O Globo
Vera Magalhães: Falta vacina para conter Bolsonaro
Arthur Lira é cúmplice dos sucessivos crimes de responsabilidade cometidos por Bolsonaro
Vera Magalhães / O Globo
Os remédios da Constituição de 1988 podem ser eficazes para evitar que Jair Bolsonaro dê um golpe de qualquer dimensão ou natureza, mas não são suficientes para removê-lo do posto diante de suas diárias e cada vez mais diretas ameaças à própria existência da democracia. O que nos leva à possibilidade real de termos de conviver por um ano e três meses com esse caos provocado única e exclusivamente pelo presidente da República, caso alguns atores não sejam instados a mudar sua conduta.
Falta ao nosso ordenamento jurídico uma vacina, o tipo de rito que permita conter de forma mais clara e rápida esse tipo de golpismo do século XXI, de que o presidente brasileiro é um expoente cada vez mais peculiar, porque tanto bebe das fontes internacionais quanto passa a ser visto como case a inspirar outros aprendizes de ditadores, pelas dimensões e pela importância estratégica do Brasil.
O impeachment, tratamento clássico para crimes de responsabilidade e para momentos em que governos se mostram disfuncionais, não é uma opção concreta no momento, mesmo diante da exorbitação de todos os limites cometida por Bolsonaro em seus dois discursos neste 7 de Setembro de conformação antidemocrática.
Arthur Lira é cúmplice dos sucessivos crimes de responsabilidade cometidos por Bolsonaro não só contra os demais Poderes, mas também no enfrentamento da pandemia. Só deixará de ser conivente se houver uma pressão tremenda de todos os partidos do Centrão, grupo que coordena à base de dinheiro público na veia. Como ainda não cessou a fonte de recursos, inútil contar com isso.
A saída propugnada pelo ministro Ricardo Lewandowski em artigo recente — enquadrar o presidente da República por crime contra a existência do próprio Estado Democrático — depende da ação do procurador-geral da República, o igualmente cúmplice Augusto Aras. Ainda que ele seja tomado de uma independência súbita, uma eventual denúncia apresentada pelo procurador-geral contra o presidente tem de passar pelo crivo da mesma Câmara comandada por Lira.
O que nos leva à angustiante situação de estarmos num labirinto, presos a Bolsonaro, a seus arbítrios e à rede de condescendência que foi criando em torno de si à base de assaltos diários nunca contidos contra as instituições.
Ele não se moderará. Depois de romper todos os limites do bom senso na Esplanada dos Ministérios e na Avenida Paulista, nada indica que recuará. Pelo contrário: além de ameaçar não cumprir decisões judiciais, reciclou a ameaça de não aceitar o resultado das urnas.
Que não se incorra no erro de subestimar seu poder de persuasão contando cabeças nos protestos deste feriado: foram muitas, o suficiente para manter o Brasil preso a uma agenda distópica daqui até as eleições, para incalculável prejuízo da economia, do tecido social e das mesmas instituições que resistem aos trancos e barrancos a atentados contra sua existência.
Diante da constatação do impasse, ministros do STF reconhecem a inexistência de mecanismos específicos para lidar com o golpismo altamente digital, financiado de forma sub-reptícia, que subverte conceitos como liberdade de expressão e a própria democracia. Daí por que os inquéritos que atualmente estejam sob a responsabilidade do ministro Alexandre de Moraes sejam a barreira possível à expansão desse mecanismo — e, justamente por isso, o alvo da ira bolsonarista.
Que se dependa de instrumentos provisórios e, mesmo eles, de alcance limitado para moderar um presidente incontrolável é a prova cabal de que a Constituição pode não ruir diante das investidas de Bolsonaro contra ela, mas sairá bastante esvaziada e combalida, como de resto todo o país, dos quatro anos de turbação da vida nacional a que os eleitores nos condenaram em 2018.
Fonte: O Globo
https://blogs.oglobo.globo.com/vera-magalhaes/post/falta-vacina-para-conter-bolsonaro.html
Míriam Leitão: Bolsonaro foge para a sua bolha
PSD pode apoiar o impeachment de Bolsonaro se ele continuar a atual escalada golpista
Leitão / O Globo
O recado de Gilberto Kassab foi claro. Ele disse na entrevista que me concedeu ontem que o PSD pode apoiar o impeachment do presidente Bolsonaro, se ele continuar a atual escalada contra a democracia. O que leva o líder de um partido de centro a fazer tal ameaça a um presidente em momento em que ele enche as ruas de apoiadores? É que no evento que Bolsonaro convocou para hoje ele parecerá forte, porque a manifestação será grande, mas estará, na verdade, mais isolado. Bolsonaro fugiu para a sua bolha, porque a sua popularidade está em queda. “Ele não vencerá nas urnas porque está mal avaliado e está mal avaliado porque faz um mau governo”, resume Kassab.
— Não tenho o menor constrangimento de defender o impeachment, o presidente está chegando no limite com essas manifestações que atentam contra a democracia. Se ele subir mais alguns degraus, defenderei o impeachment e entendo que ele está subindo esses degraus —disse Kassab em entrevista no meu programa na Globonews.
Na semana passada, em longa conversa com um político do centro, ouvi o mesmo diagnóstico: Bolsonaro pode não chegar no segundo turno, pela má gestão da pandemia, pela crise econômica, pela queda da sua aprovação.
— Eu acho que ele não estará (no segundo turno). Comparando o resultado da eleição cidade por cidade, conversando com analistas, e eu mesmo analisando os dados, o que vejo é que ele cai a cada dia — afirmou Kassab.
Na opinião do presidente do PSD, o evento deste 7 de setembro, a maneira como foi organizado diretamente pelo presidente, decorre do seu declínio nas pesquisas. Bolsonaro radicaliza porque está acuado diante da possibilidade de perda nas urnas ou de enfrentar um processo de impeachment. O problema é que para se defender ele acabou ameaçando ainda mais a democracia. Hoje ele fará seu espetáculo, mas contraditoriamente vai se isolar um pouco mais. Até porque à mortandade na pandemia se soma agora a inflação e a crise hídrica. Ele tentará culpar governadores pelo preço da gasolina, culpará o STF pelo seu mau desempenho, procura culpado pela falta de chuvas, mas a inflação corrói renda, e o eleitor sempre conclui, com razão, que é culpa do governo. Já falei aqui do efeito bumerangue: sua histeria autoritária afeta a economia, o que agrava a crise, que tira popularidade do seu governo.
Bolsonaro ontem atacou diretamente o arcabouço legal do país ao baixar uma Medida Provisória que altera o Marco Civil da Internet, que levou sete anos sendo discutido. A MP limita o combate às fake news. O deputado Alessandro Molon (PSB-RJ), que foi relator do marco civil, disse em entrevista a Alvaro Gribel, no meu blog, que os advogados do partido já estavam preparando uma Ação Direta de Inconstitucionalidade (Adin) para entrar no STF. A MP é inconstitucional. Outro caminho pode ser a devolução da MP por não atender aos critérios de relevância e urgência. O doutor em Direito Francisco Brito Cruz, diretor do InternetLab, disse que “se as redes não puderem tirar do ar spam, discurso de ódio, assédio, bullying, desinformação, elas serão só ruído e não espaço de liberdade”. Para proteger seus seguidores, fortalecer sua máquina de mentiras e estimular atos contra a democracia, Bolsonaro fez uma MP inconstitucional e arbitrária. Fechou-se mais em sua bolha.
