Paulo Guedes
Samuel Pessôa: Paulo Guedes falou
Ele deixou claro que volta para casa se o Congresso continuar a fazer greve da política
Se o presidente falou pouco no discurso de posse, menos de dez minutos, o pronunciamento do ministro da Economia, Paulo Guedes, foi longo, de quase 50 minutos.
Disse muito. Fez a ligação entre as seguidas crises brasileiras e o problema fiscal. Reafirmou o diagnóstico correto de que o equilíbrio com juros elevados e câmbio valorizado resulta de o gasto público aumentar sistematicamente além do crescimento da economia.
A reforma mais importante é a da Previdência, que é o maior item do gasto público.
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O governo enviará no início de fevereiro uma proposta de reforma constitucional, uma PEC, com a reforma da Previdência.
Segundo Paulo Guedes, a aprovação da reforma da Previdência garantirá dez anos de crescimento. Entendo a ênfase do ministro no tema, mas outras reformas serão necessárias. De qualquer forma, o ministro está coberto de razão com relação à centralidade da reforma.
E se a reforma não for aprovada? Foi aí que Paulo Guedes reservou a maior surpresa. Disse que enviaria uma nova PEC, que desvincularia as receitas da União e, se entendi corretamente, desindexaria o gasto da União.
A ideia é devolver ao Congresso Nacional o poder de discutir o que fazer com o Orçamento. Com a receita e com a despesa. Devolver a política aos políticos.
Guedes explicou que o engessamento de todo o Orçamento em regras constitucionais era compreensível após um regime militar que deu pouca atenção ao gasto social. Mas já se passaram 30 anos. Já é possível os políticos chamarem para si a sua atribuição precípua de alocar os recursos públicos.
Essa ideia faz parte de um caminho que nosso presidencialismo tem tomado desde o inicio dos anos 2000. Trata-se do enfraquecimento da Presidência da República, que se nota em eventos como a aprovação do Orçamento impositivo, que retirou do Poder Executivo a capacidade de executar ou não as emendas dos parlamentares, e em seguidas reduções no poder das medidas provisórias.
Se a Presidência tem ficado mais fraca, a responsabilidade pelo equilíbrio macroeconômico, especialmente pelo equilíbrio fiscal, tem que passar a ser uma atribuição do Congresso Nacional.
Paulo Guedes foi específico: afirmou que os políticos têm muitos privilégios e poucas atribuições, pois não se debruçam sobre o Orçamento. Disse que jogar a decisão para o Congresso era um pedido de ajuda.
Reiterou: “Se a gente aprovar a reforma de Previdência, teremos ainda dez anos de crescimento. Se não aprovarmos, teremos que desindexar e desvincular tudo ou não haverá solução. O bonito é que, se der errado, pode dar certo. Se der errado a aprovação da reforma [da Previdência], é provável que a classe política assuma o comando do Orçamento”.
E se não derem certo a desvinculação e a desindexação? Isto é, e se o Congresso Nacional continuar a fazer greve da política e jogar a economia no abismo inflacionário? Guedes deixou claro que volta para casa.
Mas fica a dúvida. Se até hoje nosso sistema político funcionou com o Executivo sendo responsabilizado pelo eleitor pela estabilidade macro —daí que o interesse pelas reformas é sempre do Executivo, e não do Legislativo—, e o Legislativo, por suas agendas locais, por que agora seria diferente?
Paulo Guedes não oferece resposta a essa pergunta. Sugere que o elevado grau de renovação das Casas legislativas será suficiente para alterar as práticas.
Fica a pergunta para a ciência política: funcionará?
*Samuel Pessôa é pesquisador do Instituto Brasileiro de Economia (FGV) e sócio da consultoria Reliance. É doutor em economia pela USP.
Julianna Sofia: Rotação e translação
Discurso lúcido e franco de Guedes perde força com pragmatismo de Brasília
O discurso preceptoral de Paulo Guedes (Economia) ao assumir a superpasta inflamou a banca financista e a elite empresarial por ser lúcido no diagnóstico e franco nas intenções ultraliberais. Bastou um movimento de rotação para o inescapável choque de Brasília dar contornos mais realistas a alguns dos conceitos guedistas.
Para o economista, se o governo Jair Bolsonaro aprovar em alguns meses a reforma da Previdência, estará garantido por dez anos o crescimento econômico. No dia seguinte, o presidente anunciou na TV que aproveitará a proposta de Michel Temer, mas indicou que suavizará o texto.
Bolsonaro quer tratar da escadinha para fixação de uma idade mínima só para o período de seu mandato; e, a despeito da convergência de regras pretendida por Temer, ele não tratará todos de forma igual. A fala vaga e sem detalhes desanimou investidores porque prenuncia desidratação, reduzindo o efeito fiscal da reforma. Sem reversão da dívida pública, não haverá crescimento.
Guedes ainda discorreu sobre um plano B caso a reforma não vingue. Os parlamentares precisarão ingerir remédio mais amargo e aprovar emenda constitucional para desvincular e desindexar o Orçamento.
O sincericídio foi lido como ameaça ou inabilidade política. Desnecessárias 24 horas para os líderes partidários criticarem o roteiro que juntou na mesma cumbuca temas tabus nos trópicos: aposentadoria, funcionalismo, saúde e educação.
Na parolagem de quarta (2), Guedes atacou a política de desonerações, que verte R$ 300 bilhões/ano. Explorou a necessidade de redução da carga tributária (36% do PIB), pois acima de 20% é o “quinto dos infernos”. Pois bem. Na quinta (3), Bolsonaro assinou prorrogação de benefícios para o Norte e Nordeste, com impacto bilionário por cinco anos. Para compensar, anunciou (e recuou) aumento de imposto num bate-cabeça federal com a área econômica.
O Chicago Oldie precisará modular discurso e ideias para resistir aos solavancos de quatro translações.
Vera Rosa: Divergência revela disputa no governo
Informações desencontradas sobre impostos e Previdência têm como pano de fundo desentendimentos entre Onyx e Paulo Guedes
As idas e vindas em torno do aumento do Imposto sobre Operações Financeiras (IOF) e da proposta de reforma da Previdência revelaram uma disputa interna na equipe do presidente Jair Bolsonaro logo na primeira semana do novo governo. De um lado está o chefe da Casa Civil, Onyx Lorenzoni, e, de outro, o ministro da Economia, Paulo Guedes. O primeiro é o capitão do time e o segundo tem a chave do cofre.
