancial, uma vez que o número de novas mortes e de novos casos vem caindo de forma muito lenta, sem falar no risco de uma segunda onda, como a que ocorre atualmente na Europa.
Em consequência, o mercado de trabalho vem se recuperando com certa lentidão, até porque muitas empresas quebraram ou encolheram, reduzindo a oferta de empregos permanentes. Mais ainda: já dá para perceber que o grande salto do processo de digitalização e da automação que resulta da pandemia também está reduzindo o número de empregos permanentes, processo que se verifica no mundo inteiro. Isso mostra a dificuldade de uma recuperação em “V”. Para citar um único exemplo: pense em quantas agências bancárias se tornaram desnecessárias como resultado do inacreditável avanço do “home banking” e da digitalização dos meios de pagamento – isso sem falar no sucesso que fará o Pix. O mesmo raciocínio se aplica para inúmeros outros serviços, como venda de carros, assistência técnica, ensino etc.
Por outro lado, a demanda de consumo deverá se reduzir no início do próximo ano. O fim do programa do coronavoucher deprimirá a renda disponível de muitas famílias, mesmo que a desejada expansão do Bolsa Família consiga ser operacionalizada, porque cairá drasticamente o número de beneficiários. Essa queda de renda, como já argumentado, não será compensada pela criação de novos empregos permanentes. Além disso, a forte elevação do custo da alimentação, que segue crescendo acima de 10%, reduz o poder de compra de muita gente. Apenas a entrada de uma nova safra, em 2021, reverterá essa tendência.
Em paralelo, não há atualmente qualquer indicação de elevação dos investimentos públicos ou privados. Ao contrário, continuamos a ver uma queda nos investimentos estrangeiros. Alguma surpresa? Basta pensar nos reveses sofridos pelo ambiente regulatório (como no caso da Linha Amarela, no Rio de Janeiro), nos atrasos em projetos que estão no Congresso (Lei do Gás) e nas privatizações que simplesmente não existem…
Tudo indica que o crescimento de 2021 ficará pouco acima de 2% e que a inflação será maior que a deste ano. Além da pressão no preço de alimentos, existem fortes altas em matérias-primas industriais básicas, químicas e metálicas, cujo repasse aguarda apenas alguma recuperação da demanda. Por baixo dessas pressões está a desvalorização do real que, dadas as incertezas atuais, tem pouca chance de ser revertida. A taxa de juros será elevada no próximo ano, ou mesmo antes.
A percepção de que a situação fiscal se deteriorou muito é agora universal. Isso mesmo sem os gastos adicionais que o Executivo e o chamado Centrão querem incluir na proposta orçamentária para o próximo ano. Como resultado, a rolagem da dívida pública agora se faz apenas com papéis mais curtos e as taxas mais longas já subiram no mercado quando comparadas a algumas semanas atrás.
Temos assim um impasse. De um lado, a situação fiscal exige uma resposta: apontar qual a trajetória que se objetiva uma vez passada a emergência do combate ao vírus. De outro, Brasília segue em festa como nos bons tempos, com óbvio apetite por elevar os gastos – e não falo apenas do Executivo, mas também de boa parte do Legislativo e do Judiciário (alguém aí pensou do novo Tribunal Regional Federal em Minas Gerais?).
No meio disso tudo, o Ministério da Economia, cada vez menor e sem rumo.
Daí a pergunta título: se o embate crescer, vamos bater no muro?
*Economista e sócio da MB Associados
Sergio Lamucci: O cenário para 2021 está mais nublado
As indefinições não se limitam ao front fiscal; há também incertezas em relação à reforma tributária e na área ambiental
Os indicadores econômicos de agosto confirmaram uma retomada mais forte da economia brasileira no terceiro trimestre, com crescimento firme na indústria e no comércio e um desempenho mais modesto nos serviços. O PIB pode ter avançado 8% em relação ao segundo trimestre, de acordo com várias estimativas. Para 2020, a expectativa é de uma queda na casa de 5%, bem menos intensa que o tombo de 8% a 9% que chegou a ser projetado por algumas instituições. O auxílio emergencial teve grande peso para o melhor resultado do período de abril a junho.