— É lamentável. O Brasil é o único país do mundo em que o governo não dá importância aos temas mais relevantes, a pandemia e a crise econômica. O presidente só se preocupa com motociatas. Gasta energia, a equipe de governo e o custo de transporte para isso. Nas últimas semanas, concentrou-se na organização e na mobilização para esse verdadeiro comício. A democracia pressupõe manifestação, mas não é isso que ele quer. O que está por trás é uma mobilização com outros interesses, ele está ameaçando as eleições. Nunca pensei que eu estaria em 2021 discutindo a sobrevivência da democracia, por conta de uma postura totalmente equivocada de um governo. Ele questiona esta eleição porque sabe que corre sério risco — disse Kassab.
Será um triste 7 de setembro. Em vez de data nacional a ser celebrada por todos, será o dia em que Bolsonaro tentará amedrontar o país convocando os seus radicais para as ruas e usando o aparato do Estado brasileiro, inclusive policiais militares. Isso para parecer forte, quando sabe que está cada vez mais fraco.
Fonte: O Globo
https://blogs.oglobo.globo.com/miriam-leitao/post/bolsonaro-foge-para-sua-bolha.html
Bolsonaro ataca STF e pressiona Fux em discurso na Esplanada
Acossado pela queda de popularidade, presidente diz que atos são 'ultimato para todos na Praça dos Três Poderes'
André de Souza, Bruno Góes e Jussara Soares / O Globo
BRASÍLIA — Investigado pelo Supremo Tribunal Federal (STF) e acossado pela queda de popularidade, o presidente Jair Bolsonaro voltou a adotar tom de intimidação e mandar recados ao Supremo Tribunal Federal (STF). Em discurso durante os atos de 7 de setembro na Esplanada dos Ministérios, em Brasília, ele afirmou hoje de manhã que “uma pessoa específica" da Praça dos Três Poderes, onde fica a sede da Corte, não pode continuar "barbarizando”.
— Não mais aceitaremos qualquer medida, qualquer ação ou sentença que venha de fora das quatro linhas da Constituição. Também não podemos continuar aceitando que uma pessoa específica da região dos três Poderes continue barbarizando a nossa população. Ou chefe desse poder enquadra o seu ou esse Poder pode sofrer aquilo que não queremos — disse.
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Enquanto ele falava, seus apoiadores gritavam "fora, Alexandre". O ministro do STF Alexandre de Moraes é o relator de inquéritos em que Bolsonaro e seus aliados figuram como investigados. O principal deles mira na existência de uma milícia digital suspeita de espalhar notícias falsas.
Discurso de Bolsonaro na Esplanada
https://www.facebook.com/jairmessias.bolsonaro/videos/269233055031491/
https://www.facebook.com/jairmessias.bolsonaro/videos/252448776756577
Por decisões de Moraes, diversos personagens ligados ao Palácio do Planalto, como o ex-deputado federal e presidente do PTB, Roberto Jefferson, foram para a cadeia. Em seu discurso, Bolsonaro não fez referência a nenhum caso específico, mas também foi crítico ao falar sobre detenções.
— Não podemos mais aceitar prisões políticas no nosso Brasil. Nós todos aqui na Praça (dos Três Poderes, onde também fica o Palácio do Planalto), juramos respeitar a nossa Constituição. Quem age fora dela ou se enquadra ou pede para sair.
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Em outro momento, Bolsonaro disse que era um "ultimato" para Praça dos Três Poderes, onde estão localizados, além do Palácio do Planalto, o Congresso Nacional e o STF.
— É um ultimato para todos na Praça dos Três Poderes. Todos devemos nos curvar à nossa Constituição — disse.
— Nós todos aqui na Praça dos Três Poderes juramos respeitar a nossa Constituição. Quem age fora dela, se enquadra ou pede para sair — disse.
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Bolsonaro também mirou os governadores, com os quais têm um histórico de confronto principalmente após as medidas de distanciamento adotadas na pandemia da covid-19.
— Muitos de vocês sentiram o peso da ditadura. Alguns governadores e prefeitos simplesmente ignoraram preceitos constitucionais. Muitos foram obrigados a ficar em casa. Vocês perderam o direito de ir e vir, ao trabalho. Imagine um desses ocupando a minha cadeira o que imporia à população — disse Bolsonaro.
Mais cedo, por volta das 8h, o presidente já havia falado no Palácio Alvorada. Durante outro discurso, ele se auto-intitulou porta-voz do povo brasileiro.
— Hoje é o dia do povo brasileiro que vai nos dar um norte. Vai nos dizer para onde o Brasil deve ir. Eu apenas hoje quero ser o porta-voz de vocês. E dizer que o que falarmos a partir de agora estou falando em nome de vocês povo brasileiro.
Uma pesquisa do Datafolha divulgada no mês passado revelou que o presidente bateu recorde de rejeição: 51% dos entrevistados disseram considerar o governo ruim ou péssimo.
Fonte: O Globo
https://oglobo.globo.com/politica/investigado-bolsonaro-ameca-stf-pressiona-fux-25187487
Fernando Gabeira: E tudo se acabar na quarta-feira
Uma das bandeiras do bolsonarismo está praticamente morta. É o voto impresso
Fernando Gabeira / O Globo
As manifestações bolsonaristas de amanhã devem ser grandes. Houve empenho do governo, intensa campanha nas redes sociais, financiamento para aluguel de ônibus do interior — enfim, um esforço excepcional.
Elas podem até ter algumas consequências adiante, mas, do ponto de vista de objetivo político, são um momento de sonho para vestir fantasias que não sobrevivem na quarta-feira.E, quando não há objetivo político válido, dificilmente uma força se impõe, mesmo havendo muita gente e até poder militar.
Uma das bandeiras do bolsonarismo está praticamente morta. É o voto impresso. Foi derrotado no contexto legal em que deveria ser analisado, e não há como voltar atrás. Nesse caso particular, estarão simplesmente carregando um defunto, na expectativa de que lhes possa ser válido no ano que vem, em caso de derrota eleitoral.
A outra bandeira do bolsonarismo será, aparentemente, a liberdade de expressão. Em termos abstratos, ninguém se coloca contra ela. A dificuldade é aceitar que se preguem a violência e a invasão de prédios públicos como se estivessem exercitando a liberdade, quando, de fato, ultrapassam seus limites legais.
Essa aceitação de limites está presente, por exemplo, no parecer da subprocuradora Lindôra Araújo, que denunciou o ex-deputado Roberto Jefferson.
Isso não significa que o tema não deva ser constantemente discutido. E o é no Brasil. Juízes têm censurado jornais; há debates sobre instruções do Supremo relativas a combate a fake news; o próprio Bolsonaro rejeitou uma lei que penaliza a divulgação em massa de notícias falsas. É um tema em aberto, mas a conclamação à violência e o racismo, para citar alguns, são limites legais que não podem ser transpostos apenas por atos de vontade.
Bolsonaro é presidente. Tem pouco a dizer diante de uma pandemia que não desapareceu, como creem alguns otimistas. Governa um país em que a economia estagnou, encontra diante de si uma crise hídrica que se desdobra também numa crise de energia.
Numa situação dessas, o presidente lidera manifestações pelo voto impresso ou por uma duvidosa concepção de liberdade. Isso é tão distante da realidade como conclamar as pessoas a comprar fuzis e definir como idiota quem está preocupado com os alimentos, cada vez mais caros.
