opinião

Germano Martiniano: O abstrato e a realidade

Há algumas semanas José Mojica visitou a cidade de Franca/SP para participar da XIV Semana de Relações Internacionais da UNESP. O evento aconteceu na tradicional escola Pestalozzi. Se eu fosse escrever sobre o evento em si sei que estaria um tanto quanto atrasado. No entanto, minha intenção é usar a palestra e as palavras de Mojica como analogia para a atual realidade.

O ex-presidente do Uruguai é de uma eloquência e retórica magistrais, soube prender a atenção do público mesmo não falando português. Seu discurso abordou vários temas, que horas se pôde ver um estadista, propondo saídas para o fortalecimento da economia da América Latina através da integração econômica para fazer frente às grandes potências mundiais; perpassou pela crítica ao sistema capitalista que nos oferece o que há de melhor em tecnologia, mas que é incapaz de usa-la a favor da equidade social; até chegar ao discurso motivacional do homem simples, bucólico, que valoriza as pequenas coisas da vida como valores essenciais para felicidade.

Em linhas gerais, Mojica não propôs caminhos, não discorreu sobre vias políticas para que pudéssemos chegar a uma sociedade mais igualitária, apenas apontou onde devemos chegar. Estes aspectos não diminuem a riqueza de seu conhecimento e sua palestra. Entretanto, e talvez nem por falha do ex-presidente uruguaio, a ausência de aspectos técnicos de como se alcançar a sociedade que ele deseja, abriu espaço para a instrumentalização do seu discurso. O “Fora Temer e o Não Vai Ter Golpe” ressoaram no evento como premissa indispensável para se alcançar a sociedade sonhada por Pepe. Perdeu-se assim uma ótima oportunidade de discorrer e refletir, dentro do pluralismo democrático, o imenso conhecimento do ex-presidente e as várias vias que existem para um Brasil mais equânime!

A presença de Pepe em Franca foi e é simbólica para nosso atual momento, julgamento do impeachment de Dilma Roussef, pois mostra o quanto parte da nossa população ainda é imatura politicamente ao negar o pluralismo democrático. O abstrato e a realidade ainda andam distantes em terras tupiniquins. Sonha-se com a democracia, mas rejeita-se as implicações que a mesma traz. Prefere-se o jogo de acusações, do que aprofundar-se no conhecimento. No final, este é o Brasil que conhecemos, sempre procurando a lei do menor esforço!


Por: Por Germano de Souza Martiniano, formado em Relações Internacionais pela UNESP Franca e assessor de comunicações da Fundação Astrojildo Pereira.


Expurgo na Venezuela

A demissão de funcionários contrários a Maduro é inaceitável

O expurgo político exigido na administração pública venezuelana pelo presidente Nicolás Maduro viola os mais elementares princípios democráticos, além da própria Constituição e da legislação do país. É uma agressão intolerável contra o princípio da liberdade de pensamento que deve existir em qualquer democracia e desenha um quadro sombrio sobre até onde o presidente venezuelano está disposto a chegar para permanecer no poder.

Na semana passada, num discurso ameaçador contra a oposição, Maduro se gabou de que o presidente turco, Recep Tayyip Erdogan, pareceria “um bebê de colo” ao ser comparado com ele no que se refere a expurgos na administração do Estado. Na segunda-feira Maduro ordenou que no prazo de 48 horas fossem despedidos todos os funcionários, a partir de certo nível, que tivessem apoiado com sua assinatura o pedido de realização de um referendo revogatório sobre sua presidência. A medida afeta cerca de 19.000 pessoas, um terço de todos os cargos de direção da administração venezuelana.

Os expurgos que Erdogan está realizado são, em muitos casos — como entre os professores —, mais do que questionáveis e abertamente criticáveis, mas deveria ser lembrado a Maduro que enquanto a Turquia sofreu uma tentativa de golpe de Estado, na Venezuela quem está violando a legalidade é o próprio Executivo, com a existência de presos políticos, julgamentos farsa, boicote ao Parlamento e agora as tentativas de boicote por todos os meios à convocação de um referendo sobre a figura presidencial — mecanismo concebido precisamente por Hugo Chávez, incluído na Constituição venezuelana e usado como uma das principais propagandas com as quais o chavismo obteve o poder nas urnas. Embora os cargos afetados sejam de livre designação, a medida poderia violar inclusive um decreto-lei assinado pelo próprio Maduro sobre a “imobilidade trabalhista” ao introduzir uma motivação inconstitucional como é a discriminação ideológica.

As mais de 400.000 assinaturas depositadas junto ao Poder Eleitoral venezuelano que, cumprindo a lei, pedem a realização de uma consulta vinculante — eram necessárias 200.000 — não foram apresentadas com o fim de que o aparelho do Governo as coteje e adote represálias contra aqueles que deram seu nome e seu número de identificação para apoiar a iniciativa. Nenhum dos signatários violou qualquer lei. No entanto, foram difamados repetidamente pela propaganda oficial. O número dois do regime, Diosdado Cabello, pediu três vezes durante este mês a demissão agora anunciada, chamando os signatários de “asquerosos”.

Maduro está recorrendo a todos os tipos de artimanhas para atrasar a realização do referendo. Se este acontecer depois de 10 de janeiro e o presidente perder, não será necessário convocar novas eleições e Maduro seria substituído por seu vice-presidente. A perseguição àqueles que pedem uma consulta legal e sua demonização como “inimigos da revolução” é uma prática inaceitável de um Governo que, nas urnas, já perdeu a confiança de seu povo.


Fonte: El País


Perdas e danos

Em dez anos, Lei de Drogas superlotou presídios e foi incapaz de reduzir as redes de tráfico

Há dez anos o Brasil aprovava um novo marco legal para o combate às drogas. A Lei 11.343/2006 nascia com a perspectiva de intensificar penas para o crime de tráfico e reduzir a criminalização dos usuários. Seu efeito, porém, mostrou-se desastroso: cadeias superlotadas, mais mulheres nas prisões e criminalização da população negra e pobre. Por outro lado, não há nenhum indicador de que as redes de tráfico tenham sido coibidas.

De 2005 até dezembro de 2014, segundo dados do Ministério da Justiça, a população carcerária teve um salto vertiginoso de 111,4%, ultrapassando a marca de 620 mil presos. Isso colocou o Brasil na vergonhosa posição de quarto país com a maior população carcerária do mundo, atrás apenas dos EUA, China e Rússia.

Em 2005, o porcentual de pessoas incriminadas por tráfico de drogas correspondia a 11% da população carcerária. Em 2014, segundo dados do Infopen, esse número alcançou 27%. Se considerarmos apenas as mulheres, o impacto foi ainda mais cruel: 64% das presas no Brasil respondiam por tráfico de drogas.

O grande responsável por essa desastrosa situação foi o aumento da pena mínima de três para cinco anos, mesmo para pequenos traficantes. Soma-se a isso a relutância dos juízes em aplicar a diminuição de pena para réus primários e a insistência no encarceramento, muito embora o Supremo Tribunal Federal já tenha decidido que a equiparação a crime hediondo não impede a aplicação de penas alternativas, como ocorre para outros crimes não violentos como o furto.