As perspectivas para o fim deste ano e em especial para o ano que vem, porém, estão contaminadas por incertezas, principalmente em relação às contas públicas, elevando os juros futuros e mantendo o câmbio excessivamente desvalorizado. As indefinições, contudo, não se limitam ao front fiscal. Há incertezas quanto ao que vai ocorrer com as propostas de reforma tributária, o que também contribui para segurar investimentos, por falta de clareza sobre o sistema de impostos que vai prevalecer no país dos próximos anos. Além disso, a política ambiental do governo segue desastrosa, afastando parte do capital estrangeiro do Brasil.
Esses fatores nublam o cenário para 2021. O quadro para o mercado de trabalho não é animador e o auxílio emergencial, cujo valor já caiu à metade, deverá deixar de existir no ano que vem. Ainda que o governo coloque de pé um programa de transferência de renda amplo, os valores envolvidos e o número de beneficiários serão bem menores que os do auxílio. Para que a retomada da economia seja firme, é preciso reduzir essas incertezas, aumentando a segurança para o setor privado investir e tirando pressão dos juros futuros e do câmbio.
O Indicador de Incerteza da Economia (IIE-Br) da Fundação Getulio Vargas (FGV) segue em nível elevado, apesar de estar em queda desde maio. Em abril, o índice atingiu o nível recorde de 210,5 pontos, devido ao choque produzido pela pandemia da covid-19. O IIE-Br tem recuado, mas a trajetória declinante perde força. Divulgada na semana passada, a prévia do indicador para outubro aponta para uma queda de 1,8 ponto no mês, para 144 pontos. Se confirmada, será a menor baixa desde maio, com o indicador permanecendo acima da máxima pré-pandemia, de 136,8 pontos, alcançado em setembro de 2015, quando a agência de classificação de risco Standard and Poor’s (S&P) tirou o grau de investimento do Brasil. Um nível elevado de incerteza afeta principalmente o investimento, que necessita de um horizonte previsível para se materializar.
A grande incógnita é o que vai ocorrer com as contas públicas a partir de 2021. Para combater os efeitos da pandemia, o governo elevou os gastos e viu as receitas caírem, como resultado da recessão. O problema é que o Brasil já partiu de uma situação fiscal pouco confortável, com uma dívida bruta de 75,8% do PIB no ano passado. O endividamento bruto deve fechar 2020 na casa de 95% do PIB, enquanto o déficit primário (excluindo gastos com juros) ficará próximo a 12% do PIB.
Para financiar um programa de transferência de renda mais amplo, o presidente Jair Bolsonaro não quer promover a fusão de programas sociais como o abono salarial, o seguro-defeso e o salário família com o Bolsa Família, o que não levaria ao rompimento do teto de gastos, mas exige medidas impopulares. Nesse cenário, surgem ideias para tentar driblar o mecanismo, como usar parte do dinheiro do pagamento de precatórios para bancar o Renda Cidadã.
A economia em 2021 deverá ter como vento contrário uma redução expressiva do estímulo fiscal, depois de um déficit primário superior a dois dígitos em 2020. Uma contração muito forte dos gastos tende a produzir efeitos negativos sobre a atividade, num quadro em que o investimento e o consumo das famílias não têm perspectivas favoráveis. A questão é que os indicadores fiscais são de fato preocupantes e o governo não dá mostras de que vai enfrentar o crescimento dos gastos obrigatórios. Um ajuste mais gradual no ano que vem precisaria ser comunicado com muito cuidado, reforçando o compromisso com medidas estruturais de contenção das despesas. O governo, contudo, caminha direção oposta. Há uma disputa entre o ministro da Economia, Paulo Guedes, e o do Desenvolvimento Regional, Rogério Marinho, escancarando a falta de coesão na questão fiscal.