O exame dos problemas reais do Brasil implica a definição da responsabilidade do presidente. Até a crise hídrica, de certa forma determinada por fenômenos como La Niña, seria mais branda se não houvesse tanto desmatamento e tantas queimadas estimulados pelo governo Bolsonaro.
Pode ser que se ouça nas ruas algum grito contra a corrupção. Mas será de uma amarga ironia. Bolsonaro apenas se aproveitou da bandeira. Os fatos descritos na CPI mostram como gigantescos golpes estavam armados contra os cofres públicos. As denúncias de rachadinha contra o filho ex-deputado estadual estendem-se ao filho vereador e alcançam o próprio gabinete de Bolsonaro.
Como se não bastassem essas revelações, o encontro com o setor fisiológico do Congresso revela que Bolsonaro, como ele próprio diz, se originou no Centrão e sempre se localizou nesse espaço político.
Muita gente pode ir para a rua, mas, se estiverem perdidos, de nada adianta serem muitos se perdidos de armas na mão.
O Brasil vive um momento dramático de crise sanitária ainda não vencida, crise econômica e social, crise ambiental, seca e escassez de energia, quase 15 milhões de desempregados.
Uma grande manifestação que ignore essa realidade e um presidente que se esconde dela servem apenas para mostrar como é profundo o abismo em que nos metemos e como será difícil superá-lo sem um grande debate sobre a reconstrução.
A cortina de fumaça que Bolsonaro cria para tentar sobreviver politicamente não nos deixa avaliar ainda quanto a democracia, o tecido social e os recursos naturais foram devastados neste período. É uma tarefa para a quarta-feira de cinzas.
Fonte: O Globo
https://blogs.oglobo.globo.com/opiniao/post/e-tudo-se-acabar-na-quarta-feira.html
Amazônia: Área de 500 mil campos de futebol é devastada em apenas um ano
464 mil hectares da Floresta Amazônica foram alvos de ações — legais ou ilegais - em apenas um ano
Arthur Leal / O Globo
RIO — Um estudo com base em imagens produzidas por satélites concluiu que, em apenas um ano, 464 mil hectares da Floresta Amazônica foram afetados pela exploração madeireira. A área equivale a quase três vezes a cidade de São Paulo ou meio milhão de campos de futebol. O levantamento, feito pela Rede Simex, com participação integrada do instituto Imazon e das ONGs Idesam e Imaflora, foi publicado à véspera do Dia da Amazônia, que é celebrado neste domingo (5).
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Os dados mostram que mais da metade destes desmatamentos, entre agosto de 2019 e julho de 2020, aconteu no estado do Mato Grosso (50,8%). O estado também lidera o ranking de mais explorações em terras indígenas. Por lá, ao todo, 236 mil hectares foram alvo da exploração madeireira. Houve sinal de exploração também no Amazonas (71 mil hectares), Rondônia (69,7 mil hectares), Pará (50 mil hectares), Acre (27,4 mil hectares), Roraima (9,4 mil hectares) e Amapá (730 hectares).
O estudo reforça que ainda não é possível apontar quantos destes hectares foram explorados com autorização dada pelo governo, pois vários dos estados não divulgam essas informações. Os pesquisadores cobraram maior transparência por parte dos governos.
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A maioria das áreas exploradas no período, segundo o relatório, concentra-se em imóveis rurais cadastrados (362,4 mil hectares, 78% do total). Os números destas categorias fundiárias também geram alerta. Houve registro também de perda de madeira em terras indígenas (24,8 mil hectares, 5% do total), em unidades de conservação (28,1 mil hectares, 6% do total), em assentamentos rurais (19 mil hectares, ou 4% do total), vazios cartográficos (17,9 mil hectares, ou 4% do total), e também em terras consideradas como "não destinadas" (12 mil hectares, ou 3% do total).
Os 464 mil hectares com exploração madeireira
- Mato Grosso — 50,8% do total — 236.091 hectares explorados
- Amazonas — 15,3% do total — 71.092 hectares explorados
- Rondônia — 15% do total — 69.794 hectares explorados
- Pará — 10,8% do total — 50.139 hecctares explorados
- Acre — 5,9% do total —27.455 hectares explorados
- Roraima — 2% do total — 9.458 hectares explorados
- Amapá — 0,2% do total — 730 hectares explorados
Raio-X das áreas mais afetadas
- Imóveis cadastrados: 362.428 hectares, 78% do total
- Terras não destinadas: 12.291 hectares, 3% do total
- Terras indígenas: 24.866 hectares, 5% do total
- Unidades de conservação: 28.112 hectares, 6% do total
- Assentamentos rurais: 19.016 hectares, 4% do total
- Vazios cartográficos: 17.956 hectares, 4% do total
Maitê Piedade:'As enchentes na Amazônia eram a cada 10 anos; agora são entre 2 ou 3'
Municípios mato-grossenses lideram ranking de exploração
- Aripuanã (MT) — 30.666 hectares
- Colzina (MT) — 29.999 hectares
- Porto Velho (RO) — 29.646 hectares
- Manicoré (AM) — 21.038 hectares
- Lábrea (AM) — 20.288 hectares
- Nova Maringá (MT) — 14.682 hectares
- Feliz Natal (MT) — 13.189 hectares
- Marcelândia (MT) — 13.089
* Título original modificado para publicação no portal da FAP
Merval Pereira: Vice-presidente Hamilton Mourão, terceira via?
Merval Pereira / O Globo
O presidente Bolsonaro acrescentou nos últimos dias mais uma preocupação às suas desditas. Além do receio de que um dos seus filhos, ou alguns deles, sejam presos em decorrência dos inquéritos abertos no Supremo Tribunal Federal (STF) devido aos desvios de dinheiro público (peculato) com as “rachadinhas” dos salários de servidores nos seus gabinetes parlamentares, ele teme que o Tribunal Superior Eleitoral (TSE) o torne inelegível para a eleição do ano que vem.
Não é por acaso que escolheu como alvos preferenciais os ministros Alexandre de Moraes e Luis Roberto Barroso. Este é no momento presidente do TSE, o outro o será durante a eleição presidencial. No Supremo, Bolsonaro acha que está resguardado, pois uma eventual punição depende de denúncia do Procurador-Geral da República, e não há indicação de que a renovação de seu mandato o tornou mais independente.
Ao contrário, como quer ir para o Supremo, Augusto Aras depende da reeleição de Bolsonaro. A próxima vaga será em maio de 2023, com a aposentadoria do ministro Ricardo Lewandowski, e em outubro do mesmo ano, com a saída da ministra Rosa Weber. Mesmo que, como tudo indica, o escolhido André Mendonça não venha a ser confirmado agora pelo Senado na vaga do ministro Marco Aurélio Mello, dificilmente Bolsonaro abrirá mão do apoio certo de Aras ao duvidoso de um novo Procurador-Geral.
A possibilidade de cassação da chapa Bolsonaro/Mourão pelo TSE é bastante difícil, depois que o tribunal deixou de cassar a chapa Dilma/Temer por “excesso de provas”. Mas há também hoje “excesso de provas” contra a campanha de Bolsonaro, por abuso do poder econômico. Se por alguma manobra política/jurídica chegar-se ao ponto de um consenso em torno do afastamento de Bolsonaro, o vice-presidente Hamilton Mourão assumiria a presidência sem nenhum problema, segundo avaliação de militares, e poderia se candidatar à reeleição em 2022.