O resultado é uma distorção racista e classista, já enraizada na cultura brasileira, mas bastante escancarada no sistema prisional: embora não existam dados sociodemográficos específicos dos presos por tráfico de drogas, o perfil geral da população prisional brasileira é composto majoritariamente por negros (61,6%) e de baixa escolaridade (oito em cada dez estudaram, no máximo, até o ensino fundamental). O foco da atuação policial no combate à venda de drogas no varejo e ao transporte feito por "mulas" faz com que um contínuo fluxo de jovens desempregados sejam levados ao sistema prisional mesmo sem praticar qualquer ato violento, enquanto as grandes organizações têm seu complexo sistema de comércio e corrupção inalterado.

Política antidrogas vem promovendo um violento massacre às populações mais vulneráveis.

A lógica militar de combate às drogas faz com que 90% das prisões por tráfico sejam em flagrante e por pequenas quantidades. Esta pessoa provavelmente passará todo o processo no regime fechado de prisão por suposto "perigo à ordem pública" - pautado não na violência da pessoa, mas na ideia abstrata do "inimigo traficante" produzida pela mídia. A guerra às drogas é a grande responsável por manter em prisão provisória, ou seja, sem julgamento definitivo, 40% dos atuais presos do Brasil.

Em uma década, o Brasil acumulou conhecimento e dados suficientes para deixar claro que sua política antidrogas vem promovendo um violento massacre às populações mais vulneráveis e tornado cada vez mais insustentável o sistema prisional. Existe uma demanda crescente dentro e fora do país para a revisão da abordagem proibicionista e tratamento da questão dentro de seu devido lugar, que é a saúde pública.

Nesse sentido, o STF (Supremo Tribunal Federal) tem em suas mãos uma oportunidade histórica. Ainda nesse semestre deve ser retomado o julgamento sobre o Recurso Extraordinário nº 635.659, da Defensoria Pública de São Paulo, que discute a descriminalização do porte de drogas para consumo pessoal.

Esperamos que os ministros do Supremo assumam para a si a responsabilidade de corrigir essa distorção, deixando de punir usuários e abrindo caminho para uma política de drogas menos violadora, menos encarceradora e menos seletiva.

Jessica Carvalho Morris e Henrique Apolinário, respectivamente diretora-executiva e assessor do programa de Justiça da ONG Conectas Direitos Humanos.


Fonte: El País


Germano Martiniano: O ouro é uma coisa, os 7 a 1 é outra

O brasileiro, ou o ser humano em geral, tem uma séria mania de querer comparar fatos que, muitas vezes, são desconexos. Depois da final Olímpica de Futebol Masculino, na qual batemos a Alemanha nos pênaltis, vi algumas pessoas no Facebook dizerem: “enquanto estamos comemorando este ouro, nossa educação, saúde, segurança etc., continuam sem medalha alguma”. Que o nosso país possuí seríssimos problemas socioeconômicos é inegável. Mas, o ouro é uma coisa, os 7 a 1 que tomamos da Alemanha em 2014, e continuamos tomando em indicadores sociais é outra.

O ouro conquistado no Maracanã pelo nosso futebol é simbólico. O estádio é o nosso cartão postal do futebol, ainda que sua obra original tenha sido destruída para se realizar as “modernas e eficientes” arenas. Foi no Maracanã que perdemos a final da Copa do Mundo de 1950 com, quase, 200 mil torcedores no estádio. Este ouro também é a única medalha que o futebol não possuía e que existia uma grande pressão para tê-la. Um outro fator que aponta este simbolismo é o próprio esporte, o futebol no Brasil não é apenas uma modalidade esportiva, é expressão social, é algo que uni nosso povo em torno de um objetivo em comum. É acima de tudo a maior paixão da maioria dos brasileiros. Por isso a comoção tão grande.

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Outra comparação equivocada foi pessoas dizerem que esta vitória sobre a Alemanha serviria de revanche sobre a dolorida derrota no Mineirão em 2014 por 7 a 1. Esta derrota para Alemanha nunca terá uma revanche, todo brasileiro levará este fardo por suas vidas. Se a vitória olímpica foi simbólica como dito acima, não menos simbólico também foi a derrota em 2014, afinal a Alemanha veio ao Brasil mostrar que ganhava de goleada não apenas no campo, mas em estrutura de futebol. E se falarmos em fatores socioeconômicos os alemães aumentam esta goleada sobre nós. Portanto, para o Brasil apagar os 7 a 1, primeiramente teria que reformar toda sua estrutura futebolística, segundo recuperar o seu futebol de essência, terceiro ganhar dos alemães de 7 a 1 lá na Alemanha, e quarto apagar da memória esta derrota. As três primeiras opções já parecem complicadas, a quarta é impossível. Pois, na vida não esquecemos das coisas, aprendemos a conviver com perdas e dores e as substituímos por outras coisas que dão razão a nossa existência, mas apagar nada apaga. A revanche nunca acontecerá!

As Olimpíadas terminaram, o Brasil ficou aquém do esperado em termos de desempenho e medalhas. A lição que fica é: o esporte é maravilhoso e transformador. Como foi bonito ver o Serginho do vôlei, de história humilde, conquistar sua quarta medalha olímpica. Assim como o Serginho existem vários outros exemplos que mereciam ser contados. Por isso pergunto: “como não se comover? ”. Temos de celebrar nossas conquistas, comemorar e curtir os prazeres que elas nos trazem, mas saber que nossa responsabilidade social como cidadãos não se modifica. Ontem, domingo 21 de agosto, terminaram os jogos olímpicos, hoje, segunda-feira 22 de agosto, continua a vida normalmente. Os ouros que conquistamos estão para história, os 7 a 1 que levamos no futebol e levamos em nossa vida social diariamente continuam latentes, é necessário separar os fatos e ter coragem e disposição para modificar nossa realidade.


Por Germano de Souza Martiniano. Formado em Relações Internacionais pela UNESP Franca e assessor de comunicações da Fundação Astrojildo Pereira.


O maniqueísmo esportivo dos brasileiros inventou a vaia olímpica

As arquibancadas do Rio revelam que nossos torcedores não sabem encarar derrotas num país que tem o esporte como vingança mundial

Saber perder não é exatamente um esporte brasileiro. Parte disso está creditado a todo ouro e toda taça que foram celebrados como as únicas maneiras possíveis de o Brasil sobressair. Éramos vira-latas internacionais até Didi carregar a bola sob o braço direito depois de a seleção de futebol sofrer o primeiro gol da Suécia, na final da Copa do Mundo de 1958.

Desde então, o país elegeu o esporte como a nossa forra mundial. Perder não estava mais no roteiro. Nossa insignificância política parecia menor se comparada ao nosso êxito no futebol. Ninguém segurava a seleção.

Essa prepotência começou a se traduzir na arquibancada. A gana pelo o que um antigo chefe definiu como “o segundo esporte mais popular” do Brasil (ganhar medalhas) gera frustrações. O culpado, quando o time local estiver em campo, é o adversário. E tome vaias, mesmo que seja para um atleta machucado, como o tenista alemão Dustin Brown. Derrota consumada, o comportamento se volta para o brasileiro caído. O futebol brasileiro (Renato Augusto, sobretudo) que o diga.