A elevação do IOF para compensar a perda de arrecadação com a extensão de incentivos às regiões Norte e Nordeste, anunciada na sexta-feira, 4, pelo presidente e depois descartada pelo secretário especial da Receita Federal, Marcos Cintra, chegou mesmo a ser cogitada por Guedes. O Estado apurou que o núcleo político do governo teria, no entanto, vencido a queda de braço e conseguido derrubar a proposta, considerada impopular.
No Palácio do Planalto há quem atribua o vazamento da notícia sobre o aumento do IOF ao ministro-chefe da Secretaria Geral da Presidência, Gustavo Bebianno, que faria uma espécie de “dobradinha” com Guedes. Nos bastidores, Onyx e Bebianno disputam o protagonismo nas articulações políticas.
Não é de hoje que o chefe da Casa Civil anda se estranhando com o titular da Economia. Nos últimos dias, Onyx ficou muito contrariado ao saber que Guedes convenceu o PSL de Bolsonaro a apoiar a candidatura à reeleição do presidente da Câmara, Rodrigo Maia (DEM-RJ).
No diagnóstico do ministro da Economia, a recondução de Maia é fundamental para que o governo tenha mais tranquilidade no Congresso e consiga aprovar, por exemplo, a reforma da Previdência. Bebianno tem a mesma avaliação de Guedes e acha até mesmo que alguma mudança nas regras da aposentadoria já poderia ter passado pelo Congresso se o aval a Maia já tivesse sido anunciado.
Resistência
Apesar de ser do DEM, Onyx resistia ao apoio a Maia. Ficou ainda mais irritado ao saber que a aproximação entre o PSL e Maia foi feita por Guedes. Para acalmar o chefe da Casa Civil, deputados eleitos do PSL disseram que foram obrigados a vencer as resistências a Maia porque, caso contrário, o partido de Bolsonaro ficaria isolado, sem assento em comissões estratégicas da Câmara, como Constituição e Justiça e Finanças e Orçamento.
Onyx só se convenceu mesmo depois que integrantes da nova assessoria de apoio parlamentar da Casa Civil – formada por deputados não reeleitos – disseram que, se Maia fosse “ignorado” pelo PSL, criaria muitos problemas para o Planalto em votações.
O ministro da Casa Civil também tem sido o protagonista de informações consideradas desencontradas sobre a proposta de reforma da Previdência. Isso desagrada à equipe técnica que elabora o texto porque aumenta as incertezas em torno da estratégia para a proposta que será apresentada depois que o novo Congresso voltar aos trabalhos, em fevereiro.
A entrevista dada pelo presidente na noite de quinta-feira ao SBT, comentando pontos ainda não definidos da proposta, trouxe preocupação ao mercado, que viu risco de a reforma ser muito branda.
O desencontro, na sexta-feira, na comunicação em torno das mudanças no IOF e das alíquotas do Imposto de Renda da Pessoa Física (IRPF), descartadas no final do dia pelo ministro da Casa Civil, também foi mal recebido pelos investidores.
No final do dia, Onxy tentou corrigir o problema. Segundo ele, Bolsonaro se “equivocou” ao falar do IOF e do IR. “Estava toda uma celeuma no País que era ter aumento de impostos. Não dá para o cidadão que votou no Bolsonaro para não ter aumento de impostos e ter aumento de impostos”, afirmou. /
COLABORARAM ADRIANA FERNANDES, LEONÊNCIO NOSSA, JULIA LINDNER, FELIPE FRAZÃO E IDIANA TOMAZELLI
Míriam Leitão: Inimigos concretos e imaginários
Um ministro da Economia não pode dizer que sabe o que fazer se a reforma da Previdência não for aprovada. Não deve considerar essa possibilidade
O dia de ontem foi de comemoração na economia. O pensamento do ministro Paulo Guedes é conhecido no mercado, mas agora ele o repete como tomador de decisões e avisa que a reforma da Previdência é o primeiro e o maior desafio. O ministro das Minas e Energia, almirante Bento Albuquerque, falou em retomar o processo de privatização da Eletrobras, e Wilson Ferreira foi confirmado na presidência da estatal de energia. Era o que o mercado queria ouvir e isso fez disparar uma onda de otimismo. A bolsa bateu recorde e a ação da Eletrobras decolou.
Ao falar na sua posse no comando do novo e fortalecido Ministério da Economia, Paulo Guedes desfilou por quase uma hora com suas explicações para a história do mundo e do Brasil. O país, disse, vive sufocado pelo excesso de gastos públicos e esse é o centro do problema e por causa dele a economia respira “a falsa tranquilidade da estagnação econômica”.
Na hora de explicar como resolver, Guedes cometeu um deslize político. Disse que a reforma da Previdência será enviada, mas se não for aprovada será mandado o projeto de desindexação de despesas. Na verdade, as duas reformas são importantes, a previdenciária e a orçamentária. Um ministro da Economia não pode dizer que sabe o que fazer se a reforma da Previdência não for aprovada. Simplesmente não pode considerar essa possibilidade de derrota, porque ela seria desastrosa demais. Há a razão fiscal que a torna inexorável, mas há também o outro motivo que o ministro tratou com clareza meridiana:
— A Previdência é uma fábrica de desigualdades. Quem legisla tem as maiores aposentadorias, quem julga, também. O povo tem as menores —disse.
Esse é o motivo mais profundo pelo qual a reforma é fundamental. Ele não é o primeiro a mostrar a Previdência como geradora de desigualdades. O governo que encerrou seu tempo na terça-feira também bateu nesta tecla. Inutilmente. Portanto, é preciso mais e melhores dados e argumentos porque esta é uma causa fundamental para o país. Que Paulo Guedes se volte com essa retórica e os números para convencer primeiro o próprio governo de que ela é necessária para o equilíbrio fiscal e para o combate às desigualdades na distribuição de dinheiro público.
No discurso de ontem, Paulo Guedes, na verdade, propôs, além da reforma da Previdência, um programa com três “D”: desvinculação das receitas, desindexação das despesas, descentralização. Ele erra quando fala de alguns projetos como se fossem alternativos a outros. São complementares:
— O bonito é que se der errado pode dar certo. Se não aprovar a reforma, a classe política pode dar um passo à frente e assumir o Orçamento.