Seria, por caminhos transversos, uma terceira via com apoio militar, depois de idealmente ter colocado ordem na bagunça institucional em que vivemos. O destino de Mourão está atrelado a essas variáveis, pois ele prefere continuar morando em Brasília. Uma candidatura a senador, no Rio, onde morava, ou Rio Grande do Sul, onde nasceu, teria preferência à possibilidade de vir a ser candidato ao governo do Rio de Janeiro. Mesmo que apareça neste momento à frente do deputado federal Marcelo Freixo nas pesquisas de opinião, é uma hipótese que está descartada pelo momento.
Ao mesmo tempo há um trabalho no Palácio do Planalto, que envolve ministros militares e o Chefe do Gabinete Civil Ciro Nogueira, para reaproxima-lo de Bolsonaro, o que vem se demonstrando difícil. Mesmo distanciado, está convencido de que não haverá arruaças nas manifestações marcadas para o Sete de Setembro, mesmo que Bolsonaro esteja esticando a corda ao máximo às vésperas da data, como se ela significasse a arrancada final para sua tomada do poder pela força, com apoio popular.
Bolsonaro tem vivido nos dias recentes em um mundo paralelo, e finge estar certo de que montam contra ele uma armadilha para impedi-lo de competir, ou então uma apuração fraudada para derrotá-lo. Seriam pretextos para um contragolpe, como classifica suas ações antidemocráticas.
Nada indica que terá sucesso, mas é capaz de provocar grandes confusões em Brasília e em São Paulo, onde discursará para seus seguidores. O discurso na Capital deve ter um tom mais contido, porque de nada adiantará tentar estimular, à la Trump, a invasão do Congresso ou do Supremo. O esquema de segurança na Praça dos Três Poderes estará reforçado, e a multidão contida à distância.
Mas, na Avenida Paulista, território de seu arqui-inimigo João Doria, Bolsonaro pode ficar tentado a insuflar seus seguidores à radicalização, o que, dependendo do que acontecer, pode acelerar as medidas judiciais contra ele. Quando escolheu o General Hamilton Mourão para seu vice, um dos zeros de Bolsonaro comemorou, dizendo que a oposição pensaria duas vezes antes de tentar impedi-lo. O feitiço virou contra o feiticeiro, e Mourão passou a ser visto por setores militares e políticos como possível solução para o problema em que Bolsonaro se tornou.
Ascânio Seleme: A terceira via ou o lunático
Ato em 7 de setembro pode ser gigante, pode ser barulhento, mas não vai funcionar; Bolsonaro nunca esteve tão solitário
Ascanio Seleme / O Globo
O resultado da maior mobilização popular já convocada em favor de Jair Bolsonaro e contra a democracia, marcada para o 7 de setembro, servirá paradoxalmente para isolar ainda mais o presidente com os seus radicais e o que resta do grupo parlamentar fisiológico que ainda lhe dá sustentação. Dois terços da população brasileira já disseram não aos seus atos criminosos reiterados. As pesquisas mostram que sua degradação se mede na casa de dois pontos ou mais por levantamento (no último, PoderData de 1º de setembro, perdeu cinco pontos para Lula). Agora, Bolsonaro viu empresários e banqueiros lhe virarem as costas através dos manifestos de diversos setores em favor da democracia e contra a aventura golpista do presidente.
Pode ser gigante, pode ser barulhenta. Mas não vai funcionar. Bolsonaro nunca esteve tão solitário. Todo governante começa a perder apoio no dia seguinte à sua posse. Alguns se recuperam e voltam a crescer, como ocorreu com os três presidentes que se reelegeram, com destaque para Lula que saiu mais forte do que entrou. Nenhum dos três, contudo, dinamitou pontes antes da reeleição. FHC queimou seu capital político no segundo mandato. Dilma, que maquiou os números da economia no primeiro mandato, foi descoberta no segundo e deu no que deu. Bolsonaro desmilinguiu-se antes de completar três anos de governo.
Com o desembarque do PIB nacional da aventura, o capitão terá que seguir com parlamentares fisiológicos, que se fingem de patriotas e que dizem pensar na nação quando defendem uma solução com Bolsonaro, com os radicais organizados, com os ignorantes políticos e com os antipetistas que só enxergam corrupção e comunismo quando miram a estrela vermelha. Mais grave para o presidente é que os manifestos em favor da democracia assinados pela Febraban, por sete entidades do agronegócios e outros setores organizados da economia apontam para uma fadiga que vai alimentar de maneira vigorosa daqui em diante a busca pela terceira via. Por um candidato que possa enfrentar Lula em condições de ganhar a eleição presidencial.
Sim, porque quem quer que seja este candidato, ele não entrará em campo para tirar Lula do segundo turno, mas sim para afastar Bolsonaro. A ideia de buscar um nome que pudesse substituir o petista no segundo turno vem se dissipando na medida em que Lula consolida seu poder eleitoral. Com as seguidas quedas de popularidade do presidente, e com este grito antidemocrático e golpista armado para o 7 de setembro, o objetivo agora é expurgar o atual ocupante da cadeira presidencial da disputa derradeira de 2022. Bolsonaro virou alvo porque é estúpido. Ele mesmo construiu o caminho que o trouxe até aqui.
Os candidatos lançados para ocupar este espaço (Ciro Gomes, João Doria, Eduardo Leite, Luiz Mandetta e agora Alessandro Vieira e Datena) terão um trabalho difícil pela frente, mas não impossível. Não é fácil derrotar um candidato à reeleição, ainda mais no primeiro turno. Nos Estados Unidos, apenas 11 dos 45 presidentes não conseguiram um segundo mandato. No Brasil nunca ocorreu. Os pré-candidatos de direita, centro-direita e centro-esquerda vão precisar formar uma ampla aliança em torno de projetos que sejam distintos dos do PT, embora da mesma forma inclusivos. Até Ciro pode ocupar este espaço, embora as concessões que terá de fazer acabarão por desfigurar sua candidatura.
A chance desta terceira via ter sucesso defenestrando Bolsonaro aumentou muito com a convocação para a parada golpista, e é aí que reside o paradoxo. Ela trouxe para o campo de jogo o capital nacional. Sem este apoio, Bolsonaro fica obviamente muito mais fraco. Os parlamentares que ainda o acompanham saberão medir de que lado será melhor se situar num futuro muito breve. E os conservadores e liberais brasileiros, muitos deles marcharão no 7 de setembro em apoio a Bolsonaro, terão uma opção fora do PT para seguir. Aí, poderão esclarecer se querem mesmo construir um país democrático ou preferem seguir um lunático.
Bom pai
Primeiro foram as rachadinhas, que começaram no gabinete de Jair e se espalharam pelos escritórios dos filhos parlamentares. Depois do Zerinho senador, agora o Zerinho vereador foi apanhado em flagrante delito. Não bastasse isso, aquela vontade de levar vantagem em tudo, como desviar dinheiro do auxílio moradia “para comer gente”, se esparrama entre todos os entes da família Bolsonaro. O filhote Jairzinho foi outro que entendeu bem a aula paterna, a ponto de se alinhar a um lobista investigado pela CPI da Covid (Marconny Albernaz, aquele que inventou uma doença e depois se escondeu para não depor) para abrir uma empresa de eventos e fazer tretas. Este também, como o primogênito da família, arrumou uma mansão para chamar de sua em Brasília. Não se pode negar que o presidente seja um “bom” pai. Tudo o que sabe, passou para os filhos. Dos métodos políticos ultradireitistas até as pequenas falcatruas do dia a dia.