Ontem, na Arena Carioca 1, no Rio, atletas brasileiros e lituanos viveram essas duas faces em uma partida da primeira fase do basquete masculino. Quando o jogo estava no início, reações da torcida báltica eram ruidosamente abafadas por vaias brasileiras. Até que a seleção europeia abriu 30 pontos de vantagem antes de o segundo quarto acabar — então, as reações negativas voltaram-se para os brasileiros. O time estava perdido em quadra, mas precisou se encontrar para que a torcida ajudasse novamente. O ufanista dirá que a seleção de basquete quase chegou a uma virada histórica porque a torcida abraçou o time, mas, de fato, foi Nenê Hilário, campeão de rebotes, e Leandrinho, o cestinha do jogo, quem a recolocou de volta no jogo.

A única medalha conquistada por um brasileiro até o domingo, a prata no tiro, foi polemizada pelo ouro, o vietnamita Xuan Vinh Hoang. O público “de futebol” o desconcentrou. Há relatos de quem estava no local de que a “virada” do brasileiro, classificado em 18º na primeira eliminatória, foi obtida graças à loucura de quem esteve presente. De fato, é preciso considerar que tiro não é um esporte popular no Brasil. Assistir a uma competição como essa exige que códigos de comportamento sejam assimilados, e não é o caso de quem comprou um ingresso para algo estranho ao nosso histórico esportivo (mesmo que alguém aponte, do outro lado da tela, que nossa primeira medalha olímpica veio do esporte, em 1920).

Todo país tem a sua maneira de torcer, mas não lembro de algum que tome a vaia como algo seu. Como construímos esse jeito? Há palpites, mas nenhuma certeza. Rivalidades foram criadas em campos, quadras, pistas e tablados. Por anos, as cubanas eram nossas rivais no vôlei. Criamos traumas contra italianos, franceses e argentinos no futebol, muitas vezes carregados em tintas nas coberturas da imprensa local. No caso da Argentina, as competições no país vizinhos traziam relatos de que fomos maltratados. Sim, já fomos (nos Sul-Americanos de futebol, por exemplo), mas estão mais restritos às primeiras décadas do século passado que a torneios recentes. Sugira um brasileiro que tenha sido vaiado no Pan de Mar del Plata, em 1995. Não há.

No fundo, somos maniqueístas ao extremo, e sempre é preciso eleger vilões. A Argentina tornou-se este ser místico que não foi poupado de vaias nem mesmo na mais olímpica das apresentações, a Abertura dos Jogos. Ontem, na Arena Olímpica, uma torcedora solitária com uma bandeira alviceleste nas mãos viu seu grito por uma das atletas que competia nas quatro modalidades de ginástica artística ser abafado também por vaias — até que alguém, sabe-se de lá de onde, mas dotado de sensatez, começou a incentivá-la a gritar por seu país, mesmo com tantos “rivais” ao lado.

A vaia parece uma saudade inexplicável de algo distante. Seriam os festivais e as “torcidas” de músicas concorrentes com raciocínios ilógicos? De vilões e mocinhos do telecatch, a popular luta livre? Arrisco a segunda hipótese. Nos ringues das lutas de mentira, havia bons e maus bem definidos tal um roteiro de novela de Silvio de Abreu. Nas quadras do Rio e nos campos de futebol do Brasil, a torcida decidiu nestes Jogos que somos todos um bando de Teddy Boys Marinos lutando contra uma renca de Aquiles, Rasputins Barba Vermelha e Múmias. E a Olimpíada não é isso.


Fonte: El País


Os Jogos Olímpicos do Rio serão lembrados como os Jogos da exclusão?

As instituições democráticas poderiam ter protegido e amparado brasileiros na preparação para os Jogos. Mas isso não aconteceu

Em agosto, a cidade do Rio de Janeiro vai sediar pela primeira vez os Jogos Olímpicos e Paraolímpicos em meio a um dos momentos políticos mais turbulentos que o país já viveu. A crise política e social no Brasil tem mostrado que muitas de nossas instituições democráticas ainda carecem de consolidação. Estas são as mesmas instituições que poderiam ter protegido e amparado brasileiros na preparação para os Jogos, assegurando um legado positivo. Isso não aconteceu.

No início deste ano, conheci e entrevistei lideranças comunitárias e moradores da Vila Autódromo, bairro do Rio localizado ao lado do Parque Olímpico. Acompanhada da Justiça Global, reconhecida organização de direitos humanos, presenciamos um protesto de moradores, com apoio de pessoas e organizações que lutam em favor da comunidade. O protesto era contra o fato de que moradores cujas casas estavam dentro da construção do Parque Olímpico estarem sendo impedidos pelas autoridades locais de entrar e sair livremente de suas casas.

Mulheres líderes, corajosas e fortes, deram seus testemunhos sobre as violações dos direitos humanos a que estavam sendo constantemente submetidas, devido às obras para sediar os Jogos. Famílias foram despejadas e removidas sem consulta ou acesso à informação. Foram deixadas sem voz para denunciar os problemas de sua comunidade, que costumava ser uma área tranquila e segura, cercada de natureza. Para algumas dessas famílias foram prometidas novas casas, e as chaves deveriam ter sido entregues na semana passada. Durante anos de construção para receber os Jogos, havia relatos frequentes de cortes de água e luz bem como de violência perpetrada pelas forças de segurança. A moradora Heloisa Helena, conhecida como Luizinha de Nanã, disse que por mais de dois anos teve o acesso restrito a sua casa e centro religioso. A casa mais tarde foi demolida.

Como afirmamos em outra ocasião, esses mesmos moradores já haviam denunciado que a prefeitura do Rio teria negociado com empresas privadas a construção de prédios a classe média no bairro onde vivem, causando com isso a remoção de ao menos mil famílias pobres. Segundo os moradores, as obras planejadas excluíam os pobres do que a prefeitura e empresas privadas têm chamado de “progresso”.

Além disso, muitas famílias perderam suas casas para a especulação imobiliária ou para reformas e construções classificadas pelo governo local como necessárias ao desenvolvimento da cidade e recebimento dos Jogos. Os atingidos pelas "remoções desnecessárias e injustas" nunca foram adequadamente consultados, tampouco participaram de tomadas de decisão, como afirmam Raquel Rolnik, ex-Relatora da ONU por Moradia Digna,RioonWatch e Lena Azevedo e Luiz Baltar em seu estudo sobre as remoções no Rio. Sem dúvida, os atingidos não estarão no público assistindo os Jogos; as construções transformaram suas vidas para sempre, não apenas no período das Olimpíadas. Acrescente-se a este legado sombrio, os trabalhadores que morreram durante as obras de construção para as Olimpíadas e para a Copa do Mundo.

Aqueles que têm resistido bravamente em protestos nas ruas em oposição aos abusos relacionados aos Jogos têm muitas vezes sofrido com violência policial e das forças de segurança. Infelizmente isso provavelmente ocorrerá novamente com grupos e também membros do Comitê Popular da Copa e das Olimpíadasque estão organizando mais uma vez importantes debates e protestos, dias antes dos Jogos começarem, para mostrar o quanto tais jogos excluíram pessoas e direitos. Neste contexto cabe lembrar que a lei de antiterrorismo, recentemente aprovada, já tem sido usada infelizmente para deter manifestantes e continuará a colocar em riscos direitos humanos muito tempo depois de terem terminado as Olimpíadas.