O que ele quer dizer é que se as receitas não forem carimbadas, se não estiverem vinculadas nem foram corrigidas pela inflação passada, o Congresso terá mais poderes porque poderá verdadeiramente elaborar a peça orçamentária. Parece lógico, mas não é assim que a política costuma entender os fatos. Será muito mais difícil do que ele imagina convencer o Congresso dessas mudanças. Há 30 anos o legislativo engessa o Orçamento achando que assim garante o dinheiro para as áreas prioritárias. Como agora dizer que ele deve quebrar o gesso para ser mais forte?
Paulo Guedes apresentou a sua tese conhecida de que tudo o que houve nos últimos 30 anos foi tocado pelo mesmo grupo político. Seria a social-democracia, que agora será substituída pela liberal-democracia. Os rótulos não explicam complexidades. Não se pode dizer que foram semelhantes as políticas econômicas de Pedro Malan e de Guido Mantega, só para citar dois polos bem diferentes entre si. Os liberais que ele lidera tentarão agora fazer reformas que estiveram no projeto de muitos dos seus antecessores no cargo, como Joaquim Levy.
Logo depois de o ministro Paulo Guedes explicar o seu projeto econômico, cheio de desafios concretos, o ministro Ernesto Araújo apresentou no Itamaraty o seu delírio contra os inimigos imaginários. O problema do embaixador Araújo é que ele tem uma visão de mundo bem específica, bem idiossincrática, e a apresenta como sendo a do país. Para ele, o Brasil agora se liberta do globalismo, na opinião dele nosso maior inimigo. Nestas primeiras horas já é possível dizer que o problema do governo Bolsonaro é que ele gasta tempo demais esbravejando contra inimigos inexistentes.
Vera Magalhães: De um lado, diagnóstico e prioridades; de outro, retórica ideológica
No primeiro time se destacaram Sérgio Moro e Paulo Guedes, cujas falas iniciais, densas, técnicas e bem centradas, confirmam a análise de que serão os pilares e os esteios do governo
Os discursos dos ministros de Jair Bolsonaro nas cerimônias de transmissão de cargos ontem em Brasília evidenciaram a existência de dois grupos na Esplanada. De um lado aqueles dotados de superestruturas, equipes afiadas, metas ousadas e prioridades para alcançá-las. De outro, o grupo escolhido por afinidade ideológica com a agenda conservadora com toques de religião, cujas falas primaram pela retórica sem conteúdo prático.
No primeiro time se destacaram Sérgio Moro e Paulo Guedes, cujas falas iniciais, densas, técnicas e bem centradas, confirmam a análise de que serão os pilares e os esteios de um governo que tem na economia seu maior desafio e na segurança e combate à corrupção suas mais poderosas bandeiras.
Moro começou explicando por que trocou a estável carreira de juiz por uma aposta na política (sim, a missão é em última instância política, por menos que ele goste). Avaliou que poderá avançar em sua agenda primordial, a do combate à corrupção, com a estrutura que terá em mãos.
E demonstrou ter consciência de que deve priorizar também o combate ao crime organizado – o que inclui enfrentar o caos nos presídios e o estrangulamento financeiro das facções – e a segurança pública, tão presente nos discursos de Bolsonaro. Tem cacife, inclusive, para mediar os excessos dos bolsonaristas nesta última seara.
Guedes deu uma aula de liberalismo no longo e nem por isso maçante discurso que proferiu ao assumir a tentacular pasta da Economia. De forma didática e desassombrada demonstrou por que a reforma da Previdência é condição sine qua non para o sucesso do governo e o crescimento sustentável da economia.
Não fez a demonização rasa da agenda anterior, ao reconhecer que a alternância de ciclos econômicos é normal e em alguma medida desejável. E, muito importante, demonstrou ter amadurecido no período da transição ao admitir reconhecer que a tarefa pode desencorajar quem, como ele, não conhece os meandros de Brasília e enaltecer a importância da articulação política e da imprensa para o convencimento da sociedade quanto à agenda liberal.
A precisão de diagnóstico e estratégia da dupla destacou ainda mais a inconsistência do outro grupo, no qual a cereja do bolo foi o discurso confuso, cheio de citações que se pretendiam eruditas, mas eram apenas deslocadas e sem relação umas com as outras, do chanceler Ernesto Araújo. Quando a retórica ideologizada toma o lugar das propostas, o resultado é sempre constrangedor. Seja na esquerda dilmista ou na neodireita bolsonaro-olaviana.
Vinicius Torres Freire: Guedes reafirma desmanche do Estado
Ministro toma posse com plano de desfazer 40 anos de estatismo em 4 de Bolsonaro
Paulo Guedes tomou posse com um discurso de combate, no estilo bolsonarista, embora tenha elogiado imprensa e Congresso.
Reafirmou na íntegra a promessa de desmanche do Estado, uma reviravolta histórica que pretende desfazer pelo menos 40 anos de fracassos de uma economia dirigida, disse.
No futuro, que trouxe de modo afobado a valor presente, a carga tributária nacional baixaria em um terço, uma enormidade. O início das reformas neste 2019 bastaria para o país crescer por uma década.
Descontadas as animações futuristas, o ministro da Economia explicou seu programa inicial. Esse plano ainda ambicioso, mas mais pragmático, pareceu mais plausível com a informação de que o bolsonarismo, o centrão e talvez parte da esquerda devem reeleger Rodrigo Maia (DEM) presidente da Câmara, que estava ao lado de Guedes no palco da posse. É uma primeira e crucial aliança política de Bolsonaro.
O mercado se animou com esse caminho luminoso. Com a ajuda do preço do petróleo e da possibilidade de privatização da Eletrobras, a Bovespa decolou, juros e dólar caíram bem.
Guedes indicou que quer reformar a Previdência em dois grandes tempos. Primeiro, a mudança do atual sistema, remendando e aprovando no menor tempo possível o projeto de Michel Temer. A mudança para o sistema de contas individuais de poupança previdenciária (capitalização) ficaria para depois.
Logo de início, o governo tocaria privatizações rápidas e a redução de gastos previdenciários e assistenciais que não depende de mudança constitucional ou mesmo de lei. Em breve, começaria o processo de unificação de impostos federais e a extinção paulatina da CLT.
Enfim, o ministro mantém o projeto de reduzir ao osso a banca estatal, a começar pelo BNDES. Mesmo programas de empréstimos subsidiados (microcrédito) deveriam ser tocados pelo setor privado.
A Caixa deve passar por enxugamento grande também —não disse, mas era possível ouvir tal coisa no governo.