Cara de bobo 1
O que o Banco do Brasil e a Caixa Econômica Federal têm contra a democracia? Ao tentar sem sucesso dinamitar o manifesto em favor da harmonia entre os Poderes, o torpedeador-chefe, Pedro Guimarães, presidente da CEF, ameaçou bancos privados com retaliações se o manifesto, já redigido e conhecido, fosse publicado. Guimarães é o mais frequente papagaio de pirata das lives presidenciais. Fica sempre ali, ao lado de Bolsonaro, rindo com aquela cara de bobo e aplaudindo todas as barbaridades proferidas pelo chefe. Quer ser seu vice na chapa de 2022. Naufragando, como tudo indica, imagina-se que vai buscar emprego no mercado financeiro, este mesmo que ele ameaçou por assinar o manifesto democrático.
Cara de bobo 2
André Esteves, do BTG, mostrou que se pela de medo de retaliações governamentais. Por que? Não sei. Segundo a jornalista Malu Gaspar, ele tentou “desfazer” a adesão da Febraban ao manifesto em favor da democracia. Agiu internamente contra o manifesto quando CEF e BB ameaçaram deixar a entidade se o documento saísse. Depois que o documento saiu, os bancos oficiais recuaram e Esteves ficou com o mico na mão. Pode dar emprego para seu amigo Pedro em 2022.
Momento pub
Não deixe para amanhã, compre hoje ainda mais uma arma para a sua defesa e segurança. Aproveite a legislação em vigor e amplie seu arsenal. Atenção, uma hora esta lei vai mudar. Compre agora o seu fuzil e tenha certeza que um dia ele vai estar sendo usado em Araçatuba. Ou na Rocinha.
Vossa senhoria
O brasileiro da camada de cima, por mais cordial que seja, trata de maneira desigual seus conterrâneos. Os mais abastados merecem salamaleques. Os mais humildes ganham no máximo um respeito condescendente. Isso ocorre por toda parte. Vejam o caso do motoboy Ivanildo Gonçalves da Silva, na CPI da Covid. O tratamento dispensado a todos os depoentes sem cargo público foi de “vossa senhoria”. Alguns senadores até se enganavam, mas para cima, chamando o depoente sem função de “vossa excelência”. Aí chegou o Ivanildo. Ele foi tratado de “senhor” por todos os senadores. Diversos se enganaram, mas para baixo, tratando o motoboy por “você”. Agora, me diga, qual a diferença entre Carlos Wizard e Ivanildo Gonçalves da Silva, além de um ser branco e rico e o outro preto e pobre?
Espanhol obrigatório
A deputada estadual Juliana Brizola (PDT) pediu e o Ministério Público do Rio Grande do Sul instaurou inquérito para investigar o governador e pré-candidato a presidente Eduardo Leite por descumprimento de preceito da constituição estadual estabelecido por emenda da deputada em 2018. Pela emenda, as escolas públicas gaúchas são obrigadas a oferecer aulas de língua espanhola aos alunos, determinação que Leite não efetivou. O argumento é simples e faz sentido. O estado tem extensa fronteira com Uruguai e Argentina, são 1774 quilômetros e 27 cidades nas divisas.
Brasil no passado
Brasileiro que vive no exterior e precisa de serviços consulares, como registrar nascimentos, casamentos e óbitos, tem que fazê-lo pessoalmente. Na era da informação, nenhum atendimento, a não ser consultas, pode ser feito de maneira remota, via internet. Não é tão difícil para quem mora em cidades estrangeiras em que haja base consular brasileira. O problema são as outras cidades, como Darwin, na Austrália. Se um brasileiro vier a morar lá e precisar de um serviço consular, terá de viajar 4.400 quilômetros até Perth. Se pudesse, com certeza este nacional pegaria um voo até Dili, no Timor Leste, 720 quilômetros ao norte, para resolver seu problema.
Greve geral
Já tem gente pensando na melhor forma de dar o troco ao 7 de setembro antidemocrático. Convocar uma greve geral em favor da democracia e contra o golpismo instalado no Palácio do Planalto. Tarefa difícil, mas levando-se em conta que os partidos de esquerda ainda mandam na maioria dos sindicatos e das federações sindicais, vai que cola.
Fonte: O Globo
https://oglobo.globo.com/politica/a-terceira-via-ou-lunatico-25184684
Pablo Ortellado: O que temer no 7 de Setembro?
Há muita expectativa quanto à dimensão e às consequências da manifestação em apoio a Bolsonaro no 7 de Setembro
Pablo Ortellado / O Globo
O principal temor é que o 7 de Setembro possa ser uma espécie de 6 de janeiro brasileiro — manifestantes pró-Trump invadiram o prédio do Congresso nos Estados Unidos naquele dia para tumultuar a sessão que confirmaria a vitória eleitoral de Joe Biden. Cinco pessoas morreram, e 138 policiais ficaram feridos.
Mas há diferenças importantes entre o 6 de janeiro americano e o 7 de Setembro brasileiro. A principal delas é que a invasão do Capitólio foi um movimento ousado, que tomou as autoridades de surpresa.
Aqui, todos os piores cenários foram antecipados pelas autoridades: a participação na manifestação de policiais militares armados, o bloqueio de estradas por caminhoneiros e uma invasão ao prédio do Supremo Tribunal Federal ou do Congresso. Pode ser que as precauções tomadas não sejam suficientes, mas a Justiça e os governadores tomaram medidas para monitorar e impedir essas ações.
Outra diferença importante é que o 6 de janeiro americano foi um gesto desesperado do trumpismo, que havia sido derrotado eleitoralmente. Aqui, embora as pesquisas indiquem que o apoio a Bolsonaro está caindo, ainda falta mais de um ano para as eleições.
Os bolsonaristas têm feito um grande esforço de mobilização — provavelmente o maior desde que o presidente tomou posse. Esse esforço se justifica. Bolsonaro tem perdido apoio mês a mês, e as perspectivas da economia e o avanço da variante Delta não sugerem uma inversão de rumo.
As aspirações golpistas de Bolsonaro precisam de respaldo popular ou pelo menos de uma imagem de respaldo popular. Seu discurso é que ele, na condição de chefe supremo das Forças Armadas, vai fazer “o que o povo pedir”.
No entanto, até agora, o saldo da mobilização de rua tem sido amplamente favorável à esquerda. As manifestações contra Bolsonaro em maio, junho e julho foram muito grandes, e a maior manifestação bolsonarista até agora, no 1º de Maio, deve ter sido pelo menos três vezes menor.
Talvez a opção pelas motociatas tenha sido uma maneira de mascarar essa diferença, seja porque motociata é um gênero de mobilização não diretamente comparável com uma passeata ou comício, seja porque a reunião de motos amplifica a sensação de multidão. A concentração das manifestações do 7 de Setembro em apenas duas cidades, São Paulo e Brasília, compõe essa estratégia de aumentar artificialmente a sensação de apoio.
Além disso, Bolsonaro recebeu um presente da esquerda. A tradicional manifestação do Grito dos Excluídos, que acontece todo 7 de Setembro, neste ano foi convocada sem muito empenho e organização, e a expectativa é que seja pequena.