A promessa de proteger o meio ambiente durante a preparação para os Jogos também não foi cumprida. Muitas árvores foram derrubadas, piorando a já comprometida qualidade do ar, afetando diretamente as comunidades do entorno. Exemplos tristes e perturbadores do descaso com o meio ambiente sãoa Baía de Guanabara contaminada e rios poluídos, os quais o governo havia prometido limpar. E chama a atenção a construção controversa de um campo de golfe em área de proteção ambiental, o que revela planejamento e políticas equivocadas, para dizer o mínimo.

Os Jogos receberam altos investimentos públicos mas que prioritariamente favorecem interesses privados. Para muitos brasileiros, isto maculou o que poderia ter sido um momento de orgulho para o país. É lamentável que uma vez mais a oportunidade de deixar um legado duradouro e positivo tenha sido totalmente perdida. Recentemente até o prefeito do Rio assumiu ser esta uma oportunidade perdida, embora pouco tenha feito para impedir que isso acontecesse. Ainda está por saber se haverá algum legado positivo decorrente dos dois grandes eventos esportivos que o Brasil sediou a Copa do Mundo 2014 e Jogos Olímpicos 2016. No momento, identificamos algumas instalações esportivas novinhas em folha e algumas melhorias de transporte, resta saber porém se esses novos estádios e outras construções terão de utilidade pública após os eventos.

Tanto o governo como as empresas deveriam ter feito muito mais e tragédias não teriam ocorrido. Más condições de trabalho e mortes teriam sido evitadas se os direitos humanos e os princípios e as boas leis trabalhistas que o país tem tivessem sido respeitados. O mesmo pode ser dito sobre as remoções e outras violações já mencionadas. Infelizmente, porém, parece que os Jogos Olímpicos Rio 2016 serão lembrados como os "Jogos da exclusão".


Por: JÚLIA MELLO NEIVA, pesquisadora sênior e representante para o Brasil, Portugal e países Africanos de língua portuguesa no Centro de Informação sobre Empresas e Direitos Humanos.

Fonte: brasil.elpais.com


Luiz Ruffato*: Estamos preparados para enfrentar as ameaças à segurança promovidas pelo terrorismo internacional?

A pouco menos de 15 dias para o início dos Jogos Olímpicos do Rio de Janeiro uma pergunta permanece sem resposta convincente: estamos preparados para enfrentar as ameaças à segurança promovidas pelo terrorismo internacional? Os recentes atentados contra alvos civis reivindicados pelo autointitulado Estado Islâmico, sejam cometidos por militantes armados, carros-bomba, homens-bomba ou “lobos solitários”, mostram a ousadia e a crueldade desses que, embora falem em nome de Deus, agem sob a égide da intolerância e do obscurantismo.

O aparato mobilizado pelo Governo para proteger os 10,5 mil atletas de 206 países e os cerca de 300 mil turistas aguardados consta de 85 mil profissionais, sendo 47 mil pertencentes às polícias federal, civil e militar, e 38 mil às Forças Armadas. Foram gastos até agora, neste que é o maior esquema de segurança da história do Brasil, um total de 1,5 bilhão de reais. A Agência Brasileira de Inteligência (Abin) elevou para o nível 4 o risco de atentado durante os Jogos, numa escala de 1 a 5, sendo 5 a certeza de que um ato terrorista está em curso.

Logo após os atentados em Paris, em novembro do ano passado, Maxime Hauchard, um francês que adotou o nome de Abou Abdallah al-Faransi, membro do alto escalão do Estado Islâmico, postou um texto no Twitter dizendo: “Brasil, vocês são nosso próximo alvo”. Em maio, foi lançado o Nashir Português, uma plataforma de comunicação e propaganda em português na internet, visando o proselitismo da causa jihadista para recrutamento de simpatizantes brasileiros. Seu principal aliciador nas redes sociais usa o nome de Ismail Abdul Jabbar Al-Brazili, conhecido como “O Brasileiro”.

Nesta semana, um grupo extremista brasileiro autodenominado Ansar al-Khilafah Brazil declarou lealdade ao Estado Islâmico e criou um canal no Telegram, serviço de mensagens semelhante ao WhatsApp. Segundo Rita Katz, do SITE (Search for International Terrorist Entities) Intelligence Group, organização que monitora atividades terroristas na internet, esta é a primeira vez que uma entidade sul-americana anuncia aliança com o Estado Islâmico e submissão ao líder do grupo fundamentalista, Abu Bakr al-Baghdadi.

Agentes da Divisão Antiterrorismo da Polícia Federal já monitoram 42 suspeitos de ligação com o terrorismo islâmico em território nacional. Um deles, o libanês Ibrahim Chaiboun Darwiche, dono de um restaurante em Chapecó (SC), indiciado por três crimes – incitação à violência, preconceito religioso e desrespeito à lei de segurança nacional –, é monitorado 24 horas por dia, com uso de tornozeleira eletrônica. Darwiche produziu um vídeo defendendo os ataques do Estado Islâmico ao jornal francês Charlie Hebdo, e, entre janeiro e abril de 2013, ficou 87 dias numa região da Síria controlada pelo Estado Islâmico, segundo a Polícia Federal.

Agentes da Divisão Antiterrorismo da PF já monitoram 42 suspeitos de ligação com o terrorismo islâmico em território nacional

Na semana passada, o Governo brasileiro extraditou o franco-argelino Adlène Hicheur, que há dois anos dava aulas na Universidade Federal do Rio de Janeiro. Hicheur foi detido em 2009 e permaneceu preso na França por quase três anos por suspeita de envolvimento com a rede terrorista Al Qaeda. Físico respeitado na comunidade científica internacional, ele trabalhou nos laboratórios do CERN (Organização Europeia para Pesquisa Nuclear), sediada em Genebra, na Suíça. Na época, o serviço secreto francês decifrou mensagens criptografadas em seu computador, nas quais Hicheur conversava amistosamente com Mustapha Debchi, membro da Al Qaeda no Magreb Islâmico, sobre uma possível associação em empreendimentos terroristas.

Em maio, o chefe da Direção de Inteligência Militar da França, general Christophe Gomart, anunciara, em depoimento na comissão parlamentar de luta contra o terrorismo, que o Estado Islâmico havia planejado ataques contra a delegação francesa durante os Jogos Olímpicos do Rio de Janeiro. Ele revelou ainda que um brasileiro estaria por trás da ação, sem indicar, no entanto, quem seria ele. Já a nossa Polícia Federal afirma que negou a entrada no Brasil de pelo menos quatro suspeitos de envolvimento com terrorismo que tentavam se credenciar para as Olimpíadas.