Guedes foi enfático ao dizer que agora começa uma história liberal no Brasil.
Que o excesso de Estado gerou dois bastardos, a corrupção e o dirigismo, que mata o crescimento: “Piratas privados, burocratas corruptos e criaturas do pântano político se associaram contra o povo brasileiro”.
O descontrole do gasto público e más políticas econômicas criaram uma dívida enorme e juros altos, o “paraíso dos rentistas, inferno dos empresários”; provocaram colapsos econômicos variados, de hiperinflação a crises e calotes da dívida externa, que obriga o país até hoje a manter um excesso de reservas internacionais.
Guedes fala tanto de história também porque quer fazer história. No limite da utopia, o governo central seria uma agência reduzida, que teria repassado recursos e tarefas a estados e cidades.
O ar seco de Brasília costuma desidratar planos túrgidos, decerto, mas o ministro parece não estar nem aí.
Convém prestar atenção, até porque a maioria do país acaba de votar em uma mudança radical depois de uma crise de raridade secular, política e econômica.
E se não passar a Previdência? O governo então iria propor a desvinculação geral de todos os gastos federais, saúde e educação inclusive, imensa mudança constitucional.
O ministro sugeriria, pois, lançar uma bomba atômica na terra arrasada que seria a de um governo fracassado na Previdência.
Guedes aprendeu um bom tanto de política desde a campanha. Mas ainda não se graduou, pelo jeito.
Fernando Canzian: Com economia, Bolsonaro pode ser duplamente cruel com a esquerda
Única coisa que nos afasta do crescimento é saber de onde tiraremos os R$ 300 bi para fechar as contas
Não são pequenas as chances de Jair Bolsonaro dar certo na economia. E de implementar por um bom tempo uma agenda de retrocessos em outras áreas. Sobretudo em temas caros à esquerda.
Além de ter perdido a eleição, a esquerda pode ficar à deriva por um longo período caso a equipe de Bolsonaro consiga entregar o contrário do que o PT propôs na campanha —mais gastos estatais para tirar o país da crise e a não urgência na reforma da Previdência.
O paradoxo hoje é o seguinte: o Brasil nunca esteve tão quebrado, precisando de quase R$ 300 bilhões por ano para conter a trajetória explosiva da dívida pública. Por outro lado, raramente teve condições tão propícias para voltar a crescer.
Apesar do endividamento estatal recorde (próximo a 80% do PIB), os juros básicos pagos a quem financia a dívida pública (todos os que têm alguma aplicação no banco) estão em 6,5% ao ano. Com uma inflação de 4%, o juro real é de 2,5% --algo muito baixo para nossos padrões.
Há uma capacidade produtiva inutilizada nas empresas de 25%, ante a média mais apertada pré recessão de 17%. Isso permite que o consumo volte a crescer —e as empresas a produzir mais— sem pressões sobre a inflação.
No setor externo, que no passado nos levou repetidamente ao FMI, a situação é invejável. Há US$ 380 bilhões em reservas (acumuladas pelo PT) e expectativa de saldo comercial acima de US$ 60 bilhões neste ano —valor próximo ao que deve entrar também em investimentos.
Em resumo, a única coisa que nos afasta do crescimento é saber de onde tiraremos os R$ 300 bilhões para fechar as contas. Eles podem vir de uma mistura de corte de gastos, aumento de impostos e de uma arrecadação maior caso o crescimento acelere.
Na equipe montada por Paulo Guedes (Economia) encontram-se alguns dos melhores técnicos da praça. Muitos são funcionários de carreira que têm, há anos, um diagnóstico bastante coerente dos problemas. Entre eles:
1) a produtividade do trabalho cresce em ritmo muito lento, com alta de apenas 17% em 20 anos, ante 34% na média dos países desenvolvidos;
2) gastos com a Previdência equivalentes a 8% do PIB, mais que o dobro do percentual em países com demografia parecida com a nossa;
3) despesas da máquina federal que dobraram para 19,5% do PIB nos últimos 25 anos, também pela remuneração de servidores, que aumentou até três vezes acima do que é pago no setor privado.
Atacar esses pontos exigirá mexer diretamente na máquina pública e em quem forma as bases dos partidos de esquerda no Brasil, como funcionários públicos representados pela CUT e seus sindicatos.
Se der certo, Bolsonaro não só pode alijar por um bom tempo a esquerda do poder. Mas chegar a isso minando justamente o seu principal terreno.
*Fernando Canzian é jornalista, autor de "Desastre Global - Um Ano na Pior Crise desde 1929". Vencedor de quatro prêmios Esso.
O Globo: Veja os destaques do primeiro discurso do superministro da Economia
Com frases de efeito, Paulo Guedes fez diagnóstico da situação econômica do país e apontou caminhos a serem seguidos
Por Marcello Corrêa, de O Globo
BRASÍLIA — Durante a cerimônia de transmissão de cargo, o novo ministro da Economia, Paulo Guedes, fez um diagnóstico dos problemas econômicos enfrentados pelo país e apontou os caminhos que serão seguidos no governo Jair Bolsonaro. Com frases de efeito, Guedes fez críticas às gestões anteriores — que expandiram os gastos públicos —, à legislação trabalhista e ao estado atual da Previdência.
“O Brasil foi corrompido pelo excesso de gastos”
Na avaliação de Guedes, o descontrole de gastos obrigatórios diminuiu a capacidade do Estado de promover o crescimento, por meio de investimentos
“O Brasil deixará de ser o paraíso dos rentistas e inferno para empreendedores”
Em referência aos gastos com a dívida pública, que chegam a R$ 400 bilhões
“Ideal era termos 20% do PIB de carga tributária, acima disso é o quinto dos infernos”
O ministro critica o peso dos impostos na economia, hoje acima de 30%.