É absolutamente certo que o bolsonarismo vai comparar registros fotográficos das duas manifestações para desmentir os institutos de pesquisa, “provar” a popularidade do presidente e dizer que “o povo” o está autorizando a agir.
Fonte: O Globo
https://blogs.oglobo.globo.com/opiniao/post/o-7-de-setembro-pode-ser-nossa-invasao-do-capitolio.html
Galdino Pataxó: O que aconteceu com os jovens que incendiaram indígena
William Helal Filho / Blog do Acervo / O Globo
BRASÍLIA, 1997
Galdino Jesus dos Santos estava em Brasília com outros integrantes da etnia Pataxó Hã-Hã-Hãe para participar de reuniões com representantes do governo federal sobre conflitos fundiários envolvendo as terras indígenas de seu povo, no Sul da Bahia. Na madrugada de 20 de abril de 1997, após participar de eventos do Dia do Índio, ele chegou na pensão onde estava hospedado, na Asa Sul, mas foi impedido de entrar. Sem opção, o agricultor de 44 anos, morador da Aldeia Caramuru Paraguaçu, decidiu repousar num ponto de ônibus a 20 metros do imóvel. Pouco depois, porém, foi acordado com o corpo coberto por chamas.
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Naquela madrugada, cinco jovens de famílias ricas da capital acharam que seria engraçado atear fogo numa pessoa que dormia na rua. Um dos criminosos era filho de um juiz federal. Outro, enteado de um ex-presidente do Tribunal Superior Eleitoral (TSE). Max Rogério Alves, Eron Chaves de Oliveira, Tomás Oliveira de Almeida, Antonio Novely e um menor de idade, todos de 17 a 19 anos, jogaram sobre Galdino um líquido inflamável e riscaram pálitos de fósforo. Enquanto a vítima era engolida pelas labaredas, o grupo fugia num Chevrolet Monza.
O menor envolvido era Gutemberg Nader de Almeida Júnior, hoje servidor concursado da Polícia Rodoviária Federal (PRF). Atualmente, aliás, todos os participantes na morte do indígena são servidores de órgãos como o Senado Federal e até mesmo o Tribunal de Justiça (veja detalhes no fim do post).
O indígena chegou a ser socorrido com vida. O advogado Evandro Castelo Branco Pertence, filho do então presidente do Supremo Tribunal Federal (STF), Sepúlveda Pertence, estava saindo de uma festa de casamento por volta das 5h quando viu a bola de fogo humana a Avenida Asa Sul. Ele parou o carro e cobriu Galdino com seu paletó, auxiliado por outro homem, enquanto a vítima gritava pedindo ajuda. Depois, o advogado usou o extintor de incêndio de seu carro. O pataxó de 44 anos foi levado, consciente, ao Hospital da Asa Norte. Mas morreu horas depois.
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"Quando vi, pensei que a parada de ônibus estava pegando fogo. Não me conformo que alguém no mundo possa fazer isso", disse Pertence ao GLOBO.
A vítima chegou ao pronto-socorro com 95% do corpo queimados. Ele estava lúcido e lembrou que tinha batido na porta da pensão na Asa Sul, mas que a responsável pelo imóvel, uma senhora chamada Vera Moretti, não o deixara entrar porque estava muito tarde. Pouco após ser admitido no hospital, Galdino apresentou insuficiência respiratória e renal agudas e começou a expelir sangue pela urina, o estágio terminal de uma pessoa queimada. O pataxó morreu momentos depois. Considerado um bom agricultor e também uma espécie de conciliador na aldeia onde morava, o líder indígena tinha mulher e era pai de três filhas.
Assassinos de Galdino na delegacia: 'Era para ser uma brincadeira', disseram eles | Foto de Roberto Stuckert Filho/Agência O GLOBO
"Ele era uma pessoa muito feliz. Gostava de trabalhar na roça. A gente nadava no rio, pegava traíra, piaba e acari. Mas hoje não dá mais peixe. Os brancos vêm da cidade pescar muito, e o rio ficou batido", descreveu o primo Tatuti Pataxó, de 22 anos, no dia seguinte ao crime. Ele e os demais indígenas tinham ido a Brasília procurar o governo federal devido a uma situação de conflito com fazendeiros em suas terras originárias. O crime hediondo que vitimou Galdino deixou todos revoltados. "Cadê o governo? Cadê a Justiça? Que país é este? Além de matar na aldeia, agora matam na cidade?", protestou o cacique Tito Mowé.
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Os assassinos foram presos graças a uma testemunha que seguiu o carro dos rapazes até conseguir a anotar a placa. Eles foram detidos cerca de duas horas depois do crime. A polícia chegou primeiro na casa de Max, que dirigia o carro. Ele confessou o que tinha feito e conduziu os agentes até as residências de seus comparsas. Na delegacia, todos negaram a intenção de matar Galdino. Diziam que era para ter sido "uma brincadeira". Na época, a Polícia Civil decidiu investigar a participação deles em episódios semelhantes. No ano enterior, dois moradores de rua haviam sido incendiados nas mesmas condições do indígena.
Cacique do povo Xavante no ponto de ônibus onde Galdino foi morto, em 1997 | Foto de Sérgio Marques/Agência O GLOBO
As investigações mostrariam que o grupo comprou dois litros de álcool num posto de combustível minutos antes do crime. Em entrevista ao GLOBO dois dias após o assassinato, Max Rogério contou que eles tinham feito um lanche e estavam rodando aquele trecho da cidade de automóvel, procurando o que fazer na madrugada de Brasília, quando viram um homem dormindo no ponto de ônibus e tiveram a "ideia" de atear fogo nele. O criminoso garantiu que não sabia que a vítima era indígena e que, portanto, o crime não tinha relação com o Dia do Índio, celebrado na véspera.
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"A gente pensou em dar um susto. Foi só isso, uma brincadeira. Pensamos que ele ia acordar, dar um pulo e sair correndo", contou Max Rogério, antes de explicar por que, então, nenhum deles prestou socorro quando viu que o indígena estava desesperado enquanto era engolido pelo fogo. "A gente ficou apavorado. Pensamos em voltar para acudir. Aí, chegou um carro, ninguém sabia o que fazer. Fomos embora. Era para ser uma brincadeira, só isso, mas acabou com a vida da gente".
Documentos de identidade dos assassinos de Galdino Pataxó | Foto de Roberto Stuckert Filho/Agência O GLOBO
O assassinato gerou comoção no país. Galdino fora morto na madrugada após participar de eventos em celebração ao Dia do Índio na Fundação Nacional do Índio (Funai). Houve protestos em Brasília. No funeral do indígena, os pataxós se pintaram para a guerra e exigiram justiça das autoridades. O então presidente da República, Fernando Henrique Cardoso, que estava em viagem oficial no Canadá, disse que o "episódio trágico ultrapassou todos os limites" e que "nós queremos ser um país diferente, mas não estamos cumprindo esse objetivo".
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Como era menor, Gutemberg cumpriu medida sócio-educativa. Em 2001, um júri popular condenou os quatro maiores de idade por homicídio triplamente qualificado (motivo torpe, meio cruel e uso de recurso que impossibilitou defesa à vítima). Eles foram sentenciados a 14 anos de prisão em regime fechado. Em 2002, porém, a 1ª Turma Criminal deu aval para que exercessem funções administrativas em órgãos públicos e voltassem para dormir no Complexo Penitenciário da Papuda. Depois, os assassinos de Galdino tiveram permissão para estudar em universidades fora da cadeia. Até que, em 2004, os rapazes conquistaram direito a liberdade condicional.