Marginalizados, filhos da humilhação e da ignorância, os jihadistas, que representam uma corrente minoritária dentro do islamismo, cultuam valores tribais e primitivos – machismo, xenofobia, homofobia – e têm como bandeira o ódio e a violência. Sua principal forma de propaganda é o espetáculo da intimidação da população civil. Desconhecendo regras, os militantes fundamentalistas julgam que toda forma de luta contra os valores ocidentais (judaico-cristãos, mas também muçulmanos) é válida e para isso transformam qualquer coisa em arma – sejam aviões comerciais, como os que derrubaram as Torres Gêmeas, nos Estados Unidos, matando quase três mil pessoas, seja um caminhão como o que tirou a vida de 84 pessoas na França ou até mesmo um machado como o usado em um ataque dentro de um trem na Alemanha, na segunda-feira.

Entre os dias 5 de agosto, quando ocorrerá a cerimônia de abertura dos Jogos Olímpicos, até o dia 21, data de encerramento, respiraremos com ansiedade, torcendo para que as ameaças de atentados não passem de bravatas e que o Brasil se mantenha longe da insânia terrorista dita religiosa.


Luiz Ruffato é escritor e jornalista.

Fonte: El País


José Ruy Lozano: O que seria da literatura numa “escola sem partido”?

Dom Casmurro, de Machado de Assis, continuaria a ser um romance de adultério

Aconteceu em meados de 1990. O aluno, de família religiosa, dirige-se ao professor e afirma, em alto e bom som: “Não vou ler esse livro aí, é obra de Satanás”. A obra em questão era Noite na taverna, de Álvares de Azevedo, o romântico brasileiro discípulo de Byron e Musset, que temperou os enredos de seus contos com cemitérios, crânios humanos e orgias à meia-noite.

À época, não havia sombra do debate sobre a “escola sem partido”, frequente no ambiente de extrema polarização política que hoje toma conta do Brasil. Mas o fato – verídico – revela a impossibilidade de trabalhar com a literatura numa escola pretensamente neutralizada de qualquer questionamento histórico, político, social ou comportamental.

Para os defensores da ideia de uma “escola sem partido”, que ameaça a educação nacional, Dom Casmurro, obra-prima de Machado de Assis, continuaria a ser um romance de adultério. E Capitu, a Madame Bovary dos trópicos, a Anna Kariênina que pudemos ter. A interpretação hoje consagrada do narrador ambíguo e não confiável, representante da elite patriarcal brasileira, que suprime sua insegurança impondo cruel desterro à esposa, seria considerada esquerdismo militante, influência feminazitalvez. Para eles Capitu é culpada, não há dúvida.

Seria possível ignorar que romances como Vidas secas, de Graciliano Ramos, e Capitães da areia, de Jorge Amado, não sejam obras engajadas no debate político e social brasileiro do período – anos 30 do século passado – e ainda atuais nos dias que correm? Para os patronos da “escola sem partido”, todo o teor de denúncia social de obras como essas deveria ser ignorado, bem como qualquer diálogo com a realidade do jovem que ainda se depara com carências similares e injustiças idênticas.

Num exercício de reductio ad absurdum, imaginemos o professor de literatura brasileira apresentando aos alunos do Ensino Médio o poema narrativo O navio negreiro, de Castro Alves. Se o poeta toma partido dos escravos e critica a economia que engendrou o trabalho servil, logo teríamos os “apartidários” defendendo a discussão do outro lado: “Seria preciso ouvir a voz dos senhores, senão estaremos tomando partido em nossas aulas! ”

Podemos recuar mais e mais na discussão e perguntar o que foram os primeiros escritores do Brasil independente senão ideólogos de um projeto político de constituição da nacionalidade, para além de seus inquestionáveis méritos artísticos. Os índios de Gonçalves Dias e José de Alencar existiriam fora do processo de construção social a que se devotaram os dois autores? Certamente não.

Até nas mais remotas obras da literatura portuguesa encontramos dificuldades semelhantes. Quando Gil Vicente apresenta em suas peças de teatro o padre lascivo e o comerciante ladrão, o professor se verá na contingência de fazer o contraponto. Para amenizar a crítica religiosa, ler, talvez, trechos da vida dos santos? Tecer elogios às virtudes do livre-mercado a fim de dirimir a acusação ao capitalismo predatório?

Sombrios os tempos em que somos obrigados a reafirmar a literatura não só como experiência de linguagem e veículo de sensibilidade mas também de conhecimento, de tomada de consciência do mundo. Os abnegados sem partido recitariam os versos de Ferreira Gullar sem perceber a acidez irônica que o poeta militante lhes dá: “O preço do feijão/não cabe no poema. O preço/do arroz/não cabe no poema (...)/Como não cabe no poema/o operário/que esmerila seu dia de aço/e carvão/nas oficinas escuras/(...) Só cabe no poema/o homem sem estômago/a mulher de nuvens/a fruta sem preço”. Ou, então, caberia ao professor explicar a política econômica da atual gestão e das que a antecederam. Sem tomar partido, é óbvio.


José Ruy Lozano é professor do Instituto Sidarta e autor de livros didáticos.

Fonte: El País


Luiz Sérgio Henriques*: Uma outra esquerda é possível

Entre nós, o principal partido de esquerda parece não ter percebido, mesmo no plano retórico, as características estruturais da sociedade brasileira, que traz em si, 'morfologicamente', a pluralidade de classes e grupos sociais e suas respectivas representações políticas.

Não se tem muita noção, por ora, do que restará do sistema partidário após o fulminante conjunto de ações que se originaram em Curitiba há pouco mais de dois anos e lançaram luz inédita sobre o financiamento da atividade política, tema crucial para as relações entre governantes e governados e para a própria qualidade da democracia. Constatamos, assustados, que tal sistema andava funcionando em bases praticamente autorreferenciais. Entre outras coisas, pouco se conhecia sobre financiadores, lobbies, interesses legítimos ou escusos que contribuíam para dar forma à representação.

Como ninguém é ingênuo, sabia-se que os controles estavam falhando. Impossível ignorar o caráter espetacular das campanhas ou os abusos de marketing, com seus magos capazes de explorar cinicamente medos irracionais e suscitar expectativas ainda menos razoáveis. Agora, no entanto, a exposição dos males tem sido impiedosa e parece não poupar nenhuma força ou personalidade relevante. O celebrado artigo do juiz Sergio Moro sobre a Operação Mãos Limpas, convém lembrar, foi publicado em 2004, no começo da era petista, quando a percepção de haver algo podre no reino da Dinamarca ainda não havia sido imensamente ampliada com os fatos que levaram à Ação Penal 470 e às investigações atuais sobre a ocupação da Petrobrás e outras empresas públicas, com fins de reprodução de mandatos e manutenção de máquinas partidárias – para não falar das situações de enriquecimento pessoal que daí derivam por gravidade.

O impacto de investigações dessa natureza não pode ser subestimado. Na Itália, de um modo ou de outro, foi simplesmente a pique a sensação de imobilidade que rodeava um “sistema de poder” congelado durante décadas. Em tal contexto “eterno”, seria quase absurdo prever o fim da Democracia Cristã, um partido que não era simplesmente “de direita”, para usar o jargão de que hoje se abusa, mas também canalizava para a vida pública os tradicionais valores solidaristas do mundo católico; e também difícil acreditar que o centenário Partido Socialista, de um “animal político” voraz como Bettino Craxi, morto no exílio, iria ser tragado no turbilhão.