“A Previdência é fábrica de desigualdades. Quem legisla e julga tem as maiores aposentadorias e o povo brasileiro tem as menores”
Para Guedes e outros especialistas, além do impacto fiscal, o atual sistema de Previdência gera desigualdades, principalmente entre servidores e trabalhadores da iniciativa privada
“A classe política é criticada por ter muitos privilégios e poucas atribuições”
Guedes defende mais responsabilidade para a classe política, inclusive na definição das prioridades dos gastos públicos
“Essa insistência no Estado como motor de crescimento produziu essa expansão de gastos públicos, corrompendo a política e estagnando a economia. São dois filhos bastardos do mesmo fenômeno”
Para Guedes, é preciso uma guinada para a economia de mercado, em que o Estado tenha um papel menor, a base do pensamento liberal
“O governo democrático vai inovar e abandonar a legislação fascista da carta del Lavoro”
Paulo Guedes quer rever mais uma vez a legislação trabalhista. A referência é ao conjunto de regras adotadas na Itália no período fascista. Críticos afirmam que o texto inspirou a CLT brasileira
O Estado de S. Paulo: Guedes alfineta membros de Judiciário e Legislativo por resistência contra reformas
Em seu primeiro discurso, ministro da Economia criticou excesso de gastos e classificou a Previdência brasileira como ‘fábrica de desigualdades
Por Idiana Tomazelli, Adriana Fernandes, Eduardo Rodrigues e Lorenna Rodrigues, de O Estado de S. Paulo
Prestes a encarar um longo processo de negociações para aprovar reformas estruturais como a da Previdência, o ministro da Economia, Paulo Guedes, usou seu primeiro discurso à frente da pasta para criticar a associação de “piratas privados, burocratas corruptos e criaturas do pântano político” contra o interesse público. Ele ainda alfinetou integrantes do Judiciário, que resistem às mudanças nas regras de aposentadoria e pensão, e do Legislativo, que no mandato atual também impuseram obstáculos à aprovação da reforma, ao dizer que são justamente eles os mais privilegiados pelas regras atuais.
Guedes criticou o excesso de gastos no Brasil e afirmou que o contínuo avanço nas despesas “corrompeu” o País. “Não foi no crédito que os bancos públicos se perderam, mas nos grandes programas onde piratas privados, burocratas corruptos e criaturas do pântano político se associaram contra o povo brasileiro”, disse o ministro, despertando a reação acalorada da plateia de banqueiros, empresários, representantes de associações setoriais e parlamentares que acompanhavam a cerimônia de transmissão de cargo realizada nessa quarta-feira, 2, em Brasília.
O ministro aproveitou a presença no palco do presidente da Câmara dos Deputados, Rodrigo Maia (DEM-RJ), e de atuais e futuros congressistas na plateia para pedir ajuda da classe política na aprovação das reformas. O presidente do Supremo Tribunal Federal (STF), Dias Toffoli, também participou do início da cerimônia, mas já havia deixado a solenidade quando Guedes fez um discurso duro em defesa desse apoio, afirmando que a Previdência brasileira é hoje uma “fábrica de desigualdades”. “Quem legisla e julga tem as maiores aposentadorias, e a população, as menores”, disse Guedes, novamente muito aplaudido.
Os servidores públicos que ingressaram até 2003 ainda podem hoje se aposentar com o último salário da carreira e com reajustes iguais aos funcionários da ativa. Na reforma já em tramitação no Congresso, houve uma tentativa de endurecer as regras para esse grupo, mas o forte poder de lobby dessas categorias acabou travando o avanço da proposta.
“O governo não controla seus próprios gastos, dá aumento generalizados de salários, aposentadorias para quem já tem estabilidade de emprego são generosas (…). O governo se endivida em bola de neve para financiar isso. Esse governo age como se não existisse amanhã”, criticou o ministro, que defende mudanças profundas na atuação do Estado.
Guedes também disparou contra o uso de recursos públicos para “comprar influência parlamentar” e disse que o governo do “capitão” Jair Bolsonaro é o caminho da reabilitação da classe política. Ele reforçou que o Congresso tem que assumir o papel das escolhas no Orçamento – hoje, as despesas são autorizadas e cabe ao Executivo decidir o que será prioridade, o que abre brechas para o toma lá, dá cá. “A classe política é criticada por ter muitos privilégios e poucas atribuições”, disse.
Para Guedes, o resultado das eleições deu o recado aos políticos de que eles “não estão conseguindo ajudar o País”.
Os 22 ministros de Bolsonaro: ala ultraliberal, militares e só 2 mulheres
Paulo Guedes, Sergio Moro e Onyx Lorenzoni encabeçam o time do primeiro escalão formado pelo novo chefe do Executivo
Técnicos, políticos de carreira, militares e até um astronauta. O Ministério de Jair Bolsonaro conta com perfis diversos, porém comprometidos com as determinações do presidente para uma guinada liberal na economia e conservadora nos costumes, nas relações internacionais e nas políticas de segurança. Por enquanto, a única missão estipulada pelo comandante a seus subordinados é elaborar, nos primeiros dez dias de governo, um relatório sobre suas respectivas pastas – além de sugestões de medidas imediatas, incluindo a revogação de atos dos últimos meses da gestão Temer. Conheça os 22 ministros nomeados por Bolsonaro.
1) Economia – Paulo Guedes
Economista formado pela Universidade de Chicago, Paulo Guedes é chamado por Bolsonaro de seu “posto Ipiranga”, o local onde ele poderia resolver qualquer pendência ou dúvida econômica. É um técnico com poucos laços políticos e o nome mais poderoso da Esplanada depois do presidente. Tem montado uma equipe de economistas liberais, como ele, muitos com passagem pela ortodoxa Chicago. É ferrenho defensor da privatização de todas as empresas estatais. Sua pasta é um dos superministérios de Bolsonaro, pois será a fusão dos ministérios da Fazenda, do Planejamento e de Indústria e Comércio Exterior.
2) Casa Civil – Onyx Lorenzoni
Deputado federal há seis legislaturas, Onyx Lorenzoni se aproximou de Bolsonaro nos últimos quatro anos. Ele encampou a candidatura presidencial do capitão reformado e passou a fazer jantares em sua casa, em Brasília, para discutir as estratégias. Na primeira reunião, havia menos de dez comensais. Na última, quase uma centena. Filiado ao DEM, Lorenzoni será o elo de Bolsonaro com o Congresso Nacional. É quase tão explosivo como seu chefe. Admitiu ter recebido caixa dois da JBS na campanha eleitoral de 2014, mas a investigação foi arquivada.
3) Justiça e Segurança Pública – Sérgio Moro
Juiz estrela da Operação Lava Jato, Sérgio Moro abandonou 22 anos de magistratura para fazer parte de um Governo. Ele foi o responsável por condenar centenas de políticos, empreiteiros, lobistas e doleiros que desviaram recursos públicos, principalmente da Petrobras. Foi por conta de uma decisão dele, que o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) foi preso e, após condenação em segunda instância, foi retirado da disputa eleitoral de 2018. No ministério, tem se cercado de antigos companheiros de Lava Jato, principalmente policiais federais.