Hoje, os cinco são servidores concursados em diferentes órgãos públicos. Além de Gutemberg, que atua na Polícia Rodoviária Federal (PRF), seu irmão mais velho, Tomás Oliveira de Almeida, é técnico do Senado Federal, com remuneração básica de R$ 21,4 mil, de acordo com a página de Transparência no site da Casa. Eron Chaves é agente de trânsito no Departamento de Trânsito do Distrito Federal (Detran-DF) e recebe salário bruto de mais de R$ 15 mil, segundo a página de Transparência do site do governo do DF. Antônio Novely Vilanova é fisioterapeuta da Secretária de Saúde do Distrito Federal e também ganha mais de R$ 15 mil por mês, conforme a mesma fonte. Já Max Rogério é analista do Tribunal de Justiça do Distrito Federal e Territórios (TJ-DF) desde que foi aprovado em concurso para o órgão, em 2016.
William Helal Filho / O Globo
Jornalista formado pela PUC-Rio em 2001. Entrou na Infoglobo pelo programa de estágio, foi repórter e editor de diferentes áreas da redação. Hoje é responsável pelo Acervo O Globo e o treinamento de estagiários e trainees.
Merval Pereira: A política na economia por conta dos precatórios
Solução avalizada pelo Judiciário, no sentido de tirar os precatórios do limite do teto de gastos, não é constitucional
Merval Pereira / O Globo
O pagamento de precatórios por parte do governo federal está virando uma questão política que só poderá ser resolvida pelo Congresso. A intenção de encontrar uma solução que fosse avalizada pelo Judiciário, por meio do Conselho Nacional de Justiça (CNJ), para evitar que a confusão avançasse no sentido de tirar os precatórios do limite do teto de gastos, parecia boa, mas não é constitucional.
O Tribunal de Contas da União (TCU) entrou na negociação com o Ministério da Economia para encontrar uma fórmula que fosse adequada economicamente e viável juridicamente, pois o TCU considerava que parcelar precatórios, como o governo chegou a propor ao Congresso por uma emenda constitucional, traria um grande dano à imagem do país. O ministro Bruno Dantas, vice-presidente do TCU e especialista em finanças públicas, disse ao ministro da Economia, Paulo Guedes, que o melhor a fazer seria reforçar o teto, aplicando-o inclusive aos precatórios mediante criação de um sublimite.
O raciocínio é que o teto de gastos congelou a despesa primária da União de 2016 e a corrigiu pelo IPCA dos anos seguintes. Como, conceitualmente, os precatórios são despesa primária, explica Dantas, não faz sentido congelar tudo e deixar os precatórios sem uma trava, para crescer fora do ritmo das outras despesas, que só crescem pelo IPCA, contribuindo para comprimir o teto e impactando em gastos discricionários indispensáveis, como manutenção de estradas.
Qual o sentido de permitir que os pagamentos para essa despesa subam além do que a emenda constitucional do teto de gastos permitiu? — pergunta o ministro Bruno Dantas. Para ele, essa regra seria mais transparente, porque o precatório que chegar depois de ultrapassado o teto será remanejado e quitado no ano seguinte. Isso daria previsibilidade e transparência.
Procurado, o presidente do Supremo Tribunal Federal (STF) e do Conselho Nacional de Justiça (CNJ), ministro Luiz Fux, se colocou à disposição para ajudar, mas não há maneira de o CNJ, que acompanha o pagamento dos precatórios, que são dívidas judiciais, entrar na questão sem uma autorização do Congresso. Fux, consultando os demais ministros do Supremo, decidiu esperar o pronunciamento do Congresso. O caminho agora é negociar com a base governista para aprovar uma PEC que permita esse mecanismo de limitar o pagamento dos precatórios dentro do teto de gastos, transferindo para o ano seguinte o que faltar.
A posição do ministro da Economia, Paulo Guedes, também foi criticada. Ao mesmo tempo que ficou entusiasmado com a solução que seria pacificada pelo Conselho Nacional de Justiça, diz que a solução deveria sair mesmo do Congresso por meio de uma mudança constitucional. A verdade é que o governo não tem como pagar os R$ 90 bilhões que deve em precatórios e não tem controle também do Congresso para garantir que a PEC a ser enviada não será usada para furar o teto de gastos.
Ou então quer que o Congresso assuma essa tarefa, o que provavelmente será feito com satisfação pelos parlamentares, que terão mais dinheiro para suas emendas se os precatórios, ou o novo Bolsa Família, forem retirados do teto de gastos. Nos dois casos, a despesa seria da mesma ordem, de R$ 90 bilhões, o que caracterizaria a quebra do equilíbrio fiscal e repercutiria negativamente no risco Brasil.
Entre os precatórios, cerca de R$ 16 bilhões são dos estados, e seria possível retirá-los da fila de pagamento para negociar em separado numa mesa de conciliação, sugestão do ministro Gilmar Mendes. O importante é encontrar uma solução que não impacte nos precatórios de pessoas físicas.
Além de todos os problemas técnicos envolvidos na questão, o ambiente político hoje está impeditivo para qualquer negociação mais delicada. Até o dia 7 de setembro, quando estão marcadas manifestações contra o Supremo em várias capitais, não há condição de achar uma solução negociada entre o Executivo e o Judiciário. O presidente do Supremo, ministro Luiz Fux, fará uma declaração hoje, na abertura dos trabalhos, alertando que é preciso respeitar as decisões do Judiciário e que a democracia não pode ser atacada nas manifestações marcadas para o Dia da Independência.
Fonte: O Globo
https://blogs.oglobo.globo.com/merval-pereira/post/politica-na-economia.html
Economia estagnada: PIB encolhe 0,1% no 2º trimestre, pior que o previsto
Resultado é considerado estabilidade pelo IBGE e teve impacto do desempenho da agricultura. Inflação elevada e crise hídrica preocupam
Carolina Nalin e Ivan Martínez-Vargas / O Globo
RIO - A economia brasileira teve variação negativa de 0,1% no segundo trimestre de 2021, em comparação com o primeiro trimestre do ano. O resultado indica estabilidade, segundo os dados divulgados pelo IBGE nesta quarta-feira, sobre o Produto Interno Bruto (PIB, conjunto de bens e serviços produzidos pelo país).
O desempenho veio abaixo da expectativa do mercado. Segundo a mediana das projeções de analistas ouvidos pela Reuters, era esperado alta de 0,2%.
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No primeiro semestre, o PIB acumula alta de 6,4%, pois a base de comparação é fraca, já que o país vive uma pandemia de Covid-19 desde março do ano passado. No acumulado nos quatro trimestres, terminados em junho de 2021, o PIB cresceu 1,8%.
O PIB já tinha voltado ao patamar do quarto trimestre de 2019, período pré-pandemia, com o avanço de 1,2% no primeiro trimestre deste ano, e assim parmanece. No entanto, a economia brasileira continua 3,2% abaixo do pico da atividade econômica registrado em 2014 e há vários riscos que podem travar seu crescimento daqui para frente.