Interessa-nos pouco aqui saber se o PT e o ex-aliado subalterno, o PMDB, com toda a marca que já deixaram na vida brasileira, o primeiro por mostrar ser plenamente plausível a “via pacífica” ao governo, o segundo por encarnar a resistência democrática ao autoritarismo, vão seguir o caminho do redimensionamento ou o da dissolução no rastro das investigações. Nesta altura, pouca gente pode prever quem serão os mortos e os sobreviventes, bem como o tamanho da tarefa de reconstrução do sistema partidário antes que se dissemine o vírus letal da antipolítica ou se agrave a sensação de que “ninguém nos representa” e “o voto não conta, todos são iguais”.

Exercícios inúteis de futurologia à parte, mais concreto já deveria estar sendo o trabalho autocrítico por parte da esquerda, dentro ou fora dos partidos. Diferentemente da situação italiana, e talvez para surpresa de muitos hoje seduzidos por um anticomunismo primário, o que nos faz falta são grupos políticos capazes de se reorientar à maneira do antigo PCI, que antes mesmo das Mãos Limpas, e não por motivos judiciais, mas culturais e políticos, havia tomado o caminho do reformismo, requalificando-se como “partido democrático” e acolhendo outras vertentes reformistas, inclusive de inspiração católica, para começar uma história diversa.

Entre nós, o principal partido de esquerda parece não ter percebido, mesmo no plano retórico, as características estruturais da sociedade brasileira, que traz em si, “morfologicamente”, a pluralidade de classes e grupos sociais e suas respectivas representações políticas. Para dar-se conta desse dado teria sido necessário preparar-se culturalmente para uma visão institucional sofisticada, cujo horizonte não se deixasse contaminar por um diagnóstico catastrófico da crise – grave – do nosso tempo e, por isso, não reiterasse contraposições caducas, como, para dar um exemplo que vale por todos, aquela que renitentemente opõe avanços “substantivos” e mecanismos “formais” do voto, dos partidos, das instituições.

Numa palavra, mais uma vez o aparato conceitual de tantos políticos e intelectuais “altermundistas”, brasileiros ou não, opôs democracia social e democracia política, como se a segunda fosse um obstáculo à primeira – e obstáculo a ser removido por mecanismos plebiscitários, apelos à mitologia de “assembleias constituintes originárias” e a concepções de “contra-hegemonia” alheias ao Estado Democrático de Direito, horizonte ineliminável de nossa época.

A nosso ver, por se inserir de modo acrítico em tal rede conceitual e virar as costas para a complexidade do País é que o petismo no poder se moveu tão desastradamente no plano institucional e no social. Se defino o Parlamento como assembleia de “picaretas”, disponho-me, ato contínuo, a cooptá-los, dispensando os processos de persuasão e aliança e tornando-me assim agente de degradação ainda mais acentuada. E se me autodefino, autoritariamente, como a irrupção dos pobres na vida social e na história do Estado, divido grosseiramente a sociedade em casa grande e senzala, pobres e ricos, amigos e inimigos – simulacro de luta de classes que, no entanto, mal arranha a desigualdade, afasta a esquerda de qualquer possibilidade dirigente e termina por preparar seu estatuto minoritário por muitas décadas.

Nas instituições e na sociedade, o resultado só podia ser desastroso. Ter feito esse tipo de aposta terá sido o pior dos males causados pelo petismo à esquerda e, sobretudo, ao País. Seja qual for o destino do partido e de seu máximo – e solitário – chefe, resta começar de novo: uma outra esquerda há de ser possível. E dela, certamente, o Brasil não pode abrir mão.


*TRADUTOR E ENSAÍSTA, UM DOS ORGANIZADORES DAS OBRAS DE GRAMSCI NO BRASIL. SITE: WWW.GRAMSCI.ORG


Luiz Ruffato: A Igreja Universal avança

Se julgarmos pelas pesquisas para prefeito em São Paulo e no Rio, o quadro é desolador.

No próximo dia 2 de outubro, iremos às urnas para eleger prefeitos e vereadores. Deveria ser um momento em que efetivamente desempenhamos um papel fundamental na transformação da sociedade, um momento único de exercício de cidadania. Mas a pergunta que fica é: estamos nos preparando para isso? O que temos feito para melhorar o espaço em que vivemos? A mudança coletiva processa-se por meio de ações individuais: é como nos relacionamos com o outro e com o entorno que ressignificamos a existência. É a ação no presente que qualifica o futuro – nosso, dos outros, do planeta.

Se julgarmos pelas pesquisas de intenção de voto para prefeito nas duas maiores cidades do Brasil – São Paulo e Rio de Janeiro – o quadro é desolador. Na rica São Paulo, em resposta espontânea, 54% dos eleitores afirmam não saber em quem votar e 26% declaram que vão votar nulo ou em branco segundo pesquisa do Ibope. Quando apresentados aos nomes dos pré-candidatos, o deputado federal Celso Russomanno aparece em primeiro lugar com 26%, bastante distante do segundo colocado, a senadora Marta Suplicy (PMDB), com 10%. Interessante perceber ainda que o pastor Marco Feliciano (PSC), ligado à Assembleia de Deus, e que já deu claras demonstrações de homofobia e intolerância, embora surja com apenas 4% das intenções de votos, tem o maior número de seguidores no Facebook: 3,77 milhões, quase cinco vezes mais que o segundo colocado, Celso Russomanno, com 670.000.

Russomanno é réu no Supremo Tribunal Federal (STF) por prática de peculato (desvio de dinheiro público). Ele já foi condenado em primeira instância a dois anos e dois meses de prisão em regime aberto, mas como possui foro privilegiado a ação foi transferida para o STF. O procurador-geral da República, Rodrigo Janot, pediu urgência no julgamento de Russomanno, para que, caso seja confirmada a sentença, ele fique impedido de disputar as eleições, de acordo com a Lei da Ficha Limpa. Russomanno é filiado ao Partido Republicano Brasileiro (PRB), partido que tem vínculos com Edir Macedo, dono da Igreja Universal do Reino de Deus.

Pertence ao mesmo PRB e à mesma Igreja Universal o sobrinho de Edir Macedo, ex-ministro da Pesca e da Aquicultura no governo Dilma Rousseff, senador Marcelo Crivella, que lidera as intenções de voto para prefeito da cidade dita mais liberal do Brasil, o Rio de Janeiro. Contra o aborto e defensor do criacionismo, o pastor e cantor gospel Marcelo Crivella tem 35% das preferências – mais que todos os outros candidatos juntos, segundo pesquisa do Instituto Gerp. Além disso, 26% dos entrevistados afirmam que não votarão em ninguém e 15% permanecem indecisos.

Sozinho, o PRB elegeu, no último pleito, uma bancada composta por sete deputados federais e um senador (Marcelo Crivella), além de ter conseguido emplacar o presidente do partido, Marcos Pereira, como titular do Ministério do Desenvolvimento, Indústria e Comércio Exterior no governo do presidente interino, Michel Temer. Pereira foi diretor administrativo e financeiro da TV Record do Rio de Janeiro entre 1995 e 1999, e vice-presidente da Rede Record de Televisão, entre 2003 e 2009. Fundada em 1977, a Igreja Universal conta hoje com cerca de 12.000 pastores, sete mil templos e quase sete milhões de seguidores no Brasil, e outros quase dois milhões de fiéis espalhados por mais de uma centena de países, segundo estimativas da própria entidade. Sua receita é estimada em cerca de R$ 1,4 bilhão de reais por ano – mas não há qualquer controle sobre esse valor, já que por lei as instituições religiosas estão isentas de impostos.