4) Gabinete de Segurança Institucional – Augusto Heleno
Ex-comandante da missão de paz no Haiti, o general Augusto Heleno é considerado o principal estrategista de Jair Bolsonaro. Foi ele quem coordenou uma equipe de 50 profissionais que elaboraram o plano de Governo do então candidato. Chegou a ser anunciado como ministro da Defesa, mas o presidente eleito decidiu que o queria mais próximo de seu gabinete e o “promoveu” ao GSI. Será o responsável por todas as atividades de inteligência da gestão federal.
5) Defesa – Fernando Azevedo e Silva
Considerado o mais político dos generais, Fernando Azevedo e Silva já ocupou cargos nos três poderes. Foi assessor legislativo do Exército, autoridade pública olímpica na gestão Dilma Rousseff (PT), ajudantes de ordem do presidente Fernando Collor (PTC) e, antes de aceitar o convite de Bolsonaro, era assessor especial do presidente do Supremo Tribunal Federal, Dias Toffoli. Seu primeiro ato no cargo foi valorizar a hierarquia militar e nomear como futuros comandantes das forças os oficiais mais antigos de cada corporação, Exército, Aeronáutica e Marinha.
6) Secretaria-Geral da Presidência – Gustavo Bebianno
Quando Bolsonaro decidiu se filiar ao PSL, precisava de alguma segurança para tocar sua campanha eleitoral. Sugeriu que o então presidente da legenda, Luciano Bivar, cedesse a direção para alguém em que o presidenciável confiasse. Foi aí que o advogado Gustavo Bebianno se destacou no cenário nacional. Profissional com passagem pelo departamento administrativo do Jornal do Brasil, Bebianno se aproximou do político no Rio de Janeiro. Sem nenhuma experiência em grandes campanhas, coordenou os trabalhos de Bolsonaro e controlou com mão de ferro boa parte dos diretórios regionais. Será o responsável pela espécie de prefeitura do Palácio do Planalto.
7) Relações Exteriores – Ernesto Araújo
Trumpista e antiglobalista, o embaixador Ernesto Araújo chegou ao topo da carreira diplomática sem nunca ter ocupado uma função de relevância no exterior. Até ser indicado para o ministério, ele ocupava um cargo de terceiro escalão no organograma do Itamaraty. Adquiriu a confiança de Bolsonaro por ter um blog em que se posiciona de maneira similar ao do presidente eleito. E por ter feito campanha para ele. Também foi indicado pelo escritor Olavo de Carvalho. Seu desafio será o de reduzir o impacto de falas polêmicas de Bolsonaro como a que a China compra o Brasil e não do Brasil. Caberá a ele também orientar o presidente na decisão de trocar a embaixada brasileira em Israel de Tel Aviv para Jerusalém.
8) Saúde – Luiz Henrique Mandetta
Médico ortopedista, Luiz Henrique Mandetta (DEM) cumpre seu segundo mandato como deputado federal. Não concorreu à reeleição por discordar dos rumos de seu partido no seu Estado, Mato Grosso do Sul. Auxiliou Bolsonaro na pré-campanha dando sugestões de projetos de saúde. Responde a uma investigação por fraude no período em que foi secretário municipal de Saúde em Campo Grande (MS).
9) Secretaria de Governo – Carlos Alberto dos Santos Cruz
General que chefiou missões de paz no Haiti e no Congo, Santos Cruz será o interlocutor de Bolsonaro para os assuntos relacionados à segurança pública. O ministério que ocupará costuma ser ocupado por um articulador político. É a primeira vez que um militar estará neste posto. Santos Cruz chegou a ser cotado para a Secretaria Nacional de Segurança.
10) Ciência e Tecnologia – Marcos Pontes
Tenente-coronel da Aeronáutica e primeiro astronauta brasileiro, Marcos Pontesé mais um da cota militar de Jair Bolsonaro. Desde a pré-campanha já era apontado como futuro ministro. Lançou a ideia de que o ensino superior passasse a ser administrado por sua pasta, mas depois das reações da academia, recuou na proposta.
11) Agricultura – Tereza Cristina
A única mulher a ocupar um cargo na esplanada até o momento, a deputada federal e produtora rural Tereza Cristina (DEM) foi indicada ao cargo pela bancada ruralista. Presidente da Frente Parlamentar Agropecuária, ela declarou apoio à candidatura de Bolsonaro na reta final da campanha. A futura ministra é investigada por conceder benefícios fiscais à JBS no período em que foi secretária estadual em Mato Grosso do Sul.
12) Controladoria Geral da União – Wagner Rosário
Técnico de carreira, Wagner Rosário é o atual ministro da Transparência do Governo Michel Temer. Por um ano ocupou o cargo de maneira interina. Formado em ciências militares pela Academia Militar dos Agulhas Negras (AMAN), a mesma de Bolsonaro, ele abandonou a atividade no Exército para se tornar auditor federal. Foi o primeiro funcionário de carreira a ocupar o ministério.
13) Educação – Ricardo Vélez Rodríguez
Um liberal crítico ao PT, o filósofo Ricardo Vélez é colombiano, naturalizado brasileiro. Não era o favorito para assumir o ministério da Educação. Seu nome surgiu depois que a bancada evangélica refutou o nome de Mozart Neves Ramos, diretor do Instituto Ayrton Senna e ex-secretário de Educação de Pernambuco que foi apontado erroneamente como um professor de esquerda. Vélez é a favor do projeto Escola Sem Partido. Foi um dos dois indicados pelo escritor Olavo de Carvalho, um dos ideólogos do bolsonarismo.
14) Infraestrutura – Tarcísio Gomes de Freitas
O futuro ministro da Infraestrutura, pasta responsável pelos setores de transporte aéreo, terrestre e aquaviário, é consultor legislativo na Câmara. É formado em Engenharia Civil pelo Instituto Militar de Engenharia (IME) e iniciou a carreira no Exército. Atuou como chefe da seção técnica da Companhia de Engenharia do Brasil na Missão de Paz da ONU, como coordenador-geral de Auditoria da Área de Transportes da Controladoria-Geral da União (CGU) e foi diretor executivo do Departamento Nacional de Infraestrutura de Transportes (DNIT), cargo para o qual foi nomeado ainda no Governo Dilma Rousseff, em 2011.