Agropecuária e indústria recuam
Pelo lado da oferta, a agropecuária e a indústria apresentaram resultado negativo na comparação com o primeiro trimestre de 2021: houve queda de 2,8% e 0,2%, respectivamente. Já os serviços avançaram 0,7% no período.
— Uma coisa acabou compensando a outra. A agropecuária ficou negativa porque a safra do café entrou no cálculo. Isso teve um peso importante no segundo trimestre. A safra do café está na bienalidade negativa, que resulta numa retração expressiva da produção — explica a coordenadora de Contas Nacionais do IBGE, Rebeca Palis.
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A atividade industrial também recuou devido às quedas de 2,2% nas indústrias de transformação e de 0,9% na atividade de eletricidade e gás, água, esgoto, atividades de gestão de resíduos.
Essas quedas acabaram anulando a alta de 5,3% nas indústrias extrativas (como a de petróleo e minério de ferro) e de 2,7% na construção.
— A indústria de transformação é influenciada pelos efeitos da falta de insumos nas cadeias produtivas, como é o caso da indústria automotiva, que lida com a falta de componentes eletrônicos. É uma atividade que não está conseguindo atender a demanda. Já na atividade de energia elétrica houve aumento no custo de produção por conta da crise hídrica que fez aumentar o uso das termelétricas — acrescenta Rebeca.
Quase todos os segmentos de serviços tiveram alta.
Consumo das famílias fica estável
Pela ótica da demanda, somente o consumo do governo apresentou alta, com crescimento de 0,7%. O consumo das famílias não variou no período (0,0%) e os investimentos, que chegaram a subir 4,6% no primeiro trimestre, recuaram 3,6%.
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— Apesar dos programas de auxílio do governo, do aumento do crédito a pessoas físicas e da melhora no mercado de trabalho, a massa salarial real vem caindo, afetada negativamente pelo aumento da inflação. Os juros também começaram a subir. Isso impacta o consumo das famílias — observa Rebeca.
A balança comercial brasileira teve alta de 9,4% nas exportações de bens e serviços, a maior variação desde o primeiro trimestre de 2010. Na pauta de exportações, houve destaque para a safra de soja estimulada pelos preços favoráveis.
Por outro lado, as importações caíram 0,6% na comparação com o primeiro trimestre do ano.
Comparação com o segundo trimestre de 2020
Na comparação anual, o PIB avançou 12,4% no segundo trimestre deste ano, com alta de 1,3% na agropecuária, 17,8% na indústria e 10,8% nos serviços.
Pela ótica da despesa, o consumo das famílias cresceu 10,8%. Os investimentos avançaram 32,9% no segundo trimestre. Esse aumento é justificado pelos resultados positivos na produção interna, na importação de bens de capital e na construção. O consumo do governo teve alta de 4,2%.
Inflação e crise hídrica preocupam
Analistas avaliam que o avanço da campanha de vacinação, somado à diminuição das restrições à mobilidade, tende a abrir espaço para a recuperação dos segmentos do setor de serviços, que ainda estão abaixo do pré-pandemia. Os serviços respondem por cerca de 70% do PIB.
Por outro lado, pesa contra a inflação elevada, que chegou a 8,99% em 12 meses, corroendo a renda dos brasileiros e impactando o consumo das famílias. O aumento da taxa de juros básica, a Selic - hoje em 5,25% ao ano -, também encarece o custo do crédito para pessoas e empresas.
Há riscos que podem dificultar o avanço de alguns segmetos econômicos. A indústria ainda enfrenta a escassez de componentes por conta da desorganização global de cadeias produtivas e, agora, teme um possível racionamento de energia, com a piora da crise hídrica.
O acionamento das termelétricas, diante do baixo nível dos reservatórios, já resulta em aumento do custos de energia para a produção em todo o setor.
Revisão de projeções
Na agricultura, o clima adverso já reduz a produtividade e deve provocar nova alta no preço dos alimentos ao consumidor, que já lida com uma inflação nos preços dos alimentos e de outros itens como energia e combustíveis.
Diante disso, o resultado tem sido revisões do PIB para baixo. Há três semanas o mercado tem recuado nas projeções para o indicador, segundo o Boletim Focus.
O mais recente, publicado na última segunda-feira, indicou que analistas esperam crescimento de 5,22% em 2021, variação negativa em 0,03 ponto percentual em relação ao dado anterior.
Fonte: O Globo
https://oglobo.globo.com/economia/economia-estagnada-pib-encolhe-01-no-2-trimestre-pior-que-previsto-25178984
Bolsonaro é aconselhado a deixar para 2022 definição do partido para reeleição
Popularidade em baixa é usada por Ciro Nogueira para adiamento. Interlocutores avaliam que ministro quer ganhar tempo no PP
Jussara Soares / O Globo
BRASÍLIA — O presidente Jair Bolsonaro tem sido aconselhado a deixar para o início do ano que vem a definição do partido pelo qual vai disputar a reeleição. O principal defensor do adiamento é o ministro da Casa Civil, Ciro Nogueira, que chegou ao cargo há um mês com as missões de melhorar a articulação política em meio à crise institucional e organizar as bases para o projeto de um novo mandato.
O principal argumento é a popularidade em baixa do presidente: no início de julho, o Datafolha apontou que 51% dos brasileiros reprovavam a gestão, um recorde, e levantamentos internos recentes apontam um desgaste acentuado também fruto do discurso inflamado contra o Judiciário e a respeito de outros temas — na sexta, ele defendeu que todos os cidadãos comprassem um fuzil.
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A interlocutores, Nogueira também afirmou que o desempenho de Bolsonaro nas pesquisas de intenção de voto será crucial para a definição da chapa. Em um cenário de recuperação, ficará livre para escolher um nome de confiança; caso contrário, será obrigado a fazer uma composição em que o partido do vice terá um peso muito relevante.
Bolsonaro, que está sem legenda desde que deixou o PSL, em outubro de 2019, havia estabelecido março como limite para a definição. O presidente dizia não querer repetir o que ocorreu em 2018, quando ingressou no PSL a sete meses da eleição. O projeto de controlar o Patriota, no entanto, esbarrou em desavenças internas na sigla, que hoje tem o senador Flávio Bolsonaro (RJ) em seus quadros. Também há conversas com PL, PTB e PMB.
Estratégia para aliviar pressão
Para políticos que acompanham as movimentações partidárias para 2022, Nogueira age também para diminuir a pressão para que o PP, partido do qual é presidente licenciado, receba Bolsonaro e seu grupo. Embora a legenda esteja no comando da Casa Civil, internamente há resistências ao presidente em razão dos atritos que ele provoca e por questões políticas locais, casos de estados como Bahia Maranhão, Pernambuco e Bahia. Na viagem que fez pelo Nordeste, o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva se reuniu com nomes do partido, casos do deputado federal Dudu da Fonte (PE) e o vice-governador da Bahia, João Leão.
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— A ida do presidente para o PP vai depender da retomada da economia e da recuperação dele nas pesquisas. O ministro Ciro Nogueira e boa parte do partido estão empenhados nisso, mas se não acontecer (a melhora econômica e a reviravolta nas pesquisas), o Ciro vai consultar os diretórios estaduais, e será decidido pela maioria — resume o deputado federal Fausto Pinato (PP-SP).
Fonte: O Globo
https://oglobo.globo.com/politica/bolsonaro-aconselhado-deixar-para-2022-definicao-do-partido-para-disputar-reeleicao-25177903