Com o panorama para as contas públicas incerto em 2021, o câmbio se desvaloriza e os juros futuros disparam - o dólar está acima de R$ 5,60, enquanto a taxa dos contratos de DI para janeiro de 2027 fechou na sexta-feira em 7,56% ao ano, muito acima dos 2% da Selic. Hoje, os índices ao consumidor mostram uma alta forte dos preços de alimentos, mas a expectativa é que esse movimento seja temporário, não levando a pressões inflacionárias mais disseminadas. Novas rodadas de depreciação do câmbio, contudo, podem mudar esse quadro, colocando em risco a Selic na mínima histórica.
Há dúvidas ainda quanto ao avanço de uma das propostas de reforma tributária hoje em discussão. O assunto não vai deslanchar antes das eleições. Qualquer progresso, se houver, ficará para 2021. O governo ainda não apresentou a segunda parte da sua proposta, que deve incluir um imposto sobre transações financeiras para bancar uma desoneração mais ampla da folha de pagamento. Em resumo, não se sabe se alguma das iniciativas em debate vai caminhar, e qual será a natureza da reforma. Uma redução da tributação das empresas - hoje mais alta no Brasil do que em muitos outros países -, acompanhada da taxação da distribuição de dividendos, seria bem vinda, mas não parece estar no radar. Com isso, há incertezas sobre qual será o desenho do sistema tributário nos próximos anos, o que também colabora para segurar os investimentos privados, num momento de enorme ociosidade de recursos na economia.
Há ainda a política ambiental. Além do retrocesso em si, a imagem do governo Bolsonaro nessa área é péssima, o que atrapalha a ratificação do acordo comercial fechado entre o Mercosul e a União Europeia (UE) e afugenta parte dos investidores estrangeiros do país. É mais obstáculo para o investimento, assim como a condução da crise sanitária pelo governo federal.
Esse conjunto de incertezas dificulta a retomada em 2021. O consenso de mercado indica por enquanto um crescimento de 3,5% no ano que vem, mas alguns analistas já projetam um resultado mais fraco, na casa de 2%, o que seria muito ruim para um país com 14 milhões de desempregados.
Rolf Kuntz: Um gigante sem fôlego e sem rumo
Sem plano sequer para alongar a retomada, o País parece condenado a crescer menos que 3%
O Brasil, vejam só, deixou de ser o país do futuro. Que futuro pode ter um país emergente incapaz de crescer 3% ao ano? Esqueçam Stefan Zweig. Pensem num ministro da Educação preocupado com a vida sexual dos estudantes, num ministro do Meio Ambiente avesso à proteção das florestas, num ministro da Economia empenhado em recriar uma aberração tributária, a CPMF. Considerem um presidente negacionista, propagandista da cloroquina e centrado em interesses pessoais e familiares, com destaque para a reeleição. Quem se importa, em Brasília, com o miserável crescimento projetado para o médio e o longo prazos, nada além de 2,5% ao ano?
Bolas de cristal muito consultadas preveem mediocridade, ou algo pior que isso, no médio e no longo prazos. Por enquanto, há algum dinamismo. Passado o grande choque, os negócios voltaram a mover-se, como em todo o mundo. Em 2021 o produto interno bruto (PIB) crescerá 3,5%, segundo a mediana das projeções do mercado. A expansão ficará em 2,8%, de acordo com estimativa recente do Fundo Monetário Internacional (FMI). A partir daí o cenário fica menos claro, mais inquietante e, principalmente, mais estimulante para uma avaliação das condições do Brasil.
O PIB crescerá 2,3% em 2022, segundo o FMI, e apenas 2,2% em cada um dos três anos seguintes. Pela projeção do mercado, captada na pesquisa Focus, do Banco Central, a expansão será de 2,5% ao ano em 2022 e 2023. Detalhe relevante: essa taxa de 2,5% aparece há tempos, nessas pesquisas, como estimativa para o médio prazo. As projeções do FMI têm a mesma característica: números baixos, na casa dos 2%, quando se ultrapassa o horizonte de um ou dois anos. Não se trata de preguiça dos analistas. O problema está na economia brasileira. Os economistas do mercado e das entidades multilaterais são inocentes.