15) Cidadania e Ação Social – Osmar Terra
Osmar Terra, ex-ministro do Desenvolvimento Social do Governo Michel Temer foi escolhido por Bolsonaro para ocupar o Ministério da Cidadania, ainda a ser criado pelo presidente eleito. Deputado federal pelo MDB do Rio Grande do Sul, o médico comandará a pasta que deve concentrar atribuições antes administradas pelos ministérios da Cultura, do Esporte e do Desenvolvimento Social.
16) Turismo – Marcelo Álvaro Antonio
O Ministério do Turismo será comandado pelo deputado federal e integrante da Frente Parlamentar Evangélica da Câmara, Marcelo Álvaro Antônio, do PSL-MG, partido da base aliada de Bolsonaro na Câmara. Ex-filiado de PRP, PMB e PR, ele chegou a estudar engenharia civil em Belo Horizonte, mas não concluiu o curso.
17) Minas e Energia – Bento Costa Lima Leite
O presidente Jair Bolsonaro anunciou via Twitter a escolha de Bento Costa Lima Leite de Albuquerque Junior para chefiar o ministério de Minas e Energia. Ele é Diretor Geral de Desenvolvimento Nuclear e Tecnológico da Marinha e Almirante de Esquadra. Chefiou os programas Nuclear da Marinha (PNM) e o de Desenvolvimento de Submarinos (Prosub).
18) Desenvolvimento Regional – Gustavo Canuto
A nova pasta do Governo, que vai incorporar as atribuições dos ministérios da Integração Nacional e das Cidades, será comandada por Gustavo Henrique Rigodanzo Canuto. Servidor de carreira no Ministério do Planejamento, ele é especialista em Políticas Públicas e Gestão Governamental. Foi chefe de gabinete do Ministério da Integração Nacional e da Secretaria de Aviação Civil.
19) Mulher, Família e Direitos Humanos – Damares Alves
Damares Alves era uma desconhecida quase completa até ser anunciada como indicada ao novo ministério, que abrigará também a Fundação Nacional do Índio (Funai). Pastora da Igreja do Evangelho Quadrangular, a advogada era desde 2015 assessora parlamentar do senador Magno Malta (PR), uma das principais figuras da bancada evangélica e, até então, o principal cotado para a pasta.
20) Meio Ambiente – Ricardo Salles
Presidente do Movimento Endireita Brasil, o advogado Ricardo de Aquino Salles comandará o Ministério do Meio Ambiente. Filiado ao Partido NOVO, ele já foi secretário particular do ex-presidenciável Geraldo Alckmin e ocupou também a pasta de Meio Ambiente de São Paulo durante o Governo do tucano. Salles é alvo de ação de improbidade administrativa, acusado de manipular mapas de manejo ambiental do rio Tietê, e, durante a campanha eleitoral deste ano, chegou a sugerir o uso de munição de fuzil contra a esquerda e o MST.
21) AGU – André Luiz de Almeida Mendonça
Conhecido como Mendonção, o novo chefe da Advogacia-Geral da União é formado em direito pela Faculdade de Direito de Bauru e estudou sobre corrupção na Universidade de Salamanca, na Espanha. Com longa trajetória na AGU, já foi Corregedor-Geral, Adjunto do Procurador-Geral da União e Diretor do Departamento de Patrimônio e Probidade. Seu último cargo foi como assessor especial da Controladoria Geral da União (CGU).
22) Banco Central – Roberto Campos Neto
Diretor do banco Santander e especialista em finanças pela Universidade da Califórnia, Roberto Campos Neto tem seu currículo marcado por experiências na iniciativa privada. Ele é neto de Roberto Campos, economista liberal que foi ministro do Planejamento durante a ditadura militar, no governo de Castelo Branco.
Bruno Boghossian: As barreiras políticas aos planos de Moro e Guedes
Parlamentares resistem a mudanças na lei e cortes propostos pelos novos ministros
O instinto de sobrevivência dos políticos será um obstáculo para os planos das principais estrelas do próximo governo. As propostas de Sergio Moro (Justiça) e Paulo Guedes (Economia) para endurecer as leiscontra o crime de colarinho branco e cortar gastos públicos não costumam fazer sucesso em Brasília.
Não foram poucos os casos em que deputados e senadores tentaram articular a aprovação de uma anistia ao caixa dois, por exemplo. Em novembro, depois da eleição de Jair Bolsonaro, caciques partidários se reuniram para uma última investida, mas o esforço fez água mais uma vez.
É improvável que o novo Congresso se atreva a insistir na ideia, mas também não se deve esperar adesão automática dos parlamentares à agenda de Moro. Movidos pelo espírito de corpo ou por orientações partidárias, os políticos apresentam resistência a medidas que possam colocar o establishment em risco.
Mesmo congressistas alinhados ao governo Bolsonaro manifestam relutância. Alguns deles querem atrelar os planos do novo ministro a propostas que punem juízes e procuradores por abuso de autoridade, além de regras mais rígidas para o cumprimento do teto salarial no Judiciário.
A missão de Paulo Guedes também não é fácil. Deputados e senadores são especialistas em ampliar despesas para direcionar obras e dinheiro para suas bases eleitorais, mas o chefe da equipe econômica passou os últimos meses afiando a faca.
Guedes já deu passos importantes para desobstruir seu caminho. Nomeou um deputado para sua equipe e abriu canais com dois personagens da elite parlamentar: Rodrigo Maia e Renan Calheiros. A dupla, candidata a presidir a Câmara e o Senado a partir de 2019, retribuiu os acenos.
A lei da sobrevivência política ainda pode impor aos congressistas uma mudança de cálculos. Moro é um personagem popular e a economia precisa de medidas duras para voltar aos trilhos. Se o país não crescer e os políticos continuarem barrando medidas anticorrupção, poucos vão se reeleger em 2022.
Elio Gaspari: O ‘Posto Ipiranga’ de Bolsonaro piscou
Faltando menos de um mês para a abertura da quitanda de Jair Bolsonaro, o futuro ministro da Economia, Paulo Guedes, ainda não equilibrou o estoque de berinjelas e a caixa para o troco. No dia 2 de janeiro terminará o mundo das promessas eleitorais e dos sonhos da formação da equipe. Quem lembra, sabe que Bolsonaro prometeu enxugar o número de ministérios, e Guedes falava em “dez ou doze”. Foram 34, são 29 e serão 22.