Além dos fiéis, a Igreja Universal controla hoje a Rede Record, que cobre 93% do território nacional e está presente em 150 países, a TV Universal, com mais de 20 retransmissoras, e a Rede Aleluia, que possui quase oitenta emissoras de rádio AM e FM, presente em 75% do território nacional. Faz parte ainda do grupo o portal universal.org., o jornal Folha Universal, as revistas Plenitude, Obreiro de Fé e Mão Amiga, a editora Unipro, que registra milhões de exemplares vendidos de livros de Edir Macedo e de outros pastores, e a gravadora Line Records, especializada em música religiosa.


Fonte: El País


Pacificar para quem?

Nós, Tupinambá, nos dirigimos ao Governo brasileiro e pedimos: ou devolvam as nossas terras ou mandem nos matar e coloquem o branco em nosso lugar. Mas tomem uma decisão já. Nem os adultos, nem as crianças podem viver neste inferno.

No dia 5 de abril, o ministro Napoleão Nunes Maia Filho, do Superior Tribunal de Justiça, proferiu uma decisão suspendendo a demarcação da Terra Indígena Tupinambá de Olivença. Dada a gravidade desse acontecimento, nós, os Tupinambá da aldeia Serra do Padeiro, uma das comunidades que vive nesse território, apresentamos esta denúncia e solicitamos ao Governo brasileiro e aos organismos internacionais que tomem as medidas necessárias para impedir que nossos direitos continuem sendo violados. Apenas nos últimos anos, mais de 30 Tupinambá foram mortos. Há violência maior que vermos nossos parentes assassinados, ninguém responsabilizado, e ainda nos negarem o direito a nossa terra?

Em resposta à decisão do ministro, apresentamos um relato histórico sobre o que nosso povo vem enfrentado nestes 500 anos. Ao contrário do que disseram os fazendeiros e empresários na ação acolhida pelo ministro, apesar de toda a violência, nunca saímos de nossa terra. Em 1500, quando aqui os europeus chegaram, logo declararam que os Tupinambá eram inimigos da Coroa portuguesa e tinham que ser exterminados e expulsos de seus territórios.

Na Capitania de São Jorge dos Ilhéus, fomos escravizados nos engenhos de cana-de-açúcar, reagimos e sofremos a retaliação da Coroa portuguesa, no massacre comandado por Mem de Sá, em 1559. Então, nosso povo teve que lutar contra os franceses, na Confederação dos Tamoios. Depois, tivemos que lutar contra os holandeses, para expulsá-los da Bahia. E sempre nos eram negados os nossos direitos.

Em 1680, criaram o aldeamento jesuítico de Nossa Senhora da Escada, para aprisionar os Tupinambá. No aldeamento, eles se esforçaram para tirar a nossa língua, a nossa crença, a nossa religião - para nos tirar tudo. Mas os Tupinambá sempre tiveram a rebeldia de lutar para não deixar que os outros ocupassem completamente o nosso território. Quando o Governo percebeu que, apesar do aldeamento, continuávamos crescendo, decidiu que ele teria que ser extinto e elevado à situação de vila, o que aconteceu em 1758. Nesse período, os Tupinambá passaram a ter alguns direitos, como o de eleger vereadores para a Câmara de Olivença, que chegou a ser presidida por um indígena, Nonato do Amaral. Porém, os brancos mandaram destituí-lo. Os índios resistiram e mataram os homens enviados para assumir a Câmara.

Pinheiro Costa [juiz federal] diz que precisamos entrar em acordo e ceder parte de nossa terra. Ele diz que nossa terra tem que ser demarcada em "ilhas", deixando a praia do lado de fora. Como é que os Tupinambá da praia ficarão sem praia? O juiz afirma que é preciso "pacificar" a região.

Nós perguntamos: pacificar para quem? Porque quem está morrendo somos nós, quem está sendo enterrado ao longo da história somos nós.

Assim, nos dirigimos ao governo brasileiro, em suas diversas instâncias, e pedimos: ou devolvam as nossas terras ou, simplesmente, parem de dizer que nós não somos Tupinambá: mandem nos matar, em menos de um ano, e coloquem o branco em nosso lugar. Mas tomem uma decisão já. Nem os adultos, nem as crianças podem viver neste inferno. Estamos em nossa terra, trabalhando, e, quando menos esperamos, a polícia chega para nos expulsar. Nos últimos anos, a polícia tentou nos matar dezenas de vezes. Vejam a gravidade do que dizemos: nós não estamos nos referindo a ações de fazendeiros ou empresários; é o governo brasileiro, através de sua polícia, que vem tentando acabar com a comunidade a qualquer preço. Como vamos enfrentar uma luta desta? Qual é a chance que nós temos de vencer?

Vocês não têm para onde nos levar, porque nós nunca fomos de outro lugar. Os fazendeiros e os empresários dizem que nós não somos os ocupantes tradicionais desta terra. Não são eles que têm que dizer, somos nós, que habitamos aqui, são os velhos que ainda vivem na terra em têm histórias, muitas histórias, com o branco sempre infernizando a vida deles. O ministro que mandou suspender a demarcação da nossa terra nunca veio aqui, nós não sabemos quem ele é. O que sabemos é que o Judiciário brasileiro tem sempre uma desculpa para manter tudo na mão dos invasores. Sempre. Que vocês fiquem sabendo: ninguém nunca governou e nem vai governar os Tupinambá da Serra do Padeiro.

Queremos que este governo decida logo. E pedimos também que a comunidade internacional e a Igreja Católica se posicionem. Ninguém pode viver mil anos nestas circunstâncias, nas circunstâncias em que já vivemos mais de 500 anos.

Rosivaldo Ferreira da Silva é o cacique Babau, que representa a organização política dos Tupinambá da Serra do Padeiro (BA) e Rosemiro Ferreira da Silva é pajé, que representa a organização religiosa dos Tupinambá da Serra do Padeiro.


Rosivaldo Ferreira da Silva é o cacique Babau, que representa a organização política dos Tupinambá da Serra do Padeiro (BA) e Rosemiro Ferreira da Silva é pajé, que representa a organização religiosa dos Tupinambá da Serra do Padeiro.

ENTENDA O PROBLEMA

O povo Tupinambá aguarda desde 2004 a conclusão do processo de demarcação da Terra Indígena Tupinambá de Olivença. Localizada no sul da Bahia, Brasil, ela tem cerca de 47 mil hectares e é habitada por aproximadamente cinco mil índios. No último 5 de abril, o Superior Tribunal de Justiça (STJ) concedeu medida liminar determinando a suspensão do processo de demarcação, acatando mandado de segurança impetrado em 2013 pela Associação dos Pequenos Agricultores, Empresários e Residentes na Pretensa Área Atingida pela Demarcação de Terra Indígena de Ilhéus, Una e Buerarema. A demora na demarcação tem agravado ainda mais a situação de conflito da região, com a morte de indígenas, como acontece em outras áreas do país, como Mato Grosso do Sul.