Para olhar um pouco mais longe, os economistas levam em conta o potencial de crescimento da economia. Esse potencial é determinado por vários fatores, com destaque para os investimentos em capital fixo (máquinas, equipamentos e construções), em capital humano, em conhecimento (ciência e tecnologia) e em inovação. Fatores institucionais e de ambiente de negócios, como tributação, segurança jurídica, burocracia e integração internacional, também são importantes. O Brasil tem ido mal, há muitos anos, em todos esses quesitos.
Só o investimento em capital fixo é mostrado de forma explícita nas contas nacionais brasileiras. Na maior parte dos últimos 20 anos esse investimento foi equivalente a menos de 20% do PIB, embora a meta oficial tenha sido, quase sempre, uma taxa de pelo menos 24%. Além disso, boa parte do investimento foi pouco produtiva.
Muitas obras públicas ficaram inacabadas, outras consumiram tempo demasiado, o superfaturamento foi frequente e houve amplo desperdício. A contribuição dessas obras para a capacidade produtiva acabou sendo muito prejudicada. O setor privado investiu mais que o governamental, mas o protecionismo e outros fatores limitaram os incentivos à busca de eficiência, inovação e competitividade.
A indústria de transformação começou a perder vigor alguns anos antes da recessão de 2015-2016. Incentivos fiscais e financeiros mal concebidos, somados à corrupção, favoreceram grupos e ramos empresariais, mas a maior parte do setor escorregou ladeira abaixo até chegar a pandemia. A equipe do presidente Jair Bolsonaro jamais apresentou um diagnóstico sério dos problemas da economia brasileira. Por isso mesmo nunca propôs um plano de modernização, dinamização e retorno a um crescimento aceitável para um país emergente.
A única reforma importante aprovada desde o ano passado, a da Previdência, estava madura no fim do mandato do presidente Michel Temer. Ainda na gestão Temer as normas trabalhistas foram modernizadas e flexibilizadas, sem eliminação de direitos. Também nesse período foi criado o teto de gastos. Hoje, além de pouco avançar na pauta de reformas, o ministro da Economia insiste em objetivos modestos, como a desoneração da folha salarial.
Essa desoneração pode evitar demissões e preservar empregos, mas é insuficiente para ampliar a oferta de vagas. Isso foi comprovado na gestão da presidente Dilma Rousseff, quando mais de 50 setores foram contemplados com a redução de encargos. Desse conjunto sobraram 17 setores – com 6 milhões de trabalhadores, segundo se estima. O mais prudente, agora, é preservar esses benefícios pelo menos por um ano, por causa das condições da economia.
Seria bom se a equipe econômica notasse a diferença entre evitar demissões e gerar empregos, objetivos tão bons quanto distintos. Geração de empregos depende, em primeiro lugar, da atividade e das perspectivas de crescimento. Não se moverá a economia eliminando direitos trabalhistas, recriando um monstrengo tributário e gastando energia para subordinar o Orçamento de 2021 aos interesses eleitorais do presidente. Planejamento para o longo prazo vai muito além disso, mas essa noção parece estranha aos condutores da política econômica.
*Jornalista
José Roberto Mendonça de Barros: Implicações do PIB do segundo trimestre
Definitivamente, o País não estava “voando”
Os resultados da evolução do PIB foram muito variados, mas o pior de tudo é que o índice do produto voltou dez (isto mesmo: 10) anos atrás. É melancólico.
Outra surpresa que se observou foi que o período de janeiro a março foi revisado para baixo: ao invés de uma queda de 1,5%, o que se viu foi um encolhimento de 2,5%. Definitivamente, o País não estava “voando” no começo do ano, como tantas vezes mencionou o ministro da Economia.