Na segunda-feira o doutor disse que “o Brasil virou o paraíso dos burocratas”. Àquela altura ele pretendia indicar Marcelo de Siqueira, diretor do BNDES, para o comando da Procuradoria da Fazenda. Funcionários da repartição ameaçaram deixar centenas de cargos em comissão caso não fosse escolhido um servidor da carreira.
Na quarta, Guedes mudou de ideia e indicou um procurador com 18 anos na carreira e currículo robusto na administração federal. Noutro lance, o doutor informou que criará um conselho para discutir o projeto de reforma da Previdência. Entre os futuros conselheiros estariam os economistas Paulo Tafner e Armínio Fraga. Mesmo assim, ganha um fim de semana em Caracas quem souber qualquer coisa que foi resolvida num conselho.
Quando não tinham o que fazer, Lula, Dilma e Michel Temer reuniam o Conselho de Desenvolvimento, conhecido como “Conselhão” e formado por ministros, empresários e celebridades.
Spektor procura e acha
Um dia depois da divulgação pelo Departamento de Estado do governo americano de 1.085 páginas de documentos diplomáticos, o professor Matias Spektor já estava debruçado sobre o volume. Nele estão centenas de papéis relacionados com a América do Sul entre 1977 e 1980. Mostram as pressões americanas em defesa dos direitos humanos na Argentina, Chile, Uruguai, Brasil e Paraguai. Alguns documentos expõem parte do que os Estados Unidos sabiam sobre a Operação Condor. Os textos relacionados com o Brasil são 28. Entre eles estão as notas das conversas dos Geisel e Jimmy Carter com sua mulher, Rosalynn.
Um memorando de março de 1979 mostra que no coração da Casa Branca havia um combativo defensor das liberdades públicas. Era o jovem professor Robert Pastor, amigo de Carter, instalado na assessoria de segurança nacional. Em 1979, quando estourou uma das grandes greves do ABC paulista e o governo interveio no Sindicato dos Metalúrgicos de São Bernardo, presidido por Lula, o embaixador americano Robert Sayre justificou publicamente a ação e Pastor foi-lhe na jugular:
“Relatos da imprensa sugerem que o senhor conversou com o presidente Figueiredo sobre essa greve, apoiando a decisão. Se a embaixada for perguntada, deve deixar publicamente claro que o assunto não foi discutido com o senhor e que nós não apoiamos tais ações.
Nosso cônsul-geral em São Paulo deve acompanhar esses acontecimentos, usando as oportunidades apropriadas para mostrar o apoio dos Estados Unidos aos direitos trabalhistas”. Pastor era demonizado pelos olheiros da ditadura em Washington e morreu em 2014, aos 66 anos. Não se sabe se a sugestão foi mandada a Sayre.
(O volume 24 da coleção “Foreign Relations of the United States —1977-1980” está na rede.)
CARNAVAL
Um sueco veio ao Brasil para as festas de fim de ano e leu as notícias do dia:
1) Num início da tarde o ministro Marco Aurélio de Mello mandou soltar os presos condenados na segunda instância. No início da noite o presidente do Supremo mandou que eles continuassem presos.
2) O deputado Rodrigo Maia, no exercício da Presidência da República, autorizou o esburacamento da Lei de Responsabilidade Fiscal.
3) O ministro Ricardo Lewandowski determinou que a União pague o aumento dos servidores já em 2019.
O sueco telefonou para seu agente de viagens reclamando porque ele o trouxe ao Brasil no Carnaval.
LULA PRESO
Quando o ministro Dias Toffoli marcou para 10 de abril a discussão do encarceramento dos réus condenados na segunda instância, sinalizou uma má notícia para Lula. Antes de 10 de abril Lula poderá ter sua condenação confirmada pelo Superior Tribunal de Justiça . Neste caso, mesmo que a segunda instância caia, ele continuará em Curitiba. A menos que peça para cumprir a pena em regime domiciliar.
FALTA A SAFRA
Com algum barulho, Gilberto Kassab, futuro chefe da Casa Civil do governador paulista João Doria, viu-se acusado de ter embolsado R$ 30 milhões de propinas da JBS. No mesmo lance, o grão tucano Aécio Neves foi acusado de ter recebido quatro capilés da mesma fonte, um deles em caixas de sabão em pó.
Tudo bem. Essas acusações estão desde 2017 nos 118 anexos da colaboração da JBS. Deles, só 46 tiveram desdobramentos. A turma das investigações deveria seguir o padrão dos fabricantes de vinho, rotulando cada denúncia com o ano da safra. Assim, o público saberia a idade da acusação.
BANCOS E MAGANOS
Primeiro alguns bancos estrangeiros pediram a clientes do andar de cima brasileiro que fechassem suas contas. Depois, pediram a empresas que suspendessem suas operações com a Venezuela. Agora, quando um cliente tem notável militância na política e no mundo dos negócios, sugerem que fechem os escritórios eleitorais. Casas tradicionais voltam a operar com a lei segundo a qual não se deve operar com gente dos três Ps, “press, politicians e priests” (imprensa, políticos e padres).
INFRAESTRUTURA
A escolha do consultor legislativo Tarcísio Freitas para o Ministério da Infraestrutura sugere a possibilidade de fechamento da fábrica de jabutis das empreiteiras que funciona no Congresso. Freitas é o primeiro consultor legislativo a chegar a um ministério e conhece a máquina do Parlamento. Depois de Bolsonaro, ele é o segundo capitão do governo. Serviu na tropa depois de cursar o Instituto Militar de Engenharia, onde diplomou-se com inédito louvor.
Mesmo antes de assumir, Freitas desmanchou uma bombinha que estava prestes a ser aprovada.
POUPATEMPO
Um curioso tem uma sugestão para os sábios da equipe de Jair Bolsonaro. Ele deveria mandar uma força-tarefa de Brasília ao serviço de Poupatempo do governo de São Paulo. Trata-se de uma repartição pública onde conseguem-se, entre outros documentos, carteiras de motorista, identidade e trabalho. O posto mais movimentado fica no coração da cidade. Dezenas de funcionários atendem os contribuintes com solicitude e resolvem qualquer problema. É um serviço público que funciona. A força-tarefa não precisa falar com os chefes. Basta entrevistar o pessoal da infantaria, que fica nos balcões. Se for o caso, poderiam levar equipes do Poupatempo a Brasília, para ensinar como se pode trabalhar.