Fonte: El País


BRICS ainda é prioridade estratégica para o Brasil

Serra faria bem em enviar um sinal inequívoco de que país está disposto a fortalecer a cooperação.

Há quase dez anos, em 2007, o presidente Luiz Inácio Lula da Silva era um dos palestrantes mais esperados no Fórum Econômico Mundial de Davos. Um enorme fluxo de investimentos transbordava um dos mercados emergentes mais empolgantes do mundo, e o chanceler Celso Amorim — que mais tarde seria considerado “o melhor ministro das relações exteriores do mundo” pela revista norte-americana Foreign Policy — estava começando a expandir a presença econômica e diplomática do Brasil ao redor do mundo.

Era a primeira vez que um país da América do Sul estabelecia uma rede tão ampla de embaixadas, a ponto de rivalizar com as de grandes potências. Um ano mais cedo, Amorim começara a se encontrar regularmente com seus pares na Rússia, Índia e China para discutir como os países BRIC poderiam fortalecer seus laços de cooperação e articular posições para lidar com desafios globais de forma conjunta. O grupo BRICS (que desde 2010 passou a incluir a África do Sul) se tornou rapidamente uma das inovações mais importantes da política mundial desde a virada do século, e foi capaz de chamar a atenção de potências tradicionais para a necessidade de adaptar estruturas globais a novas realidades.

De volta a 2016, o desempenho da economia brasileira é um dos piores do mundo, o país é comandado por um Governo interino envolto em escândalos e abalado por protestos, medidas de austeridade e uma espantosa investigação de esquemas de corrupção que ameaça as carreiras de grande parte da elite política do Brasil. Observadores internacionais consideram os BRICS como algo do passado, e alguns analistas brasileiros acreditam que o grupo já não deve ser prioridade para a política externa brasileira.

Eles não poderiam estar mais errados.

A sugestão de negligenciar o BRICS não leva em consideração as amplas vantagens estratégicas que a participação no grupo traz ao Brasil. Não tratá-lo como uma prioridade (por exemplo, se esquivando de ir à Cúpula anual) seria um erro cabal. Há três razões pelas quais o grupo é essencial para os interesses estratégicos do Brasil.

A primeira e mais importante é que a adesão aos BRICS providencia ao Brasil acesso direto e institucionalizado às lideranças políticas em Nova Déli e Pequim — um privilégio que o país não necessariamente teria de forma automática a cada ano. Apesar da desaceleração do crescimento econômico, espera-se que a China cresça em torno (ou até mais) de 6% em 2016 e 2017. O desempenho da Índia tem sido ainda melhor e espera-se que o país crescerá mais rápido do que a China. O FMI prevê que a China e a Índia contribuirão com mais de 40% da expansão da economia global até 2020 – em comparação, os Estados Unidoscontribuirão com apenas 10%. Atualmente, já se contabiliza mais riqueza privada na Ásia do que na Europa, e espera-se que a China, independentemente da atual desaceleração, supere os Estados Unidos como a maior economia do mundo.

O Brasil deve fazer muito mais para se adaptar a essa nova realidade, e não há dúvidas de que o futuro do país dependerá em grande parte da Ásia. O grupo BRICS importa neste contexto porque representa muito mais do que cúpulas presidenciais anuais. Na realidade, o grupo inclui mais de 15 reuniões a nível ministerial por ano, que auxiliam na promoção de cooperação intra-BRICS em áreas tão diversas como agricultura, educação, economia, ciência e tecnologia — sem mencionar o Novo Banco de Desenvolvimento, criado no âmbito do BRICS.

Como a influência crescente da China na Venezuela afeta os interesses nacionais brasileiros? Como a região como um todo deveria responder ao papel da China? Nenhuma dessas questões tem sido abordada a sério.

Em segundo lugar, a próxima reunião de Cúpula do BRICS na Índia em outubro é uma chance única para o presidente interino Michel Temer apresentar como ele está tentando superar as atuais adversidades do Brasil. Com a reputação do país em frangalhos, investidores asiáticos precisam ser reassegurados de que a investigação sobre corrupção em andamento é um passo na direção certa, que em última instância levará o Brasil a ser um país mais amigável para investidores. Temer, portanto, deveria ser acompanhado dos principais líderes da sua equipe econômica, os quais deveriam visitar investidores em vários centros financeiros asiáticos após o encontro da cúpula.

Finalmente, a adesão do Brasil ao grupo BRICS, junto com seu status de membro fundador no Banco Asiático de Investimento em Infraestrutura (AIIB) e o Novo Banco de Desenvolvimento do BRICS, são sinais importantes de que a presença global estratégica do país estabelecida na primeira década do século 21 é permanente e não será afetada substancialmente pela crise atual. As instituições citadas acima são símbolos de um maior deslocamento em direção à Ásia, que impactará o Brasil mais do que muitos estão cientes.

Enquanto a China se tornou o maior parceiro comercial do Brasil em 2009, a elite brasileira na política, nos negócios, na mídia e na academia estão ainda lamentavelmente ignorantes em relação à China e à Ásia como um todo. Pouquíssimos diplomatas brasileiros falam chinês e jovens estudantes nas melhores universidades brasileiras ainda preferem passar seus semestres de intercâmbio em Barcelona ou Paris em vez de Pequim ou Xangai. Não há um único programa de dupla diplomação entre universidades brasileiras chinesas e, no lugar de enviar correspondentes para a China, muitos jornais brasileiros compram conteúdo relacionado à China de jornais estrangeiros.

Isso mostra que o Brasil está entre os grandes países menos preparados para o surgimento de uma ordem mundial centrada na Ásia. Considerando a crescente influência da China na América do Sul, esta falta de preparo cria sérios riscos estratégicos. Como a influência crescente da China na Venezuela afeta os interesses nacionais brasileiros? Como a região como um todo deveria responder ao papel da China? Nenhuma dessas questões tem sido abordada a sério. O fato de que alguns pensadores (particularmente entre a esquerda da América Latina) ainda veem o crescimento da influência chinesa na região como positiva simplesmente porque Pequim é tido como adversário de Washington mostra quão incipiente é o debate na região — como o exemplo africano mostra, as coisas são bem mais complexas do que isso.

Independentemente da orientação ideológica de seu Governo, qualquer país no mundo hoje deve construir o conhecimento necessário para se envolver significativamente com a Ásia (e especialmente a China), que será em breve o centro econômico do mundo. Com o grupo BRICS, o Brasil já tem a sorte de ser parte de um fórum institucionalizado que facilita esse processo.

É pouco provável que o Brasil se afastará do grupo de maneira abrupta. O chanceler sabe da importância do BRICS. No entanto, considerando que há algumas dúvidas em Pequim e Déli em relação ao compromisso do novo Governo com o grupo, José Serra faria bem em enviar um sinal inequívoco de que o Brasil está disposto a não só manter, mas a fortalecer a cooperação intra-BRICS.


Oliver Stuenkel é Professor Adjunto de Relações Internacionais da Fundação Getúlio Vargas em São Paulo

Fonte: El País