Será muito difícil conseguirmos repetir uma queda de tal magnitude (-9,7%), decorrente de uma causa totalmente inesperada vinda da área da saúde, que provocou uma parada súbita no sistema econômico.
Os segmentos que mais sofreram foram aqueles dependentes de aglomerações, tais como restaurantes, viagens e serviços correlatos (a chamada cadeia da hospitalidade, que inclui os serviços criativos), que caiu mais de 40%, e, de outro lado, os segmentos industriais que foram obrigados a fechar as fábricas, como automotivo, máquinas e equipamentos.
O tombo da indústria de transformação reforça a crescente fragilidade do setor, o que torna mais longe ainda a possibilidade de que ele volte a liderar o crescimento. Chama a atenção a elevação da assimetria entre empresas, em que uma nata de companhias ajustadas e capitalizadas segue avançando e aproveitando a desvalorização cambial para reforçar sua competitividade, enquanto a maioria das empresas vê seus balanços piorarem e seus produtos envelhecerem, sem fôlego para competir com a importação, mesmo descontando-se a perda de valor da moeda brasileira.
Só os setores de recursos naturais tiveram desempenho favorável: o agronegócio e o petróleo. O agronegócio, em qualquer comparação, e o petróleo, quando comparado com o mesmo trimestre do ano anterior, uma vez que a Petrobrás suspendeu a produção em mais de 40 plataformas no início da pandemia. Além deles, apenas setores que sempre investiram bastante em tecnologia foram bem no período. Menciono aqui o setor financeiro e as empresas preparadas para venda pela internet.
Sem nenhuma surpresa, o investimento, que já vinha fraco, foi desastroso. Vai ser difícil retomar um crescimento sustentado, após a natural ocupação da capacidade de produção depois da liberação das unidades de produção.
As transferências recebidas por mais de 70 milhões de pessoas alavancaram, a partir de maio, o setor de cimento (reformas), móveis e utilidades domésticas. Isso nos levou a uma leve melhora em nossa projeção de crescimento para o ano: de -5,4 para -4,8%.
Olhando adiante, não dá para ver uma recuperação em V, uma vez que as transferências irão começar a cair nestes próximos meses e serão ainda mais reduzidas no ano que vem, quando o coronavoucher estará encerrado. Além disso, muitas empresas ainda irão sair do mercado e/ou diminuir ainda mais o contingente de seu pessoal. Com isso, a renda das famílias provavelmente será reduzida quando comparada com o auge de maio a agosto e o emprego líquido não crescerá muito. Assim, projetamos uma expansão de apenas 2,2% para o ano que vem.
A demanda internacional de alimentos está aquecida. O ponto forte decorre dos grandes volumes de transferências para as famílias, que ainda ocorre em praticamente todos os países do mundo. Com isso, a procura por alimentos se mantém forte.
Ademais, muitos países, perante a pandemia, tentaram elevar suas importações para constituir estoques de emergência. Do lado da oferta, tanto China como Estados Unidos têm tido problema nos últimos anos. Gripe suína, guerra comercial e problemas climáticos estão prejudicando a produção deste ano, pressionando a oferta e provocando uma apreciável elevação nas cotações de Chicago. Tudo isso se traduz em preços e renda bastante elevados no Brasil.
Isto sugere que os setores de recursos naturais continuarão a puxar nosso crescimento e, por conta disso, temos que levar adiante importantes avanços da bioeconomia, de sorte a contribuir para o fim das queimadas ilegais e para a criação de novos produtos, inclusive materiais, vindos do setor agropecuário.
Este caminho exige uma integração entre o setor agro, a indústria e os serviços de tecnologia. Uma consequência importantíssima é que temos que mudar a lógica da representação empresarial: de federações para coalizões em torno de projetos específicos.
Voltaremos a esses pontos num futuro próximo.
*Economista e sócio da MB Associados.